quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Um presente inesquecível



Um presente inesquecível

José Pedro Araújo
Historiador, romancista e cronista

Estava certo dia desfrutando do meu estimado ócio em minha casa, quando recebo a ligação de um grande amigo, Chico Carlos, o nosso inventivo Acoram. Não foi o telefonema de um amigo qualquer, daqueles arranjados ao sabor das libações, em volta de uma mesa de bar. Mas de um tipo que se convencionou chamar de ”amigos de todas as horas”. Convidava-me a prefaciar um livro de sua autoria que, a bem da verdade, não sabia eu que ele estava a escrever. Fiquei, naturalmente, preocupado com o convite. Afinal, reside ai uma das muitas tarefas sobre as quais não me sinto pronto para desempenhar. E fiquei com aquilo em mente, preocupado, sem saber como pedir ao meu amigo que procurasse alguém mais capaz para desempenhar tal missão com competência e à altura do seu trabalho, que já intuía de boa qualidade. E fiquei assim, esperançoso que ele esquecesse o convite que me havia feito. 

Passados alguns dias, nem mais um contato. Eu, naturalmente, já estava confiante de que o meu desejo havia se concretizado. Chico Acoram havia chegado à conclusão de que a mim não cairia muito bem esse papel. Mas qual! Daí alguns dias, volta o Acoram a me ligar. Bom, meditei rapidamente, sempre há a possibilidade de ser uma ligação com um pedido de desculpas por ter esquecido o convite feito, mas que já encontrara outro prefaciador. Não aconteceu assim. Para meu desgosto. Ao invés disto, convoca-me para uma chegada até o seu local de trabalho quando me apresentaria a boneca do seu livro. Já que era assim, ponderei sem muita confiança, que assim fosse.

Chegando ao prédio da AGU(Advocacia Geral da União), local em que o velho cacique desempenha e esbanja a sua competência habitual, sou recebido por ele com a efusiva alegria de sempre, o que me deixou um pouco mais tranquilo, mesmo ainda estando com o semblante carregado, denotando preocupação. Resolvi embarcar na cordialidade e alegria com as quais habitualmente sou envolvido quando nos reencontramos, e isso me fez bem. Aos poucos fui me soltando ao ponto de deixar a preocupação de lado e entrar na brincadeira saudável do Acoram.  

Satisfeito com as novas instalações da Procuradoria Federal, fui conduzido por ele para um Tour de reconhecimento, passando inclusive pela cozinha, onde fui apresentado a uma simpática copeira, a moça do cafezinho, mas também pela sala do chefe, espaçoso escritório que contrastava em tudo com as velhas instalações da Procuradoria no tempo em que ainda ocupava um velho e acanhado prédio ao lado da Prefeitura Municipal de Teresina. A caminhada, as tiradas alegres do meu amigo e, sobretudo, as apresentações que foram acontecendo no trajeto, fizeram-me esquecer um pouco a razão do convite feito. Mas isso demorou pouco. Logo voltamos à sua sala e ele me recordou o porquê de estar ali.

Depois de ir a um armário apanhar alguma coisa, ele depositou sobre a mesa um pacote robusto, que pelo barulho feito ao ser lançado sobre ela, pareceu-me bem volumoso e pesado. E de fato era. A essa altura a minha curiosidade já suplantara o receio, e eu já queria que ele abrisse o grande envelope e me apresentasse o que ele continha. Velho brincalhão, o Chico Acoram! Trapaceiro, no bom sentido. O que saiu do envelope foi um grande livro encadernado, capa dura, na cor verde, com a inscrição estampada em letras douradas: Teresina, 160 Anos!

Sorrindo com a peça pregada, contou-me que durante todo o ano de 2012 havia adquirido a edição de domingo do Jornal O Dia, com o propósito de obter o encarte que ele trazia sobre a história de Teresina. E me surpreendeu outra vez: aquele volume que eu tinha em mãos era meu. Algo inestimável e que me causou profundo contentamento. Preciso dizer ainda que o presente recebido ainda me tirou aquele peso das costas que eu carregava desde o dia daquela famigerada ligação telefônica que ele havia me feito. Duplo presente, eu diria.

Passei a manusear o volumoso exemplar que tinha nas mãos, enquanto a conversa se desenrolava alegremente, e pude perceber a riqueza que ele guardava. Tratava-se de um trabalho primoroso feito pelo professor e imortal Fonseca Neto, que assim homenageava a cidade de Teresina pela passagem do seu aniversário. As matérias traziam ainda fotografias e gravuras históricas que muito enriqueciam o hercúleo trabalho, tudo organizado, encadernado e protegido por uma bela capa mandada fazer pelo meu bom amigo Chico Acoram.

Tenho sido brindado com ótimos presentes ao longo da minha vida. Alguns deles, ainda conservo comigo, apegado que sou às coisas que mais prezo. Este, com certeza, foi um dos que mais me trouxe alegria. E também um sentimento contrário aos das traças: pretendo guardá-lo comigo até o fim. 

Pensei em fazer e publicar esta pequena resenha no meu blog neste período festivo em que é tão comum a troca de presentes entre as pessoas. E recorrendo à memória, procurei nela informações para saber se já havia ofertado algo ao amigo Chico Carlos. Não consegui descobrir nada, pois se já tiver lhe presenteado com algo deve ter sido coisa insignificante, pois não me lembro de nada. Ao passo que o que ele me presenteou jamais vai sair das minhas mãos enquanto vida eu tiver. E isso pela excelência do mimo, e pela importância do que ele contém para um rematado curioso sobre a história desta cidade que me acolheu tão carinhosamente, lugar que escolhi para passar os meus dias. Aqui pratiquei a coleta dos víveres necessários à minha sobrevivência, apanhei água na fonte para matar a minha sede, e juntei o material necessário para armar o meu barraco em lugar ideal para oferecer proteção à minha família contra as intempéries e os animais peçonhentos.


Sou grato à cidade, mas também aos amigos que aqui amealhei. Amigos como o Chico Acoram que me pregou a mais deliciosa das peças que já fizeram a mim nesses tempos que já se alongam.  

6 comentários:

  1. Caro JP,
    Você caiu como um patinho na armadilha do nosso bravo cacique Acoram.
    Mas a pegadinha foi muito bem bolada.
    Ante a excelente crônica, parabéns à caça e ao caçador.

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  2. Prezado amigo,
    O nosso bravíssimo cacique Acoram herdou o sangue dos Itacoatiara de Piripiri, terra dos nossos maiores humoristas. Acho, contudo, que sai no lucro dessa história:vi-me livre do peso de um prefácio e ganhei um belo exemplar com a história da nossa querida Chapada do Corisco. Bom retorno, mestre!

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  3. Francisco Acoram Araújo7 de janeiro de 2016 às 11:48

    Dr. Araújo,

    Tenho uma boa notícia. Em breve, estarei concluindo a redação de um livro da minha lavra. E o prefaciador será, sem dúvida, o notável cronista do Velho Curador. O Senhor não concorda, Dr. Elmar Carvalho. Obrigado mais uma vez, Dr. Araújo por essa belíssima crônica. Obrigado também, Dr. Elmar por seu comentário.

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    1. Acho que vou acrescentar um novo adjetivo a você: torturador de anciãos. E agora o texto ganhou espaço nobre, o blog do Poeta Elmar.Índio agora não se contenta mais somente com miçangas e espelhinhos, Poeta!

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  4. O nosso Acoram é chique.
    E não poderia ter escolhido melhor prefaciador: Araújo, Defensor Perpétuo do Curador.

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