quarta-feira, 31 de julho de 2013

XVII ENCONTRO CULTURAL DE AMARANTE


O XVII ENCONTRO CULTURAL DE AMARANTE é uma das maiores festas do Estado do Piauí. Nesse encontro são valorizadas as manifestações populares locais, notadamente a riqueza do folclore amarantino em suas danças, lendas e culinária. Além disso, durante o período do evento, serão focalizadas ações públicas que visam integrar governo e sociedade. Fortalecendo o acontecimento, grupos musicais locais e de outros municípios se farão presentes, inclusive com uma banda musical de renome nacional.


A PROGRAMAÇÃO É A SEGUINTE:

DIA 02/08 – A partir das 19:00h – ABERTURA DO ENCONTRO CULTURAL
- Participações de Igrejas Evangélicas, louvores e show com a Banda Petrus uma referência da música gospel em todo território nacional
DIA 03/08 – A partir das 19:00h – Apresentações culturais de vários municípios do Piauí, incluindo Teresina.
- Noite dos Talentos – Participações de artistas de Amarante
DIA 04/08 – 08:00h – Missa na Igreja Matriz de São Gonçalo do Amarante em homenagem aos 142 anos da cidade de Amarante.
- 16:00h – Inauguração de calçamentos no “Residencial Amarante Novo”
- Inauguração da reformas empreendidas no Posto de Saúde Mamede Rodrigues
- Inauguração da Básica de Saúde “Auta Rosa” no Residencial Amarante Novo
- Recepção das autoridades: senadores, deputados, prefeitos de diversas cidades e lideranças políticas.
19:00h – Atrações culturais populares, bandas musicais
- Encerramento – Grande Show com a “Banda Musical Moleca Sem Vergonha”.

terça-feira, 30 de julho de 2013

RÉQUIEM AO INESQUECÍVEL

Neto e Zé Francisco Marques
No sítio Karajás, Elmar, Neto e Zé Francisco

Neto com amigos e familiares, no sítio Karajás


José Francisco das Chagas Marques

Se alguém pedisse para descrever o meu compadre Neto, eu usaria, sem dúvida, palavras como: honesto, prestativo, solidário, amigo... Enfim, palavras que embora tragam no bojo substanciais significados certamente não definiriam o caráter e presteza da grande figura humana por ele representada.

Conheci-o logo assim que comecei a lecionar. Aproximou-se de mim com aquele olhar paternal a um filho que se sentia perdido em mundo recém adentrado. Recebi dele as primeiras lições de como me portar na atividade letiva, como também recebi dele vasto acervo didático que trago comigo até os dias presentes. Era o irmão que me faltara até então. Tínhamos gostos semelhantes e nos nossos momentos de lazer formávamos uma “dupla sertaneja” que recebia nomes jocosos a cada encontro.

Recebi do meu amigo diversas lições que modestamente procuro por em prática. Devo a ele o significado e entendimento de algumas palavras que antes eu não tinha a dimensão e muito menos a clareza de como são importantes quando postas em prática. Ele era a própria personificação da bondade e disponibilidade, não somente para os seus familiares, como também daqueles que precisassem de seus tão bem vindos préstimos.

Vem-me à mente um flashback dos momentos maravilhosos que podemos compartilhar. Das pescarias, dos bate-papos noite adentro, das “violadas” ao pôr de sol e das inevitáveis piadas que construíamos para de certa forma “driblar” os nossos problemas cotidianos em comum. Dividimos também o lado amargo que a vida nos apresenta. Fui, por vezes, o seu aconselhador ao ouvir-lhe pedido de socorro aos problemas que a vida insistentemente nos remete. Tenho a satisfação de dizer que contribuí em muitos momentos para amenizar as “culpas” que o meu querido compadre dizia trazer consigo.

E... veio a doença fatal e impiedosa, dessa vez mais avassaladora e letal. Tentei utilizar, de todas as formas possíveis, palavras que o trouxessem de volta à realidade, que parecia ter sido substituída por um mundo de desesperança e conflitos internos gigantesco. A doença que o acometera lhe tirou o brilho do olhar, extirpou do seu ser a enorme fé que o acompanhava, e esse turbilhão de fatores negativos certamente o levaram a sucumbir da tão preciosa vida que Deus generosamente nos ofertou.

A sua energia ficara para sempre na sua querida Chácara Karajás. A brisa costumeira da noite, ondulando as vastas árvores do lugar, será canção àqueles que jamais o esquecerão. Na bonita paisagem que se afigura do local, estará sempre a sua face a reluzir. Os pássaros que recebiam dele terna proteção, habitando os frondosos galhos das árvores do lugar, entoarão para sempre a canção melodiosa da paz, em lindo e harmonioso concerto divinal.

Será difícil ultrapassar os portões da chácara e não sentir incontinente a sua presença tão substanciosa, como também difícil será não ver os seus braços abertos prontos para um abraço como só ele sabia dar. Será difícil não ver aquele sorriso terno e não ter aquelas palavras amigas e reconfortantes.

É amigo, você na vida foi o mestre da doação, do dispor e ... esqueceu-se de sua própria pessoa. Quem, além dos grandes homens da história, possuíram tais dons beneméritos? Quem, além daqueles que desconhecem do seu vocabulário a palavra egoísmo, se dispuseram a tais feitos filantrópicos?

Quando o vi pela última vez, recebi o mais forte abraço que eu recebera até então. Mas, falível que sou como humano, não pude entender que mais que um abraço, aquele gesto era um pedido de socorro ou – quem sabe? – a despedida de alguém que da vida finalmente vira o brilho de todas as cores cessarem. Não pude lhe agradecer pelo enorme bem que me fez, da pessoa que, espelhada em seus exemplos, tenta a cada dia melhorar no plano em que habitamos.

Vá em paz, meu compadre, e que Deus lhe conceda as benesses celestiais dignas de sua postura em nosso convívio.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

"Não tenho ouro nem prata, mas..."


José Maria Vasconcelos

Este MAS, inserido no enunciado da mensagem do Papa Francisco, em visita ao Brasil, exige reflexão: "Não tenho ouro nem prata, MAS vos trago Jesus Cristo." Certas autoridades que lhe apertaram a mão sentir-se-iam envergonhadas, se caíssem em si, em contrição, diante de um servo de Deus simples, despojado de vaidade e fome de poder.
Postei, no Facebook, a preciosa saudação, e desafiei: "A frase não é do Papa, mas inspirada na Bíblia. Em que livro se encontra e quem a pronunciou?" Danilo Damásio, Rafael Almendra(IFPI), Allan Ribeiro, Doroteia Linhares(Brasília), Liete Sampaio(Feira de Santana), Pastor Tiago(Recife) e Fernando Sá acertaram na mosca.
O Papa evocou belo trecho extraído dos Atos dos Apóstolos, narrado por Lucas, capítulo 3: Pedro e João dirigiram-se ao templo para orar. Encontraram um homem coxo, nas escadarias do belíssimo monumento sagrado, que lhes pediu uma esmola. Pedro, chefe dos apóstolos, respondeu: "Olha, não tenho ouro nem prata, MAS o que tenho, eu te dou: em nome de Jesus Cristo Nazareno, levanta-te e anda."
Ouro e prata, fruto proibido que alimenta o pecado insaciável da ambição a qualquer custo. Quando se alia a satanás, para subir escadarias, dando pé na bunda dos coxos e excluídos. Ouro e prata roubados dos hospitais, escolas e serviços públicos. Ouro e prata por banalização do sagrado em troca de milagres. Pelo ouro e prata, até se trai o Mestre.
Papa Francisco esquentou, quando disse:"Jesus bota fé nos jovens". Oportuno momento em que multidões clamam, nas ruas, contra o ouro e prata surrupiados pela corrupção desenfreada. Jovens sabem que certas mãos que apertam à do Papa dão bananas pra Jesus, por exclusiva ambição áurea e argêntea. O coletivo que se dane. Aliás, essa gente que comanda o país nem vai ao templo. Já viu Lula ou Dilma em culto evangélico ou missa? Querem até eliminar ensino religioso nas escolas, detonar a família, acasalar o que é par, criar o reino de Sodoma.
A riqueza, às vezes, cega e penaliza o espírito, resvala para avareza. Senhora oitentona, vestida de terceira categoria, estacionou seu velho corcel, quarentão e desgastado, frente à loja. Comentei com o balconista:"Tadinha! O carro dela se arrasta por milagre!" Que nada, tratava-se de uma dama, viúva, herdeira de imensurável fortuna amealhada por empresa próspera, durante governo de um membro da família... imóveis dentro e fora do país. Tadinha, novamente! Nem a carcaça do quarentão irá acompanhá-la para a eternidade. Pena que ela, naquela idade, desconhece a segunda oração: MAS...
Não esqueço Frei Higino, no velho seminário, durante palestra: "Ai do homem, depois dos quarenta anos, que ainda não conheceu a Deus!" E este país, há séculos, ainda não aprendeu a separar o ouro e a prata da simplicidade cristã, dos interesses coletivos acima das ambições pessoais. Só apertar a mão do sereno e abnegado servo de Deus, Francisco, é pouco, é festivo e eleitoreiro. Falta ir fundo no recado trazido à nação brasileira. Nem ouro nem prata, MAS Jesus Cristo, o amor coletivo acima de tudo, de olho nos coxos das escadarias da vida. Aí, sim, o milagre vai acontecer: "Levanta-te e anda". 

domingo, 28 de julho de 2013

Seleta Piauiense - Raimundo Alves de Lima – RAL


Inventário

Raimundo Alves de Lima – RAL (1956)

Teus olhos
cendrados
como duas lâminas na sombra.

Teus braços fincados
nos orifícios
do poema.

Como lavar o cérebro
desse povo,
dessa bandeira angustiada?

sexta-feira, 26 de julho de 2013

O POETA E O INSETO


O POETA E O INSETO

Elmar Carvalho

Uma música longínqua
e melancólica cria ressonâncias
na concha acústica de minha alma.
A bebida eu a tomo em longos goles.
Um inseto pousa sobre
a mesa e me faz companhia.
Sorve um trago da porção/poção
(derr)amada. E se embriaga.
A tristeza imensa me deixa cruel:
enxoto o pobre inseto bêbado que
ensaia um atropelado vôo. E cai.
A tristeza continua a crescer e a cair
em minha alma como infiltrações de estalactites
em (f)urna mortuária ......................................


quarta-feira, 24 de julho de 2013

Minha escola aos 50 anos


Fonseca Neto 15/07/13

Estudei a vida inteira em escola pública: o curso primário, fiz em Passagem Franca, onde nasci; depois, três anos ginasiais numa escola fundacional ligada à paróquia de Colinas, MA; em Teresina concluí o ensino médio no Liceu Piauiense; graduei-me e fiz mestrado, na Ufpi; agora o doutoramento na Ufma.

Na Passagem, depois de estudar a “carta de abc” e a “cartilha”, na escolinha Getúlio Vargas, fui para o primário na escola Clodomir Cardoso, funcionando em salões alugados. No dia 12 de julho de 1963, a cidade inaugurou o seu primeiro prédio escolar e nele criada uma nova escola, o Grupo Escolar Estado do Paraná. Fiz nela do primeiro ao quinto ano primário –com breve passagem pela escola paroquial Pio XII.

Agora completando 50 anos da inauguração “do Paraná”, as lembranças batem. Por isso escrevo. Eu fazia o 2º ano no dia da inauguração, um prédio enorme para a cidade: quatro salas de aula, boas e arejadas, piso “mosaico” (quadro negro na parede), diretoria, cantina, sentinas e um grande salão de recreio. Tempo de férias, mas todos fomos chamados à escola, pela manhã, de farda, porque haveria – como houve – distribuição de material escolar e merenda. A parte solene ficou para “gente grande”: professoras, prefeito, padre, pais. Cada sala recebeu um nome: a do 1º ano, “Raimundo Correa”; do 2º (?); 3º, “Padre Manoel Oliveira”; 4º, “Padre Vicente Britto”; 5º/diretoria, “Governador Newton Bello”; salão de recreio, “Senador Vitorino Freire”.

Lembro que, naquela manhã, recebemos das mãos das professoras e das filhas do prefeito, cadernos novos, lápis, borracha – mas o mino maior, a “máquina de fazer ponta de lápis”, só para professores... Houve mais de uma rodada de distribuição de bombons “sortidos”. Nossas carteiras novas eram muito bonitas (“cimo”), daquelas que sentavam dois estudantes em cada uma, com um engavetado para guardar os materiais, a cavidade de repousar lápis e canetas, e, ao meio, o lugar para se encaixar o tinteiro. O quintal da escola era enorme, parte dele, com laranjeiras, cajueiros, pés de ata; mas outra parte era chão recém brocado; distinguia-se um pequizeiro erado, no pátio descoberto –na época deles, da sala de aula, ouvia-se o som dos pequis caindo ao chão... A cantina, a parte menos cuidada: uma bilheira com dois potes de água fria, que logo secavam; as sentinas eram uma fábrica de brigas, confusão todo dia.

Naquela primeira metade dos anos 60, pelo “Estado do Paraná” ou nas demais escolas que por lá funcionavam, o magistério era somente de professoras; lembro das minhas: Maria da Paz Almeida, Mocinha Saraiva, Jesus Angeline, Carmelita Saraiva, Maria da Luz Lopes, Oscarina Ventura, Jacira Fernandes e Clóris Labre da Silveira Dias. Antes disso, fizera o “jardim” com dona Eurides Borges (minha primeira professora, do ABC) e dona Teresinha Moreira (a Cartilha).

A testemunhar esta história que agora tiro da cabeça, há centenas de colegas do tempo, com suas próprias memórias. Mas três pessoas são testemunhas da vida desse grupo escolar, como poucas: as vizinhas dele, dona Chiquinha do Mané Corró e dona Maria do Leó; também dona Sidona do Zé Cearense (já falecida), que desde o primeiro dia montou uma banquinha de venda de bolos e manga rosa e vivia às voltas com as professoras que não liberavam a saída de quem tinha um trocado para ir comprar –também nos davam água.

A cada dia, no início de tudo, “tia” Clóris, a diretora, fazia a formatura, regia o hino e a oração do dia. Cada dia, um hino: nacional, do Maranhão, Independência, à Bandeira e até o do Descobrimento do Brasil, que nunca mais vi cantado em lugar nenhum. Aqui e acolá aparecia alguma “autoridade constituída” para participar. O inspetor estadual era a autoridade educacional mais reverenciada – e temida – das que vinham de fora: lembro-me bem do professor Tony Macedo, perfilado, de terno.

Friozinho bom o da Passagem, era coisa ruim acordar cedo para ir à escola. Vida dura: encanto? Desconfio que a escola pública mudou.

(Dedico esta crônica aos padres Manoel e Vicente; donas Chiquinha, Maria e Sidona; a Anastácio Borges, prefeito que a inaugurou – falecido há seis dias.)

terça-feira, 23 de julho de 2013

Pablo Neruda/Isla Negra/Campeira e Frei Pedro


Pablo Neruda/Isla Negra/Campeira e Frei Pedro

José Itamar Abreu Costa

I
Neruda cantou e divulgou sua terra
Altevir Alencar, canta também a sua
William Soares, Pedro Costa na viola
Jonasalles, pintas as paisagens do longá

II
Neruda, têm sua Isla Negra
Altevir Esteves, sua Campeira
Neruda têm Valparaiso
NetoPacifico tem Frei Pedro

III
Neruda, compôs tomando vinho,
Itamar, escreve no Pernambuquinho
São Universais, divulgam seus ninhos


IV
Neruda, fala de amor, política e paz
Valmira descreve sobre seus pais
Evaldo, compra os sonhos dos demais. 

Quem são os líderes despojados?


Quem são os líderes despojados?

José Maria Vasconcelos

De tempos em tempos, surge avalanche de neologismos, às vezes, totalmente deturpados no sentido tradicional e etimológico. A década de 1960 foi pródiga em neologismos e significados exóticos (psicodélico, prafrentex, engajado, alienado, esquerda, direita, long-play, inserido no contexto, anticoncepcional, sex-appeal, brasa, mora!, tira (militar), amizade colorida, hippie). Anos 70-80, pouca invenção. Nas últimas décadas, avanços tecnológicos e a "internet"(olha aí o novo), centenas de neologismos e esquisitices verbais invadiram as comunicações. É o caso da palavra "despojado".
Descobri, em loja do centro comercial de Teresina, anúncio que dizia: "Alugamos e vendemos looks(olha o novo) de luxo despojados para noivas." E se inspirava em desfiles chiques de marcas famosas. Apaixonados por motos turbinadas e caras criaram, no Rio, a "tribo"(olha de novo o novo) dos "Despojados do Asfalto".
No programa televisivo,"Pequenas Empresas, Grandes Negócios", a empresária exibia "perucas despojadas" a preços acima de 10 mil reais, além dos serviços de "cachos despojados". E por aí vai colando o vocábulo em todo produto bom e caro.
Desidério Murcho, filósofo e escritor português, escreveu o livro, "Os Despojados", sobre utópica organização política e social em um planeta fértil e imaginário. Uma colônia de anarquistas, sem dinheiro, sem classes sociais, sem leis. Aos poucos a sociedade dos despojados começa a utilizar princípios comunistas e capitalistas. O termo "despojado", neste caso, adequa-se à terminologia.
Finalmente, qual o verdadeiro significado do termo "despojado"? Vamos ao latim clássico, "spoliare", em português vulgar, virou "esfolar", extrair as tripas. Daí, o sentido figurado, "roubar", e, em português erudito, "espoliar. Por fim, o sentido cristão de "tirar de si e oferecer", "simples", "desambicioso", "enxuto", "informal". Nos evangelhos, Jesus ensina o despojamento da vaidade, do sentar-se nos primeiros lugares, do exibir-se em prejuízo dos mais humildes e excluídos. Despojar-se da soberba nos banquetes e ceias, de exigir lava-pés da submissão. Despojar-se de avançar no cônjuge alheio. "Nisto conhecerão que sois meus discípulos."
A verdadeira liderança se conquista com o exercício do despojamento, através da generosidade, espírito público, ética, transparência. Na hora da eleição, é o candidato mais lembrado. Toda espiritualidade, especialmente cristã, ensina a se despojar do excessivo apego ao material. A comunidade agradece e venera. Louvável exemplo, Papa Francisco, conquista cristãos e não cristãos.
Políticos por aí posam de despojados, abraçando povo humilde, rezando fervorosos, comendo panelada com os pobres. Que despojamento? Esfolando o alheio e a própria consciência? Portanto, não colar a palavra em produto de fantasia comercial, em desfavor da pureza e do exercício cristão.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

SOBRE O RAL E OUTRAS COISAS

Raimundo Alves de Lima ou simplemente RAL

João Luiz do Nascimento

Grande Ral, grande amigo, grande poeta da nossa geração. Recebo a notícia de seu passamento com tristeza e resignação, afinal, como já dissera alguém, somos seres nascidos para a morte.

Um a outro, nos conhecemos ainda na segunda metade dos anos setenta, em verdade, uma das primeiras pessoas que de nossa geração que tive o prazer de conhecer. Trabalhamos juntos (eu, ele e Paulo Machado, o poeta, registre-se) na então recém-inaugurada (e hoje extinta) Livraria Corisco, que ficava na esquina da 13 de maio com a Areolino de Abreu. Éramos vendedores e atendentes, ao mesmo tempo. Foi o meu primeiro emprego e trabalhava com o que eu mais gostava (e gosto): livros. Na época, a Livraria Corisco (que ainda não tinha sido picada pelo aguilhão dos livros didáticos e produtos de papelaria) só se dedicava à literatura (ficção e poesia). Foi ali que, juntamente com o Ral, tive contato inicial com os contistas e poetas nacionais que me influenciariam, em especial quanto ao realismo fantástico e que, posteriormente, me levariam até Kafka, Júlio Cortázar, Borges, Juan Rulfo e Gabo, dentre outros. Vivíamos o "boom" da literatura. E o conto era o principal veículo daquele momento literário. Civilização Brasileira e Codecri eram as editoras mais evidentes nesse segmento. Lembro, como se fosse hoje, das palavras do Cíneas Santos, meu professor de Literatura e primeiro grande incentivador: "para escrever, basta olhar pela janela". Claro que estava querendo dizer que, vivíamos os anos de chumbo, tema havia para todos os gostos, o que não dispensava, por óbvio, o talento para escrever. Na prosa curta, Dalton Trevisan, Rubem Fonseca, J.J. Veiga, Roberto Drummond, Murilo Rubião, Domingos Pellegreni Jr, Wander Piroli, João Antônio, Luiz Vilela, Antônio Torres, Luiz Fernando Emediato, Caio Fernando de Abreu, Deonísio da Silva, dentre tantos outros, eram os nomes emergentes de nossa ficção. Tempos bons aqueles. Havia uma grande dose de romantismo em tudo, natural para um jovem de 18 anos. Talvez isso tenha contribuído para que não percebêssemos que o ovo da serpente, que mais tarde transformaria a utopia em mais uma desilusão, já cozinhava. Mas enquanto durou, o sentimento, jurado em conjunto, de que o mundo poderia vir a ser outro, nos alimentou a esperança.

O tempo, a distância e a necessidade de assumir compromissos pautados pela faticidade cuidaram de nos afastar (eu e o Ral, eu e outros tantos) e recortar nossos objetivos.

Mas, esse tempo que afasta é o mesmo que aproxima, é o que se guardou na memória rígida. E isso não há força ou alguém possa nos arrancar. 
Tempos bons aqueles, Raimundo Alves de Lima. Onde quer que esteja, fique bem, fique em paz.

Fonte: Blog do Emerson Araújo

domingo, 21 de julho de 2013

p o é t i c a



poética
ao poeta salgado maranhão

Paulo Machado (1956)

fica o ranço das metáforas,
o outono na velha aquarela.
no porto, a lembrança das velas.
fica o silêncio, o esboço do poema,
os músculos rijos à espera do agora.
fica a certeza de caminhar
em linha reta,
não fugir nunca.
remar contra a corrente, lutar
sem temer os golpes sujos dos que rastejam,
cães roendo os ossos da omissão.
fica a ânsia, o sangue queimando nas veias
até o último momento.
fica um princípio:
não temos o direito de trair a poesia,
crucificá-la numa sexta-feira de passivismo.
jamais expô-la como símbolo
de uma vanguarda precoce, medrosa.
a poesia é torpedo-suicida,
não podemos camuflá-la de bailarina persa.
a escuridão dos calabouços,
as câmaras de tortura,
nada fará calar os poetas.
a poesia sobreviverá às bombas de gás, ao tédio.
ressurgirá das cinzas no vôo dos pássaros.
(à tardinha os homens imitam os pássaros, ingenuamente)
sonhemos: com o verde da tardia esperança,
o branco da paz inaudita. 

sábado, 20 de julho de 2013

Saudação ao novo escritor barrense


Senhores e senhoras,

Ao reler Estórias de minha gente, de Constâncio Furtado Rêgo, a fim de que pudesse fazer um retrato fiel de sua proposta literária, vi-me convidado a recuperar leituras da sociologia do conhecimento e da estilista. Fundamentado nessas áreas, comentaria os valores e costumes que o autor descreve e a estilização da linguagem oral própria de seu texto. Desisti dessa intenção inicial, para fornecer uma visão mais geral do texto, sem, entretanto, contar nenhuma das tramas elaboradas pelo autor. Desisti de uma leitura acadêmica, a fim de me aproximar mais de cada futuro leitor aqui presente.
Sejamos simples – o livro que ora chega às suas mãos tematiza especialmente a humildade, em quase que praticamente todos os contos. De Cristo – símbolo máximo dos humildes, até nós, esse traço do caráter tem se revelado, inclusive, como um poderoso elemento de transformações. Sejamos simples. Aquilo que mais toca a percepção tem um quê de simplicidade. O livro Estórias de Minha Gente, de evidente qualidade literária e gráfica, conforme verão ao apreciarem seus contos, consiste num atestado de exaltação à simplicidade – a exaltação da natureza camponesa em todas as suas dimensões.
Senhores e senhoras,
Envoltos pela mais profunda e sincera satisfação, Nova Aliança, de Leonardo Dias, e Entretextos, de minha propriedade, fazem-se aqui presentes por intermédio de minha pessoa, para o lançamento de Estórias de minha gente, de Constâncio Furtado Rêgo, o primeiro livro editado, entre vários que o escritor mantém inéditos. São vários motivos de nossa alegria, mas eu destacaria:
a)Trata-se a obra de um livro escrito por um conterrâneo de talento.Homem sensível, que sabe interpretar o seu tempo, com a grandeza peculiar ao verdadeiro homem de letras. Embora viva no campo, isso não tirou do autor o ânimo pra escrever; pelo contrário, dessa condição e das lides da terra, retirou a seiva para a produção de sua literatura. Nossa satisfação vai muito além de se tratar o livro de fruto da lavra de um conterrâneo de talento: é um livro escrito com o gosto da terra onde o escritor nasceu; com o afeto, as dores e as esperanças de sua gente; as dores e esperanças dos mais humildes. Isso já seria razão suficiente para comemorar esse feito, principalmente, porque esse tipo de acontecimento não vigora corriqueiramente nas práticas de sociabilidades nas pequenas cidades do Piauí, por enquanto, dadas as carências sociais e econômicas que vicejam entre nós.
b)Trata-se Estórias de Minha gente, da estreia da Nova Aliança, do livreiro editor Leonardo Dias e Entretextos, portal que criei há dez anos com o fim de divulgar literatura, na edição de livros cujo teor é a literatura de tradição oral, segmento da letras de irrefutável valor, e ainda não devidamente explorado pelo mercado editorial do Piauí. Nova Aliança e Entretextos promovem atualmente, em parcerias solidamente alicerçadas no princípio da ética e da qualidade do que edita, a maior revolução experimentada pelo mercado editorial piauiense, segundo os que acompanham atentamente a cena cultural do Estado. Sem amparo público, mesmo para a aquisição de livros, editamos no curto intervalo de dois anos e meio 37 livros de qualidade gráfica e de conteúdo. Isso mesmo: Estórias de minha gente é o 37 livro editado pela parceria Nova Aliança/Entretextos e inaugura linha de livros calcada na tradição da literatura oral, a ser explorada em novas obras.
Senhores e senhoras,
Não posso deixar de recorrer à teoria literária, embora tangenciamente, para explicar Estórias de minha gente, de Constâncio Furtado Rêgo. Minha missão nesta manhã é exatamente justificar o valor desta obra, já que não se trata de nenhum capricho autoral, mas de livro de inquestionável qualidade. Espero – vou enfatizar - por essa razão, não lhes aborrecer com as rápidas notas teóricas.
Estórias de minha gente se insere no rol das obras que reforçam a tradição da literatura oral. De Homero à era digital, seu valor tem se reafirmado incontestavelmente. As tecnologias modernas, que aparentemente poderiam representar a essa forma literária uma ameaça, acabaram também por contribuírem para reforçar-lhes o seu lugar de excelência como receptáculo do patrimônio cultural de comunidades rurais ou de pequenos lugarejos, fortemente influenciados pelo modo de vida da roça. As tecnologias modernas, embora modifiquem severamente o modo de vida campestre, também auxiliam a literatura oral na conservação e difusão de antigos valores e costumes de pequenas comunidades, os quais, por meio desse gênero, paradoxalmente, vencem o tempo e as barreiras geográficas e reforçam, até, o registro das formas de constituição da linguagem de grupos sociais específicos.
Historicamente, contos como os de Estórias de minha gente contribuem não apenas para documentar o aqui e agora de povos e regiões, mas também, acentuadamente, por meio da aparente simplicidade da escritura, que é uma marca linguística elogiável dessa vertente literária, subverter a voz do narrador, para expressar uma visão de mundo que é coletiva. Em estórias de minha gente, pois, os narradores englobam discursos anônimos, frutos do contar e recontar próprios da tradição oral. Assim, em Zequinha Piaba, Neco, Bena, Dr. Virgílio, Gerardo, Bernardo Moura e dezenas e dezenas de personagens, muitos deles sem nome, a fim de lhe revigorar a aparente fragilidade ou poder, ou mesmo por questão de conveniência, está a voz coletiva dos trabalhadores rurais ou dos senhores de terra; a voz dos oprimidos ou dos opressores, uma voz que a literatura em uma de suas funções magistrais recompõe tão habilmente, facilitando o alcance imediato da comunicação. Os contos que escreve Constâncio chegam fáceis ao leitor, preso pela sintaxe e pelo vocabulário bem piauienses, preso por estórias que o autor ouviu e recontou, supostamente ocorridas em dado tempo e no lugar social de que fala, o município de Barras do Marathaoan. Estórias recriadas com humor, indignação, surpresa e, até mesmo, para despertar alguma função moral.
Constâncio Furtado Rêgo, sobrinho do poeta Pedro Alves Furtado, que publicou obra de versos telúricos de exaltação a Barras do Marathaoan, infelizmente esquecido ou ignorado pelas gerações adultas, e absolutamente desconhecido pelos mais jovens, revela uma vocação que endossa, pelo estilo de literatura que produz, as tradições da cidade natal. Nesse quesito, o gênero que cultiva enseja o bairrismo bem característico dos barrenses, que se excedem, ingênua ou conscientemente, como poucos piauienses, em louvar as belezas naturais, a paisagem e mesmo a história antiga do lugar em que nasceram. Na literatura produzida por barrenses, narrativas com essa feição foram habilmente produzidas também pelo folclorista Bilé Carvalho, de saudosa memória, e pelo historiador e cronista Antenor Rêgo Filho; este, autor de obra ímpar no gênero, o consagrado livro “Jacurutu”.
Constâncio Furtado Rego, sobrinho ainda de Judith Furtado, escritora igualmente absorta na elevação da paisagem de sua terra-berço, Barras do Marathaoan, diferentemente de seus familiares escritores, foge do romantismo para tocar nas feridas da condição humana, produzindo – com propósito e projeto literário claro e consciente - contos de feição popular, assinalados por tom de denúncia social. Em seus contos, os leitores se esbarrarão com a perplexidade das injustiças sociais e da desigualdade, com a surpreendente capacidade de comunicação espontânea do camponês, com a inesperada reação resignada do homem da roça, enfim, com o jeito de ser e viver dos que, verdadeiramente, pela sua força produtiva foram quase que exclusivamente o motor principal da economia das comunidades piauienses até bem pouco tempo.
Senhores e senhoras,
É por meio dos livros que a memória dos homens e a cultura se constituem e se mantêm. Somos seres efêmeros e logo seremos substituídos por outras gerações e hábitos; às vezes, até a paisagem ou a arquitetura em que vivemos - onde há um menor grau de consciência sobre o patrimônio imaterial - são severamente modificados para atender as pressões do capital ou as vaidades, ou os mecanismos de controle social.
Estórias de minha gente é livro importante para Barras e aos barrenses, porque guarda um tempo que vai gradativamente sendo consumido pela globalização e pelas consequentes mudanças na vida rural. Livro que nos prende tanto pelos dramas dos personagens, como pela ambientação em que transcorrem as narrativas. Assim, o leitor se absorve diante de passagens como estas, em que se descreve, respectivamente, a cobertura habitual das antigas casas dos moradores da zona rural ou Barras à luz da usina elétrica:
A casa era coberta de palha de palmeira, coisa que para ele não era difícil conseguir, pois morava no meio do cocal. As madeiras da construção eram adquiridas nas imediações da localidade, às vezes até mesmo na própria roça. Tudo era muito rústico e simples, coisa de gente pobre”, (p.108) .
A luz fraca iluminava as rodas formadas nas calçadas das mais conceituadas famílias de Barras. Ali, o assunto predominante era a política. A construção da nova Capital Federal no Planalto Central do Brasil, incrustada no estado de Goiás, concentrava parte da conversa, que acabava sempre convergindo para a política local ou estadual.
Na velha cidade, apenas algumas ruas tinham calçamento: a maioria era empoeirada no verão e enlameada durante o inverno. Nalgumas delas, a água escorria entre as fileiras de casas, misturando-se com a piçarra encarnada, formando uma tintura escarlate na maior parte do período chuvoso (...)
Naquela época, a energia elétrica que iluminava o centro urbano era fornecida por uma velha usina abastecida à lenha, pertencente ao poder público municipal, usina que funcionava das dezoito às vinte e uma horas. Quinze minutos antes de se apagar as lâmpadas, ouvia-se uma buzina que tinha o objetivo de avisar a população que estivesse fora de casa, a fim de programar o retorno aos lares, antes que a energia elétrica fosse desligada”, (p.118).
Mais poderia dizer, porém, para não cansá-los, fico por aqui, na certeza e na satisfação de que vocês levam para casa, ao adquirirem Estórias de minha gente, de Constâncio Furtado Rêgo, um pedaço de vocês em forma de palavra, um pedaço de Barras. Cada um de vocês não sairá desta leitura sem rir e chorar, aplaudir e lamentar, mas principalmente sem reviver um tempo que é o de sempre – o tempo do sonho e das descobertas. É um livro para aqueles, como nós, que vivem a essência do que há de bom nesta cidade. Um livro para os que amam esta cidade; livro para guardar no coração
Muito obrigado pela atenção.
Dílson Lages Monteiro
Fonte: Portal Entretextos
Barras, 14.07.2013

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Discurso de recepção ao Acadêmico Homero Ferreira Castelo Branco Neto


Reginaldo Miranda
Presidente da Academia Piauiense de Letras

Discurso de recepção ao Acadêmico Homero Ferreira Castelo Branco Neto, na Cadeira 31 da Academia Piauiense de Letras, proferido pelo acadêmico Reginaldo Miranda, atual presidente da Academia Piauiense de Letras, em 20 de junho de 2013, às vinte horas, no Auditório da OAB/PI. 

I. IMORTALIDADE ACADÊMICA
Segundo Heródoto – considerado o pai da História, o numeroso exército persa possuía uma tropa de infantaria pesada composta por dez mil homens, que avançava à frente, nos combates. Essa formação era permanente, de forma que durante as batalhas, cada membro morto ou gravemente ferido era imediatamente recolhido pelos companheiros e substituído por outro, entre os que estavam na retaguarda. Então, essa tropa de elite sempre avançava em combate com o mesmo número inicial. Dessa forma, se morresse um combatente era substituído por outro combatente; se morressem dois combatentes eram esses substituídos por outros dois combatentes, e assim, sucessivamente, de forma que a infantaria persa nunca tinha mais, nem menos de dez mil integrantes. Daí ganharam a fama de imortais, ou imorredouros, na tradução literal do grego, porque o inimigo tinha a sensação de que realmente o eram, vez que nunca diminuíam.
Assim, também, são as academias de letras. Fundadas no modelo francês têm a formação permanente de quarenta membros. E toda vez que falece um, sua vaga é preenchida por outro. Dessa forma, nunca aumentam nem diminuem. Pelas mesmas razões da infantaria persa, também seus membros são cognominados de imortais. Imortais na permanente composição da casa, na lembrança dos pósteros e na perenidade da obra, é o que se deseja.
A imortalidade foi sempre objeto de fascínio do homem, desde o começo dos tempos, constituindo-se num dos mais profundos desejos humanos. No fabrico do elixir da longa vida se bateram os mais antigos e ousados alquimistas do passado. Na busca pela fonte da juventude os homens foram capazes de lutas sangrentas e de proezas mirabolantes. Tudo em vão, pois já trazemos ao nascer a certeza da morte: morte física, biológica.
Dizia com ironia o argentino Jorge Luís Borges: “Todos os caminhos levam à morte. Perca-se”.
Para o velho bardo Manuel Bandeira: “Duas vezes se morre: primeiro na carne, depois no nome”.
Os mais conscientes dessa condição humana, conformaram-se com a entrega do corpo à terra e  foram buscar a imortalidade da alma. Daí nasceram as religiões, pregando a vida eterna depois dessa passagem terrena.
A imortalidade acadêmica tem sentido diverso. Quando se diz que os acadêmicos são imortais, evidentemente, não se está dizendo que são imorríveis ou imorredouros, o que seria até interessante. Mas que possuem vitaliciedade e que serão lembrados para sempre, na forma regimental, pelos futuros ocupantes de sua cadeira; que tiveram o reconhecimento público de sua obra pelos contemporâneos e que terão as suas efemérides lembradas pelos demais acadêmicos; enfim, que foram pessoas úteis à sua comunidade e cujos nomes merecem ser lembrado pelos pósteros.

II. AS ACADEMIAS
Mas para que servem as academias? Essa é uma indagação que, vez ou outra se ouve. Existem aqueles que são acadêmicos até demais e, às vezes, se tornam inconvenientes, se insinuando em vaga inexistente. Outros, que de tão antiacadêmicos, vivem desfazendo das academias.
Na verdade, o fato de ser acadêmico não faz ninguém escrever melhor. Todavia, entre o critério de escolha dos novos acadêmicos está o de se eleger aqueles que bem escrevem. E em assim sendo, as academias são em si um conjunto de intelectuais que prezam a arte do bem escrever. Na verdade, se as academias não tivessem outra utilidade, justificaria a sua existência a reunião de escritores e a troca de informações. É um ambiente propício à discussão intelectual e geração de ideias, à divulgação das letras e ao desenvolvimento da literatura e da historiografia.

III. A APL
A nossa academia, fundada há quase um século, tem primado pelo cultivo do idioma pátrio e pelo desenvolvimento da literatura piauiense. Fundada por uma geração brilhante, cujo pensamento intelectual plasmado na Escola do Recife, foi alimentado pelo idealismo positivista de Augusto Comte(1798 – 1857), pela pregação agnóstica e pelo cientificismo positivista de Haeckel(1834 – 1919) e Spencer(1820 – 1903). Foram líderes dessa geração, entre outros, Anísio de Abreu, grande tribuno parlamentar, Abdias Neves, Clodoaldo Freitas e Higino Cunha: o primeiro faleceu antes da fundação da Academia, sendo eleito patrono de uma Cadeira, e o segundo não está entre os dez fundadores porque se encontrava no Rio de Janeiro, no exercício do mandato de senador da República, mas aderiu à mesma imediatamente, tomando posse na Cadeira 11.
Durante todos esses anos a academia nunca se afastou dos ideais de seus fundadores, pugnando diuturnamente pelo desenvolvimento da literatura e da historiografia piauiense. Nenhum grande projeto intelectual, projeto de qualidade, foi desenvolvido no Piauí, sem a participação efetiva da Academia Piauiense de Letras. Se voltarmos as vistas para o passado e verificarmos a fundação da velha Faculdade de Direito do Piauí, da Faculdade de Filosofia, de Odontologia, de Medicina e, mesmo da Universidade Federal do Piauí, vamos ver a participação efetiva de muitos acadêmicos.
Na produção literária piauiense, mercê da carência de recursos financeiros, a Academia foi sempre estrela de primeira grandeza, para isso contando com importantes parceiros, que os concitou a grandes empreendimentos. Com o Governo do Estado editou importantes obras; o mesmo ocorreu, em épocas diversas, com o Município de Teresina, com o Senado Federal, com a Universidade Federal do Piauí, com o Banco do Brasil e com o Banco do Nordeste, para lembrar apenas as parcerias mais expressivas.
É importante ressaltar o memorável Plano Editorial do Piauí, que notabilizou o primeiro governo de Alberto Silva, no início da década de setenta, promovendo o resgate de importantes obras e divulgando outras novas. Foram 37 publicações, numa época em que era difícil publicar um livro. Pois, à frente desse grande empreendimento literário brilharam os nomes de Arimatéa Tito Filho, estimado e saudoso presidente da Casa de Lucídio Freitas; de Deoclécio Dantas e Armando Madeira Basto, mais tarde e em homenagem à sua determinação nesse empreendimento, também fizeram-se membros, ao lado do próprio governador Alberto Silva, de nossa agremiação literária.
Outro grande momento literário, um como sucedâneo do outro, representando, ambos, em seu conjunto, uma verdadeira revolução intelectual no Piauí, foi o Projeto Petrônio Portella, no início da década de oitenta, no governo Hugo Napoleão. Mais uma vez brilhou a estrela de Arimatéa Tito Filho, ao lado do secretário de cultura Jesualdo Cavalcanti, que o concebeu, do médico Clidenor Freitas Santos, do professor Benjamim do Rego Monteiro Neto e do governador Hugo Napoleão, todos integrantes da Casa de Lucídio Freitas. Portanto, esses nomes devem ser guardados pelo povo do Piauí.
A Academia mantém, desde sua fundação, a sua revista literária, já na 70ª edição. Desde que assumimos a direção do Sodalício demos especial atenção à atualização dessa revista, já tendo publicado sete edições e encontrando-se com mais duas em fase de preparo, para fechar esse ciclo com a edição relativa ao corrente ano, de forma que publicaremos dez edições, atualizando, assim, essa importante revista literária piauiense.
Recentemente, em parceria com o Governo do Estado, a Academia deu à estampa a Coleção “Grandes Textos”, divulgando nove importantes obras de cunho histórico e literário. Publicou algumas obras avulsas e deu início a uma importante coleção literária. Trata-se da Coleção “Centenário”, visando comemorar o primeiro século de fundação da Academia. Foram publicados os três primeiros números, dois em convênio com o Senado Federal e um com a Universidade Federal do Piauí. Dando prosseguimento a essa iniciativa, mais seis obras literárias se encontram no prelo, duas em preparo e doze foram, recentemente, aprovadas pelo Conselho do Sistema de Incentivo Estadual à Cultura(SIEC). É nossa intenção que esse seja o maior empreendimento literário do Estado do Piauí, superando os dois anteriores, com a edição de mais de sessenta obras que forem julgadas importantes para a compreensão da realidade piauiense. Será o ponto culminante dos festejos com que a intelectualidade piauiense comemorará o centenário de fundação da Academia. Para isso desejamos contar com o apoio das instituições públicas e da iniciativa privada.

IV. OS CASTELO BRANCO
Na Academia, para o bom êxito deste trabalho teremos de contar com o apoio e a colaboração de todos os acadêmicos. Nesse aspecto, a eleição de Homero Ferreira Castelo Branco Neto é um alento, pois se trata de um escritor admirável e um intelectual engajado e muito determinado em seus afazeres. Homero costuma dar tudo de si em cada coisa que faz, por mais que pareçam pequenas. Nesse aspecto segue à risca a lição do bardo Fernando Pessoa:
Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa.
Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive”.
Aliás, eu não diria que Homero chega tarde, mas chega na hora certa. “Tudo neste mundo tem seu tempo; cada coisa tem sua ocasião”. Está no Eclesiastes(31-8). Para Homero ainda é tempo de plantar, de construir, de se alegrar, de abraçar e de amar. A sua eleição foi consagradora, por unanimidade, dizendo, assim, a Casa, da satisfação em recebê-lo.
Meu caro Homero, esta Casa é vossa, seus familiares ajudaram a construí-la. A família Castelo Branco tem profunda ligação com a assim cognominada “Casa de Lucídio Freitas”, ele próprio aparentado aos Castelo Branco. A sua família deu uma enorme contribuição à literatura piauiense.
Foram patronos de cadeiras na Academia Piauiense de Letras: Hermínio de Carvalho Castelo Branco(2), Joaquim Sampaio Castelo Branco(3), Teodoro de Carvalho e Silva Castelo Branco(6), Antônio Borges Leal Castelo Branco(15), Miguel de Souza Borges Leal Castelo Branco(22), Simplício Coelho de Resende(26) e Heitor Castelo Branco(37). A grande ausência foi Leonardo de Nossa Senhora das Dores Castelo Branco, autor deO ímpio confundido(1837) e A criação universal(1836).
Tiveram ou têm assento nas diversas cadeiras da Academia: Fenelon Ferreira Castelo Branco, um dos fundadores(3), Cristino Castelo Branco(15), Carlos Castelo Branco(15), Renato Pires Castelo Branco(19), Emília Castelo Branco de Carvalho(37), Emília Leite Castelo Branco(37), e na atualidade, Maria Nerina Pessoa Castelo Branco(35) e Heitor Castelo Branco Filho(37), para mencionar apenas aqueles que trazem consigo o nome da família.
A Academia ainda abrigou ou abriga outros descendentes de Dom Francisco da Cunha Castelo Branco, tais como: João Pinheiro(2), Breno Pinheiro(8), Celso Pinheiro(10), Celso Pinheiro Filho(8), Benedito Martins Napoleão do Rego(11), Aluízio Napoleão de Freitas Rego(11), Benjamin do Rego Monteiro Neto(15), Jacob Manoel Gayoso e Almendra(20), Gerardo Majela Fortes Vasconcelos(22), José de Arimatéa Tito(29), José de Arimatéa Tito Filho(22), Hugo Napoleão do Rêgo Neto (9), Alcenor Rodrigues Candeira Filho (19), Magno Pires Alves Filho(26) e Afonso Ligório Pires de Carvalho(29), para citar apenas os descendentes em linha direta.
Portanto, meu caro Homero, a sua família é quase dona da Casa de Lucídio Freitas. E isto ocorreu porque sempre prezaram o estudo e cultivaram as boas letras.

V. O NOVO ACADÊMICO
V.a. NASCIMENTO
O novel acadêmico Homero Ferreira Castelo Branco Neto, entrou pela vida na cidade de Amarante, barrancas do Parnaíba, terra de grandes paladinos, entre os quais Da Costa e Silva e Odilon Nunes, ilustrados membros de nossa Casa. Foram seus pais, dona Hosana Pontes Castelo Branco e Herbert de Marathaoan Castelo Branco, que ali exercia o cargo de promotor de Justiça, depois sendo juiz de Direito e desembargador do Tribunal de Justiça do Ceará. Sobre essa época, mais tarde se reportaria o velho pai:
Foi justamente em Amarante, este recanto admirável do Piauí, encravado na confluência dos rios Parnaíba e Canindé, que veio ao mundo, no ano de 1943, meu filho Homero” (Mensagem ao povo de Amarante, 1978).
V.b. FORMAÇÃO
Cedo, porém, Homero deixa a bucólica cidade de Amarante, do “velho monge”, atravessa a Serra da Ibiapaba, das missões jesuíticas, e depois de breve período no interior cearense, vai ter-se na “capital alencarina”, defronte aos verdes mares bravios. Ali cursa, com êxito, as diversas séries dos ensinos Ginasial e Médio, para ingressar no Curso de Economia da Faculdade de Ciências Econômicas e Contábeis da Universidade Federal do Ceará, onde se forma no ano de 1967. Desejando aprimorar os conhecimentos, fez especializações em Monterrey, no México e em Atlanta, nos Estados Unidos da América.
V.c. VIDA PROFISSIONAL
Então, a convite do Prof. Raimundo Nonato Monteiro de Santana, ilustre membro de nossa Casa, regressa ao Piauí, fixando-se na cidade de Teresina, onde se emprega na extinta CODESE(Coordenação de Desenvolvimento Econômico do Piauí), instituição que antecedeu a Fundação Centro de Pesquisas Econômicas e Sociais do Piauí (CEPRO) e como professor no Liceu Industrial e na Escola Técnica “Leão XIII”. Ainda no campo profissional, exerceu os cargos de diretor do Departamento de Assistência aos Municípios, secretário de Planejamento do Município de Teresina, onde também, por breve período, exerceu o cargo de Prefeito Municipal; em nível estadual, exerceu ainda os de subsecretário de Planejamento, secretário de Administração, de Fazenda e do Trabalho e Ação social.
V.d. FAMÍLIA
Homero Ferreira Castelo Branco Neto é casado com dona Hilma Martins Castelo Branco, de tradicional família sul-piauiense, com quem tem três filhos: Geraldo (administrador), Verônica(contadora) e Hosana Karinne(médica); o casal tem, também, três netos: Stelios, Stella Hilma e Nícolas.
V.e. O POLITICO
Com vocação política, Homero Castelo Branco ingressou no movimento estudantil ao tempo dos estudos no Ceará, sendo eleito e assumindo os cargos de presidente do Diretório Acadêmico “Nogueira de Paula”, da Faculdade de Ciências Econômicas, e presidente do Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal do Ceará(DCE/UFCE).
Portanto, com essa imensa vontade de servir, não tardaria a ingressar na política partidária. Disputou seu primeiro mandato de deputado estadual no pleito travado em 1974, integrando a Assembleia Legislativa do Piauí, onde permanece, com breves interregnos, até fevereiro de 2007. Político ativo e irrequieto, durante esses sucessivos mandatos parlamentares, ocupou os cargos de vice-presidente e secretário da mesa diretora, presidente de comissão técnica e relator de várias matérias de interesse do Estado, além de cofundador de partido político e líder de bancada(PFL).
Homero Castelo Branco colocou sempre seus mandatos a serviço do povo, pugnando pelas grandes causas. Por essa razão, teve o reconhecimento popular, consubstanciado nas sucessivas reeleições, e das diversas organizações e instituições estaduais, nacionais e até internacionais. A cidadania honorária lhe foi outorgada pelo povo, através de seus representantes, em 36 municípios piauienses e em Monterrey, no México. Foi condecorado em Nova Leon, no México, e em Amarante, cidade homônima e patrona de sua terra natal, em Portugal.
E o reconhecimento público não pára por aí. Tem as seguintes medalhas: do Mérito Legislativo, outorgada pela Assembleia Legislativa do Piauí; do Mérito Municipalista, pela Associação Piauiense de Municípios; de Honra ao Mérito “Heróis do Jenipapo”, pela municipalidade de Campo Maior; do Mérito “Conselheiro José Antônio Saraiva”, pela Prefeitura Municipal de Teresina; do Mérito Legislativo, pela Câmara Municipal de Teresina; além de várias outras condecorações outorgadas por instituições culturais e lojas maçônicas, todas em forma de reconhecimento ao seu trabalho em benefício das comunidades e das instituições que representou.
E toda essa atividade política, meu caro Homero? “Valeu a pena?”.
..................? Tudo vale a pena
              Se a alma não é pequena” – responde Fernando Pessoa, acrescentando:
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor”.
Ouçamos o experiente Homero Castelo Branco, político tarimbado, que foi muito além do Bojador:
Cedo me deixei dominar pela mais exigente e absorvedora das amantes que o homem pode portar: a política. (...).
A política tenho como dona de minha cabeça. Chegou como festa – paixão e como paixão sempre recomeço. (...).
Hoje ando devagar. Tive pressa. Chorei demais por tantas topadas. Mas a política continua-me seduzindo, apesar de ter a certeza de que muito pouco sei dessa divindade. Ela é muito sedutora e nunca a esquecerei. Digo e ela não acredita. É minha amada e amante de todos. Ela é bonita demais. Aprendi a amá-la. Agora pressinto que vai abandonando-me. Meu Deus, logo agora! Ela é parte de minha vida, de minha alma, de meus nervos e de meu sangue!” (CASTELO BRANCO, Homero. Sentimentos embalsamados. Teresina: Gráfica do Povo, 2013. p.43/44).
Portanto, valeu a pena.
V.f. O INTELECTUAL
Mas o que justifica a eleição consagradora de Homero Ferreira Castelo Branco Neto, para a Academia Piauiense de Letras? Sem sombra de dúvidas, é a sua intensa atividade intelectual. De fato, a sua atuação parlamentar esteve também a serviço da cultura. Concomitante à militância política andou publicando alguns trabalhos interessantes, o que se intensificou depois dos mandatos parlamentares. Podemos dizer assim, que o Piauí perdeu um parlamentar atuante e ganhou um escritor produtivo. Em face dessa intensa produção intelectual, pertence ao Instituto Histórico e Geográfico do Piauí e a quatro academias regionais.    
Homero Castelo Branco é autor das seguintes obras: Histórias do velho Homero, onde relembra a personalidade de seu avô paterno; Auta Rosa, resgatando uma personagem mítica de Amarante, a sempre lembrada terra natal, cujo laço nunca se quebrou; Padre Marcos, estudo biográfico, o melhor que até aqui se produziu, sobre um dos principias personagens do Piauí na primeira metade do século XIX, o famoso Padre Marcos de Araújo Costa, da Boa Esperança, religioso exemplar e um educador de grandes méritos; e, Alcides – o primeiro filósofo e o último coronel de Barras,tomando por tema o político barrense Alcides do Rego Lages; com saborosas crônicas e uma pitada de humor, traça um painel da cidade de Barras, sua história, suas contendas políticas, enfim, é Barras que surge, além de trazer à baila o fazer político sertanejo.
A divulgação de suas ideias, a análise da conjuntura política, as teses defendidas nos palanques populares e na tribuna parlamentar, ele as resumiu em: Temas de uma intensa vida parlamentar; Planejamento familiar e aborto: uma discussão sem hipocrisia; 100 dias sem rumo; Agente do desenvolvimento; João Paulo II; Do Planalto a Guaribas; Voz do ontem; Grandes civilizações americanas; 2004 – do sonho ao pesadelo; Acredito; Conversas soltas ao vento; Amor & outros males; Anjo ou demônio; Prevenção da cegueira; Ventos imprevisíveis; e, Quando a porca torce o rabo, este último um conjunto de saborosas crônicas
De sua vasta obra desejamos destacar: Sentimentos embalsamados e Ecos de Amarante.
O primeiro é também o mais recente livro do novo acadêmico: Sentimentos embalsamados. Lançado em abril, em comemoração aos seus setenta anos de vida, é um livro que veio para ficar, porque o autor desnudou a sua alma, falando francamente sobre suas forças e suas fraquezas. São livros como esse que ficam, porque acrescentam ao leitor, conforme as mostras delineadas nessa fala. Alguns escrevem memórias, mas poucas, porém, ficam porque a maioria dos escritores esconde os sentimentos, o que não foi o caso de Homero. Sua franqueza e estilo lembram asMemórias, de Humberto de Campos; Minha formação, de Joaquim Nabuco; ou, Confiteor, de Paulo Setúbal. Modesto, Homero Castelo Branco nega ter pretensões literárias, chegando mesmo a afirmar não ser escritor, no que não concordamos. Sentimentos embalsamados é mais do que o desnudamento de uma alma, do que a história viva e empolgante de uma pessoa, resgatando a própria história de uma geração, as impressões de um povo, o drama da alma humana. Homero Castelo Branco é um piauiense genuíno, que ama a sua terra com intensidade, daí os seus sentimentos serem os sentimentos de todos os piauienses. É, também, um observador perspicaz e abalizado protagonista da cena política, razão pela qual suas observações servem de suporte para os historiadores da época contemporânea. Enfim, com olhar percuciente penetra fundo na alma humana, fazendo de suas conclusões um suporte seguro a todas as pessoas inteligentes.

Ecos de Amarante é um belo livro sobre sua cidade e os personagens que a fizeram. É a história romanceada de Amarante, recheada de personagens fictícios e reais, onde a principal protagonista é a própria cidade. De suas páginas pululam políticos, coronéis, fazendeiros, comerciantes, gente simples, pessoas do povo, numa trama entremeada de ficção e realidade, onde vão aparecendo a paisagem local, as ruas, os becos, as praças, os morros, os rios, as fazendas, os sítios, o modo de falar, de ser, as estórias e as histórias do lugar; o resgate dos costumes, das lendas, das cantorias, das modinhas, da dança, das rezas, das “incelenças”, das festas juninas, do folclore, enfim, de personagens esquecidos e da vida política, econômica e social da cidade. O livro traz um vasto painel da Amarante antiga. Aliás, Homero e Amarante sempre protagonizaram uma história de amor. Nas inúmeras campanhas políticas o povo daquela cidade viu nele um intérprete de seus sentimentos e a transformaram em sua base eleitoral.
Juscelino Kubitschek, ex-presidente da República, anotou em um livro de memórias, Meu caminho para Brasília, que nos momentos mais difíceis, quando muitas eram as provações, retornava à sua Diamantina natal e ali, no reencontro com as suas origens, recobrava as energias e retornava mais forte à arena de luta. Parece-me que Homero Castelo Branco pode dizer a mesma coisa com relação à sua Amarante. Pode até cantar com o conterrâneo ilustre, Da Costa e Silva:
A minha terra é um céu, se há um céu sobre a Terra:
É um céu sob outro céu, tão límpido e tão brando,
Que eterno sonho azul parece estar sonhando
Sobre o vale natal, que o seio à luz descerra.”
Ou pode dizer com Fernando Pessoa:

“Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver do Universo...
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer,
Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não do tamanho da minha altura... “.

Ele mesmo mesmo diz:
Viajei por muitos países. Conheço uma dúzia de mar. (...).
Vi gruta, nevoeiro, vi tanta coisa bela e doida neste mundo incerto, mas nunca sai de meu coração, Amarante, meu berço, este pedaço de terra no Piauí, feito de esperança, que guarda história, lenda e cantiga. Cidade feita de azul que não desbota, cidade de todos os amantes, de todos os poetas, que ouve queixa e não conta as suas. Que ouve cantiga, viola, prece, desejo e voto. Cidade que festeja iemanjá” (CASTELO BRANCO, Homero. Sentimentos embalsamados. Teresina: Gráfica do Povo, 2013. P.36).
Assim é o amor de Homero por sua Amarante.
Com essas observações, não temos dúvida em afirmar que Homero Ferreira Castelo Branco Neto é um bom escritor, de linguagem simples, concisa, precisa, elegante.
É, também, um conversador admirável, lhano de trato, um gentleman.
Por esses relevos de personalidade, é uma boa aquisição que faz a Casa de Lucídio Freitas. E com muita honra é que o recebo nesta solenidade.
Sede, pois, bem vindo Senhor Homero Castelo Branco, à nossa casa. Ela agora também é vossa.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

ERROS FUTEBOLÍSTICOS OU EM DEFESA DE MIM MESMO


17 de julho   Diário Incontínuo

ERROS FUTEBOLÍSTICOS OU EM DEFESA DE MIM MESMO

Elmar Carvalho

Vindo passar uns dias de minhas férias em Parnaíba, tomo conhecimento de que eu teria cometido erros graves em meu trabalho Craques do Futebol Parnaibano. Irei aqui fazer um mea culpa, em que tentarei justificar ou mesmo fazer a expiação de meus supostos ou verdadeiros equívocos.

Quando o escrevi, no começo deste século XXI, fiz questão de enfatizar que me fundamentava na memória prodigiosa de meu amigo Genésio da Silva Costa. Fiz uso de recurso da chamada história oral, que é sempre suscetível de falhas, pois como todos sabemos a memória é muitas vezes frágil e enganosa. Evidentemente, lancei mão de eventuais artigos ou registros e anotações a que tive acesso, além de consulta a algumas outras pessoas. Publiquei-o em sites e jornais, com a esperança de que alguém me enviasse eventuais retificações ou mesmo me desse novos subsídios, que pudessem enriquecer o meu modesto ensaio historiográfico. Todavia, não recebi nenhuma carta ou e-mail com reclamações, retificações ou sugestões, de forma que o considerei digno de publicação em livro.

Por conseguinte, o enfeixei no opúsculo O Pé e a Bola (publicado em 2003), que traz excelente prefácio do intelectual e comentarista esportivo Carlos Said, cujo nome dispensa qualificativos, por ser uma legenda da crônica futebolística piauiense. A obra, que tem como subtítulo “Craques do futebol campomaiorense e parnaibano”, é divida nas seguintes seções: a) O Pé e a Bola, que é um ensaio sociológico sobre o futebol, mormente o amador ou dos campinhos de várzea, e as suas sociabilidades; b) Craques do futebol campomaiorense; c) Craques do futebol parnaibano e d) Memória iconográfica.

Nas partes b e c fiz uma síntese histórica do futebol em Campo Maior e em Parnaíba, e relacionei os principais atletas, na avaliação de meus informantes (Genésio da Silva Costa e Zé Duarte, além de outros). Minha intenção primordial ao publicar essa obra foi relembrar o nome de grandes craques, que já se encontravam em quase completo esquecimento. Ressaltei que não tinha a pretensão de esgotar o assunto, e que outros poderiam fazer mais e melhor do que eu. Deixei bem claro que em todas as listas de melhores, sempre alguém poderia apontar alguma inclusão indevida ou alguma indevida exclusão. Mas, como disse, não tinha eu o objetivo de exaurir a matéria.

Quando publiquei o meu livro em 2003, fiz pequenas alterações, de modo que alguns dos erros apontados já foram corrigidos. Por exemplo, na página 29 do meu livreto está dito que um dos introdutores do futebol foi Septimus Clark, de ascendência inglesa (e não James Clark), de modo que o reparo já foi solucionado. No texto anterior eu tinha optado por atualizar a grafia do nome do Parnahyba, mas no livro resolvi manter a grafia original, ou seja, conservei o nome como sendo Parnahyba Sport Club, de sorte que esse outro “erro” também já fora sanado, desde 2003.

Outro senão que me imputaram foi o de não saber o significado da palavra escrete. Na verdade, as palavras têm o sentido denotativo e conotativo. No meu texto, dei a essa palavra a conotação de time, e não de seleção. De qualquer sorte, alguns dicionários registram esse vocábulo como tendo também o significado de time. Por conseguinte, tanto no sentido denotativo como no conotativo, eu não estaria errado. Assim, a censura teria foro de preciosismo linguístico, que não tentei seguir, mesmo porque sei que a semântica está sempre sendo enriquecida, com as palavras adquirindo outras e novas significações, tornando-se, às vezes, plurissignificantes.

Quanto a antigos dirigentes que citei, esclareço que eu não disse terem sido presidentes, mas que teriam exercido cargo na direção, e não exatamente na presidência do time. De qualquer modo, a informação me foi passada oralmente, e é possível que o meu informante possa ter se equivocado. Foi o meu amigo Genésio Costa quem me informou que foram disputados campeonatos em campo de futebol localizado onde hoje se ergue a Praça Santo Antônio, o que não impede que outros torneios possam ter sido praticados em outros locais. Eu não disse, em momento algum, que o Ginásio São Luiz Gonzaga já existisse no tempo em que o empresário Zeca Correia criou o seu campo de futebol; disse apenas que ele foi instalado em local perto de onde (hoje) se ergue esse educandário.

Conheci Mário Carvalho, e lhe tinha respeito, admiração e amizade, principalmente porque ele era colaborador do Jornal Inovação, do qual fiz parte, com muita honra para mim. Não lhe omiti a participação no episódio referido na crítica. Aliás, ele é o primeiro nome relacionado no meu livro O Pé e a Bola, conforme pode ser visto na página 30, quando eu afirmo: “No início da década de 60, os proprietários quiseram desativar o estádio [do International], dando-lhe outra destinação, o que gerou uma acirrada revolta popular, com vários manifestantes, em cuja linha de frente estavam Mário Carvalho e Mário Pereira (...)”.

Quanto ao nome de Jesum Messias já corrigi o equívoco no original do texto. Realmente Galdino foi ourives, desportista e líder comunitário, mas não foi escritor e nem compositor; quem me deu essa informação deve ter se equivocado, ou então o equívoco foi meu, quando fiz a sua anotação manuscrita. Com relação ao atleta Genésio, escrevi o seguinte: “nossa principal fonte informativa, Genésio da Silva Costa, o Geruca (Guarani e Ferroviário), meia-direita e centroavante, invicto nos campeonatos de 1943 e 1944”. Acredito ter sido fiel ao que ele me disse, e que imediatamente anotei. Contudo, no dia 16/07/2013 o velho atleta desfez seu engano, e me disse que a invencibilidade ocorreu apenas no ano de 1943. Já fiz a devida correção.

Peço ao leitor de meu livro que me perdoe por esses erros (que infelizmente acontecem quando se recorre à história oral), que tentei justificar. Esforcei-me para fazer o melhor que podia. Não tive o desiderato de exaltar ou escamotear de forma injusta o brilho e o mérito de ninguém. Entretanto, acrescento que na época em que o escrevi não existia nenhum livro sobre o futebol parnaibano, ao menos do meu conhecimento, e ao qual pudesse ter acesso. Ressalto que publiquei o meu opúsculo com o objetivo de resgatar a memória dos grandes craques do futebol campomaiorense e parnaibano, que se encontravam imersos em quase absoluto esquecimento, e penso que o atingi. Em resumo: alguns erros apontados já estavam corrigidos, quando publiquei o livro em 2003, e os outros já estão retificados no original.

Encerro esses esclarecimentos, com o seguinte trecho do aludido livreto:

Sem dúvida, as belas e caprichosas jogadas de grandes craques rapidamente caem no esquecimento. Diria mesmo que essas jogadas de arte, verdadeiros malabarismos, verdadeiras coreografias e balés, têm uma glória magnética e eletrizante, mas tênue, passageira, comparáveis a belas esculturas executadas com neve, tão mais precárias quanto mais delicadas.


Desejo também registrar que a glória dos estádios muitas vezes é fugaz e traiçoeira, pois não raras vezes um craque, após uma jogada de gênio, comete logo a seguir um lance infeliz, como um passe para o adversário, ou mesmo o suicídio melancólico de um gol contra. A torcida, implacável, transforma os aplausos em apupos e vaias, o êxtase em sofrimento, ainda mais quando o atleta atua na posição ingrata de goleiro, em que uma falha é quase sempre fatal.”


(*) Em minha juventude, joguei futebol, tendo atuado preferencialmente na posição de goleiro. Remeto o leitor, caso tenha interesse, para as crônicas "Quem te ensinou a voar?" e "Despedida de Goleiro", ambas publicadas em vários blogs e portais.