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O VELHO DO RESTELO
Valério Chaves
Des. inativo TJPI
Um dia desses, como costumeiramente
faço nas horas vagas, quando procurava sintonizar uma emissora de rádio, ouvir
um apresentador de programa noturno perguntar para um ouvinte se ele sabia
responder o que era experiência.
Depois de algumas respostas
aleatórias não condizentes com a pergunta formulada no ar, o próprio
perguntador respondeu dizendo que experiência era tudo aquilo que a gente pensa
que sabe com base na quantidade de vezes que errou na vida.
Do alto de toda essa sabedoria
contida na resposta daquele locutor de rádio, pude compreender que o tempo
vivido faz a gente olhar para trás, examinar as atitudes certas que tomou, e
talvez, decepcionado com o que errou ou deixou de fazer, vê que realmente o
tempo ajuda a aprimorar a convivência social, familiar e todas as etapas
futuras da vida.
À medida que os anos vão passando
(envelhecendo), parece que mais razão a gente vai dando a Camões quando ele
fala, no célebre episódio do Velho do Castelo (canto IV, estrofes 94-104), de
um velho que através de um discurso veemente, condenando a aventura insana de
Vasco da Gama iniciando viagem às índias, no momento em que este se despedia do
porto de Belém, em 1492.
Em “Os Lusíadas”, Camões diz em
verso que o próprio Vasco da Gama falou do episódio ao rei de Melinde (África)
no relato que fez de sua viagem:
94 - (O Velho do Restelo)
Mas um velho d’aspecto venerando
Que ficava nas praias, entre a
gente,
Postos em nós os olhos, meneando
Três vezes a cabeça, descontente,
A voz pesada um pouco alevantando
Que nós no mar ouvimos claramente,
C’um saber só de experiência feito,
Tais palavras tirou do experto
peito.
Como se pode extrair das estrofes
seguintes desse poema camoniano, o discurso do Velho, que representava a
opinião conservadora da época, não era inteiramente rejeitado por Camões, pois
não obstante sua empolgação com a aventura da viagem ultramarina, impelida pelo
desejo de riqueza e fama, representava também a expressão de suas ideias
divididas entre o Humanismo pacifista e os ideais da Cavalaria e das Cruzadas
organizadas por nobres europeus, com notáveis consequências políticas e
religiosas.
Ao lado dos perigos e das
inconveniências da viagem de Vasco da Gama, inclui o que em grego se chamava
skhetliasmós, ou seja, uma reclamação visando condenar a viagem ou a persuadir
o viajante a desistir de fazê-la.
Portanto, mirando-se em assuntos ou
pessoas dos tempos atuais, poder-se-ia dizer que Vasco da Gama à luz do
pensamento do Velho do Restelo, representa hoje aqueles que, por vaidade,
cobiça de riqueza ou prestígio político, se lançam às aventuras e aos
interesses pessoais despreocupados com o futuro da Pátria e bem-estar da
sociedade.
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