Ovos de páscoa, uma ova!
José Maria Vasconcelos
Cronista, josemaria001@hotmail.com
Semana Santa, morte e ressurreição de
Cristo. Somente ele, e não mais ninguém, veio ao mundo para romper o mistério
do destino humano depois da morte. Jesus aceitou o aniquilamento de seu corpo,
para logo ressuscitar. Prova de amor à humanidade, duvidosa da existência de
outro lado da vida. Que só à luz da fé nas suas palavras para decifrar e
aceitar fantástico mistério, que se repetirá conosco, conforme promessa do
Mestre. Que a felicidade eterna se alcança, praticando misericórdia com o
próximo, despojando-se do egoísmo exacerbado à vida material.
A sociedade moderna, pautada no
consumismo e bens de capital, transforma as representações do sagrado em
produtos de mercado, desviando-se de sentido mais sublime da espiritualidade.
No natal e páscoa, o homo
religiosus contemporâneo direciona suas relações com o sagrado, comercializando
apenas bens simbólicos da religião. Esta
demanda fortalece a constituição de um mercado de consumo, especializado na
oferta daquilo que está, especialmente, na mesa. Uma espécie de religiosidade
de glutões, e não de crentes.
Símbolos natalinos e pascais
transformam-se em produtos mercadológicos, na hipócrita impressão de fé.
Cristãos primitivos traduziam a fé com a pedagogia dos símbolos, sem intenções
mercadológicas: ovos simbolizavam a ressurreição de Cristo: assim como o pinto
sai do ovo, espontaneamente, Jesus libertou-se do sepulcro. A fertilidade do
coelho retratava a fertilidade da graça em Jesus. Em tempo de jejum,
substituía-se a carne vermelha por modesto peixe. A apelação comercial moderna,
porém, explora antigas tradições com o consumo fantasiado de religiosidade. Os
preços disparam, e a espiritualidade reduz-se a paganismo, “cujo Deus é o
ventre”, no dizer de Paulo apóstolo.
Ouro, incenso e mirra, presentes
oferecidos pelos reis magos, na gruta de Belém, servem para movimentar
gigantesca indústria de papai Noel, em dezembro. O período da quaresma, com
restrições ao consumo de alimentos, antecipa-se, porém, com o carnaval de
nudismo, comilança e devaneios pagãos. E espírito religioso às favas.
A fé industrializou-se em ovos de
páscoa, coelhinhos, papai Noel, receitas de pratos raros, caros, de nenhuma
aliança com o transcendental. A televisão se enche de reportagens ao sagrado,
associadas a superficialidades, superstições e crendices, quase sempre aceitas
como “fé popular”, mas sem atingir o verdadeiro sentido da fé inteligente e
menos emocional.
Criei-me em família cristã. Meus
pais e uma vida modesta. Conceitos de virtudes e de vida santa, exemplos
repassados aos filhos. Éramos abençoados porque aprendíamos, desde cedo, a
exercitar a presença de Deus na família conjugada à Igreja.
O mal atravessa gerações, quando
se negligencia o exercício das virtudes. O bem vai mais além, rompe até quarta
ou mais gerações. Graças à educação recebida no ninho de meus pais, depois em
seminário franciscano. A indústria do consumo não me seduz, na tentação do
fruto paradisíaco. Ovo de chocolate com mensagem pascal, uma ova! Vai-te
satanás!
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