terça-feira, 2 de julho de 2019

O DIA EM QUE MATEI FONSECA MENDES

Elmar Carvalho, Rubem Freitas e Antônio Gallas, no começo dos anos 1980, na Praça da Graça


O DIA EM QUE MATEI FONSECA MENDES

Pádua Marques
Joranlista e escritor

Por uma deferência especial do jornalista e secretário municipal Arlindo Neto (Arlindo Leão), recebo mensalmente, em primeira mão, o Jornal O Piagüi Culturalista, um jornal alternativo voltado para literatura, arte e história. Em o  Piagüi Culturalista encontramos, contos, crônicas, poesias e fatos da história da Parnaíba e do Piauí.

Ao folear a edição deste mês de junho que me foi entregue bem de manhãzinha pelo Arlindo Leão, deparei-me com uma crônica do escritor Pádua Marques relatando sobre o dia em que ele, Pádua Marques tinha matado o Fonseca Mendes.

Fonseca Mendes, brilhante  jornalista, poeta e escritor,  oriundo do Maranhão,  assim como eu, trabalhamos juntos no Jornal Norte do Piauí, nos anos 1970. 

Aos sábados, após recebermos o famoso "vale" corríamos para o bar da tia Noemia Cerveira (também de Tutóia)  para degustarmos uma deliciosa "loura suada" com um tira gosto de torresmo ou qualquer outra guloseima.  O Bar ficava na Rua Almirante Gervásio Sampaio por trás da Antiga AABB, hoje Caixa Econômica, na mesmo rua onde ainda funciona a redação do Jornal Norte do Piauí.

Mas, vamos deixar de lero-lero  e ver o que interessa: a crônica O DIA EM QUE MATEI FONSECA MENDES do colega escritor e acadêmico Pádua Marques:

                      (Antônio Gallas)

Eu havia chegado em Parnaíba e estava passando pela sucursal do O Dia, dirigida pela diligente Marize Assunção. Não ganhava um tostão com isso, mas pra não perder o gosto e a tarimba de escrever fui ajudar aquela nova amiga. O Trabulo Júnior havia me chamado em Teresina, mas chegando lá ele olhou pra mim e me vendo negro, feio e magro certamente duvidou que eu fosse jornalista de formação. Insistiu pra que eu ficasse, mas vendendo assinatura de jornal.

Voltei decepcionado, mas não deixei a amiga na mão. Continuei ajudando com alguma noticia aqui e ali. Ainda era o tempo da máquina de escrever e alguma coisa que acontecia aqui em Parnaíba levava uma semana pra ser registrada em jornal porque não tinha ainda televisão. A Marize, lá pelo final do ano, me incumbiu de representar o jornal num coquetel oferecido pra imprensa pela Caixa Econômica Federal, festa organizada pelo Rubem Freitas.

No coquetel encontrei, ali na praça da Graça, o Osmar Dias, única pessoa que conhecia, por ele ser amigo de minha irmã e ser simpatizante do Inovação. Ele me apresentou a algumas pessoas, entre elas, o Zé Luiz e o F. Carvalho, que à época andavam fazendo muito sucesso com o Correio do Povo, um jornal pequeno, quinzenal, do tamanho de uma folha de papel sulfite e que muito me lembra o Opiagui. Dava um trabalho danado pra fazer.

Entre discursos, homenagens e coisa e tal, falaram nos jornalistas veteranos e aqueles que haviam morrido. Lembro muito bem de ouvir discursos do Renato Bacelar sobre seu pai Raul e Fonseca Mendes. Meu erro foi não prestar atenção e ouvir errado. Ainda naquela noite e já entrando pela madrugada conheci outras pessoas de rádio e de jornais. Na volta à sucursal na segunda-feira, redigi uma matéria falando sobre a festa e a Marize mandou pra Teresina.

Na matéria falei do coquetel, dos homenageados e dos mortos. Entre os mortos estava Raimundo Fonseca Mendes. Na sexta-feira o O Dia chegou e, no canto direito, lá em cima na página dois estava minha matéria. Dois parágrafos apenas, mas que me deixaram muito satisfeito, feliz mesmo. Mal sabia o que estava por vir, uma tremenda barriga. Depois fui convidado pra ajudar o F. Carvalho e o Zé Luiz no Correio do Povo. A redação ficava no Edifício Anelle, atrás da Caixa Econômica.

Um belo dia à tarde, estava eu debruçado no parapeito e olhando pra quem passava na Gervásio Sampaio, quando quem vejo? Raimundo Fonseca Mendes em carne e osso, a passos lentos e de camisa xadrez. Entrou na galeria onde sua filha Rita Holanda tinha uma loja, um salão de cabelereiro, algo assim, perto do escritório do Thote Ibiapina. Fiquei sem chão debaixo dos pés.

Mas não disse nada pra ninguém. Se fosse hoje, com as redes sociais e até mesmo no tempo em que a televisão tinha grande alcance, meu erro teria sido suficiente pra um processo por danos morais e materiais e com direito a uma baita indenização. Mas saiu

apenas num jornal e já naquele tempo ninguém se importava com o que saia em jornal, principalmente se fosse de Parnaíba. Raimundo Fonseca Mendes morreu mesmo de morte morrida.

Fonte:Blog do Professor Gallas

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