terça-feira, 14 de agosto de 2018

DEPOIMENTO SOBRE DANILO DE MELO SOUZA


Fonte: Google/Conexão Tocantins

DEPOIMENTO SOBRE DANILO DE MELO SOUZA

Alcenor Candeira Filho
    
     De 1982 a 1984 fui professor  de Danilo de Melo Souza no curso científico da Unidade Escolar Alcenor Candeira (Cobrão), período em que pude observar seu grande interesse pela literatura e pelo jornalismo. Nessa época produziu os primeiros poemas e foi um dos principais colaboradores do jornal estudantil O IMPACTO.
     Destemido e dinâmico líder estudantil, capaz de trazer dores de cabeça a dirigentes escolares, o jovem Danilo Melo desempenhou em Parnaíba intensa atividade nas áreas social, política, educacional e cultural:

     - presidente do Diretório Acadêmico 03 de Março (CMRV/UFPI);
     - presidente do diretório municipal do Partido dos Trabalhadores-PT;
     - idealizador e coordenador do grupo de poesia “A Veiz do Ônzimo”;
     - membro fundador da Associação dos Artistas e Técnicos de Parnaíba – ASATERP;
     - apresentador do programa “Rádio  Rock-‘N-Roll”, na Rádio Educadora de Parnaíba;
     - editor e fundador do jornal LITORAL NEWS, primeiro jornal de turismo de Parnaíba;
     - editor do jornal universitário O TETEU, órgão de divulgação do Diretório Acadêmico 03 de Março;
     - colaborador do jornal INOVAÇÃO;
     - integrante de POEMARÍT(I)MOS, antologia de poetas piauienses editada em 1988 pela secretaria de cultura do Estado do  Piauí;
     - membro da Academia Parnaibana de Letras _APAL aos 24 anos de idade;
     - secretário de cultura de Parnaíba na primeira administração de José Hamilton Furtado Castelo Branco (1993-1996).

     Na vitoriosa  trajetória de vida, Danilo Melo concluiu em 1989 na Universidade Federal do Piauí/Campus Ministro Reis Velloso o curso de Licenciatura Plena em Pedagogia, tendo sido o orador da turma. O discurso  por ele proferido na solenidade de formatura é rico de conteúdo e de largo sentido utilitarista, questionando a prática do saber na universidade, a crise deste saber, o ofuscamento da razão e o relativismo que de maneira alienante estabeleceu uma cumplicidade, uma ausência de cobrança mais rígida do papel dos alunos e dos professores no contexto universitário:

    “Desejávamos uma reforma profunda na maneira de se
      pensar e administrar a nova universidade. Tivemos êxitos e derrotas,
      amadurecemos na luta. Desejávamos participar de um centro  de
      excelência e fomos abandonados num centro onde se privilegiou
      atuação dos currículos ultrapassados, longe da realidade  que
      nos cerca e – por que não dizer? -  demasiado tecnicista em
      detrimento da reflexão do aprofundamento do debate e   da
      livre circulação das ideias.
      O saber na universidade e a difusão do conhecimento
      puro estão comprometidos pelo caráter gerencial, excludente e
      privatista que esta instituição adquiriu, por conta da intervenção
      autoritária das políticas governamentais, que protegeram a
      ascensão do ensino privado, o sucateamento da escola pública
      e o afastamento das classes populares do ensino superior”.
                    
          Danilo Melo cultivou o jornalismo em Parnaíba de forma amadorística mas com a garra e a responsabilidade peculiares aos grandes profissionais da imprensa. Sabedor  da importância do jornal como veículo de comunicação social, nele ocupou espaço não para fazer promoção pessoal ou para ser simpático à burguesia sonolenta, mas para lutar pela democracia e pela dignidade da pessoa humana. Jornalismo livre, sem peias, sem medo, sem qualquer subordinação a grupos econômicos ou a facções políticas; jornalismo sem propinas, sem puxa-saquismo, sem cargos públicos;  jornalismo limpo, transparente, atraente.
     Como poeta, Danilo Melo reuniu seus principais versos na antologia POEMARÍT(I)MOS (1988), prefaciada por Renato Castelo Branco, e no livro (IN)CERTOS VERSOS E ALGUMA (P)ROSA (2010), editado em Palmas-TO. Desse livro, em cujo lançamento em Parnaíba tive a honra de fazer  a apresentação, diz o autor na contra-apresentação:

      “Em 1981, comecei a escrever prosa poética. Eram
      escritos de adolescente com pouca imaginação, exagerado
      romantismo, e de um passadismo que anunciava tardiamente o
      'mal do século’ oitocentista.
      Alguns anos depois, junto a um grupo  de jovens
      subversivos (o 11º ou o ‘ônzimo’) saímos por aí com a ideia
      maluca de mudar o mundo por intermédio da purificação  da
      palavra.  Fazíamos poemas coletivos, nos reuníamos para percorrer
      bares e restaurantes e participávamos de saraus literários nem
      sempre bem compreendidos.
      Descobrimos na inspiração dos poetas marginais dos
      anos 70 e dos Beatinics que  a literatura deveria ‘desafinar o coro dos
      contentes’. Uma vanguarda poética mais panfletária que
      propriamente proletária, numa privíncia de frente para o mar.
      Arrotávamos Maiakosvski, Breton, Ginsberg, Torquato, Mário
      Faustino e Chacal com uma intimidade duvidosa..
                     (...)
      Assim deve ser a poesia, uma arte, que ao contrário do
      que se imagina requer dedicação, empenho e paciência. Ninguém
      haverá de deitar sadio e acordar poeta. Poesia não é dor de cotovelo,                   
      nem declaração desajeitada de apaixonados. Poesia é também uma
      arte de solitários, é o reino da concisão”.

     Pelo teor de sua produção, constata-se que efetivamente o poeta não crê na poesia a que baste a beleza para justificar-se. Ao contrário, acredita na poesia que concorra para o desenvolvimento da consciência humana, na poesia enfim que sirva à sociedade, - testemunhando-a, observando-a, analisando-a, interpretando-a, para que o poema seja um documento vivo e expressivo de um povo, em certo momento histórico. Poesia não é instrumento de deleite, nem analgésico para dores de cotovelo. Poesia é o que conscientiza emocionando, ou, se preferirem, o que emociona conscientizando. Poesia ativa, útil, solidária, poesia que, na síntese drummondiana, “...faça acordar o homem/e adormecer as crianças”.
     E porque acredita na natureza utilitarista da poesia, é que Danilo Melo escreve versos como estes:

                   “Piso as mesmas pedras
                          com o mesmo tênis e ninguém reparou nos meus pés.
                          Sei onde piso.
                          Piso na águia americana, na suástica nazista e
                          nos monumentos a Somoza.
                          Faço parte dos que pisam diariamente,
                          tive a lúcida ideia de pisar.
                          A oportunidade de pisar deve ser única,
                          a não ser que se faça corpo mole.
                          Pisar  é uma ideia, uma lâmina..
                          Em se pisando
                          machuca um pouco.
                          - Qual o corte não doloroso?
                          - Qual a vida não sofrida?
                          E será mesmo sina pisar um pouco em tudo e em todos?”

     Diversos poetas em diferentes momentos produziram poemas inspirados na cidade de Parnaíba. Via de regra, são poemas laudatórios e cívicos, estruturados nos moldes clássicos, passadistas, ora em forma de soneto, ora em forma de ode. Dentre os poemas que li sobre Parnaíba, nenhum me comoveu tanto quanto o de Danilo Melo, denominado “Parnahyba”, importante trabalho de re-criação poética resultante do desenvolvimento parafrástico do poema “América”, de Allen Ginsberg, reconhecido como o maior poeta da geração beat.
     Os saudosistas de velhas escolas literárias insurgem-se não raro contra a poesia espontânea, irreverente e contestatória que rompeu com as barreiras acadêmicas da poesia tradicional.
     É preciso, porém, deixar dito o seguinte: essa gente que, por ingenuidade ou má-fé, contesta e detesta  poesia não passadista, não acomodada a preceitos e preconceitos estéticos, - essa gente está de fato é fazendo o papel  dos reacionários da arte, dos autores e/ou consumidores de uma poesia que já nasce ultrapassada e, assim, não admitem versos como estes:

              “Parnaíba, vi de uma só vez: 50 favelas sem água, luz, piso, almoço,
                                                                                                           [café da manhã          
           e porra nenhuma.
                                              (...)
               Parnaíba, estão corrompendo um ciclo histórico.
               Não deixe o rio secar, tenho de pular da ponte
               E um monte de malinação.
               Parnaíba, intervirei em teu coração.
               Meu lado burguês pragmático conquistará teu terreno, teus olhos...
               Pois o amor é o final de nossas contas.
               E você me perdoará, estou certo
               Parnaíba, curral ontem, curral hoje, curral sempre”.

     Depois de realizar excelente gestão  na secretaria municipal de cultura, Danilo Melo teve que deixar Parnaíba em razão de perseguição política, passando a residir na capital de Tocantins, onde fez mestrado em educação, ingressou no quadro docente da Universidade Federal de Tocantins e exerceu os cargos de secretário de educação e cultura do município de Palmas e em seguida de secretário estadual de educação e cultura, reconduzido em 2014 ao cargo de secretário de educação e cultura de Palmas.
     Filho de Alípio Firmino de Souza e de Isabel Melo, Danilo nasceu em Parnaíba-PI em 1965 e é casado com Christina Rosa, com quem tem os filhos Victor e Daniel.         

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