sexta-feira, 7 de maio de 2010

ARTE-FATOS ONÍRICOS E OUTROS


O ASSALTANTE DISFARÇADO

Elmar Carvalho

Era um motorista experiente. Sabia que não se deve dar carona a ninguém, pois em nenhum desconhecido se deve confiar. Antigamente, gostava de dar carona, tanto para cumprir a sua cota de caridade, como também para quebrar a monotonia da viagem, com a companhia de alguém para conversar. Vinha devagar, já que estava feliz, descansado, e não tinha nenhum compromisso imediato, que exigisse uma maior velocidade. A uns duzentos metros avistou o caboclo, parado à sombra de uma árvore, perto da casa de taipa, à beira da estrada, com o seu chapéu de palha de matuto e um pequeno cofo, acompanhado de um menino de aproximadamente doze anos, que julgou ser seu filho. Pensou em não parar, como já era a sua rotina, ditada pelos perigosos tempos atuais, mas a sua bondade, o seu desejo de ajudar e a vontade de ter companhia fez com que impulsivamente parasse o veículo. Aberto o vidro da porta, deu bom dia, e convidou o carona a entrar. O homem, em voz baixa e mansa, despediu-se do garoto, e entrou no veículo. O motorista puxou conversa sobre as chuvas, as plantações, os animais e tudo que pudesse interessar a um lavrador. O homem era de poucas palavras, e só respondia monossilabicamente, em sua voz mansa e pausada. Perto da curva fechada, o motorista diminuiu a velocidade e prestou atenção exclusivamente ao ato de dirigir. Quando entrou na reta, ao se voltar para o carona, percebeu que este lhe apontava um revólver, e lhe ordenava que reduzisse a velocidade e entrasse na primeira estrada vicinal que surgisse. Ficou nervoso, claro, mas sabia que o melhor era obedecer docilmente. Assim, entrou na primeira estrada carroçável que encontrou. Um pouco adiante, o homem mandou que parasse o automóvel. Pediu-lhe que não o matasse, pois tinha mulher e filhos; que o amarrasse e o deixasse ali, que nada contaria à polícia, jurava-lhe. O assaltante mandou que saísse do carro e se deitasse de bruços. Teve morte instantânea com um disparo efetuado contra sua cabeça. A polícia investigou, fez perguntas nas circunvizinhanças e colheu a informação de um garoto, o qual disse haver visto um homem vestido com roupas simples, com um chapéu de palha e um cofo, com se fosse um lavrador, parado na porta de sua casa, como se estivesse esperando um ônibus ou uma carona; que não era pessoa da localidade. Afirmou que esse homem descera de um automóvel novo, a uns trezentos metros de sua casa. Vira o homem descer do carro quando estava no mato, na beira da estrada, a caçar passarinho, enquanto seus pais tinham ido para a roça. Acrescentou que depois chegou até onde o homem estava, quando ia de volta para sua casa; que o homem pediu que lhe fizesse companhia, em troca de algumas moedas, que lhe deu imediatamente; que viu quando esse homem pegou carona em outro automóvel, que chegou um pouco depois. Os investigadores concluíram que o assaltante, astuciosamente, se caracterizara de rurícola e se postara na frente do casebre de palha, na companhia do menino, que pareceria ser seu filho, para despertar o impulso da bondade de algum motorista, porquanto este jamais iria desconfiar que um lavrador, acompanhado do filho, ao pedir carona na frente de sua casa, poderia ser um assaltante. Quanto ao assaltante, nunca se soube quem era, e o inquérito policial foi inevitavelmente arquivado.

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