quarta-feira, 30 de junho de 2021

O Sósia



O sósia


Carlos Rubem 


Retornei a Oeiras hoje (27.06.2021) pela manhã. Passei uns dez dias em Teresina revendo familiares e amigos.


Mal cheguei, fui direto participar da impreterível roda dominical que se forma entre parentes e amigos, na Praça das Vitórias, coração da cidade.


Para a minha supimpa alegria, lá se encontrava o meu filho Gérson Oeirense soltando curica (pipa), acompanhado do meu netinho Joaquim Miguel, de um ano de idade.


Em dado momento, o pequerrucho veio, sorridente, ao meu encontro. Sentado numa cadeira, coloquei-o no meu colo. Fiz-lhe mimos!


JM tem um marcante traço fisionômico: no início de sua cabeleira há um redemunho, como se diz aqui (redemoinho), de sorte que o cabelo encobre a  sua testa, parcialmente.


Ao meu lado estava o Manoel de Fia, pedreiro, morador do bairro Rosário, um dos figurantes do grupo folclórico Congos de Oeiras.


Ao ver JM, Manoel disse que o mesmo está parecendo com Hugo Napoleão, que já exerceu elevados cargos públicos, que ostenta, também, parte do cabelo sobre sua região frontal.


Achei interessante a observação do congadeiro. Resolvi gravar um vídeo relatando a singeleza deste fato e o remeti a Hugo Napoleão, via WhatsApp, com quem, há pouco, conversei ao telefone.


Gentleman reconhecido, aludida personalidade me enviou, por escrito, a seguinte mensagem: “Obrigado Dr. Carlos Rubem. Me deu grande prazer com a ligação e o retrato do meu sósia!”


E acrescentou: “Abraço para o Manoel e um beijo para o Joaquim “Napoleão”.

segunda-feira, 28 de junho de 2021

O Poeta e o Inseto


Neste videoclipe ou clipoema, tiro onda de ator à toa, fazendo o papel de mim mesmo.

domingo, 27 de junho de 2021

Clipoema: O Búzio

Seleta Piauiense - Hermínio Castelo Branco

 


Canto do Desterrado


Hermínio Castelo Branco (1851 – 1889)

 

Qual é o ente que longe

Do torrão onde nasceu,

Desterrado no estranho,

Não se recorda do seu?

A distância é importante

Para quem saudades sente.

 

Tenho saudades dos bosques,

Das brenhas virgens, sombrias,

Dos tabocais intricados,

Entre as vertentes mais frias,

Dos campos tenho saudades,

Onde eu brincava de tarde.

 

Tenho saudades das fontes,

Dos olhos-d’água vitais,

Das lagoas pitorescas

Das cascatas naturais

E da sombra hospitaleira

Da soberba gameleira.

 

Tenho saudade das noites,

Em que passei atilado,

Sobre ramos de pau-d’arco,

Suavemente embalado

Sob um luar prazenteiro,

Esperando o capoeiro.

 

Tenho saudades do ronco

Que fazia o tambori.

E do queixoso carpido

Da queixosa juriti;

Tenho saudades, também,

Do vigilante quenquém.

 

Dos mundéus tenho saudades

Nas veredas dos tatus

E dos laços que armava

Para colher as nambus

Tenho saudosa memória

Do cantar da sericória.

 

Tenho saudades do grito

Retumbante da acauã,

Sobre o atalho do morro,

Pousada pela manhã.

E da funerária risada

Da mãe-de-lua, chamada.

 

E da temida raposa

Da chapada das Mangabeiras,

E velozes caititus

Das matas das Cabeceiras,

E do macaco ladrão

Das roças do Batalhão.

 

Enfim, eu tenho saudades

De todo meu Piauí:

Prefiro enterrar-me lá,

A ser imortal aqui

E confio em Deus bondoso

De ser ainda ditoso.

sábado, 26 de junho de 2021

O Cio das Pétalas



Fonte: Google/Mega Curioso

 

O Cio das Pétalas

 

Elmar Carvalho


Recebi uma mensagem de WhatsApp do poeta Nathan Sousa, em que vinha o seu belo poema Porque vejo rostos, que faz parte do livro O Cio das Pétalas, em processo de elaboração. À guisa de aperitivo e chamariz, o poema segue abaixo:


PORQUE VEJO ROSTOS

 

Nathan Sousa

 

Por enquanto é de uma face

sumida que eu quero falar.

 

Destas que se recolhem

sob a indiferença na

penumbra da noite.

 

Não quero falar de risos

e de bocas desmedidas,

como se a vida ainda

florescesse em uma

juventude imaginada

ou sugerida.

 

Por enquanto o que eu

quero é falar de uma face

esquecida.

 

Destas que se reservam

ao reflexo das vitrines,

enquanto a vida

(apressada)

acelera o que pode

ser passagem

ou despedida.

 

Por isso quero mesmo

é falar de uma face

perdida.

 

Destas que a mim

(quando pede

ou deseja)

ataca-me

como quem

nega um beijo

ou a saída.

Após enviar os meus aplausos ao talentoso e bem-humorado poeta, não resisti, e tirei a seguinte “casquinha”:

Essas pétalas no cio vão atrair muitos zangãos.

Espero que elas, ao contrário das laboriosas abelhas, não os matem, ainda que em gloriosa morte orgasmática. 

quinta-feira, 24 de junho de 2021

Didi

Didi, em foto de 2010


DIDI

Elmar Carvalho

Quando eu voltava ao meio-dia e meia para casa, vi o Didi a trabalhar na casa de um dos meus vizinhos. Estava literalmente com as mãos na massa, razão pela qual elas estavam sujas de argamassa. Enquanto o Didi trabalhava, meu vizinho enxugava uma cerveja estupidamente gelada, a olhar o trabalho.

Parei o carro, para cumprimentá-los. Fiz menção de pegar na mão do Didi, mas ele negaceou, dizendo que suas mãos estavam sujas. Respondi que elas estavam sujas para ele próprio, mas para mim estavam mais limpas do que as de certos engravatados, mais limpas do que os colarinhos de certos políticos, sobretudo do Distrito Federal.

Conheço-o faz vinte e cinco anos, desde que vim morar no conjunto Memorare, onde resido até hoje, onde eu e minha mulher criamos nossos dois filhos. Ele ganha a vida prestando pequenos serviços aos moradores, sempre respeitador e bem-humorado, sem nunca se queixar, sem nunca se maldizer.

Conquistou a estima e a amizade de todos. Às vezes, amanhecia sem um centavo no bolso, mas nunca demonstrava preocupação, e tudo acabava dando certo para ele. Didi sempre me faz lembrar as palavras de Cristo, quando falava que as aves não têm celeiro, mas nunca lhes falta o que comer; que os lírios do campo não fiam e não tecem, mas que nem Salomão, em toda a sua glória, se vestia como um deles.

Didi é mais milionário do que muitos arquimilionários porque pouco possui, mas o que tem lhe é o bastante, e nasceu desprovido da ganância e da ambição. Portanto, tem o reino do céu, aqui mesmo na terra. Sem dúvida, é um bem-aventurado.

21 de fevereiro de 2010

quarta-feira, 23 de junho de 2021

Os últimos Piratas - História do conjunto parnaibano do século passado

Fonte: Jornal da Parnaíba/Google


Os últimos Piratas - História do conjunto parnaibano do século passado


Vicente de Paula Araújo Silva

Historiador e escritor


O conjunto musical denominado Piratas do Ritmo, existiu em Parnaíba no século passado capitaneado pelo maestro Anastácio Magalhães de saudosa memória.            

Durante a sua existência estiveram em sua composição hábeis instrumentistas que concorreram para a otimização do seu conceito no cenário musical dos estados do Piauí, Maranhão e Ceará. Por ele passaram os músicos Raimundo Eliziário, Chico Eliziário, Domingos Cunha,  Sebastião, Nobre,  Amorim, Louro,  Totonho e a cantora Olga Maria. Hoje, dos músicos mencionados apenas estão vivos: Chico Eliziário, Domingos Cunha, Nobre e Olga Maria.


Aliás, Chico Eliziário  após residir no Rio de Janeiro por muitos anos, retornou a Parnaíba e com Domingos Cunha e o medico Costinha passou a reunir em sua residência no Macacal uma plêiade de notáveis instrumentistas,  fazendo ressurgir na cidade o tradicional Chorinho, gênero musical que existia desde o seu nascimento no Rio de Janeiro no século passado. Entre eles alguns se foram e estão no além como Mundico Baquil, Beja Canjica, Chiquinho Sorveteiro, Zequelé, Josias Sapateiro e Sansão.


Atualmente, na mesma casa do hoje Bairro de Fátima reúnem-se sempre aos domingos remanescentes da chamada “turma do chorinho” dentre os quais destacam-se o Assis Canjica, Mendonça do Cavaquinho, Renildo da Viola, Capitão Rocha, Tonhão, Lulu, Barata e, vez por outra, visitantes como Vitor Couto, Gregório Freitas, Manga, Raimundo Panela, Capitão Zezico, Velho Moço, este escriba e alguns jovens amantes de um bom samba e do velho chorinho. Tudo isso, sob o olhar cativante e batuta do “Velho Chico” que aos 92 anos de idade, comemorados nesse ano de 2013 com muita música na intimidade dos amigos e seio familiar ampliado com as presenças de suas irmãs vindas do Rio de Janeiro e Minas Gerais.


Mas, lembrando  “Os Últimos Piratas”, hoje é dia de aniversário do mais importante de todos os  instrumentistas desta nossa Parnaíba, o querido Maestro Domingos Cunha, que mesmo enfermo após um grave acidente na Avenida São Sebastião, experimenta uma boa recuperação, já ensaiando na sua expressão algumas músicas do seu vasto repertório. Parabéns a esses “Últimos Piratas".    

terça-feira, 22 de junho de 2021

MUNDINHA DO ZÍPER ou MUNDINHA SALVA-ROLA (*)



CENTENÁRIO DE NASCIMENTO DE FRANCISCA RAIMUNDA PEREIRA DA SILVA (MUNDINHA DO ZÍPER ou MUNDINHA SALVA-ROLA)


Em tempos de pandemia, poucos se recordam de outra praga que assolou gravemente nosso planeta não há muito tempo.


Nas décadas de 1960, 1970 e 1980, qual criança e homem não teve, ao menos  uma vez, a agonizante experiência de, ao puxar o zíper (ou fecho ecler) para fechar ou abrir a calça, prender, neste processo, a pele do pênis ou do saco?


O problema era tão sério que gerou debates na OMS. Relatos de mutilações transbordavam e o zíper, apesar de um artefato prático, estava prestes a ser banido por suas sequelas nocivas, da mesma forma que o amianto.


Cientistas do mundo inteiro, financiados pela multimilionária indústria da moda, lutavam para criar um meio de evitar que o zíper enganchasse na genitália masculina. Sem sucesso.


Foi quando uma humilde costureira cearense de Tamboril, Dona Mundinha, analfabeta, teve a ideia de colocar um pedaço de tecido entre o zíper e a parte interna da calça de seu marido, seu Anastácio (Tacim Zovão), que frequentemente sofria “acidentes” por conta de uma caxumba que o deixou com formas despropositadas. Logo, o “salva-rola”, como apelidaram a peça, fez sucesso em Tamboril. Encomendas não paravam de chegar e chamaram a atenção de pesquisadores.


A ideia de Dona Mundinha foi um divisor de águas na História da Humanidade. Logo, Fortaleza, São Paulo, Paris, Milão e Nova York contavam com o “tecido milagroso” em suas vestimentas.


Como nunca patenteou seu feito, foi rapidamente plagiada por europeus e norte-americanos o que ocasionou a perda de uma fortuna em royalties para o Brasil (o equivalente, segundo estudos sérios, a cem anos de exportação de nióbio).


Dona Mundinha morreu em 2001. Pobre e esquecida. Pior. Foi vítima de ingratidão por meio de chacotas constantes, como o apelido de Mundinha Salva-Rola, detonava: “Quisera nunca ter inventado isso e esse bando de fela da puta morresse com gangrena na chibata depois de enganchar no zíper”, disse, certa feita, com os olhos marejados. 


O escritor e pesquisador Pedro Salgueiro ainda resgatou a história de Mundinha e enviou documentação para Estocolmo, pedindo um Nobel da Paz para a heroína, mas os suecos se revelaram tão preconceituosos quanto os meninos que pixavam “Mundinha da Rola” no muro de sua casa. 


É hora de resgatarmos a dívida com esta grande mulher e incluir seu nome no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria.


(*) Texto da autoria do Dr. Alcindo, engenheiro civil e escritor, enviado pelo historiador e escritor Vicente Miranda, através de WhatsApp.   

segunda-feira, 21 de junho de 2021

Presente a longo prazo



Presente a longo prazo 


Carlos Rubem


Antônio Nogueira Campos, o tio Campos, 86 anos, conheceu, nesta data (19.06.2021), o meu neto varão, Joaquim Miguel, 01 ano, nascido no início da pandemia. Este fato se deu na tarde de hoje, na casa dele, em Teresina.


Parte da minha infância, dormia na casa do vovô Joel com Antônio e Gerson Nogueira Campos (1934 - 1973), irmãos. Antes de caírem nos braços de Morfeu conversavam amenidades, cantavam e declamavam versos de poetas vários. Impreterivelmente, recitavam Nogueira Tapety,  tio materno de ambos.


Lembro-me de “O chato”, fesceninos versos de autoria do tio Gerson, paródia de “A ideia”, de Augusto dos Anjos, censurado por tia Amália quando do lançamento do livro “Sonetos & Retalhos”, obra póstuma, por mim editada (1979), que se inicia assim: “De onde ele vem, de que matéria imunda // vem o bruto, chato feio, horripilante // que habita o rego virgem da minha bunda // e não me deixa sossegado um só instante?”


Tio Campos sabia de cor longos poemas, inclusive da literatura de cordel, a exemplo de “A chegada de Lampião no Inferno”, da lavra de José Pacheco.


Estudante do extinto Ginásio Municipal Oeirense, nos anos cinquenta, por ordem do seu rígido Diretor, Padre Baldoíno Barbosa de Deus, com antecedência apenas de dois dias, tio Campos decorou “Navio Negreiro”, de Castro Alves e o disse, com muita desenvoltura, num evento cívico. 


Pedi ao tio Campos que recitasse algum poema oferecido ao JM, pois iria ser filmada a sua performance e que, quando o pequerrucho crescesse, irá tomar conhecimento dessa singela homenagem.


A princípio alegou que pelos achaques da vida; sequela de um câncer de garganta que superou; da sua precária memória; não saberia satisfazer meu propósito. Mesmo assim pronunciou “Senhora da Bondade”, de Nogueira Tapety, soneto adiante transcrito:


“Não te quero por tua formosura 

De rainha da graça entre as mulheres: 

Quero-te, porque és boa, porque és pura 

E inda mais, porque sei que tu me queres.


A beleza exterior nem sempre dura,

E a d’alma, estejas tu onde estiveres,

Ungirá de virtude e de doçura

Tudo em que a bênção deste olhar puseres.


Eu sou artista – encanta-me a beleza 

Em ti, porém, abstraio-a inteiramente,

E penso amar-te, assim, com mais nobreza,


Pois se te esqueço a forma e a mocidade,

É para amar em ti unicamente

A encarnação suprema da bondade.”


Oeiras – agosto – 1916  

domingo, 20 de junho de 2021

Josélia


Josélia, em tela de Rogério Albino

JOSÉLIA


Elmar Carvalho

 

(Em lembrança de minha irmã falecida aos

 15 anos de idade, em 02 de julho de 1978.)

 

Fui pisado

pela terra.

Fui pisado

pela terra,

eu que sempre

procurei pisar

nas nuvens e

no céu.

 

                             Sem dormir sonhei,

                             mas o sonho acabou

                             antes de haver começado.

                             (Ainda bem, porque

                             o sonho era mau.)

 

Sonhei que minha

irmã morrera,

mas ela não morreu.

Era tão cheia de vida

que continua viva

na lembrança dos

que ficaram.

Ela continua viva

porque houve apenas

uma metamorfose

existencial.

 

                             Seu sorriso

                             seu (e)terno sorriso

                             sem precisar da

                             matéria para

                             ser desfraldado

                             continua estampado

                             em seu rosto

                             imaterial.

 

Josélia tinha a pureza dos inocentes

a inocente malícia dos felizes

e a beleza dos que não são

deste mundo cão.

Por isso foi

para o céu de

onde (vi)era.   

quinta-feira, 17 de junho de 2021

Chá das 5: Literatura de autoria feminina no Piauí

 


Carlos Castelo publica livro de minicontos

 




Carlos Castelo publica livro de minicontos

Ironia, intensidade e situações absurdas se combinam nos 101 brevíssimos relatos reunidos em “Cacos”, de Carlos Castelo; o texto da orelha é de Gregorio Duvivier


Humor e situações absurdas se combinam nos 101 minicontos do livro Cacos, de Carlos Castelo. De acordo com José Eduardo Degrazia, no prefácio da obra, as narrativas transmitem “o máximo de intensidade com o mínimo de palavras”.

 

Conhecido pela irreverência frente à banda Língua de Trapo, Castelo não é diferente na literatura. Em seus relatos ficcionais, alguns com duas ou três linhas, destacam-se o nonsense da vida — e um humor mais macabro, também, como quando o aluno de escrita criativa mata seu professor e colegas a machadadas para ter uma boa história.

 

Outro exemplo para entender o estilo do autor está em Achados e perdidos: “Um pouco alcoolizado no sambódromo, acredito que fiz sexo com quatro pessoas ao mesmo tempo. Estava escuro e desconfio que um deles era um cão. Ao acordar, senti falta da minha correntinha com o crucifixo”.

 

“Se um romance é uma maratona, o microconto são cinquenta metros rasos. Carlos convoca todos os músculos da palavra para atingir o mais rápido possível a linha de chegada”, escreve Gregorio Duvivier no texto de orelha.

Fonte: rascunho.com.br

segunda-feira, 14 de junho de 2021

ADEUS AIRTON MENEZES - ''O POETINHA"



ADEUS AIRTON MENEZES - ''O POETINHA"

 

Antonio Gallas

Contista, cronista e jornalista

 

Passavam vinte e sete minutos da zero hora deste domingo, 13 de junho, Dia de Santo Antonio, quando recebo do eminente acadêmico e  poeta Elmar Carvalho a  mensagem qual havia sido enviada a ele  pelo jornalista Reginaldo Costa: "Estou passando por aqui para noticiar o falecimento de José Airton Saraiva de Menezes, 62 anos, um dos idealizadores da Fundação Cultural Assis Brasil, o “poetinha”, como era tratado por todos, no âmbito do grupo Inovação.

 

Pessoa simples e de convivência social saudável, veio a óbito neste dia 13 de junho de 2021, à meia noite, no Hospital Marques Bastos, de infecção generalizada".

 

Por ele ter sido um dos que fez parte do Jornal Inovação,  imediatamente,  e sem saber que fora o Reginaldo Costa que havia encaminhado a mensagem ao Elmar,  repassei a dita ao Reginaldo e ao jornalista Bernardo Silva  que  lamentaram o ocorrido,  sendo que,  Reginaldo informou-me  ter sido  ele,  quem informou ao Elmar, através de Fátima, esposa do poeta. 

 

Pessoa simples, humilde, tinha um potencial poético de grande valor, todavia não gostava de exibicionismo, entretanto soube cativar a amizade e o reconhecimento dos amigos.  É verbete no livro Escritores Piauienses de Todos os Tempos - Dicionário Biográfico, autoria de Adrião Neto  com o seguinte: José Airton Saraiva de Menezes (Parnaíba, 24.11.1958). Poeta, construtor civil e design em arquitetura civil. Participou do livro Nuvem". Também citado em Aspectos da Literatura Piauiense de Elmar Carvalho.

 


Em seu blog "Blog do B Silva", o jornalista lamentou e noticiou a morte do "poetinha"  e do músico Herculano Falcão que também faleceu na manhã de hoje da seguinte forma: 

"NOSSO “ATÉ BREVE” A MAIS DOIS GRANDES AMIGOS QUE NOS ANTECEDEM NA GRANDE VIAGEM"

"Ontem à noite, através de uma rede social, ficamos sabendo pelo professor Antônio Gallas, da morte do “poetinha” José Aírton Saraiva de Meneses, 62 anos, um dos idealizadores da Fundação Cultural Assis Brasil. Faleceu por volta da meia noite do dia 13 de junho, no Hospital Marques Bastos, de infecção generalizada.

 

Hoje, no facebook, informam-nos do falecimento do músico e sindicalista Herculano Falcão (infarto), outro grande amigo, um dos integrantes e proprietários do grupo musical “Os Atômicos”, que, juntamente com o grupo “Os Apaches”, liderado por Fernando Holanda, animavam os bailes dos clubes sociais de Parnaíba, nos anos 70/80.

 

Sem dúvidas a partida desses dois grandes amigos nos deixa um grande vazio no peito e a tristeza de quem perde o convívio de dois grandes seres humanos. Nossa condolências aos seus familiares e amigos que ficaram".

 

Herculano, com os amigos Pituca e Reginaldo Mendes que também integraram “Os Atômicos”
Crédito foto: Blog do B. Silva
       

domingo, 13 de junho de 2021

Seleta Piauiense - Licurgo de Paiva

Fonte: Google


Suspiros

 

Licurgo (José Henrique) de Paiva (1842 – 1887)

 

Se no mundo existisse uma alma ainda

Que a ternura guardasse imaculada,

Ai! Eu dera, Senhor! por possuí-la

         A vida tão cantada.

 

Eu quisera voar com ela aos astros,

Exilar-me por lá desta poeira;

Em sua asa divina e perfumosa

         Transpor esta barreira.

 

Mas, ah! Senhor, o céu de minha vida,

Como a noite, no mar é turvo-escuro!

Minha estrela não fulge, que me mostre

         O trilho do futuro!    

sexta-feira, 11 de junho de 2021

Alguns bares e botecos de Parnaíba


Banner com charge de Gervásio Castro
Árvore nascida de semente plantada por João Lucas, originária da mungubeira do Bar Recanto da Saudade, do saudoso Augusto da Munguba. Ao fundo se vê a Banco do Louro. Foto da autoria de Jairo Leocádio. 


Alguns bares e botecos de Parnaíba

(um pouco da vida boêmia parnaibana nos anos 70/80)

 

Elmar Carvalho

 

Eu e minha família fomos morar em Parnaíba em junho de 1975, sendo que meu pai nela já se encontrava há alguns meses, quando assumira a chefia da Empresa de Correios e Telégrafos nessa cidade. Em setembro desse ano fui morar em Teresina, mas no início de 1977 retornei, para cursar Administração de Empresas na UFPI – Campus Ministro Reis Velloso. Em agosto de 1982 voltei a morar em Teresina, para assumir o cargo de fiscal na extinta SUNAB – Delegacia do Piauí.

De modo que este trabalho se refere sobretudo aos anos 1970 e 1980. Como em toda relação ou lista, sempre alguém poderá dizer que houve alguma exclusão indevida. Aqui haverá, mesmo porque não tive a pretensão de fazer um trabalho longo, aprofundado ou exaustivo. Talvez algum universitário o faça, em dissertação de mestrado ou em tese de doutorado. Estou apenas dando um fraco pontapé inicial, para que outra pessoa faça mais e melhor.

Na segunda metade da década de setenta, começou a decadência dos clubes sociais. Em 1975 o Cassino já não existia. Em seu lugar foi construído o prédio da TELEPISA. A Associação Atlética do Banco do Brasil - AABB, com as suas festas e tertúlias, ainda funcionava na Praça da Graça, no local onde depois foi construída a agência da Caixa Econômica Federal, mas pouco depois se mudou para a Beira-Rio. O Igara Clube ainda resistiu por mais alguns anos. Existem (ou existiam) ainda os clubes sociais do SESC, do BNB, dos Ferroviários e dos Trabalhadores. Animavam essas festas dançantes Os Apaches, com os irmãos Fonseca Júnior e Fernando Holanda na liderança, e os Atômicos, sob o comando de Reginaldo Mendes, que também era locutor da Educadora, então a única rádio da cidade.

Nos anos 70 se tornaram moda as churrascarias. Pontificaram as churrascarias Mangueira, que como o nome sugere, tinha mesas e redes colocadas debaixo de frondosas fruteiras, tendo como piso macio areal. Era bucólica e acolhedora, mormente para casais, que procuravam os locais mais escuros e mais distantes; a Gabriela, cujo nome fora inspirado, sem dúvida, na telenovela Gabriela, de 1975, que se localizava, salvo engano, na rua Vera Cruz, a três ou quatro quarteirões da Santa Casa de Misericórdia; a Cajueiro, do Antônio José Neves, no final da avenida Nossa Senhora de Fátima, que tinha muitas mesas colocadas debaixo de enorme e esgalhado cajueiro, que dava um tom de bucolismo e rusticidade ao ambiente e a do Iran, que ficava do outro lado do Igaraçu, na Ilha Grande de Santa Isabel, perto da ponte Simplício Dias.

Na segunda metade dos anos 70, explodiu a moda das discotecas (discotheques) e da dança solta. Geralmente havia um ambiente fechado para dança, com luzes multicoloridas, piscantes e giratórias. Nesse embalo, serviu de inspiração, talvez, o filme Os Embalos de Sábado à Noite, estrelado por John Travolta, no início da carreira, e que foi exibido no Cine Gazeta, na Praça da Graça. Músicas de letras simples, próprias para esse tipo de dança solta, livre, em que os pares quase não se tocavam. Recordo que havia as discotheques Pioneer, Barbarella e uma outra na Beira-Rio. Particularmente, em termos de música de discoteca, eu gostava da Tina Charles, de timbre mais romântico e de voz aguda, cuja melodia se espalhava na noite da cidade.   

Por essa época, o extrativismo econômico já estertorava. A navegabilidade do Igaraçu e Parnaíba já começava a definhar, por causa do asfaltamento de muitas estradas de rodagens. As grandes firmas das famílias tradicionais parnaibanas já começavam a entrar em decadência. A poderosa Casa Inglesa, com filiais em várias cidades do Estado, já encerrara suas atividades. Dessas grandes empresas, que ainda conheci em atividade, todas entraram em bancarrota e terminaram falindo.

Como consequência da problemática econômica, mas sobretudo da mudança de costumes, do surgimento das “moças de programa” e do uso massivo dos contraceptivos, os cabarés começaram a ser extintos. Todavia, ainda alcancei em funcionamento, entre outros, os seguintes: os da Munguba, o da Maria das Neves (na Guarita), o Cabeça de Porco, nas cercanias da Lagoa do Bebedouro, o Rio-Chic e os da Coroa. Outros surgiram nessa época, e tiveram vida efêmera: a Velha Debaixo da Cama (na avenida São Sebastião), Beleza da Rosa e o Dallas, que ficava num banco de areia, perto do Campus da UFPI.

Da Beleza da Rosa era frequentador assíduo um boêmio, de enorme força física, um verdadeiro Hércules ou Maciste. Ao dançar, em dado momento, como um guindaste, suspendia a rapariga, segurando-a em uma das coxas e em um dos braços, e a levantava acima da cabeça; girava-a em sua dança exótica e aloprada, a se deslocar pelo salão.

Nesse mesmo lupanar, segundo uma das envolvidas confessou a um conhecido meu, duas prostitutas se apaixonaram, uma pela outra. A confidente disse ao meu colega que não sabia mais o que fizesse, pois a sua amante a estava consumindo, e ela já se encontrava exaurida, sua energia sugada pela outra, de forma que não tinha força para nada, e mesmo já não suportava esse tipo de relação. O interlocutor a aconselhou a fugir, já que ela não tinha coragem para romper com a sua amante. Não sei se ela lhe seguiu o conselho.    

Curiosamente, fora as barracas e restaurantes da praia, poucos bares comercializavam o caranguejo cozido na cidade de Parnaíba. Lembro que, entre esses poucos, se destacavam o do Cornélio, perto do Igaraçu, no final da Rua Coronel Pacífico, e o do Mário, na Beira-Rio. Os restaurantes mais chiques só vendiam o crustáceo em casquinha.

A limpeza do caranguejo era precária, de modo que ele vinha com um pouco de lama do mangue, o que lhe dava um exotismo e um sabor adicional. Era quebrado diretamente na mesa de madeira, com porretes rústicos. Muito diferente de hoje, em que se fornecem tábuas e martelos bem trabalhados para o desmonte da iguaria. Também hoje são servidos acompanhamentos de arroz e molhos, além de que os caranguejos são bem limpos e cozidos em águas com temperos.

Acrescento que eles eram vendidos, em corda de 4 unidades, debaixo da ponte Simplício Dias, nos anos 1977/1978, por um preço inferior a uma garrafa de cerveja. Com o crescimento da “exportação” para Teresina e Fortaleza, o preço começou a subir em escala rápida. Basta que se faça uma comparação hoje entre o preço de uma garrafa de cerveja (600 ml) e uma corda de quatro caranguejos.

Mas voltemos ao trilho de nosso tema.

Na Beira-Rio (Avenida Nações Unidas) ficavam os bares e restaurantes frequentados pela elite, entre os quais se destacavam: o Veleiro, o Cabana e o Navegante. Deles se contemplava a beleza do Igaraçu e da Ilha Grande de Santa Isabel.

Desde 1977 conheci o Bar do Augusto, situado na Munguba, perto da vala da Quarenta, que desaguava no Igaraçu, que passava ali perto. Instalado em um pitoresco prédio de taipa, mas bem conservado, rebocado, pintado de branco. Graças ao zelo do Augusto, sua brancura era quase sempre imaculada. Nele, outrora, funcionara um cabaré, no qual eram realizados alguns famosos bailes. De um velho texto, entre vários, que escrevi sobre ele, pinço o seguinte:

“O Recanto da Saudade não tinha esse nome, não. Era tão-somente o bar do Augusto. Eu o conhecia fazia muito tempo, desde o ocaso melancólico da Munguba, quando ali aportava em companhia de meus amigos Reginaldo Costa e Jonas Carvalho, para tomarmos uns bons goles de cerveja, tendo como tira-gosto saudosas músicas dos velhos tempos que não voltam mais.

Mesmo naquele tempo, era um ambiente familiar e de muito respeito, pois o Augusto é um cordial cavalheiro de ar sério, embora não carrancudo, que sabe imprimir ordem na casa. A sua característica principal é o proprietário ter mantido o estilo rústico do prédio e não ter aderido à moda avassaladora dos CDs, continuando fiel à sua velha radiola e aos seus antigos discos de vinil, alguns dos quais valiosas raridades e verdadeiras relíquias.

É no Recanto da Saudade, que enternecidas lembranças me traz, que ainda encontro velhos amigos do tempo de outrora e de agora, como meu compadre Airton Meneses e os radialistas e jornalistas Bernardo Silva, João Câncio, prof. Antônio Gallas, que tive a satisfação de introduzir na confraria dos saudosistas, e que hoje é um de seus mais dedicados adeptos.

O Recanto é o reduto irredutível do Dourado, misto de boêmio, músico, carnavalesco e humorista, que por ali circula desfiando suas estórias e tiradas e desfilando, a caráter, suas personagens momescas, como PC Farias e outras personalidades de uma fauna nem sempre recomendável.

O bar teve alguns pequenos e sutis melhoramentos, mas exclusivamente para o conforto da clientela, que aumentou muito nos últimos tempos, sendo comum, no final de uma tarde de sábado ou domingo, vários amigos e casais da chamada terceira idade ali aparecerem para ouvir uma música daquele tempo d’antanho, que tantas recordações e saudades deflagram na alma do ouvinte sensível.

O cliente escolhe sua música predileta, mas somente o comandante Augusto pode manipular os velhos discos de vinil, com a habilidade toda sua e insuperável cuidado. Quando deseja limpá-los, faz uso de uma longa flanela vermelha, que mais parece uma bandeira ou uma toalha.

No Recanto da Saudade é fácil recordar uma época que não presenciamos, mas que teima em se manter viva; um passado de que só temos notícia através das conversas e do Almanaque da Parnaíba, ou mergulhando nas páginas dos Vareiros do Parnaíba e outras estórias, do saudoso jornalista e escritor Souza Lima, que ainda conheci. Aliás, cheguei a ver o deputado Olavo Rebelo, debruçado sobre uma enferrujada máquina de escrever, datilografando esse precioso livro, como uma prova de reconhecimento de seu valor. Ali, ainda parecem navegar as velhas alvarengas, acaso egressas de algum poema do Alcenor Candeira Filho; ali, ainda parecem desfilar os entroncados porcos d’água e vareiros; ali, até parecem ressuscitados os antigos Bailes Azuis e as respeitadas e respeitadoras meretrizes de antigamente, bem mais respeitáveis que as moças de programa de hoje em dia. E tudo isso perpassa no romance Beira Rio Beira Vida, do insuperável mestre Assis Brasil.”

Vez ou outra, apareciam no Recanto da Saudade os saudosos cego Uchoa e o Balula. O Uchoa, sempre bem-humorado, desfiava suas anedotas e “causos” jocosos, ou engendrava suas tiradas, ao sabor do improviso, conforme o ensejo da conversa. O Balula, alourado, de olhos claros, com a sua bela voz, algo tonitruante e levemente de timbre metálico, interpretava, como um verdadeiro ator, os poemas que decorava. Antes fazia um preâmbulo, à guisa de suspense, depois, executava sua mise-en-scène, como se estivesse em um palco. Numa de suas declamações preferidas, ele dizia que iria quebrar a taça da amargura. E diz a lenda que, algumas vezes, ele chegou a literalmente quebrar, no calor de sua emotiva interpretação, algumas valiosas taças de cristal.   

O Recanto da Saudade sucumbiu, pode-se dizer, literalmente, com a morte de Dom Augusto da Munguba. Dele só restam ruínas e saudades. Talvez nem mesmo as ruínas ainda existam. Um boêmio saudosista (*), cujo nome infelizmente não guardei, e isso lamento muito, me falou que, instigado por um texto meu, plantou uma semente da vistosa mungubeira, que havia perto dele, na Praça da Graça, no entorno da Banca do Louro. E a semente já se transformara em bela árvore, que bem poderia ter uma placa em lembrança do Augusto e de seu legendário bar. Me restou também um soneto, do qual desentranho os tercetos:

Onde, agora, o Augusto?

Onde, agora, a vitrola, a música e o bar?

Como nos versos sublimes de Bandeira,

 

ficaram de pé, suspensos no ar. . .

Encantados no destempo de um tempo

sem passado, sem futuro, sem presente. 

Na Praça da Graça e no seu entorno existiam famosos bares, frequentados por bravos boêmios, dos quais posso citar: Bar Parnaíba e o seu espaçoso salão das mesas de sinuca, Bar do Pimpão, o bar e restaurante Acadêmico e o Bar Fortaleza, muito frequentado, no início da Rua Riachuelo.

Antes da destruição da antiga Praça da Graça havia o abrigo, no qual funcionava o conhecido Bar do Gago. No novo formato da Praça, não tão belo quanto o modelo do logradouro anterior, surgiu o Bar Carnaúba, construído com os troncos dessa árvore e coberto com as palhas dessa linda palmeira, símbolo do Piauí. Foi arrendatário dele, durante vários anos, o Osmar Linhares, famoso pelo seu “boa noite”, mesmo que fosse durante um bom e belo dia.

No bairro Coroa, mais ou menos entre a Rio-Chic e a Beira-Rio, costumava ver o Bar Corujão da Meia Noite. Como o seu nome indica, funcionava até tarde da noite. Ficava perto dos pequenos cabarés que funcionavam em seus arredores. Era um típico e pequeno boteco, pitoresco por ser todo de tábuas. Os clientes ficavam ao relento, a céu aberto, a ver estrelas. Se chovesse, os fregueses tinham que suportar os pingos d’água. Só havia lá fora; lá dentro só ficavam os utensílios, os tira-gostos e os litros de bebida. Embora o achasse interessante, nunca fui seu freguês. Assim como não o fui de um bar, que havia perto de um bueiro, nas imediações da capela da Avenida Nossa Senhora de Fátima. Este tinha uma grande clientela, que ficava ao pé do balcão, ou num pequeno alpendre que dava para a avenida.

Durante um ano ou dois, eu e o jornalista B. Silva, aos sábados, gostávamos de tomar três ou quatro cervejas no Bar do Cajueiro, localizado na Avenida Piauí. Praticamente o bar era o próprio cajueiro, pois a mesa ficava debaixo dessa frondosa fruteira, que dava uma refrescante sombra, que mais se tornava refrescante pela brisa, que sempre havia. Desse bar, disse o historiador e escritor Vicente Araújo (Potência), numa de suas tiradas, que era nele que o vento fazia a curva.

No final dos anos 70 e começo dos oitenta, frequentei algumas vezes o bar do senhor Raimundo ou Raimundão, por causa de sua altura, que ficava na beira da Lagoa do Bebedouro, à margem da estrada que vai para Rosápolis. Na época a lagoa não fora urbanizada e havia poucas casas no seu entorno. Os conjuntos habitacionais ainda não haviam sido construídos. De lá se tinha uma bela vista da lagoa. O boteco era rústico, mas o dono era acolhedor. No quintal havia umas palmeiras e uma enorme e frondosa amendoeira, que nos deu sombra e beleza, no dia em que debaixo dela comemorei a conclusão do meu curso de Administração de Empresas.

Quando meus pais moraram perto da Praça da Santa Casa, fui algumas vezes ao bar dos irmãos Vasconcelos, que ficava no início da Avenida Capitão Claro. Ficava quase colado à antiga agência da empresa Marimbá, em cujos ônibus viajei tantas vezes para Teresina ou vice-versa. Na realidade um dos irmãos era o dono e o outro, seu empregado e hóspede, posto que morava na casa do primeiro. Já eram idosos nessa época. Eram dos Vasconcelos da Ibiapaba, de Ubajara ou Tianguá. Quando um morreu, logo em seguida morreu o outro.

Defronte ficava um posto de combustível, em cuja dependência lateral funcionava um outro barzinho, de propriedade de um irmão do Raimundo (da Lagoa do Bebedouro), bastante frequentado no final dos anos 70. Próximo dali, mais precisamente perto do Mercado Central, havia o bar e lanchonete Cascatinha, aberto a noite toda. Nesse estabelecimento, tanto os boêmios bebiam, como tentavam matar a ressaca com caldo de carne ou outras comidas mais substanciosas.

No final da década de 70, a Lagoa do Portinho era pouco frequentada. Existia uma rústica churrascaria e as margens da lagoa ostentavam uma densa floresta de cajueiros. Debaixo deles, na companhia de familiares e alguns bons amigos, comemorei minha aprovação para fiscal da SUNAB, hoje extinta. Certo dia, voltando da praia, estive nessa churrascaria. A natureza se mostrou muito caprichosa nessa tarde inesquecível; em momentos chovia, em outros fazia sol, tornando as cores cambiantes; ora fazia frio, ora calor. Tarde mágica, em que ainda havia uma belle de jour, que me inspirou o poema “Mulher na Lagoa do Portinho”, do qual estampo os seguintes versos:

Na tarde antiga

de sol e bruma

de luz e penumbra

as dunas mudaram

de cores e formas.

 

Os belos olhos esplendentes –

pálidas cálidas opalas ou

esmeradas esmeriladas esmeraldas –

da mulher bonita

de sinuosas dunas e viagens

furta-cores furtaram

outros tons e sobretons.

Perto (e no lado esquerdo) da ponte que antecede o antigo povoado de Morros da Mariana ficava o barzinho de dona Maria, companheira do senhor Raimundo, parente do Reginaldo Costa, do jornal Inovação. O senhor Raimundo gostava de tomar uma cachaça, muito forte, uma verdadeira “serrana”, por ele fabricada, num alambique instalado numa propriedade sua, vizinha. Em momentos agradáveis de minha juventude estive nesse boteco algumas vezes, em companhia do Canindé Correia, do Vicente Araújo (Potência), do Reginaldo Costa e do B. Silva.

Em minha crônica evocativa de meu saudoso amigo Canindé Correia, recordei esse tempo de música, poesia e alegria: “Num barzinho, que ainda existe, quase debaixo da ponte, imediatamente antes do então povoado de Morros da Mariana, degustávamos saborosos caranguejos, que chegavam fresquinhos, ainda cobertos pelas belas e grandes folhagens do mangue; o igarapé, por onde os crustáceos chegavam, em pequenas canoas, passava em frente ao boteco, e aumentava a sedução e a beleza da paisagem.” 

Na rua 19 de Outubro, perto do Bar do Cornélio, localizado no final da Rua Coronel Pacífico, ficava (ou fica) o Bar do Cheira Mijo. Boteco rústico. O cliente tomava sua bebida quase sempre em pé, ao redor do balcão. Ali perto fica o Porto dos Tucuns, onde, outrora, atracavam muitos barcos, procedentes das ilhas e povoados do Delta do Parnaíba. Os porcos d’água ou embarcadiços urinavam nessa rua ou nas adjacentes, de modo que passaram a chamar a artéria de “rua do cheira mijo”, donde se originou o pitoresco nome do bar. Perto ficavam alguns casebres e cabarés. Os moradores, nessa época, faziam suas necessidades dentro de casa, e depois jogavam os dejetos na rua. De modo que nessa região da Munguba também ficava uma via, que era denominada como “rua da bosta”.

Ainda na Munguba, entre o saudoso Recanto da Saudade e o Bar do Cornélio, à margem do Igaraçu, fica a metalúrgica do senhor Pereira, em cujo local, em determinado dia da semana, se reunia a confraria A Forja. Cada “confrade” levava determinada quantidade de cerveja e de carne para tira-gosto. Os membros d’A Forja eram pessoas bem situadas, como se diz, empresários e profissionais liberais, como médicos, engenheiros e advogados, além de graduados funcionários públicos. Funcionava com ordem e regularidade, talvez porque não tivesse estatuto e nem regimento escrito.

Alguns botecos, sobretudo os frequentados pelos “profissionais papudinhos", tinham a (má) fama de vender cachaça “desdobrada” ou “manipulada”, isto é, adulterada. Para simplificar, misturada a outras substâncias, inclusive água, em menor ou maior quantidade, conforme o proprietário do botequim fosse mais ou menos desonesto, para obtenção de maior lucratividade. Também alguns vendiam tira-gostos indigestos, alguns requentados uma ou mais vezes, que segundo diziam ou matavam ou adoeciam o cliente. A esses poderíamos aplicar os versos epigramáticos de Oswald de Andrade:

No baile da corte

Foi o Conde d’Eu quem disse

Pra Dona Benvinda

Que farinha de Suruí

Pinga de Parati

Fumo de Baependi

É comê bebê pitá e caí

Os remanescentes dessa velha guarda costumam curar sua ressaca na lanchonete do senhor José dos Santos, que vende um saboroso e substancioso caldo de carne. Alguns boêmios preferem continuar ou começar a farra nessa lanchonete, posto que ela também vende bebidas. Fica ao lado do Mercado de Fátima. Nesse mercado fica a lanchonete/restaurante da Maria, que comercializa um igualmente delicioso caldo de carne.

Reconheço que cada boêmio tem o seu boteco preferido, o boteco de sua memória, afeição e bem-querer. Por conseguinte, em cada canto da cidade existe um “recanto da saudade”, um barzinho bucólico, rústico, intimista, aconchegante ou inesquecível. Como diria Patativa do Assaré: cante o seu, que eu canto o meu.

(*) Precisamente hoje (15/06/2021), alguns dias após eu haver escrito esta crônica, o fotógrafo e bibliófilo Jairo Leocádio, por WhatsApp, me comunicou haver encontrado na Praça da Graça o cidadão que plantara a munguba. Estava com o meu texto em seu celular e disse se chamar João Lucas. Portanto, tem o nome de dois evangelistas. Jairo me prometeu enviar uma fotografia dessa árvore, que fica perto da famosa Banca do Louro.        

Chá das 5 entrevista Claucio Ciarlini


quarta-feira, 9 de junho de 2021

Noturno de Oeiras (fragmentos)

Esse lindo banner foi elaborado pelo poeta Claucio Ciarlini e ornará o espaço Pasárgada de nossa casa.

terça-feira, 8 de junho de 2021

Parnaíba revisitada

Esse lindo banner foi elaborado pelo poeta Claucio Ciarlini e ornará o espaço Pasárgada de nossa casa.

segunda-feira, 7 de junho de 2021

PORTO DAS BARCAS

Fonte: Google/Delta Rio Parnaíba Turismo


PORTO DAS BARCAS

 

             Fernando Basto Ferraz *

 

            Toda cidade possui seus símbolos que a identificam e lhe dão personalidade. Em Parnaíba o Porto das Barcas é um desses símbolos.

            Foi no Porto das Barcas que a cidade de Parnaíba se fez e prosperou a partir do empreendedorismo do português Domingos Dias da Silva, procedente do Rio Grande do Sul, que comercializava seus produtos diretamente com as cidades do Porto e Lisboa, em Portugal, com a autorização da Rainha D. Maria I.

            Não importa que o embrião de nossa cidade tenha acontecido no povoado Testa Branca situado próximo ao aeroporto de Parnaíba. Foi no Porto das Bascas que nossa cidade firmou-se com sua pujança econômica.

            Ainda é tempo de parabenizar e agradecer ao grupo de parnaibanos que tomaram para si a iniciativa bem sucedida de revitalizar todo o acervo das edificações do patrimônio histórico existente no perímetro do nosso Porto das Barcas que se encontrava abandonado, em ruína.

            Toda a polêmica sobre a homenagem que o Governo do Piauí quer prestar à memória do ilustre e empreendedor João Claudino, já falecido, ao dar seu nome ao Porto das Barcas constitui uma agressão a esta cidade, ao seu povo, à sua história rica de empreendedorismo, ousadia, independência, pioneirismo.

            Não se discute os méritos do homenageado, que ao longo da vida conquistou o respeito e a admiração dos piauienses como empresário de muitas empresas bem sucedidas no Piauí.

            O que tem provocado estranheza, inconformismo, aborrecimento aos parnaibanos com o pretendido ‘Porto das Barcas João Claudino’ é a percepção de que ele não criou vínculos com a cidade de Parnaíba para receber tal homenagem.

            João Claudino, ao contrário do que ocorria com frequência em Teresina, sequer era visto nas ruas e eventos sociais desta cidade de Parnaíba. Na verdade, ele passou a ser lembrado, com indignação, por ter demolido o belo prédio da avenida Presidente Vargas, no centro da cidade, onde funcionou o Escritório de Representação da Companhia de Navegação inglesa Booth Line para, no lugar, construir um prédio com formato de caixão, próprio para funcionamento de armazém de secos e molhados, onde instalou uma de suas lojas do Armazém Paraíba.

            De positivo, essa demolição, até hoje lamentada na cidade, despertou nos parnaibanos a iniciativa de não mais permitir a destruição do acervo do patrimônio histórico de suas edificações, hoje preservados pelo IPHAN.

           

            Trata-se de mais um mau exemplo de agressão, prepotência de singular astúcia política que poderia ter sido evitada se o Governo do Estado do Piauí tivesse usado o bom senso de previamente ouvir o Instituto Histórico Geográfico e Genealógico de Parnaíba, além de Academia Parnaibana de Letras, como bem lembrou o acadêmico Pádua Marques.

            O Piauí tem se destacado nas homenagens que presta a seus filhos ilustres, figuras públicas, quando os imortaliza com nomes de cidades de baixo IDH, com população de no máximo 5.000 habitantes, com o conforto de não ser incomodado com a resistência de uma oposição aguerrida. Já são mais 50 cidades piauienses com nomes de pessoas – versão atual do coronelismo regional que atende aos interesses de projetos de poder que se propõem continuar existindo ‘ad eternum’.

            A nós, parnaibanos, cabe o papel de lutar, de resistir contra tal decisão precipitada, inoportuna, descabida, de acrescentar ao Porto das Barcas o nome do respeitado empresário João Claudino que em vida jamais cultivou laços afetivos com Parnaíba e o seu povo.

            Convém ser lembrado sempre que o Porto das Bascas permanece sendo o símbolo maior da pujança econômica da cidade de Parnaíba. Por esta razão, convém que permaneça apenas com este nome por melhor harmonizar-se com sua história.

            Se, contudo, permanecer a intenção do Governo do Piauí de homenagear João Claudino nesse lugar, que o faça dando seu nome ao Museu do Mar que acaba de criar naquele lugar.

            A história e os valores da cidade de Parnaíba não se negociam, não podem ser ignorados por seus governantes de ocasião, seja a nível municipal ou estadual, sob pena de perderem o respeito e a legitimidade de suas ações perante a história e a memória de nosso povo.

            Viva Parnaíba!  Viva a terra de Simplício Dias da Silva, que não se curvou e nem se acovardou perante as agressões e provocações de decisões políticas equivocadas, inoportunas, agressivas de iniciativa daqueles que momentaneamente detinham o poder e a condução de seu destino.

            A cidade de Parnaíba e o seu povo exigem respeito!

 

(*) da Academia Parnaibana de Letras e da Academia Cearense de Cultura.