Charge de Fernando di Castro |
FUMA NA VENTA*
Em
décadas passadas, nas ruas de Parnaíba, via-se considerável quantidade de jipes
servindo como táxis, mas os seus condutores não eram chamados de taxistas.
Prevalecia, para tais profissionais, o termo “chofer de praça” - nomeação
bastante reforçada e divulgada em música de Luiz Gonzaga, o Rei do Baião. Mais
tarde, com o crescente sucesso de Roberto Carlos, firmou-se o termo “taxista”.
E não é de se duvidar que venha em futuro próximo, do mesmo talento do rei
capixaba, uma música enaltecendo o motorista “uber”. Esperemos!
Assim, porque os carros de praça não tinham
conforto, quando alguém mais velho ou uma mulher parida necessitava de um
transporte mais macio que o jipe, não havia outro recurso, o jeito era procurar
o Sr. Raimundo Nonato Farias Ferreira, mais conhecido por “Fuma na Venta”.
Ele não
era taxista ou chofer de praça. Era mecânico afamado. Jamais esquecia a maleta
de ferramentas no veículo como também o inseparável frasco contendo rapé. Às vezes fazia corridas nas horas vagas,
usando o seu confortável automóvel Austin A70, de cor azul, que dirigia com
habilidade e com o nariz escorrendo de tanto tabaco.
Elizeu -
proprietário de um Opala, do mesmo que matou Juscelino Kubitschek,
ex-presidente do país, em 1976 na Via Dutra, quando seguia de São Paulo para o
Rio de Janeiro - talvez enciumado porque o velho Austin ali estivesse, na
praça, posicionado ao seu lado, na fila dos carros prontos para carregar
passageiros importantes, um dia procurou diminuir o colega, fazendo-lhe uma
advertência agravada por usar o repudiado apelido:
- Seu
Fuma, me diga uma coisa: por que o senhor não deixa o diabo deste seu rapé? –
Isto prejudica a saúde e deixa os nossos clientes mal satisfeitos...
Neste
momento, Raimundo, sentindo-se ferido no seu orgulho de respeitado pai de
família, principalmente por ser tratado pelo apelido que não gostava, não
obstante o uso do “seu” como forma cortês de tratamento, e também porque
repreendido quanto ao seu inocente vício, respondeu ao colega que diariamente
transportava D. Paulo Hipólito de Souza Libório – reverendíssimo Bispo da
Diocese de Parnaíba:
-
Elizeu, acho melhor ser viciado em rapé do que fazer como você faz: Você sim, é mais errado, pois bota o Sr. Bispo no
seu carro e anda pelas ruas bebendo uísque até secar a garrafa. E concluiu
vermelho de raiva, dando mais uma cheirada no seu inseparável pó:
- Isto
sim é que é prejudicial, andar bebendo e dirigindo!
O dono
do Opala - saindo para pegar o religioso que naquele instante aparecia à porta
principal da Catedral de Nossa Senhora da Graça, de gorro roxo na cabeça e
também roxo de raiva porque o vinho da missa teria sido pouco - advertiu o dono
do Austin:
-
Cuidado! Você sabe que eu não bebo! E veja bem o que diz! Respeite as
autoridades...
E saindo apressado rumo a Matriz para embarcar seu
importante cliente – patrono da cadeira de º 35 da Academia Parnaibana de
Letras - arrematou:
- Você pode até ser
castigado...
• Crônica
de Pádua Santos, feita para o Almanaque da Parnaíba, edição de 2019, com
ilustração de Fernando de Castro, dedicada à memória do reverendíssimo Bispo D.
Paulo Hipólito de Souza Libório, patrono da Cadeira de nº 35 da Academia
Parnaibana de Letras.
• Foi
escrita especialmente para o Almanaque da Parnaíba, edição de 2019. Como
terminou o ano e o Almanaque não saiu, vai publicada através do Blog do Elmar
Carvalho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário