A POESIA
É A PÉROLA DO SENTIMENTO
Francisco
Miguel de Moura
Escritor,
membro da Academia Piauiense de Letras
Poesia
é a essência do sentimento, em qualquer tipo de arte.
Poderia,
neste artigo, cingir-me apenas ao teórico. Mas, como vivo
no meio intelectual - a Academia é um deles – abordo, em primeiro
lugar, o esquecimento, pra não dizer o desvalor a que vem ficando
relegada a poesia. Ora, o mundo da poesia é um mundo limpo e
inocente, onde as soluções não ficam à mostra e as nossas
perguntas não são recusadas nem respondidas de pronto. Fala-se na
ciência, na história, na política, mas a poesia não é
apresentada como valor, sequer como problema. Por quê? Talvez porque
o plano da poesia é de um mundo de sofrimento, amor e dor; e também,
por incrível, da organização do caos pela palavra concebida no seu
valor mais fundo. É essa palavra que se faz ação. “No princípio
era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus, e o Verbo era Deus”
(João, 1:1).
Será
por causa da anulação deste princípio que a sociedade se tornou
vazia, vã? E a luta se cumpre apenas ao alcance do superficial
utilitarismo e das ações aéticas, desumanizadas?
O
mundo é representado pela linguagem. Se não se tem vontade de
dizer-se ou uma forma de expressar-se, ninguém é, nada é. “O que
se quer e o que se faz são uma e a mesma coisa, vistos porém de
perspectivas diferentes. Da mesma forma como nos homens, a vontade
seria o princípio fundamental da natureza. (...) Na arte, a relação
entre a vontade e a representação inverte-se, a inteligência passa
a uma posição superior e assiste à história de sua própria
vontade; em outros termos, a inteligência deixa de ser atriz para
ser expectadora”, segundo o filósofo Artur Schopenhauer.
É
a crítica e a autocrítica. Crítica no sentido em que “viver
é sofrer” e autocrítica pela capacidade que a inteligência
tem de julgar e julgar-se. Mas ninguém tem a
capacidade de dizer-se, nem sabemos como nos desdizer. Somos
realidades éticas não ditadas por leis ou mandamentos, mas pela
vontade – que é a verdade. Assim vem o “lutar com a palavra
/ é a luta mais vã / no entanto lutamos / mal rompe a manhã”, do
Drummond. O poeta não consegue dizer tudo. O sentimento final é o
de que nos tenhamos anulado. E mais nenhum sentimento nos batesse,
nem o coração nem os olhos. E o ouvido silenciado, tanto o de
dentro, quanto o de fora do contínuo ruidoso mundo. Aí perderíamos
toda a originalidade de sermos apenas um, o grande um.
O poeta é, sobretudo, a diversidade e a discrepância, a diferença
para acordar-se e acordar o mundo, hoje, quando os deuses
desapareceram da face do céu e ainda não chegaram à terra. Quantos
milhares de homens não reconhecem Jesus, aquele que antecipa em
milhares de anos, a palavra de Deus, segundo sentiu Dante, na “Divina
Comédia”!
“Subi
ao céu que mais a luz recebe
do
infinito, e vi coisas tais, que embalde
tentará
repetir quem de lá volte”.
Considerava
ele que Cristo, ao ressuscitar, transpôs o tempo e ascendeu ao
absoluto, onde todos falam um único idioma na paradoxal permanência
de suas expressões peculiares, onde não há mais presente, passado
nem futuro.
Poderia
falar nos movimentos poéticos, do classicismo ao moderno e
modernoso. Mas para quê? Todos os modismos passam, o que não passa
é a poesia. A poesia é divina. Quando falei, uma vez, em sessão da
Academia, que os livros da Bíblia foram escritos em versos
(versículos), portanto em forma poética, houve quem me contestasse.
Não me incomodei. Sei como a ignorância e as ideologias obscurecem
a mente. Ora, a poesia é a voz da criação, linguagem de Deus. E é
por isto, talvez, por sua grandeza e simplicidade, que se sobrepõe a
todos os gêneros e a todos as espécies de arte. Não ficaremos
inertes diante do que acontece hoje em dia: - Não se dar valor
àquilo que todos, inconscientemente, usamos e nada custa. A poesia
está em tudo, na música, na pintura, no teatro... Pena que os
jornais e revistas quase a tenham deixado fora de circulação. Mas
ela continua navegando pelas peças artísticas de propaganda, na
tevê e pelos saites da internete.
Livros?
Por que não se editam mais livros de poemas como antigamente?
Retorno ao assunto inicial para afirmar que, não propositadamente, a
poesia tem ficado em segundo plano, comparada com o gênero prosa,
nos empreendimentos editoriais da Academia Piauiense de Letras. A sua
Revista, atualizada na dinâmica gestão do historiador Reginaldo
Miranda, quase não publica poemas. Além da Revista, o
empreendimento editorial atual da APL, por conta do seu Centenário
(a APL foi fundada em 30-12-1917), está sendo realizado em etapas: a
1ª, nos anos de preparação da festa do Centenário, que já correm
desde o ano passado; e 2ª no ano da comemoração e possivelmente
mais alguns depois da festa.
Claro
que os poetas, atuais membros da “Casa de Lucídio Freitas” (não
vou citá-los) não estão satisfeitos, pois, das 50 obras listadas
para publicação, algumas já prontas, apenas 30% (15 obras) são de
poesia. Como poeta, não obstante reconheça ser justo editar os
escritores falecidos, creio que também seja importante publicar os
poetas atuais. É sabido, também, que a Academia Piauiense de Letras
não possui recursos financeiros para publicar sequer a sua Revista e
que todo esse suporte vem de verbas públicas, através de
instituições criadas para o incentivo à cultura. Mas vale a pena,
estamos produzindo cultura. Como Monteiro Lobato, ainda cremos que
“um país se faz com homens e livros”, pois neles vão parar
desde a poesia à história, desde a gramática aos estudos
científicos mais avançados.
Excelente texto, e acrescento que a poesia está em todo o lugar, e, principalmente, nos pequenos e desapercebidos atos do cotidiano. Mas, só os poetas, que possuem um olhar apurado deste mundo invisível para maioria podem, por esta lupa divina nos olhos dos homens comuns, como eu. Desde um simples beijo de um casal num banquinho de praça, até a cura de uma doença pelos cientistas, há poesia. Pois, tudo envolve sentimentos que podem ser traduzidos em palavras... Parabéns aos escritores e poetas abnegados. Fabrício Carvalho Amorim Leite, um fã do blog.
ResponderExcluirCaro Fabrício,
ResponderExcluirVocê tem toda razão e o Elmar também concordará, pois que se prontificou em publicar no seu blogue. E a publicação saiu muito ao meu gosto. Obrigado ao comentarista. Obrigado ao Elmar Carvalho, poeta e cronista de sentimentos profundos e razão suficiente para reconhecer as coisas sublimes como a poesia, que naturalmente está desde o ínfimo íntimo de nós mesmos até a grandeza e beleza imensurável do Criador, nosso Deus.
Francisco Miguel de Moura