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NEM SÓ DE MAZELAS A VELHICE É
RECHEADA
Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal (afcsousa01@hotmail.com)
Uma
das vantagens de ser idoso não está na cara, obviamente, mas no fato de, mesmo
que apenas exista há mais tempo que eles, querendo ou não, sendo deficiente
visual ou não, viu e, até mesmo, enxergou bem mais que os menos velhos. Muitas
de essas vivências ou experiências teriam ocorrido quando aqueles sequer eram
células vivas, corpos e almas animados – ainda que para religiosos convictos, nos
planos de Deus sempre estão aqueles que Ele já conta como possibilidades, aos
quais quer trazer à vida, gerados ou, ainda, não –, outras, por sua vez,
enquanto adentram à velhice e os outros vivem sua juventude.
Sobre
experiência por que passei, há pouco, no umbral, já pisando na soleira da
velhice burocrático-legal, é que gostaria de falar. Perguntei a muitos, mas vou
fazê-lo a você que verá, lerá ou, talvez, venha a tomar conhecimento deste
questionamento por qualquer outro meio; alguns não conseguiram ou não quiseram
adiantar nada a respeito; outros comigo concordaram depois de afirmar que não
conseguia pensar no assunto de modo diferente. É o seguinte: quando da
involuntária expatriação de milhares de venezuelanos, uns amedrontados e
perseguidos, outros fugindo da fome e da miséria que, certamente, os castigaria
se ficassem em sua terra, sendo governados por um ditador tirano, será que para
cá vieram, para nosso estado, somente índios e, além disso, pedintes,
esmoleres, indivíduos sem prática em nenhuma atividade laboral que pudessem
oferecer à população? Pois é assim que os vejo, onde quer que os encontre,
notadamente, nos cruzamentos das vias de maior fluxo, pelas quais transito com
assiduidade, homens, mulheres, novos, velhos, crianças, exibindo cartazes que,
possivelmente, alguém para eles confeccionam, nos quais se identificam como
índios, e que passam fome; a condição de mendigos não fazem questão de esconder
ou negar, tanto que, nos locais escolhidos, estão sempre, ou estendendo as
mãos, ou sacudindo canecas, prontas para receber óbolos. Pode ser que existam,
mas ainda não vi nenhum deles mostrando cartazes – a propósito, quem os leva
para as ruas, como escolhem os pontos que deveriam dividir, quem os recolhe
quando encerram o expediente trabalhista? – nos quais se ofereçam como
prestadores de algum tipo de mister, ocupação ou serviço prático e/ou útil,
capaz de transformá-los ou os fazer candidatos a uma categoria formal de
trabalhador.
Será
que, de fato, fizeram bem eles em deixar seu país para se submeterem a
sofrimentos, possivelmente, semelhantes, tão humilhantes quanto aqueles que
sofreriam naquelas, ou, simplesmente, não tiveram outra alternativa? Será que,
quem sabe na sua velhice, os que, forçosamente, tiveram que vir para cá como
emigrantes, verão seus filhos conseguirem recuperar a dignidade, a honra e a
pátria que um ditador, um dia lhes roubara? Quantos deles ainda sonham em
voltar para casa?
Mas,
à parte as mazelas que a velhice nos permite experimentar e compartilhar com
todos, inclusive os mais novos, também ela nos contempla com momentos
humorosos, como este que me foi contado por um velho amigo: numa partida de
futebol amador que assistia, meu companheiro teria se encantado com um jogador,
tipo longilíneo, magro e alegre, que se movimentava, rapidamente no gramado a
uns quarenta metros dele; conversava com outros torcedores, elogiando a
performance do magricela bom de bola. Terminado o primeiro tempo do jogo, como
é de praxe, os atletas se dirigem aos vestiários para o sagrado descanso do
intervalo. Ao se aproximar do meu amigo, só então este teria percebido que se
equivocara, pois o lépido e fagueiro craque não era mais nenhuma criança. Ato
contínuo, falando com amigos e apontando para o jogador, que passava ao largo,
teria dito: - ora, ora, e eu pensando que estava olhando e torcendo para um
jovem; que nada, o homem é um velho, cara de maracujá de gaveta, bem mais idoso
do que eu.
Não me contou meu idoso e enganado amigo, se teria aproveitado a ocasião para parabenizar o velho e bem conservado atleta que o teria encantado, ou se, com inveja da figura, nem ficara para assistir ao segundo tempo do jogo.
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