quinta-feira, 17 de março de 2022

FÉ, AMOR, ESPERANÇA...



FÉ, AMOR, ESPERANÇA...


José Expedito Rêgo


Não tenho fé. Não consigo professar nenhuma das religiões por mim conhecidas. Ter fé é uma questão de sentimento, independe da razão. A lógica dos homens não pode provar ou negar a existência de Deus. Afirmar que todo relógio tem necessariamente um fabricante leva à indagação de quem criou o fabricante e que fabricou o criador, numa interminável cadeia. Só a dúvida é real. Claro que Deus pode existir, mas nós, pobres mortais, nada sabemos a respeito dele. Alguns podem senti-lo, tenho inveja desses.


Mesmo sem fé, procuro amar o próximo. Na profissão que exerço torna-se fácil. Durante quarenta anos de medicina, tive muita raiva, fiz talvez alguma maldade, mas a cota de bem que espalhei foi grande. Os pobres de Oeiras e Floriano podem atestá-lo facilmente. Um amigo disse-me certa vez que me admirava porque pratico o bem sem ter esperança de recompensa, além da morte; ao contrário dos religiosos que agem na expectativa de ganhar o céu. Isso me lembra Bertrand Russel, para o qual Sócrates, o grande filósofo grego, demonstrou imensa coragem ao ingerir a cicuta, a que foi condenado, conversando tranquilamente com seus discípulos, ensinando-lhes a doutrina da alma imortal. Entretanto, continua Russel, Sócrates provaria maior coragem, se tivesse bebido o cálice de veneno, na certeza de que a morte é o fim de tudo.


Acredito na bondade natural dos homens. Não é preciso o prêmio de um paraíso para que sejamos bons. Não almejo retribuição, neste mundo ou outro. Procuro ser bom porque gosto.


Tenho esperança. Apesar da maldade que vemos ainda espalhada pelo mundo, o homem encontrará um dia a paz do bem viver. Há momentos em que tudo parece perdido, mas sempre uma luz brilha à nossa frente. O ser humano tem melhorado bastante através dos tempos. Se voltarmos algumas páginas da história, veremos que houve maiores desgraças, o homem já foi perverso e ruim. Calamidades como o massacre de cristãos nos primeiros anos do Império Romano, não mais existirão. Não veremos outra vez os dias da Inquisição ou dos navios negreiros. O extermínio de judeus pelo nazismo é uma página definitivamente ultrapassada. Não mais teremos, no Brasil, ditaduras militares, ao que tudo indica.


Um moderno maniqueísmo, sem deuses nem demônios, fará que o bem finalmente vença o mal. O homem compreenderá um dia o amor é o caminho único para a felicidade. Pena que não viverei para presenciar esse final ditoso. Talvez ele só aconteça quando nossa espécie tiver para outro planeta. 

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