domingo, 19 de julho de 2020

UMA ROUCA VOZ MUDA QUE ECOA; E ATÉ HOJE, ENTRE NÓS, MUITO RESSOA

Cidade de Barras (PI), onde nasceu David Caldas        Fonte: Globo/1Google


UMA ROUCA VOZ MUDA QUE ECOA;

E ATÉ HOJE, ENTRE NÓS, MUITO RESSOA

Um poema a David Caldas

Chico Acoram Araújo


1

Oh, valente (in)ditoso conterneo!

Da fazenda Morrinhos, lá em Barras

do rio Marataoan, tu vais às garras

do tal mundo enfrentar, e consenneo

 

2

com os teus ideais tu combateste

o inimigo tervel e abismal.

Para tanto, fundaste seu jornal

“O Amigo do Povo” onde escreveste,

 

3

com extrema coragem, as ideias

republicanas no Brasil Reinado,

e artigos em defesa do açoitado

povo; daquelas gentes tais plebeias!

 

4

David Moreira Caldas que nasceu

a vinte e dois de maio, mil oitocentos

do ano de trinta e seis, um dos rebentos

mais ilustres que Barras mereceu.

 

5

O pai, o capitão já da reserva,

Manuel Joaquim da Costa Caldas

desejava que o jovem ainda em “baldas”

cuidasse da fazenda que preserva.

 

6

Mas sua atenta mãe, a Manuela

Francisca Caldas, que tanto o adorava

já notara que o filho só pensava

mesmo estudar; havia, pois, apoio dela.

 

 7

De fato, os pais percebem que o rapaz

aptidão não tinha pra cuidar

das terras da falia, pois entrar

nesse mundo das letras é capaz.

 

8

David, em tenra idade, já chamava

bem a atenção dos seus pais e parentes

por ser ele dotado de fulgentes

talentos para as letras que almejava.

 

9

Pra tanto, o capitão Manuel pede

a colaboração do professor

e Juiz de Direito, o Doutor

da Comarca daquela antiga Sede.

 

 10

Francisco Xavier Cerqueira é quem

muito ensinou ao jovem: o francês,

 o difícil latim, o português,

 a então arittica, também.

 

11

Vendo que seu rapaz era portento

e aplicado na escola, o Capitão

Manuel, mesmo com pouco tostão,

mandou-o pra Recife, e com talento

 

12

terminar seus estudos tais voltados

assim pra Faculdade de Direito

de Olinda, e com bastante tal deleito

dos pais, David partiu bem nos meados

 

 13

de janeiro de mil dos oitocentos

e sessenta, mas para desencanto

do jovem estudante que em tal pranto

recebeu más nocias com lamentos

 

14

da morte do seu pai, o que ocorreu

dia primeiro do mês daquele agosto

do citado tal ano, a contragosto,

retornou para terra onde nasceu.

 

15

Dias depois, já estava na fazenda

Morrinhos, lá em Barras, pra ajudar

sua mãe e da irmã, pra bem cuidar

das terras e do gado; e da vivenda.

 

 16

Mas pra David virar um lavrador

não tinha nem sentido; vocação,  

apenas o pendor do coração

para as letras, e ser um professor!

 

17

Diante desse drama, ele deixou

a administração daquela terra,

e foi ser professor – (pois se desterra)

de letras mesmo em Barras, que ansiou.

 

18

Em doze de dezembro do ano mil

oitocentos sessenta e dois, com linda

moça, David desposa com Benvinda

de Queiroz, com registro no civil

 

 19

e no religioso, ali na igreja

que de Nossa Senhora Conceição,

com alegrias de grande uma emoção

de seus familiares; e assim seja!

 

20

No ano seguinte, o jovem jornalista

encontra-se morando em Teresina

escrevendo em jornal: é sua sina;

já como redator e colunista.

 

21

Com Deolindo Moura, começou

a sua profissão com competência,

desvelo, maestria e inteligência

no tal “Liga e Progresso”, onde brilhou.

 

22

Entretanto, convém esclarecer

que em mil e oitocentos e cinquenta

e nove, o jovem Caldas já frequenta

seu próprio “O Arrebol” para escrever.

 

23

Ano mil oitocentos e sessenta

e cinco, o jornalista e literato

escreve nesse “A Imprensa”, do cordato

Deolindo, de forma sempre isenta.

 

24

Além de servidor daquela então

tal província, ele atua no jornal

“A Imprensa”, do partido liberal,

como um bom redator na profissão.  

 

25

David, um jornalista respeivel,

tornou-se um Deputado que atuante,

palavras eloquentes, e elegante

criticava um Governo deplovel.

 

26

A favor dos mais pobres, requereu

que esse imposto da cima [da] urbana

fosse pra construir boa choupana

de telha para o povo que o elegeu.

 

27

Homem de visão frente de tal era

desejava ruir as construções

de casas em palhoça em quarteirões

da nova Capital cheia de tapera.

 

28

Defensor incanvel das pessoas

mais carentes, o jovem deputado

agora passa ser muito odiado

pela elite potica, com “loas”.

 

29

Perseguido por gente poderosa

(começa esse infornio do guerreiro

perdendo, com um ato bem certeiro,

dois cargos no Governo) – e tal danosa.

 

30

Por combater o então Governador,

demitiu-se do cargo conquistado

por um concurso blico do Estado,

pois no Liceu foi grande professor.

 

31

Sendo um homem correto, coerente,

e íntegro, resolveu abandonar

o emprego do Liceu por ponderar

que o Governo era sim, seu insurgente!

 

32

Além disso, David sem aliados

decidiu-se sair do seu Partido

Liberal por motivo, bem sabido,

da falta de um apoio dos coligados.

 

33

David que sem desforra, nem infensa

com esse conhecido movimento

partidário, decide (em desalento)

demitir-se, também, da tal “A Imprensa”.

 

34

O bravo David Caldas, muito “afoito”

em prol dos ideais republicanos,

funda o “Amigo do Povo” lá nos anos

mil oitocentos de sessenta e oito.

 

35

Em “O Amigo do Povo”, no seu ano

quarto, edição datada pelo dia

quatorze de janeiro já dizia

 na capa ser jornal republicano.

 

36

Via-se, no seu jornal, que o valoroso

jornalista detinha fundamentos

convincentes nos temas e comentos,

combatendo tal Rei inglorioso.

 

37

Dentre os principais vultos do passado,

David Moreira Caldas se desponta

como o mais combatente, pois bem conta

 Monsenhor Chaves sobre esse letrado.

 

38

Na época, David Caldas se tornou,

um dos maiores tais propagandistas

dentre os republicanos vanguardistas

do Piauí Província; herói virou.

 

39

Chaves disse também, com seus treze anos

David já carregava no seu peito

 ideais da Reblica, e no leito

seu sonhava o Brasil sem os Tiranos.

 

40

Entretanto, aperturas no seu lar

o nosso herói bastante amargurou,

sem rendas e salário bom, passou

a ser um professor particular.

 

41

Para agravar mais ainda sua vida,

 o “O Amigo do Povo” que, a contento

não lhe dava uma renda pro sustento

 próprio e sua falia tão querida.

 

42

David era um bom homem, desprendido,

trouxe pra sua casa lá morar

a irmã e quatro filhas a chorar

por causa do cunhado falecido.

 

 43

Ano mil oitocentos e setenta

e três, David dá um nome intrigante

para seu jornal, com um instigante

dístico “Oitenta Nove, que ele inventa.

 

44

O inusitado nome é alusivo

ao tal número da última edição

ou seja, oitenta e nove, desse então

bom “Amigo do Povo”, e decisivo.

 

45

Nosso Wilson Gonçalves nos revela

que, no exemplar primeiro desse “Oitenta

e Nove”, David faz calorenta

matéria contra o Rei em “desmazela”.

 

46

Dizem que David Caldas era um ser

profético, escrevendo um curioso

artigo sobre um fato auspicioso:

prenúncio da Reblica, há de ver!

 

47

De fato, em dois dos picos do artigo

mencionado, Caldas descrevia

bem que a Proclamação ocorreria

ano de oitenta e nove; assim bem digo.

 

48

Escreveu no jornal a produção

literária de críticas, protestos

ao sistema do imrio, e manifestos:

“República urge, pois, proclamação!”

 

49

Por conta da maria, o jornalista

recebeu cognome de PROFETA

DA REPÚBLICA, que bastante afeta

minha imaginação de cordelista.

 

50

Wilson Gonçalves diz que David ante

aos vis acossamentos e os perigos

desses seus implaveis inimigos,

e a pobreza, tornou-se um delirante.

 

51

Também o levou a um profundo estado

de depressão nervosa, até perdendo

a razão do real, mesmo vivendo

de abstrações; ficando ele isolado.

 

52

Tal fato aconteceu no fechar do ano

desse mil oitocentos e setenta

e sete, onde David qual fundamenta

os princípios de cunho bem insano.

 

53

Essa nova ciência, de evidências

na formação de certa tal trindade

humana, sem sentido, ou com verdade,

os cálculos de certas coincidências.

 

54

A citada trindade era formada

pelo próprio David, Gonçalves Dias,

por Deolindo Moura, em ousadias

em sua teoria que alucinada. 

 

55

Dois anos depois, dia três de janeiro,

paupérrimo, David Caldas falece;

esse republicano bem merece,

no jornalismo, ser ele o primeiro.

 

56

Para finalizar, Chaves relata

que Licurgo de Paiva estava ao lado

do amigo David Caldas, acalmado

nos últimos instantes; vida ingrata!

 

57

Paiva cita que o amigo faleceu

balbuciando os versos do belo hino

“Glória in excelsis Deo, e com atino

bem confessava não ser um ateu.

 

58

Apesar de David ser grande crente

a Deus, em sua morte foi negado

pela igreja calica o legado

de um enterro cristão assim decente.

 

59

A negação da igreja em tal ofensa

foi comprovada pelo grandioso

bardo Celso Pinheiro em valioso

livro que publicou tocante a imprensa.

 

60

“Mas nem a morte fez arrefecer

a vingança dos áulicos” do Imrio

contra o republicano que foi rio

combatente com seu dom de escrever.

 

61

E membro da Irmandade do Santíssimo

Sacramento, David foi condenado

como herege, uma vez que era tratado

como inimigo assim perigosíssimo

 

62

pelo Estado e da igreja lá de Roma,

que negaram direito um bom enterro

no cemitério, dando-lhe desterro

em uma sepultura (sem aroma

 

63

das flores e, tampouco, rezadeiras),

em frente ao Cemirio São José,

debaixo de um antigo grande

 de um bento jato; sem choradeiras.

 

64

Pinheiro cita que essa sepultura

alguém de alma bondosa fez cercados  

de ferro, e que seus ossos exumados

e transladados dessa “cercadura”

 

65

bem para o interior do Campo Santo,

assim como dos corpos dos coitados

protestantes que foram sepultados

nos túmulos daquele tal recanto.

 

66

O translado ocorreu nos anos trinta

do século passado quando a via

recebeu calçamento, assim urgia,

que ali não era pra gente distinta.

 

67

Em sua enciclodia, o competente

Gonçalves nos relata ainda, que além

de grande jornalista, David tem

uma grandiosa obra de patente.

 

68

Escreveu importantes bons trabalhos

de cunho cienfico, poético,

pedagógico, pois bastante eclético

porém, de paradeiro sem atalhos.

 

69

Estrela de primeira tal grandeza,

e que, segundo o erito escritor

Dilson Lages, “David foi grande autor

e cronista de lego” e destreza.

 

70

Lages diz, ainda, que o grande ativista

não está no rol dos grandes autores

em razão da aversão dos seus labores

pela classe monárquica e elitista.

 

71

 Que é preciso pesquisa, pois, com vistas

inserir nosso ilustre jornalista

na galeria e honrada bela lista

dos tais grandes autores beletristas.

 

72

David, sem qualquer vida, era mesmo

talentoso; nasceu pro jornalismo

de vanguarda no tempo monarquismo,

combatendo o inimigo, não sem “esmo”.

 

 

 


2 comentários:

  1. Valeu amigo Acoram. Você já era paidegua em prosa e agora em verso. E ainda escolheu uma homenagem por demais merecida. Parabens.

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    1. Chico Acoram Araújo20 de julho de 2020 às 09:05

      Obrigado, meu mestre. Seus ensinamentos me foram muito valiosos. Um abraço.

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