EU,
A CIDADE E O RIO PARNAÍBA
Elmar Carvalho
Na
sala de reunião da APL, alguns dias atrás, recebi, através do
confrade Humberto Guimarães, o livro “Eu, a cidade e o rio”,
enviado por seu autor, o amigo João Batista Dias Pinheiro,
pertencente a ilustre estirpe do município de Rio Gonçalves e
parente do juiz aposentado Orlando Martins Pinheiro, também dado à
arte de escrever, e do saudoso magistrado e prosador William Palha
Dias.
Trazia,
em caprichosas letras, quase uma obra de arte da caligrafia, uma bela
dedicatória a este cronista. Apresenta um belo projeto gráfico da
autoria de Paulo Moura e foi impresso com esmero pela Gráfica do
Povo, no ano passado. Ostenta um esclarecedor prefácio da lavra do
médico Humberto Guimarães, membro da Academia Piauiense de Letras e
conterrâneo do autor.
Embora
na apresentação o autor confesse nunca haver pensado em publicar
livro, termina por dizer que costumava escrever muitas cartas aos
seus familiares e que chegou a ser convidado pelo professor de
português Valdemar Sandes a fazer parte da União dos Moços
Católicos – UMC, sob a promessa de que teria uma coluna no jornal
da entidade. Acrescenta que recusou a oferta por “pura timidez”.
Também se houve bem nas redações que fez no concurso para
tabelião, em que logrou ótima nota, que lhe permitiu ingressar no
serviço público.
Pretendia,
inicialmente, escrever um trabalho sobre a vida e estórias de seu
avô, João Dias Pinheiro, de quem herdou o nome. O certo é que o
projeto inicial evoluiu, e acabou por escrever uma obra, de natureza
memorialística, em que fala de episódios interessantes de sua vida,
da vida de seus ancestrais e de outros familiares; termina abrangendo
vários moradores do antigo povoado Remanso, do qual se originou a
cidade de Ribeiro Gonçalves. O livro narra importantes fatos
históricos do município, desmembrado do território de Uruçuí,
mormente relacionados com a sua fundação e com a administração
pública. Na parte final, a obra traz uma “memória fotográfica”,
em que fotografias antigas reavivam a lembrança de pessoas citadas e
de logradouros que já não existem ou que foram acentuadamente
modificados.
Muito
me agradou haver recebido “Eu, a cidade e o rio”, uma vez que
vivenciei essa urbe, pois fui titular da Comarca de Ribeiro
Gonçalves, da qual fazia parte o termo (município) de Baixa Grande
do Ribeiro. Tomei posse desse cargo no último dia de fevereiro de
2000, e o exerci durante quase quatro anos, quando, por motivo de
doença (CA), consegui minha remoção para a Comarca de Capitão de
Campos.
Quando
assumi minhas funções, João Batista Dias Pinheiro já era
aposentado e morava defronte ao fórum. Por ser um cidadão correto,
pouco andava em sua antiga repartição e nunca ouvi falar que tenha
feito qualquer pedido indevido a qualquer dos juízes da Comarca. As
informações sobre ele eram as melhores possíveis, e lamentei não
mais encontrá-lo em atividade. Dizia-se que o desembargador Paulo
Freitas, que fora corregedor geral da Justiça e presidente do
Tribunal de Justiça o considerava um dos melhores escrivães do
estado, e classificava o seu cartório como o mais organizado do
Piauí.
Nos
meus tempos ribeirenses, morei no prédio do fórum, no apartamento
destinado ao juiz de Direito. Passava um final de semana em Ribeiro
Gonçalves, trancado no fórum, e outro em Teresina. Aproveitava
esses finais de semana para prolatar sentenças e decisões
interlocutórias, de modo que mantive sempre os meus serviços em
dia. Foram meus antecessores imediatos os magistrados Rogério Nunes,
grande no tamanho, na inteligência e no bom humor; Almir Tajra,
cumpridor de seus deveres e de grande coração, apesar de não haver
sido picado por nenhum “barbeiro” e Francisco Ferreira, em
companhia de quem viajei, no final de fevereiro de 2000 para assumir
a titularidade da Comarca. Fora ele buscar os seus pertences.
Eram
excelentes servidores da Comarca, todos portadores de contínua
boa-vontade: dona Conceição, Márcia, Nilza, Barbosa e Toinha, além
de dona Marilene, que desempenhava os serviços gerais do fórum.
Trabalharam na Comarca, durante minha serventia, os promotores de
Justiça: Antônio Barbosa Maciel, que além de cumprir suas funções
com correção, era compositor e cantor, tendo musicado um poema de
minha autoria; Afonso Aroldo, incomensurável dedicação ao
trabalho, vários vezes o vi trabalhar durante as silentes e frias
madrugadas, e Araína Cesárea, inteligente e de muito preparo
intelectual, posteriormente aprovada em outros concursos. De todos
guardo boas recordações.
Fui
visitado por irmãos da Loja Maçônica Celso Antunes de Sousa.
Passei a frequentar muitas de suas reuniões. Humildemente,
contribuí, juntamente como todos os irmãos, para a construção do
templo, posto que a sede ficava em casa alugada. Nesse edifício
maçônico foi afixada bela placa, na qual foi estampado o meu poema
Mística I, concebido com elementos da simbologia da sublime Ordem.
Dessa forma convivi com vários obreiros, todos dedicados e corretos,
entre os quais cito: Hugo Torres, Elson Antunes, Aníbal Carvalho,
Francisco Modesto Barbosa, Joel, tenente Wilson Ribeiro dos Santos,
José Pinto, Ubiratan Ribeiro Soares, Marcos Ribeiro, Joveraldo,
Otoni, Gilmar, José Ricardo, Arenaldo, Tomaz, Arimatéia e Cícero.
Eram
assíduos visitantes da loja os mestres maçons Antônio Carlos e
Ulisses, que foram gerentes da agência local do Banco do Brasil. O
tenente Wilson e Ubiratan foram prefeitos do município, e Elson
exerceu a vereança em mais de um mandato. Antes de minha chegada,
foi venerável da oficina maçônica Carlos Alberto, que fora
promovido a gerente da agência do Banco do Brasil em Picos. Aníbal
gostava de palestrar comigo sobre cultura e poesia. Admirava os
grandes poetas do romantismo, do simbolismo e do parnasianismo,
especialmente Augusto dos Anjos, por quem nutria a mais elevada
admiração. Não assimilava muito bem os poemas modernistas. Era o
mestre maior da retórica daquelas altas ribeiras parnaibanas.
Após
eu haver deixado a Comarca de Ribeiro Gonçalves, foi criada, sob a
liderança de Adovaldo Medeiros, a Fundação Leôncio Medeiros, em
homenagem ao primeiro prefeito do município. Sua diretoria me
outorgou o título de membro honorário. Em meu discurso, intitulado
Tempos Ribeirenses, que transformei em livreto, distribuído na data
da solenidade de instalação da ONG, ocorrida no dia 14/11/2004,
narrei vários episódios engraçados ou interessantes, de que fui
testemunha, protagonista ou mero coadjuvante.
Expus
alguns fatos de que participei ou que presenciei. Brevemente,
publicarei esse texto na internet. Na solenidade estavam presentes as
pessoas mais representativas e gradas da cidade. Oriundos de
Teresina, estavam presentes o saudoso magistrado e intelectual
William Palha Dias, cujo nome fora dado à biblioteca da Fundação,
o deputado federal B. Sá, o político e escritor Jônathas Nunes e o
médico, ensaísta e romancista Humberto Guimarães.
Em
minhas viagens de retorno a Ribeiro Gonçalves, revia, com o mesmo
encantamento com que a vi pela primeira vez, a paisagem inicial da
graciosa urbe. Ao descer a ladeira, descortinava-se a várzea,
repleta de imponentes e belos pés de buritis. Quase sempre via uns
meninos sararás, na porta de sua casa de taipa, a brincar perto da
puaca da estrada, despreocupados com o tempo e a vida. Adiante
contemplava o poço jorrante a emitir seu jato d'água, formando a
poça na qual muitos banhavam. Em derredor da pequena lagoa se
espraiava a vegetação e o buritizal. Se eu fosse pintor, sem dúvida
dali teria extraído uma pintura magistral.
Na
frente do fórum se erguia um frondoso flamboyant. Com encantamento
eu via as suas floradas, como se fossem rubras e belas hemoptises de
um poeta tísico. Mais adiante, na encosta do morro, escoravam-se
algumas casas humildes; um majestoso angico branco servia de poleiro
aos urubus, operários da limpeza e acrobatas dos espaço azuis,
contra os quais se recortavam no suave bailado das alturas.
Logo
adiante, ao lado direito do prédio da Justiça, erguia-se a
pequenina igreja branca, no meio de uma grande praça. Mais em
frente, passava o rio Parnaíba. Do outro lado do Velho Monge ficava
a casa do sogro do coronel e advogado Benedito Guimarães, de boa
conversa, simpático e bonachão, que havia sido secretário do
governo do território e ilha de Fernando de Noronha. Na época, o
rio se encontrava ainda bem preservado na região, com as margens bem
definidas e fixadas pelas matas ciliares, que lhe conservavam
estreito e profundo, sobretudo na proximidade do centro da cidade,
perto de onde se erguia um grande morro, no lado maranhense, em cujas
encostas íngremes pastavam equilibristas bodes e cabras.
A
capa do livro e a leitura de vários trechos me fizeram evocar essa
paisagem bucólica, que tanto me encantou no início de minha
judicatura. E também me trouxe muitas recordações, que ainda me
trazem acridoces saudades. Muitas evoquei em meus “Tempos
Ribeirenses”, em que narrei alguns fatos de minha vida
profissional, literária e social, todos ligados à encantadora urbe.
Caro Elmar.
Li e reli a crônica que vc escreveu no seu blog que
faz parte dos meus sites favoritos.
Fiquei bastante orgulhoso em razão do parentesco que
tenho com João Batista Dias Pinheiro. Meu pai, Hermes Dias Pinheiro
era primo legítimo do pai dele, Artur Dias Pinheiro. Tinha-o como
meu tio, assim como o João em relação ao meu pai. Fomos criados
pedindo a benção a cada qual, existindo o máximo de respeito.
Quando tinha 7 anos passei férias maravilhosas em
Ribeiro Gonçalves em companhia do João Pinheiro e seu irmão Pedro
Pinheiro, precocemente falecido. Guardo na memória aqueles dias
felizes que lá passei, os banhos no riacho no sítio do tio Dondô,
hoje pertencente ao João. O destino quis que somente voltasse lá já
como Juiz Adjunto, curtindo o orgulho de trabalhar com o João
Pinheiro, ele na qualidade de Escrivão do Cartório do 2º Ofício
que, segundo as palavras do Des. Paulo de Tarso Mello e Freitas, o
melhor escrivão que ele conheceu na oportunidade em que realizou
correições em quase todas as Comarcas do Piaui.
Eu trabalhei por 2 anos como juiz da Comarca de
Uruçuí, respondendo pela Comarca de Ribeiro Gonçalves, quando
constatei a veracidade das palavras do meu querido Professor Paulo de
Tarso Mello e Freitas. O João Pinheiro, mercê de sua educação
primorosa que recebeu dos queridos tios Artur Pinheiro e Pureza,
continua a ser um cidadão exemplar, excelente pai de família e
querido parente que muito me orgulho em estima-lo.
Senti-me grato pelos elogios a ele dispensados
merecidamente.
Fraternalmente
Orlando Martins Pinheiro.'.
Caro Elmar.
ResponderExcluirLi e reli a crônica que vc escreveu no seu blog que faz parte dos meus sites favoritos.
Fiquei bastante orgulhoso em razão do parentesco que tenho com João Batista Dias Pinheiro. Meu pai, Hermes Dias Pinheiro era primo legítimo do pai dele, Artur Dias Pinheiro. Tinha-o como meu tio, assim como o João em relação ao meu pai. Fomos criados pedindo a benção a cada qual, existindo o máximo de respeito.
Quando tinha 7 anos passei férias maravilhosas em Ribeiro Gonçalves em companhia do João Pinheiro e seu irmão Pedro Pinheiro, precocemente falecido. Guardo na memória aqueles dias felizes que lá passei, os banhos no riacho no sítio do tio Dondô, hoje pertencente ao João. O destino quis que somente voltasse lá já como Juiz Adjunto, curtindo o orgulho de trabalhar com o João Pinheiro, ele na qualidade de Escrivão do Cartório do 2º Ofício que, segundo as palavras do Des. Paulo de Tarso Mello e Freitas, o melhor escrivão que ele conheceu na oportunidade em que realizou correições em quase todas as Comarcas do Piaui.
Eu trabalhei por 2 anos como juiz da Comarca de Uruçuí, respondendo pela Comarca de Ribeiro Gonçalves, quando constatei a veracidade das palavras do meu querido Professor Paulo de Tarso Mello e Freitas. O João Pinheiro, mercê de sua educação primorosa que recebeu dos queridos tios Artur Pinheiro e Pureza, continua a ser uma cidadão exemplar, excelente pai de família e querido parente que muito me orgulho em estima-lo.
Senti-me grato pelos elogios a ele dispensados merecidamente.
Fraternalmente
Orlando Martins Pinheiro.'.
Caro Dr. Orlando,
ResponderExcluirSuas palavras me deixaram desvanecido, embora não as mereça na íntegra.
Muito obrigado.