São Cristóvão, só lenda e
superstições
José Maria Vasconcelos
Cronista,
josemaria001@hotmail
Som agudo dos rojões e foguetes ecoava
nos céus da Zona Leste de Teresina, no final daquela tarde. Carros, motos,
fiéis a pé, imagem de São Cristóvão entronizada na carroceria de caminhonete da
Polícia Rodoviária Federal. Padres e comandante rodoviário respondiam às
perguntas de repórteres. E tome rojões, foguetório, hinos religiosos e vivas ao
padroeiro do bairro e dos caminhoneiros. Só faltava uma paradinha para
reflexão, digamos, menos sentimental.
Fervor sem análise crítica da razão resvala
para a paixão. Só pura manifestação emocional, sem consciência crítica,
facilmente se resvala para acreditar no lendário, no supersticioso e
ideológico. Devoções e culto a personagens nunca existidos, lendários ou
produtos da ficção, seduzem a imaginação das mentes ingênuas. É o caso de de
São Cristóvão.
O Papa João XXIII, aos 77 anos, assumiu a Igreja de 1958 a 1963, e provocou
uma revolução de modernidade, graças ao espírito simples e alegre, quebrando
várias tradições, sair do Vaticano para visitar abrigos e países. Rejeitar o
tradicional andor, que servia de traslado do Papa, carregado por policiais
suíços meio à multidão. Também acabou com a missa em latim ou com o celebrante
de costas para o público. Instituiu o Concílio Vaticano II e o movimento de
aproximação com “irmãos separados”. Promoveu mudanças no calendário católico,
retirando santos consagrados pela fé popular, mas sem provas históricas de sua
existência. Saíram Jorge, Cristóvão, Sebastião, o culto às chagas de Francisco
de Assis etc. Continuam cultuados, porque dividendos falam alto.
A lenda de São Cristóvão lembra velhas
historinhas infantis: senhor alto e forte residia às margens de um rio.
Generoso, e por causa da altura, costumava carregar, na corcunda, quem atravessasse
o rio. Um dia, uma criança lhe pediu carona. Depois da travessia, ela lhe
agradeceu e se identificou: era menino Jesus. Daí CRISTÓVÃO, do grego, “aquele
que conduz o Cristo”.
Lendas e crendices inebriam a
imaginação humana, quando acredita que são verdadeiras. A Igreja Católica
estabelece algumas regras para aceitar a Santa Tradição, aquelas fontes
históricas, fora da Bíblia, mas fundamentadas e testemunhadas pelas primeiras
comunidades cristãs. Evangélicos, em geral, só aceitam fontes bíblicas, mesmo
assim, eliminam alguns livros – segundo eles - não passam de lendas e duvidosa
inspiração divina.
Se vigários estimulam e preservam a
chamada “fé popular”, com festejos, que atraem mais multidões e foguetório do
que os louvores ao Rei dos reis, Jesus Cristo, alguma coisa precisa ser
revista, conforme os planos do Papa João XXIII.
A Igreja continua lenta na
evolução, como travessia de um rio a pé. “É preciso bater o pó da História”,
segundo o querido e popular João XXIII. Papa Francisco ergue a bandeira com
grande aceitação popular, que cobra mudanças, porque lendas, superstições e
tibieza não alimentam a fé inteligente, corajosa e entusiasmada. Torrente de
difícil travessia exige pé no chão, sem fantasias.
Nenhum comentário:
Postar um comentário