Cunha e Silva Filho
Ontem, soube que um dos dois tios maternos, o Carlos Alves Setúbal, falecera no dia 3 de fevereiro passado em consequência de um derrame.. Ele, no fim da Segunda Guerra Mundial, tinha-se alistado para compor mais um grupo de brasileiros que iriam combater na Itália contra as forças alemãs, das quais a Itália era aliada, juntamente com o Japão, formando o chamado Eixo. Carlitos, como era conhecido pelos familiares, nasceu em Teresina em 1924.
Nunca, não sei por que razões, dissociava o hipocorístico Carlitos da figura do grande ator inglês Charles Chaplin(1889-1977). Era um associação, uma analogia que do meu subconsciente não conseguia me separar, pois meu tio Carlitos nada tinha de cômico nem de engraçado. Era uma pessoa tratável, simpática, mas séria. De altura média, bem magro na velhice, seus olhos pareciam com os de minha mãe. Não só os olhos, o semblante também, o jeito de perecer estar refletindo distante, sobre alguma coisa insondável.
Quando o conheci, em 1964, estava em plena forma, de sua mocidade de quarenta anos, já casado com a Gelsa, uma carioca alegre e espirituosa, que gostava e ainda gosta de estar informada sobre o que se passa no seu país e que sempre, para mim, era uma boa dona de casa inclusive com os predicados de cozinhar bem.
Calitos, era essa a minha maneira mais tarde de o tratar, sempre me recebeu bem desde quando lhe fui apresentado por um outro tio, ainda vivo, o Zequinha. Foi o tio Zequinha que me levou de Oswaldo Cruz, onde morava, subúrbio do Rio, para Piedade, também subúrbio do Rio. Em Piedade, morava o Carlitos, já casado, com um casal de filhos. Meu tio morava com o pai e a mãe de Gelsa, duas pessoas encantadoras e bem-humoradas, muito gentis, hospitaleiras. Se chamavam Hilário e Ormezinda
Carlitos veio para o Rio muito jovem , ainda adolescente. Posto tenha tido alguma ajuda de um tio o Dico, do lado materno, que era militar e se não me engano, também professor de educação física, Carlitos logo teve que se virar sozinho na cidade grande porém bem mais agradável que era o Rio de Janeiro do final dos anos trinta. Morou em vaga, conheceu a vida noturna carioca e boêmia e meio malandro daquele tempo. Morou na Av. Mem de Sá e provavelmente em outros lugares modestos do velho centro do Rio. O certo é que viveu, a seu modo e com a dificuldades de proteção maior. Ficou adulto, aprendeu a dirigir carros.
O tempo foi passando. Carlitos, finalizada a Segunda Guerra ( agosto de 1945), já tendo regressado da Itália, e na condição agora de pracinha vitorioso da FEB, nesse mesmo ano, retornou a passeio ao Piauí, reviu sua Teresina, foi até Amarante visitar parentes, inclusive minha mãe que, naquela época, lá morava. Mamãe estava grávida, esperando que o autor destes comentários viesse a este mundo, de sorte que viu apenas os meus irmãos Sonia e Winston.
Carlitos, em 1945, embarcou no porto do Rio de Janeiro em navio de guerra para a Itália. Estava-se no ano do final da Segunda Guerra Mundial..Depois de longa viagem, aportaram na Itália. Como tinha aprendido no Rio a dirigir carro, foi logo aproveitado como motorista no front italiano. Uma vez, não sei bem o motivo, numa de suas missões de conduzir militares, seu carro capotou e ele amanheceu, no dia seguinte, em um hospital. Tinha ferido seriamente a cabeça e tivera que se internar. Esta circunstância de guerra me traz à lembrança imagens do romance de Hemingway, A Farewell toArms ( 1929).
Antes do acidente, Carlitos teve também seu tempo de preparação militar a cargo, às vezes, de soldados americanos, esteve em combate, viu, nos campos da Itália, montes de gente morta, soldados alemães, italianos. Viu muita miséria, fome, mulheres que, para sobreviverem, mercadejavam o sexo.
Passou por várias cidades italianas, pelo cemitério de Pistóia,. Em Roma, grupos de destacamentos militares incumbiam-se de levar alimentos para o Vaticano, onde conheceu a Praça de São Pedro e, pessoalmente, as bênçãos do Papa Pio XII (1876-1958), o primeiro Papa romano.
Deixando os tempos da Itália, novamente no Rio de Janeiro, profissionalizou-se como motorista de linha de ônibus cortando a cidade de São Sebastião ainda competindo com a existência dos bondinhos que aos poucos foram desaparecendo como consequência do progresso e das novas necessidades do transporte urbano.
Carlitos, anos depois, foi recompensado ao benefício da pensão do Exército por ter participado como pracinha da FEB. Daí então, melhorou sua vida, teve conforto, conseguindo do Exército o direito de patente de subtenente. Foi bom que tivesse tido a experiência no front da Itália. Sua participação só lhe trouxe benefícios e amadurecimento, assim como lhe deu uma visão mais ampla da vida e da realidade em tempos difíceis. . Voltou com vida e com saúde. Conseguiu sustentar e formar sua família. Comprar, não sem dificuldades, sua casa, uma bela casa, por sinal no bairro de Sulacap. Viveu longos anos de felicidade, sobretudo a partir da sua nova condição de pensionista do Exército.
Sua velhice era simples. Estar junto da esposa, companheira de longos anos, conversar com amigos, vizinhos, jogar sinuca num barzinho, dirigir seu automóvel, fazer compras no supermercado, ler jornal, ver noticiários na tevê. Vida, assim, de um homem simples mas de muitas memórias que lhe ficaram no espírito para sempre. Não era religioso.
Gostava, sempre que lhe pedia alguma informação sobre o tempo da guerra, de me mostrar fotos envergando seu uniforme militar, cheio de vitalidade, de lugares, da Itália, de companheiros de farda, das belas mulheres italianas de então. Seu pai, meu avô materno, Avelino Alves Setúbal, morto precocemente, fora também militar do Exército. Sua fisionomia e porte lembram a aparência física de meu filho mais novo.
Como em muitos falecimentos de entes queridos, não fui, por motivos de comunicação que não me chegou ao conhecimento, ao sepultamento do meu tio Carlitos, agora, jaz no Cemitério Jardim da Saudade. Deixará saudades. Se é um lugar-comum, valerá mais a sinceridade dos meus sentimentos à sua digna família.
Quando o conheci, em 1964, estava em plena forma, de sua mocidade de quarenta anos, já casado com a Gelsa, uma carioca alegre e espirituosa, que gostava e ainda gosta de estar informada sobre o que se passa no seu país e que sempre, para mim, era uma boa dona de casa inclusive com os predicados de cozinhar bem.
Calitos, era essa a minha maneira mais tarde de o tratar, sempre me recebeu bem desde quando lhe fui apresentado por um outro tio, ainda vivo, o Zequinha. Foi o tio Zequinha que me levou de Oswaldo Cruz, onde morava, subúrbio do Rio, para Piedade, também subúrbio do Rio. Em Piedade, morava o Carlitos, já casado, com um casal de filhos. Meu tio morava com o pai e a mãe de Gelsa, duas pessoas encantadoras e bem-humoradas, muito gentis, hospitaleiras. Se chamavam Hilário e Ormezinda
Carlitos veio para o Rio muito jovem , ainda adolescente. Posto tenha tido alguma ajuda de um tio o Dico, do lado materno, que era militar e se não me engano, também professor de educação física, Carlitos logo teve que se virar sozinho na cidade grande porém bem mais agradável que era o Rio de Janeiro do final dos anos trinta. Morou em vaga, conheceu a vida noturna carioca e boêmia e meio malandro daquele tempo. Morou na Av. Mem de Sá e provavelmente em outros lugares modestos do velho centro do Rio. O certo é que viveu, a seu modo e com a dificuldades de proteção maior. Ficou adulto, aprendeu a dirigir carros.
O tempo foi passando. Carlitos, finalizada a Segunda Guerra ( agosto de 1945), já tendo regressado da Itália, e na condição agora de pracinha vitorioso da FEB, nesse mesmo ano, retornou a passeio ao Piauí, reviu sua Teresina, foi até Amarante visitar parentes, inclusive minha mãe que, naquela época, lá morava. Mamãe estava grávida, esperando que o autor destes comentários viesse a este mundo, de sorte que viu apenas os meus irmãos Sonia e Winston.
Carlitos, em 1945, embarcou no porto do Rio de Janeiro em navio de guerra para a Itália. Estava-se no ano do final da Segunda Guerra Mundial..Depois de longa viagem, aportaram na Itália. Como tinha aprendido no Rio a dirigir carro, foi logo aproveitado como motorista no front italiano. Uma vez, não sei bem o motivo, numa de suas missões de conduzir militares, seu carro capotou e ele amanheceu, no dia seguinte, em um hospital. Tinha ferido seriamente a cabeça e tivera que se internar. Esta circunstância de guerra me traz à lembrança imagens do romance de Hemingway, A Farewell toArms ( 1929).
Antes do acidente, Carlitos teve também seu tempo de preparação militar a cargo, às vezes, de soldados americanos, esteve em combate, viu, nos campos da Itália, montes de gente morta, soldados alemães, italianos. Viu muita miséria, fome, mulheres que, para sobreviverem, mercadejavam o sexo.
Passou por várias cidades italianas, pelo cemitério de Pistóia,. Em Roma, grupos de destacamentos militares incumbiam-se de levar alimentos para o Vaticano, onde conheceu a Praça de São Pedro e, pessoalmente, as bênçãos do Papa Pio XII (1876-1958), o primeiro Papa romano.
Deixando os tempos da Itália, novamente no Rio de Janeiro, profissionalizou-se como motorista de linha de ônibus cortando a cidade de São Sebastião ainda competindo com a existência dos bondinhos que aos poucos foram desaparecendo como consequência do progresso e das novas necessidades do transporte urbano.
Carlitos, anos depois, foi recompensado ao benefício da pensão do Exército por ter participado como pracinha da FEB. Daí então, melhorou sua vida, teve conforto, conseguindo do Exército o direito de patente de subtenente. Foi bom que tivesse tido a experiência no front da Itália. Sua participação só lhe trouxe benefícios e amadurecimento, assim como lhe deu uma visão mais ampla da vida e da realidade em tempos difíceis. . Voltou com vida e com saúde. Conseguiu sustentar e formar sua família. Comprar, não sem dificuldades, sua casa, uma bela casa, por sinal no bairro de Sulacap. Viveu longos anos de felicidade, sobretudo a partir da sua nova condição de pensionista do Exército.
Sua velhice era simples. Estar junto da esposa, companheira de longos anos, conversar com amigos, vizinhos, jogar sinuca num barzinho, dirigir seu automóvel, fazer compras no supermercado, ler jornal, ver noticiários na tevê. Vida, assim, de um homem simples mas de muitas memórias que lhe ficaram no espírito para sempre. Não era religioso.
Gostava, sempre que lhe pedia alguma informação sobre o tempo da guerra, de me mostrar fotos envergando seu uniforme militar, cheio de vitalidade, de lugares, da Itália, de companheiros de farda, das belas mulheres italianas de então. Seu pai, meu avô materno, Avelino Alves Setúbal, morto precocemente, fora também militar do Exército. Sua fisionomia e porte lembram a aparência física de meu filho mais novo.
Como em muitos falecimentos de entes queridos, não fui, por motivos de comunicação que não me chegou ao conhecimento, ao sepultamento do meu tio Carlitos, agora, jaz no Cemitério Jardim da Saudade. Deixará saudades. Se é um lugar-comum, valerá mais a sinceridade dos meus sentimentos à sua digna família.
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