José
Maria Vasconcelos
Cronista,
josemaria001@hotmail.com
Final
de tarde, igreja de Fátima, liturgia eucarística. Devoto-me a missa
em meio de semana, pela simplicidade do culto e do envolvimento do
celebrante com os fiéis. Há sacerdotes que conhecem o rebanho,
descem do altar, interagem com os fiéis. Não é sermão, homilia
dos clássicos doutores. É pregação familiar enxertada com
exemplos do cotidiano. Naquela terça, dezenas de pessoas,
especialmente do judiciário e repartições públicas, chefes e
gente importante. O evangelho batia forte na presunção de quem se
arvora por prestar serviço público, se acha insubstituível,
poderoso. O direito ao culto pessoal, que outros se dobrem e o
reconheçam como tal.
Os
apóstolos pediam ao Senhor que lhes aumentasse a fé. Jesus
contou-lhes a parábola do servidor. "Qual de vós,
tendo um servo ocupado na lavoura ou guardando gado, lhe dirá,
quando ele vier do campo: "Senta-te à minha mesa e come"?
Ao contrário, tu ordenas: "Prepara-me a ceia, cinge-te, e
serve-me enquanto eu como e bebo; depois comerás tu e beberás."
E, quando o servo tenha feito tudo o que lhe fora ordenado,
porventura lhe fica o senhor sujeito a servi-lo? Creio que não. Pois
assim também vós, depois de terdes feito tudo o que vos foi
mandado, dizei: Somos uns servos inúteis; fizemos apenas o que
devíamos fazer". (Lucas, 17:5-10).
A
tarefa de servir é mais importante do que a pose de comandar e
exigir privilégios. Pegue este recado e o anexe no quadro de avisos
do serviço público, na sala dos gestores, nas câmaras setoriais,
na testa dos que se arvoram donos do terreiro, do dinheiro e do
poder. Gente por aí, porque galgou um cargo, vira leão de majestosa
juba, rei dos animais. E da cocada.
Nos últimos dias, têm-se esbanjado elogios e
flores ao ministro do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, pela
lisura, coragem e dignidade em condenar um bando de malandros
engravatados, usurpadores de milhões de reais dos contribuintes, em
farras eleitoreiras e partidárias. Pela internet, admiradores já o
lançaram candidato a presidente da república, tão carente anda a
nação de estadistas de vergonha. O ministro, reservado e sério,
não se encanta com o delírio da torcida. Apenas se acha zeloso do
ofício a que lhe outorgaram. Correto: ele é pago, portanto sua
obrigação é o dever. Obrigação de servo, o dever de
consciência. Se aos homens sérios exige-se a humildade de servir,
imagine aos malandros engravatados e corruptos. Têm de ser banidos e
punidos.
"Quando
fizerdes tudo o que vos for mandado, dizei: Somos servos inúteis:
fizemos somente o que devíamos fazer." Não que sejamos paus
mandados, servos e escravos, mas escolhidos para servir. Vai mal o
servir nos hospitais, nos guichês de atendimento, nas filas de
espera, nas esfarrapadas desculpas e preguiça, cara de cimento
armado. Principalmente com os mais humildes.
Servos inúteis, quando sobrepomos a humildade
cristã à prepotência do "sabe com quem está falando?".
Quando pegamos a toalha e lavamos os pés do próximo - eis a
metáfora do servir. Extraímos parte de nós em prol do próximo.
Servos inúteis, pois todo poderoso é o Senhor da vida. Somente a
Ele o direito à majestade. Mesmo assim, desdobra-se de amor por nós.
Mesmo na prosperidade e no pode, a humildade nos incita repetir, como
Maria: "Eis a escrava do Senhor!"
A
pose faraônica passa. As pirâmides da soberba, um dia se calarão
para sempre, dormitam no deserto do esquecimento. Nem missa levantará
esses mortos. Mesmo com a mais bonita pregação.
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