sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

DISCURSO DE RECEPÇÃO A 5 NOVOS ACADÊMICOS DA APC (*)

Elmar Carvalho pronuncia seu discurso de recepção aos novos acadêmicos

Diva Figueiredo e Aurélio Melo, novos acadêmicos
Manuel Domingos Neto, presidente da APC
Fides Angélica, Felipe Mendes e Manuel Domingos Neto
Severo Eulálio, Paulo Gutemberg e Manuel Domingos Neto
Felipe Mendes, Messias Júnior e Diva Figueiredo




DISCURSO DE RECEPÇÃO A 5 NOVOS ACADÊMICOS DA APC (*)
 

Elmar Carvalho

 

Nesta noite festiva e cultural, a Academia Piauiense de Cultura se regozija em receber cinco novos acadêmicos, figuras emblemáticas e proeminentes nas searas da cultura, da intelectualidade e das artes, a primeira solenidade de posse após a sua instalação efetiva, na memorável noite do dia 23/07/2022, acontecida no Porto das Barcas, em que tomaram posse seus 40 membros fundadores.

Não posso deixar de referir que nesta oportunidade também será lançado o número inaugural da revista Peleja (ano 0, nº 1, fevereiro de 2025), que será o órgão de divulgação de nosso sodalício. Não posso usar outra expressão, a não ser proclamar que esse número está magnífico, pela qualidade do papel couchê em que foi impressa, pela sua excelente diagramação e, sobretudo, pelas matérias nela coligidas e pela beleza de suas ilustrações e fotografias. E os novos acadêmicos contribuíram para a sua excelência, através de textos, formatação e programação visual. 

Fui designado, em reunião dirigida pelo nosso presidente Manuel Domingos Neto, para fazer o discurso de recepção aos cinco novos confrades. Missão muito honrosa, no entanto, muito difícil, porquanto em tempo exíguo terei que saudar e louvar pessoas tão valorosas, detentoras de muitos títulos e conquistas e de extensos e ricos currículos. Mais difícil ainda porque devo dedicar aproximadamente o mesmo tempo e atenção a cada um, de modo que os louvores e encômios sejam de idêntica lapidação e quilate. Seguirei a ordem do número das cadeiras que ocuparão.

Felipe Mendes de Oliveira será o primeiro ocupante da cadeira nº 41, cujo patrono, por ele escolhido, é o professor Manoel Paulo Nunes. Nasceu em Simplício Mendes, em 19 de abril de 1949. Formou-se em Economia. Especialista em Consultoria Industrial e mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Nosso confrade exerceu os mais importantes cargos públicos, entre os quais citarei os seguintes: secretário da Fazenda e do Planejamento do Estado do Piauí; secretário do Planejamento e de Finanças da Prefeitura de Teresina; presidente da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba – CODEVASF; Deputado Federal em três mandatos, tendo participado da elaboração da Constituição Federal de 1988. Congressista dos mais atuantes, conseguiu verba para importantes obras no Piauí, entre as quais várias barragens, Hospital Universitário (UFPI) e Tabuleiros Litorâneos. Professor aposentado de Economia (UFPI). Meu confrade na Academia Piauiense de Letras.

Autor, entre outros, do livro Economia e Desenvolvimento do Piauí, que se tornou um clássico. Enciclopédico, no dizer de Teresinha Queiroz. Sobre essa obra canônica tive a oportunidade de dizer: “Sem dúvida o magistério superior de economia, as longas e profundas leituras e a experiência e conhecimento adquiridos nos importantes cargos públicos que exerceu lhe possibilitaram escrever essa importante obra, pioneira do ponto de vista do enfoque e abordagem e da formatação do conteúdo”.

Exerceu seus cargos públicos com competência, probidade e dedicação, como um verdadeiro servidor público e estadista, com o olhar voltado para o interesse social e com espírito público. Talvez por isso, o governador Lucídio Portella, operoso e austero em sua gestão, ao olhar o simples e sóbrio relógio, que nosso confrade usava, retirou do pulso o seu próprio relógio e o entregou ao nosso confrade. Creio que com esse gesto, talvez algo impulsivo, Lucídio quisesse atestar ou certificar, de forma simbólica, a eficiência e a probidade de nosso caro Felipe Mendes.

O patrono de sua cadeira é o professor Paulo Nunes, figura emblemática da Academia Piauiense de Letras, figura exponencial de escritor, intelectual e crítico literário, por quem eu tinha amizade e admiração, um dos que muito contribuíram para a criação da Universidade Federal do Piauí. Sobre ele já tive o ensejo de dizer: “M. Paulo Nunes é um exemplo de estilista, de frases bem construídas, elegantes, rítmicas, cadenciadas em suas pausas, e de denso conteúdo, graças ao seu poder de síntese e percuciência, e sobretudo erudição, em virtude de ser leitor constante, voraz e compulsivo. Diria que o seu estilo, como um poderoso ímã, atrai o leitor para os seus textos escorreitos e de plástica fluidez.”

Na cadeira nº 42 tomará assento a Dra. Diva Maria Freire Figueiredo, nascida em Boa Esperança (MG). Graduada em Arquitetura e Urbanismo pela UFMG. Fez mestrado na UFPE e doutorado na UFMG. Exerceu suas atividades profissionais sobretudo no Piauí, em que se destacou na preservação de seu patrimônio cultural através de gestão, ensino e pesquisa. Superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional no Piauí, foi uma dos principais responsáveis pela proteção de diversos bens, mormente os situados nas cidades históricas de Parnaíba, Oeiras e Piracuruca e em Serra da Capivara. O nosso Estado lhe fez justiça ao lhe conceder o título de Cidadania Piauiense.

Na segunda metade da década de 1980, quando vários prosadores e poetas reativamos e demos existência fática e legal à União Brasileira de Escritores do Piauí (UBE-PI), sua sede, onde fazíamos reunião semanal, ficava na Secretaria de Cultura, em cujo prédio vi algumas vezes nossa confreira a desempenhar suas funções, com competência, zelo e assiduidade. Mais tarde, por ter morado em Parnaíba durante vários anos, pude acompanhar o seu enorme e inestimável trabalho para promover o tombamento do centro histórico dessa cidade, que é como se fosse um imenso livro de pedras, tijolos, telhas e argamassa, constituído por vetustos sobrados, por deslumbrantes palacetes, elegantes chalés e antigos casarões solarengos, impregnados de histórias e fantasmas, além de imponentes e suntuosos edifícios, que abrigaram escolas, comércios, indústrias, bancos e outros empreendimentos, vestígios do fastígio empresarial parnaibano, da opulência do extrativismo, em que o Porto Salgado (ou Porto das Barcas) era muito movimentado, cheio de embarcações, tripulantes, estivadores, vareiros e porcos d’água. A solidez dessas edificações é apenas aparente; elas facilmente se dissolvem no ar, pela incúria, pelo abandono e pela ganância das demolições propositais. Era um tempo em que os hidroaviões da Condor enfeitavam o céu de Parnaíba.

O patrono de sua cadeira, por ela escolhido, é o arquiteto e urbanista Olavo Pereira da Silva Filho (1947-2023), que restaurou importantes monumentos históricos e arquitetônicos em Minas Gerais, Maranhão e Piauí. Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí. Exímio em sua profissão, contribuiu para preservar obras notáveis da arquitetura nacional. Recebeu importantes premiações, notadamente o Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade (2008) pelo seu livro Carnaúba, Pedra e Barro na Capitania de São José do Piauhy. Tendo restaurado importantes monumentos históricos e arquitetônicos, feitos de pedra, barro, tijolos e telhas, escreveu essa monumental obra, que tem como suporte a fragilidade do papel, mas que restaura, conserva e resgata a história, a memória e a imagem dos antigos sobrados e solares e as rústicas casas-grandes de nossas velhas fazendas. Somente um Hércules dos doze trabalhos ou um lunático e idealista Quixote poderia construir um livro tão laborioso, mas de tamanha grandeza, qualidade e magnitude. E literalmente monumental, digno dos maiores louvores e encômios.          

Raimundo Aurélio Melo passa a ser o primeiro ocupante da cadeira 43 de nossa agremiação literária. Nasceu em Oeiras, mas muito novo, juntamente com a sua família, se mudou para Teresina. Um dos maiores nomes da música piauiense, para a qual tem contribuído em atividades de regência, ensino e composição. Segundo a lenda ou a tradição, se diz que, em sua cidade natal, quando uma criança nasce, a mãe joga o barro na parede para saber se o filho será músico ou doido. Em entrevista para a revista Peleja, mestre Aurélio Melo disse que, se sua mãe fez isso, parte do barro colou e parte caiu.

Ainda menino teve contato com a música através do programa “Banda nas Escolas”, criado por Wall Ferraz, quando secretário da Educação, no governo Alberto Silva. Começou na percussão, passou a tocar bombardino e, depois, trombone, em que “se encontrou”, conforme disse na referida entrevista. Seu primeiro emprego foi na Banda de Música XVI de Agosto, da Prefeitura de Teresina. Ao receber o primeiro salário, comprou um violão. Nos anos 1970, criou o grupo Candeia, quando passou a compor. Mais ou menos por essa época compôs a música Teresina, que se tornou uma espécie de hino não oficial ou popular de nossa capital, que me deixava tonto zonzo de encantamento.

Aprendeu muito dos fundamentos de teoria musical, arranjos e regência com grandes maestros, entre os quais Reginaldo Carvalho e Emmanuel Coêlho Maciel. Reginaldo Villar de Carvalho (1932-2013) é o seu patrono em nossa Academia; nasceu em Guarabira (PB). Foi um dos pioneiros em música eletroacústica brasileira, nos anos 1960. Exerceu as atividades de professor, regente e compositor. Tem uma vasta obra dedicada à música coral. Foi um dos fundadores do curso de Música da UFPI e da Escola de Música de Teresina. Emmanuel Coêlho Maciel foi o primeiro regente da Orquestra Sinfônica de Teresina. Foi sucedido pelo maestro Aurélio Melo, hoje presidente da Fundação Cultural Monsenhor Chaves, que a expandiu e consolidou.      

Paulo Gutemberg de Carvalho Souza, nascido em Oeiras, em 1964, tomará assento na cadeira 44, patroneada pelo célebre fotógrafo José Araújo de Medeiros. Graduado em Direito e História, pela UFPI. Especialista em Comunicação e mestre em História do Brasil. Foi historiador-pesquisador do Núcleo de História Oral da Fundação CEPRO, de 1987 a 1994. Repórter fotográfico. Foi editor de fotografia do Jornal da Manhã, revista Cadernos de Teresina, jornal Meio Norte e revista Pulsar. Assessor de comunicação social do TRE-PI, Procuradoria da República e Justiça Federal.

Publicou críticas e ensaios fotográficos em jornais e revistas culturais. Participou de exposições fotográficas em Teresina, Brasília e Fortaleza. Publicou os seguintes livros: Teresina (2004), História e Identidade: as narrativas da piauiensidade (2010), Docas do Mucuripe (2010) e Guilherme Müller e a invenção visual de Teresina (2017). Professor de história na UFPI e de fotojornalismo na FSA. Fez curso de Cinema e de Cinematografia Digital. Diretor de fotografia do curta Entrelinhas. Idealizador e fotógrafo do Projeto Caminho das Abelhas. Recebeu importantes prêmios na área de fotografia e a Comenda do Mérito Renascença.

É presidente da Fundação Fotógrafo José Medeiros. Este notável fotógrafo, nascido em Teresina, em 1921, foi por ele escolhido para ser o patrono de sua cadeira. Medeiros teve importante atuação no fotojornalismo brasileiro, mormente por suas reportagens fotográficas na revista O Cruzeiro. Diretor de fotografia de filmes clássicos, como Xica da Silva, Memórias do Cárcere, Jubiabá e Morte e Vida Severina.   

Paulo Gutemberg, para a realização de um trabalho fotográfico criativo e experimental, inventou, certa feita, uma engenhosa engenhoca, uma verdadeira máquina do tempo, que simulava antigas fotografias, com a qual produziu verdadeiras pinturas fotográficas. Assim, posso dizer que na arte fotográfica ele pinta, borda, transborda e fotografa.       

Será o ocupante da cadeira 46 o ativista e cientista social José Messias Andrade Júnior, que tem se dedicado à preservação e fortalecimento da cultura popular, especialmente do carnaval de Teresina. Em 1994 fundou o Bloco do Paçoca. É o coordenador do Movimento de Salvaguarda do Carnaval de Teresina. Presidiu a Escola de Samba Brasa Samba. Escritor e compositor. Em parceria com Osnir Veríssimo e Machado Júnior, compôs marchinhas e outras músicas carnavalescas para o Bloco do Paçoca. Uma dessas composições recebeu o 2º lugar num festival de marchinhas. Em 2015 escreveu a Revista Paçoca, que relatou a trajetória de seu bloco e a memória do Boteco do Dedim, em homenagem a seu pai, um dos incentivadores dessa agremiação carnavalesca. Nascido em Campo Maior, no dia 7 de setembro de 1969, no mesmo dia em que nasceu o grande prefeito Raimundinho Andrade, em 1922, recebeu, com justiça, o título de Cidadão Teresinense.

Em sua colaboração para o número inaugural da revista Peleja, aborda os problemas e mazelas enfrentados pelo centro comercial e histórico de Teresina, que é do conhecimento de todos nós, para os quais ele sugere as seguintes providências: “A revitalização do Centro de Teresina passa pelo seu repovoamento. É preciso tornar o Centro habitável. A oferta de condições dignas de moradia, circulação segura, lazer e fácil acesso aos mais diversos serviços públicos é fundamental. // Um plano de revitalização do Centro deve ter em conta a capacidade de atração turística, que fortalece o comércio local, gera empregos e impulsiona a economia.”

Messias Júnior escolheu para patrono de sua cadeira outro Messias, o sambista e carnavalesco Manoel Messias do Espírito Santo (1948-2023), um dos fundadores da Escola de Samba Sambão, que mereceu a honrosa alcunha de Jamelão do Piauí. Mal saído da adolescência, morando perto da Casa Saló, eu ouvia os tambores e atabaques dessa escola ressoando e atroando na Baixa da Égua, noite adentro, madrugada afora.  

Todos os novéis acadêmicos são pessoas de alto mérito em suas atividades profissionais, artísticas e culturais, e certamente abrilhantarão a nossa Academia com o fulgor de seu talento, inteligência, engenho e arte.

 (*) Discurso proferido na Sessão Solene da Academia Piauiense de Cultura, realizada para a posse de novos membros e para o lançamento da Revista PELEJA, no Theatro 4 de Setembro, em Teresina, no dia 20/02/2025.

3 comentários: