17 de julho Diário Incontínuo
OS GANSOS DA
VÁRZEA SIMÃO
Elmar Carvalho
À tarde, do
alpendre de nossa casa da Várzea do Simão, onde degustávamos um churrasco,
vimos os gansos chegar, provenientes da casa do Maninho, sobrinho da Fátima e
nosso vizinho. Atravessaram a cerca divisória dos imóveis, e entraram em nosso
terreno. Eram semelhantes a grandes patos, porém de andar mais elegante e firme.
Ostentavam uma espécie de crista vermelho-amarelada sobre a parte posterior do
bico, como se fosse uma espécie de elmo, ou mesmo uma coroa estilizada.
Chamei a
protuberância de elmo porque tive notícia de que eles são um tanto belicosos,
sobretudo quando invadem seu território, no caso, o terreiro do Maninho, dono
deles. Encostam-se ao invasor e procuram bicá-lo, evidentemente no intuito de
afastá-lo do terreno que consideram de uso exclusivo seu. Também disse que o
enfeite parecia uma coroa porque esses bichos têm uma postura nobre, orgulhosa,
e um tanto imperial.
Quando caminham alinhados,
parecem militares a marchar em fila indiana. Estufam o peito, como grandes e
enfatuados pombos, e, às vezes, levantam altivamente a cabeça, como
empertigados generais. Suponho que fazem isso para amedrontar eventuais
inimigos, simulando um porte mais avantajado, como também para sondar o
terreno, o mais longe possível, seja em busca de adversários ou à procura de
ervas ou raízes de sua predileção.
Após a chegada
dessas belas aves, ligamos a ducha, com que iríamos banhar. Logo notamos o seu
interesse, pois elas começaram a se aproximar com certo entusiasmo e alvoroço.
Após os sucessivos banhos, colocamos o equipamento perto de um rego, usado para
a pequena irrigação das árvores próximas. Imediatamente a água começou a
correr, como se fosse um minúsculo regato. Esse fato e o
barulho da água atraíram a atenção dos gansos, que vieram para perto da fonte.
Começaram a
fuçar no entorno, à procura de raízes de sua estima. A terra, amolecida pela
água, facilitava seu meticuloso trabalho de busca. A presença das pessoas não
os intimidava nesse mister. Mergulhavam vigorosamente os grandes e poderosos
bicos na terra e no líquido, e os revolviam em todos os sentidos: para cima,
para baixo, para um lado, e para outro. O forte e longo pescoço, de marcante
musculatura, com o arremate do gracioso e frenético bico, dava ao conjunto o
aspecto de uma pequena draga viva.
Conta-se que, no
quarto século antes de Cristo, os guerreiros de Breno, à noite, de maneira
furtiva, tentaram surpreender os defensores da velha Roma, em repouso nas
fortificações do Capitólio ou Monte Capitolino. Não conseguiram seu intento
porque os gansos consagrados a Juno, com fortes alaridos, como verdadeiras
trombetas, acordaram os soldados romanos, os quais puderam rechaçar a invasão
dos gauleses. Era do alto do Capitólio, uma das sete colinas de Roma, que os
generais triunfantes contemplavam a cidade eterna, pela qual lutavam.
Depois, quando
bem quiseram, sem nenhum gesto de agradecimento, subserviência ou medo, os
gansos da Várzea se foram, de peito empinado, como galantes príncipes ou
generais. Erguiam a cabeça e estufavam o peito, orgulhosos de sua força e
beleza, conscientes da nobreza de seu próprio ser. Acaso essa aristocrática altivez
remontasse aos seus ancestrais devotados a Júpiter, guardiães do Capitólio da
cidade eterna.
Mestre,
ResponderExcluirGansos são aves realmente diferenciadas. O digo, pois já tive a oportunidade de criá-las quando na época morava em uma casa cujo quintal propiciava tal prática. São realmente aves imponentes e elegantes que desfilam com galhardia as suas penas que, de tão brancas confundem-se por vezes com nuvens no céu a fulgurar.
Tê-las como companhia vez por outra é por certo presente divino para completar ainda mais esse paraíso recém inaugurado, que com a graça de Deus conhecei brevemente in loco.
Mestre,
ResponderExcluirVocê, com o seu comentário conciso e pertinente, terminou elaborando uma pequena crônica, repassada de legítima prosa poética.