A
esquerda também usa black-tie
José
Maria Vasconcelos
Cronista, josemaria001@hotmail.com
Sabe
o que é black-tie? Já ouviu falar no filme “Eles não usam
black-tie”, do ator Gianfrancesco Guarnieri, 1981? Sem pomposos
cenários nem figurinos luxuosos nem terno longo e gravata preta nem
presença de ricos. Só moradores de morro, operários com bordões
decorados na ponta da língua marxista, de desmonte da autoridade.
Era assim o Cinema Novo, terceiro-mundista, revolucionário, devotado
à ex-União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), Albânia,
Cuba, ex-China comunista e Coreia do Norte.
Você
conhece lideranças políticas atuais, cujo passado de estudantes
universitários, professores, sindicalistas e intelectuais pedalavam
bicicleta, pegavam ônibus, ganhavam merrecas, montavam barricadas e
“aparelhos”, empunhavam microfone... e como sabiam falar! Frente
a escolas e faculdades, atiravam surrados bordões: “pelegos da
ditadura, elite atrasada, burguesia podre, empresários,
latifundiários, capitalistas, oligarquias”. Gloriosos
tempos, a estrela vermelha apontava para uma sociedade mais justa e
costumes renovados na política brasileira. Ótimo, bravo! Nada mais
idealista do que um partido voltado para os interesses coletivos e à
moralidade. Os tempos são outros e decepcionantes. A utopia se foi,
tragada pela gula do poder financeiro e político, a qualquer custo
de uma vaga no inferno.
Antes,
irreconhecíveis, calça e tênis surrados, cabelos e barba
desalinhados, pregação utópica, assaltos a banco e sequestro de
diplomatas, a fim de arrecadar dinheiro (olhe só!) para nobre
“projeto” de país justo. Até agachados a líderes religiosos.
Chegaram ao poder, mas logo correram atrás do black-tie das verbas e
obras inacabadas. Cada qual se arranjando como pode, agora comendo do
mesmo veneno que condenavam nos palanques e nos discursos inflamados.
Lula, em 1996, no Altas Horas da TV Globo, vociferava contra o
governo do presidente Fernando Henrique: “Se está com medo da CPI,
é porque tem o rabo preso!” Hoje, têm o rabo preso ao conforto do
black-tie. Temem a varredura das CPIs, com empulhação e tapinhas
que não doem nas costas de parlamentares e senadores.
Eles
não usavam black-tie; hoje, condenados e presos por escândalos
financeiros, exigem até o fraque nos presídios. Do passado de lutas
e ideais sublimes, só restam os mesmos bordões surrados. Quebrados
não se encontram mais; quebrando está o Brasil. Eles se fazem de
vítimas da imprensa e das elites, todavia apunhalam as riquezas
nacionais. Desfrutando generosos contracheques, tratam a classe média
e os empreendedores com deboche, semelhante ao descrito por um
petista roxo (digo, vermelho), professor universitário, classe
média, vida confortável, em artigo de jornal: “Vivem, sobretudo,
com a espoliação capitalista, mais gulosa que em qualquer tempo,
contra a qual se há que se levantar”. Uma agressividade
patriótica, mas risível pela paradoxal aptidão por guarda-roupas
de luxo. Bem que Geanfrancesco Guarnieri, lá do fundo de seu
descanso eterno, suplicasse a esta fracassada geração de sublimes
ideais, que o estilo black-tie já caiu de moda. Que eles,
antigamente despojados e puros, se vistam da simplicidade e da
decência. Franciscanamente.
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