Era uma vez: o encontro da Mentira com a Imaginação
Fabrício Carvalho
Amorim Leite (*)
-Sou a Mentira, rainha das
torpezas, das trapaças e do poder.
-É mesmo? Chamo-me Imaginação.
Crio mundos da fantasia e educo às pessoas através da boa-fé e brandura.
Revelo, de forma simples e diferente, a complexa realidade da convivência
humana.
-De que adianta a boa-fé, se o
mundo e os humanos são feitos de mentiras, hein, Imaginação?
-Ah, ah, ah! Imagino, sem trair a
verossimilhança das coisas e realidade.
-Ajudo às pessoas a descobrirem
as entrelinhas de seus mundos interiores. Faço as crianças, jovens e adultos
sonharem. Crio mundos imagináveis, lindos quadros, obras de arte, poemas,
contos de fadas e super-heróis. O belo.
-Enfim, molduro à existência dos
aflitos, ajudando-os a superar seus traumas e dilemas. Fantasio estórias para
brincar e contar coisas. Trago o bem. Sou parte de um plano maior do criador.
-Como é? Plano do criador? Desde
quando também não faço parte? E às úteis mentiras sociais? Não seja
arrogante...
-Já imaginou se os humanos
falassem verdades e fossem honestos o tempo todo? E se disséssemos todas as
verdades sobre os outros? Certamente, o mundo e a raça humana não conviveriam
por causa do aumento das guerras e tristeza.
-Então, mesmo falseando falar
verdades, acha que me engana, rainha das torpezas? Veja o personagem Pinóquio,
criado para mostrar às crianças, jovens e adultos o lado ruim de mentir.... Com
sua história, vimos os males trazidos por você.
-Pimbinlimpimpim. E Pinóquio mostrou
que toda mentira tem perna curta. Não é verdade, Mentira?
-Entendo o seu lado, querida
irmã, mas, eu sou do bem. Veja só: se você falou do lado ruim da mentira, é
porque há um bom, também...
-Quê? Querida Irmã? Do bem? Já
vem mentido outra vez. Não sou sua irmã e não venha com esta que é do bem. Seu
pai é o diabo! Com este, não possuo parentesco!
-E você desvirtua, sem um pingo
de ética, meus contos de fadas. Queres me iludir? Estes falsos afagos não me
seduzem...
- Quando crio Pinóquio e a Rainha
má, de Branca de Neve, trago simples alegorias e lições para combater você e a
sua falsidade, entendeu? Ou possuí memória seletiva?
- É mesmo? Obrigada pelo sincero
elogio. Porém, continuando com o assunto... Verdadeiramente, a Rainha má, de
Branca de Neve, é linda, representa o belo. E, como Aristóteles “o belo é o
esplendor da ordem”.
- Lá vem você, novamente. Usa,
com atrevimento, uma velha falácia de autoridade, para tentar legitimar suas
torpezas e distorcer a essência da personagem criada por mim!
- Pobre Aristóteles, está se
mexendo no túmulo! O belo não é isto!
- Ah, é? A propósito da história.
Recordo-me de uma cena linda na qual a Branca de Neve saboreia docemente uma
rubra e brilhante acerola presenteada pela bela Rainha má. Admita, irmãzinha?
Não é verdade?
-Bum! Peguei você, de novo, a
Mentira tem perna curta mesmo! Quem, afinal, vai dar ouvidos a você, não é?
- O pseudofruto era, na verdade,
uma maçã envenenada vermelho-sangue oferecida pela mentirosa bruxa e Rainha
má...
- E, quer saber mais? A verdadeira
perfeição e beleza vem depois, quando o príncipe encantado, com seu amoroso
beijo, salva a meiga Branca de Neve do terrível feitiço!
- Está bem! Sinceramente,
Imaginação, é culpa da minha memória ruim, estou ficando um pouco cansada
diante séculos e séculos de ofício ...
-É verdade! Pelo menos, nisto,
concordamos: a memória é a maior inimiga da mentira. Bom! Espero, o quanto mais
rápido possível, dê entrada em sua aposentadoria. Adeus!
(*) Advogado e escritor.
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