O adeus a M. Paulo Nunes
Reginaldo Miranda[1]
Quando falece um amigo ficamos
mais pobres! Assim nos sentimos desde a última quinta-feira (14/10), quando
partiu para o outro lado da existência o professor Manoel Paulo Nunes. Era um
grande amigo, afável, culto, inteligente, uma voz firme que conduzia toda uma
geração literária. Quem se preocupar em escrever a história da literatura
piauiense não pode deixar de consignar sua benéfica influência no meio
literário piauiense. Foi ele o sucessor de A. Tito Filho, no comando da
Academia Piauiense de Letras e se desejasse a teria presidido por todos esses
anos. Todos nós que assumimos a administração daquele Sodalício o fizemos sob
seu beneplácito.
Em nossa presidência foi eleito
tesoureiro e o mestre Santana vice-presidente. Ele, cuja administração das
finanças domésticas era entregue à esposa, D. Clara, às vezes, em tom jocoso
ironizava: “Essa Academia vai mal, entregando o comando das finanças a um
sujeito que não administra nem as finanças de casa!”. E ria contidamente.
Tomando gosto pela leitura dos
clássicos desde a mocidade formou sólida base cultural, porque lia com certo
método. Orador brilhante, citava com facilidade os grandes escritores e
pensadores, porque os conhecia profundamente. Só cita quem conhece, quem tem
intimidade com o texto.
O Prof. M. Paulo Nunes devotou
toda a sua vida a duas grandes paixões: o magistério e a literatura; a educação
e a cultura. Na primeira, ingressou com 19 anos de idade incompletos, ao
assumir a cátedra de português no Colégio “Demóstenes Avelino”, pelas mãos de
seu primo Amandino Teixeira Nunes, que ali lecionava. Três anos depois assume a
mesma cátedra no Liceu Piauiense, onde estudara e então a mais conceituada
escola do Piauí. Desde então passou por diversas escolas e pela Faculdade de
Filosofia, sendo um dos principais fundadores da Universidade Federal do Piauí,
de que deveria ser o primeiro reitor. Porque seu nome foi vetado retirou-se
para Brasília, em exílio voluntário, passando a servir no cargo de assessor no
Ministério da Educação.
Retornando a Teresina no início
dos anos noventa, assume protagonismo literário ao suceder A. Tito Filho no
comando da Academia Piauiense de Letras; e a presidência do Conselho Estadual
de Cultura. Realiza profícua gestão nas duas instituições, permanecendo no
comando desta última até recentemente, oportunidade em que editou uma das mais
conceituadas revistas literárias do País, a Presença, reconhecida pelo alto
padrão do texto literário e esmero gráfico. Também, conduziu por algum tempo a
Secretaria Estadual de Cultura. Um fato interessante é que ao retornar à cidade
de Teresina estabelece seu domicílio em confortável casa residencial situada à
Rua 31 de Março, na zona leste da cidade. Mais tarde, já na velhice, muda-se
para um belo apartamento localizado à Avenida Marechal Castelo Branco, no
Bairro Cabral. Então, durante uma fala em sessão da Academia relembrava sua
trajetória e se queixava da mudança domiciliar, razão pela qual teve de doar
grande parte de sua biblioteca. Ao referir-se aos dois endereços, não me contive
e interpelei o estimado mestre: “Professor o senhor gostava do regime militar,
pois primeiro morou na 31 de Março, depois na Marechal Castelo Branco”. Ao que
ele prorrompeu em gostosa gargalhada, pela coincidência dos endereços.
O Professor deixa uma obra
fabulosa, monumento da crítica literária, grande parte constituída pelos
inúmeros discursos proferidos em solenidades literárias e pelas centenas de
artigos publicados em revistas e jornais, sobretudo na coluna semanal que
mantinha em um periódico de Teresina. Sua contribuição à literatura de língua
portuguesa é inestimável, porque analisou e interpretou os principais clássicos
e pensadores do Brasil e de Portugal. Também, alguns de língua espanhola,
dentre outras, sobretudo Jorge Luís Borges, Gabriel Garcia Marques, Vargas
Llosa e Garcia Lorca. Fui convidado para prefaciar um de seus livros e produzir
um texto intitulado “M. Paulo Nunes e os valores literários”, que ele costumava
dizer, para gáudio nosso, que era o melhor texto ao seu respeito.
O reverenciávamos por reconhecer
sua grandeza moral e intelectual, nutrindo por ele a maior estima, onde o
contraparentesco e as leituras comuns foram o início para sólida amizade.
Ingressamos na Academia por suas mãos e por elas chegamos à presidência, com
ele sempre votando e defendendo as mesmas ideias, inclusive no zelo pelos
interesses da nossa casa literária.
Com a sua partida ficamos todos
nós mais pobres. Porém, seu nome há de permanecer na descendência deixada e na
substanciosa obra que nos legou. Vá em paz amigo, todos nós seus discípulos
haveremos de lembrar com carinho o seu nome e exaltar a sua obra literária,
verdadeira bússola para os estudiosos que queiram aprofundar no estudo do
vernáculo e no conhecimento da literatura de língua portuguesa. Você parte, mas
deixa um legado que haverá de imortalizar o seu nome. Descanse em paz, amigo!
[1] REGINALDO MIRANDA, advogado e escritor, membro da Academia Piauiense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí Candidato à vaga de desembargador do Quinto Constitucional da OAB no TJPI.
Fonte: Portal Entretextos
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