sábado, 7 de janeiro de 2012

Uma doença chamada paixão


ROBERTO VELOSO (*)

Nos últimos dias temos assistido a fatos supostamente envolvendo a paixão. Sejam eles crimes ou suicídios. Pessoas desesperadas pela ausência de reciprocidade de sentimentos cometem agressões físicas, algumas chegando ao homicídio, ou então ceifam a própria vida.
Do ponto de vista penal, quando alguém movido pela paixão comete crime, não há nenhuma isenção de pena, ao contrário, o crime pode ser entendido como praticado por motivo egoístico, ou seja, se a pessoa não pode ficar com o agressor, então não poderia ficar com ninguém.
Partindo dessa premissa, neste artigo tratarei sobre a paixão enquanto doença e na próxima semana tratarei sobre os remédios. A paixão como doença tem como fundamento a impossibilidade. Segundo a psicologia, a principal característica é a carência de afeto, colocando o apaixonado num estado permanente de eminência de rejeição, de ansiedade, de preocupação quanto à perda.
O caso exemplar da paixão é relatado pela mitologia grega. Segundo a lenda, Apolo era o deus mais belo, senhor das artes, da música e da medicina. Após derrotar Píton, vangloriando-se de seu enorme feito, fez pouco de Cupido, o deus do amor, dizendo-lhe que suas flechas eram muito mais poderosas do que as do pequeno deus.
Cupido respondeu que as flechas de Apolo eram poderosas porque podiam ferir a todos, mas as dele, Cupido, podiam ferir ao próprio Apolo. Cupido, então, lançou uma flecha de ouro na ponta, no coração de Apolo, provocando neste uma paixão desenfreada por Dafne, uma bonita Ninfa, filha do rio-deus Peneu. Em Dafne, Cupido lançou uma flecha com chumbo na ponta, suscitando uma repulsa por Apolo.
Apolo passou a perseguir a amada, enquanto essa fugia dele em um profundo sentimento de rejeição. Dafne, não suportando a perseguição e a repulsa que sentia por Apolo, pede a seu pai que a mude de forma, no que é atendida e é então transformada em uma árvore, um loureiro. A partir desse momento, Apolo passou a usar uma coroa de louros como símbolo de sua paixão não correspondida.
A ciência, por sua vez, ao estudar a reação do corpo humano ao sentimento da paixão, aponta que há a produção de substâncias químicas que alteram o humor e o comportamento.
De acordo com estudos, o cérebro do indivíduo que está apaixonado produz altas taxas de feniletilamina. Essa substância estimula a produção de dopamina e norepinefrina, que são estimulantes cerebrais e estão relacionadas também à sensação de bem-estar e à perda da capacidade de análise comportamental do parceiro. É a mesma sensação de quem ingere anfetaminas.
Está associada também às sensações da paixão a produção de uma alta taxa de serotonina, substância química encontrada em grande quantidade em abacaxis e chocolates.
É certo que há a produção de adrenalina pelo cérebro e pela glândula adrenal, sendo um inibidor natural do apetite e do sono. Tal estado de excitação causa danos na memória e na concentração, provocando prejuízos no trabalho e nos estudos. Para o neurocientista Renato Sabbatini, tudo isso não faz mal se for por um período curto de tempo. Começa a virar uma doença se durar mais de três meses.
Para o cientista, a paixão é uma emoção positiva e sendo assim, uma pessoa apaixonada não consegue cometer um crime, portanto, seria errado se falar em crime passional. O que causa a prática de crime é a combinação irresistível de ciúme, sentimento de perda e raiva, os quais ativam a produção de outras substâncias químicas, em especial o cortisol, que é o hormônio do estresse.
É fácil assim concluir que esse sentimento que pode causar tantos danos não é amor, porque o amor tudo enobrece. Conforme a primeira carta de São Paulo aos Coríntios, capítulo 13: “O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece. Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal; Não folga com a injustiça, mas com a verdade; Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.

(*) Roberto Veloso é presidente da Associação dos Juízes Federais da 1ª Região

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