Fonseca
Neto
O lugar em que eu nasci, Passagem Franca, no Maranhão, até meados do século passado, foi um destino de migrantes de vários estados nordestinos, em geral fugidos das secas, ou simplesmente em busca de novos e “verdes” horizontes em suas vidas.
Até
os anos de 1960, aquela nesga de sertão do sudeste maranhense não
se entendia como pertencente à região “Nordeste” do Brasil, daí
que os chegados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, e mais
ainda do Ceará, eram conhecidos como “os nordestinos”, espécie
de gente de longe.
Essa
migração de “nordestinos” explica a própria colonização da
microrregião onde foi erguida a povoação original, de cidade e
município, no vale do Inhumas/Balseiros/Corrente, complexo de riotes
afluentes do rio Itapecuru.
Nesse
vale de cocais nativos, ubérrimo, moldado com uma serrania em cujos
pés há olhos d’água que pingam, notadamente no lugar da
Passagem, os Araújo e Alencar, cearenses oriundos do “riacho do
Sangue” e descidos da Serra Grande, chegaram no ano de 1777. Ali já
encontraram as terras doadas a sesmeiros antes chegados, os Franco,
por exemplo, e fixados no grande entorno da Lagoa do Taboleiro...
As
famílias Franco, Araújo e Alencar, dando combate aos nativos
Aranhim, logo, destes, tomaram as terras, passando a senhoriá-las e
fundando fazendas de criar gado e agricultura. Ao longo do século
seguinte, o dezenove, várias outras famílias para ali migraram, em
torno de 1877, a exemplo dos Souza da vila riograndense de Pau dos
Ferros, que, décadas mais tarde, atrairiam para o Maranhão outras
parentelas. Também os Pereira de Sá e Brandão, além dos Mourão,
da Freguesia do Senhor do Bonfim da Serra dos Cocos, chegaram na
região dos cocais, ao que se sabe, no alvorecer do Oitocentos. Os
Coelho, idem, vindos do médio São Francisco – descendentes de
Valério Coelho Rodrigues. Fixaram-se estes então, na sede do
Julgado de Pastos Bons, depois desceram o Balseiros e ajudaram a
erguer a vila da Passagem.
Mas
as mais significativas levas migrantes aportam por volta de 1915 e
1932, anos marcados por graves estiagens naqueles Estados. Na
Passagem, até política pública a prefeitura municipal implementou
para acomodar “os nordestinos”: em 1935, o prefeito Nelson Porto
determinou a abertura de uma rua para acomodar os chegantes, na borda
direita do riacho Inhumas, entre a Passagem do Bezerra e o Riachinho,
a hoje rua da Santa Luzia. Trata-se de área em que os tradicionais
moradores locais não queriam habitar, por considerá-la alagadiça e
palustrosa; a prefeitura mandou sanear a área e distribuí-la com
“os nordestinos”; era tudo que estes almejavam: um ligar para
morar com água farta – cavava-se um metro no quintal e “dava”
n’água.
Desde
os anos 1930 essa rua teve moradores “nordestinos”. A família de
Aureliano Raimundo e Maria, toda a nação dos Lopes e Porfíro. A
rua da Santa Luzia era espécie de periferia da cidade; os moradores
mais antigos moravam na parte superior do Largo da Igreja, e da
histórica rua Grande, que vai da hoje praça Rio Branco ou rua do
Tamarindo até a Joaquim Távora, parte mais alta e salubre da urbe
passagense.
Na
rua da Santa Luzia moravam esses retirados da seca e de outras
aventuras. Além de Aureliano, chefe de um ramo do Pau dos Ferros, os
referidos Porfiro e Lizarda. Uma rua de homens e mulheres admirados
por serem trabalhadores muito dispostos. Os “nordestinos” sempre
foram admirados pelos locais, porque tinham jeito de empreendedores,
davam um jeito em tudo, comiam bicho e fruta que passagenses não
comiam, como, por exemplo, tripa de porco, camaleão, lapichó,
jenipapo...
Ali
na Santa Luzia também morou o Valdir, “cearense”, valente, assim
temido por muitos. Morou o Zito e Floriza e uma legião de filhos. O
mestre João Ferreira e dona Mercês E a dona Lourdes... Sua
moradora mais conhecida e falada pelas linguagens dos adolescentes da
cidade inteira.
Uma
rua que dá muitas outras crônicas. Voltaremos ao assunto.
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