terça-feira, 9 de agosto de 2016

O LADO DESCONHECIDO DA BIOGRAFIA DE R. PETIT

O psiquiatra José Ribeiro Chagas e o poeta Alcenor Candeira Filho

João Câncio Rodrigues Neto, José Ribeiro Chagas, Alcenor e Cosme Sousa 

R. Petit participa desta coletânea
Antologia da qual fazem parte Alcenor e R. Petit


O LADO DESCONHECIDO DA BIOGRAFIA DE R. PETIT

Alcenor Candeira Filho
Membro da APL. 
Poeta, cronista e crítico literário


          R. PETIT, pseudônimo de Raimundo Araújo Chagas, nasceu em Belém do Pará em 1891 e faleceu em Sorocaba (São Paulo), em 1969.

          Ainda criança  veio  residir em Parnaíba, onde permaneceu por cerca de quarenta anos.

          Publicou as seguintes obras poéticas: ANTE OS ABISMOS DA VIDA (1924), LIVRO DE MISS PIAUÍ (1929) e NORTADAS (1937), edição ilustrada com desenhos de Nestablo Ramos. Deixou livros de poesia inéditos, dentre os quais TABERNA DOS SENTIMENTOS.

          O seu poema mais famoso é o seguinte soneto, inserido em NORTADAS (Rio de Janeiro, Pongetti, 1937, p. 15/16):



                               PAPAGAIOS DE PAPEL

                                              Aos  vaidosos.



            Quando eu era pequeno, venturoso,

            Meus lindos papagaios empinando,

            Dizia:  - Não há nada  mais pomposo

            Que um papagaio de papel voando.



            Cresci...

                              Hoje, tristonho, pesaroso,

            Esses brinquedos de papel, olhando,

            Logo descubro o vulto carunchoso

            Dos que sobem a tudo se apegando.



            Tipos que sobem de alma feita em trapos,

            Mostrando ao mundo, despreocupados,

            Uma cauda nojenta de farrapos...



            Tipos de nulidade tão cruel

            Que só sabem subir encabrestados

            Como esses papagaios de papel.



          Embora grande poeta, R. PETIT imortalizou-se sobretudo como autor da letra do HINO DA PARNAÍBA, com música de Ademar Neves, oficializado através da Lei Municipal  Nº 255, de 07.09.1963, sancionada pelo Prefeito Lauro Andrade Correia. Antes da lei, a famosa obra era conhecida como Hino do Parnahyba Sport Club. Eis os versos iniciais:



             Ó Parnaíba,

            Teu nome exprime

            Em nosso peito

            Ardor sublime

            Que nos inspira a repetir a doce escala

            Da voz do rio que te envolve e que te embala.



          O HINO DA PARNAíBA é uma das mais belas composições cívicas do Brasil. Nessa peça poética de exaltação à cidade de Parnaíba, identifica-se verdadeiramente um hino patriótico, isto é, um canto de louvor ou de veneração a uma cidade e a seu povo, com características marciais ou solenes, traduzidas na retumbância de sons de clangor.  Por isso mesmo os  parnaibanos conhecemos bem a composição, que cantamos com entusiasmo em festas cívicas e em solenidades.

          Já ouvi alguns hinos de cidades, inclusive piauienses, que não entusiasmam as pessoas, nem pela letra nem pela melodia, exatamente pela ausência de recursos sonoros essenciais em obras dessa natureza. Não citarei exemplos para  não ferir suscetibilidades.

          Recentemente fui visitado pelo médico psiquiatra José Ribeiro Chagas, neto de R. Petit, cearense residente em São Paulo. Ele estava acompanhado do amigo Cosme Sousa. Com 67 anos de idade, o dr. José Chagas nunca tinha vindo a Parnaíba. Agora resolveu conhecer a cidade amada e homenageada pelo avô. Visitou o ex-prefeito Lauro Andrade Correia e o atual Florentino Alves Veras Neto.

          Através do ilustre visitante, com quem conversei por mais de uma hora, fiquei sabendo que R,PETIT foi compelido por autoridade local a sair de Parnaíba e ir para o Rio de Janeiro e depois para São Paulo, contra a própria vontade e a de familiares, poque havia contraído lepra, infecção crônica e contagiosa ,  que provoca lesões na pele, mucosas e nervos periféricos, sem cura na época. A “expulsão” ocorreu numa madrugada de 1944, coincidentemente ano das  comemorações de 1º Centenário de elevação da Vila de São João da Parnahyba à dignidade de cidade.

          Em conversa por telefone, o poeta Elmar Carvalho me recomendou a leitura do capítulo  -  “O Preconceito da Lepra no Piauí”  -  , constante do livro GENU MORAES  -  A MULHER E O TEMPO. Nas páginas 283 a 287, Genu Aguiar de Moraes Correia presta corajoso depoimento sobre como a lepra  ou a simples suspeita da doença tornou pessoas e famílias vítimas de preconceitos.  GENU se refere a várias pessoas que na primeira metade do século XX foram hostilizadas no Piauí em razão de fofocas ou de comentários maldosos de que eram leprosas. Dentre as vítimas, ela cita o desembargador  e escritor Cristino Castelo Branco. Inventaram que uma de suas filhas estava com lepra. O magistrado, contrariado com as fofocas, que não correspondiam à realidade, aposentou-se como desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí aos 55 anos de idade, indo morar no Rio de Janeiro.

          Durante a conversa com o dr. José Chagas, eis que repentinamente entra na sala o vereador Neto – João Câncio Rodrigues Neto -  com uns  papéis que eu deveria assinar. Tomando conhecimento da revelação do médico, exclamou:

          - Puxa! Só agora entendo por que, na minha infância, quando meu pai (Olavo Pinho) quis comprar a casa da av. Capitão Claro, onde o poeta morou e que ainda hoje pertence à minha família, ouvia conselhos de que não deveria fazer a aquisição por se tratar de casa  mal-assombrada.

          R. PETIT é patrono da Cadeira Nº 09 da Academia Parnaibana de Letras – APAL, cujo primeiro ocupante é Alberto Tavares Silva.


                               Parnaíba, 09.08.2016.

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