Os aventureiros comemoram, com dois visitantes, o sucesso da expedição Barra do Longá e o triunfo do super Tremembé |
O TRIUNFO DO TREMEMBÉ
Elmar Carvalho
Na sexta-feira desta Semana Santa saí
direto de Teresina para a Várzea do Simão, com o objetivo de inaugurar, no
sábado de Aleluia, o motor de popa Yamaha, 15 HP, dois tempos, que comprei
através da internet na Paraqueda Náutica, por indicação do amigo Roberto Carlos
Sales da Silva, brioso delegado da Polícia Civil do Piauí, de cuja Academia é
reitor.
O equipamento se destinava a mover o
pequeno barco de alumínio, que designei como Tremembé, em homenagem aos bravos
indígenas, que antigamente percorriam o delta do Parnaíba. A saga desse barco,
como muitos de meus leitores sabem, foi infelizmente inglória. Farei, como
dizem os juristas em seus floreios de linguagem, uma apertada síntese.
O projeto inicial era muito simples e
muito modesto. Comprei um barco inflável modelo Cheyenne 500, através do site
da loja Submarino. Fiz duas viagens, sem nenhum acidente ou uso indevido.
Quando fui usá-lo pela terceira vez, no intervalo de apenas três meses,
descobri que o equipamento estava descolado, na parte que liga o fundo à borda,
o que o tornou inservível.
Fiz contato com a Submarino, para que
resolvesse o problema, mas ela se negou a isso, alegando que já se passara mais
de sete dias. No meu parco entendimento, essa empresa deveria encontrar uma
solução, já que se tratava de defeito oculto (ou vício redibitório), podendo
ela, depois, usar o chamado direito de regresso contra o fabricante, sediado no
estrangeiro, mas não empurrar a parte mais fraca para resolver esse ônus.
Logo constatei que o motor de 2,6 HP
que eu havia comprado para o barco inflável era insuficiente para o barco de
alumínio que eu adquirira por causa do defeito do inflável. Fui aconselhado
pelo advogado Carlos Eduardo, experiente em motonáutica, a adquirir um de 15
HP, que seria o ideal para o tamanho e peso do meu casco. Então, seguindo a
orientação do comandante Roberto Carlos, sempre em ritmo de aventura, fiz o
negócio referido no primeiro parágrafo.
Como o comandante Natim Freitas, que
antes demonstrava ser um panteísta, dissesse que havia feito uma promessa com
Santa Luzia, padroeira do povoado Barra do Longá, seguimos eu, ele, Francisco
Ribeiro e o Didi para essa localidade, distante aproximadamente 18 km a
montante. O rio Parnaíba estava muito cheio, com forte correnteza. Após a ponte
do Jandira, percurso por nós desconhecido, vimos belas paisagens, sobretudo
agora, em que se mostravam verdejantes, por causa das chuvas.
Em certo trecho, vimos uma comunidade,
talvez familiar, com as casas encarapitadas em imponente morro, situado numas
das curvas do Velho Monge. Noutro local, umas grandes pedras formavam uma
espécie de estreito, que tornavam as águas revoltas. Nosso hábil timoneiro
venceu essa corredeira, sem nenhum acidente ou sobressalto.
No decorrer da viagem o Natim, com o
aval do Francisco Ribeiro (que em seus 73 anos de vida demonstrou mais
vitalidade e preparo físico que nosotros), nos contou que seus saudosos avós
João Simão e Filomena, meus sogros, na embarcação Borboleta, com a ajuda de uma
vela, iam participar dos festejos de Santa Luzia. No retorno, embora a
correnteza fosse a favor, o vento soprava em sentido contrário, de modo que a
vela era arriada. Por esse motivo, os filhos Pedro, Beré e Zuza, na época
jovens e fortes, empunhavam os remos com todo vigor e velocidade.
Atracamos na comunidade Barra do
Longá, em local perto da ermida. O mestre Natim se dirigiu ao templo, que se
encontrava fechado. Ante esse óbice, ele espalmou suas mãos sobre a madeira da
porta e rezou contrito, como convinha. A viagem de retorno, rio abaixo, não
teve, felizmente, nenhum percalço ou acontecimento notável, com exceção do
vento forte, que provocava fortes ondulações, quase pequenas pororocas, nos
causando a sensação de cavalgada fluvial.
Enfim, chegamos ao nosso porto
seguro. Após retirarmos o triunfante Tremembé do rio, fomos comemorar a
venturosa aventura na Toca do Velho Monge. O Natim Freitas nos esclareceu que
em suas orações pedira que uma forte chuva caísse sobre a Várzea do Simão.
Outrora os coronéis da política interiorana eram chamados algo talvez
ironicamente de mandachuvas. Logo após suas palavras, uma torrencial chuva nos
afagou a pele, tornando a tarde mais agradável e mais abençoada.
O autoproclamado mago Paulo Coelho,
autor de O Alquimista, O Diário de um Mago e A Bruxa de Portobello, afirmou ver
anjos e que sabia produzir chuva, embora tenha acrescentado, numa crise de
humildade, que vira apenas as asas angélicas, e que esses atributos não eram
importantes. Assim, tenho como certo que, atualmente, apenas o bruxo Paulo
Coelho e o comandante Natim Freitas fazem chover.
Estou até pensando em mudar o nome do
Natim, por causa de sua bravura, para Mandu Ladino, o grande líder indígena,
que comandou a confederação tribal de que faziam parte os Tremembés, já que ele
é também intrépido piloto do agora super Tremembé, de gloriosa saga, apesar de
todos os percalços e embaraços, que já enfrentou.