CAMPO MAIOR
E A INDEPENDÊNCIA DO PIAUÍ
Valério Chaves Pinto
Desembargador inativo do TJPI
Transcorridos
mais de 190 anos da Independência do Brasil em 1822, até hoje a data da
proclamação no Piauí permanece em processo polêmico, sem se saber
verdadeiramente a quem pertence a prioridade desse fato histórico para efeito
de se fixar com exatidão a data em que oficialmente deve ser comemorado o Dia do
Piauí - 19 de outubro ou 24 de janeiro. Do pouco que se tem notícia, nem sempre
se pode afirmar de modo convincente,a que verdade comanda as esparsas e
deficientes narrativas e interpretações existentes.
Pesquisadores,
historiadores e tantos nomes ilustres das letras piauiensesdo passado e do
presente fiéis aos ensinamentos históricos tais como: Monsenhor Joaquim Ferreira
Chaves, Odilon Nunes, Arimathéa Tito Filho, Wilson de Andrade Brandão e Abdias
Neves, contribuíram de modo louvável com seus estudos, análises e pesquisas,
porém não há até hoje uma interpretação segura capaz de elucidar a verdade.
A polêmica
maior se acende entre Parnaíba, em cuja sede houve uma conspiração em 1821 visando
mudar a ordem política da província; e Oeiras então capital (1761),cada qual reivindicando para
si a primazia da Independência do Piauí,apresentando como justificativa os
acontecimentos revolucionários contra as ordens portuguesas ocorridos em 19 de
outubro de 1822 e 24 de janeiro de 1823, respectivamente.
Nos bastidores dessa polêmica há ainda aqueles
que defendem a tese de que a verdadeira independência do Piauí foi proclamada
no dia 13 de março de 1823 em Campo Maior, com a sangrenta Batalha do Jenipapo onde
brasileiros e portugueses lutaram,em campo aberto, em defesa da causa nacional
do Brasil - fato ignorado por muitos brasileiros de outras regiões.
O professor
e pesquisador Arimathéa Tito Filho, dando sua contribuição em homenagem ao debate
do tema, afirma com o fulgor de sua inteligência, em entrevista concedida à
Rádio Difusora de Teresina em 1979 que, na verdade,“houve duas proclamações da
Independência no Piauí. A primeira - diz ele, foi feita no dia 19 de outubro de
1822, em Parnaíba, quando o Major Manuel Clementino de Sousa Martins, liderando
um movimento insurgente, rapidamente sufocado, derribou os portugueses liderados
pelo Major João José da Cunha Fidié; e a segunda foi feita em Oeiras em 24 de janeiro
de 1823 pelo visconde da Parnaíba, que naquele tempo não era Visconde, era
apenas o cidadão Manuel Clementino de Sousa Martins”, (sobrinho e genro do
Barão da Parnaíba), o qual, à frente de uma conspiração em favor da secessão de
D. Pedro I como Imperador do Brasil, proclamou a independência no Piauí.
Sabe-se que
quando Fidié teve notícia de que a Independência tinha sido também proclamada em
Oeiras, marchou com sua tropa de Parnaíba no dia 28 de fevereiro para combater
os oeirenses, porém encontrou em Campo Maior a resistência de um improvisado
exército brasileiro, travando-se ali a já referida Batalha do Jenipapo,seguindo
depois para Caxias no Maranhão, donde passou a resistir durante três meses,
sendo finalmente vencido e preso, curiosamente, pelas tropas de Manuel de Sousa
Martins.
O historiador pernambucano Francisco
Augusto Pereira da Costa conta que após o entrevero do Jenipapo, parte da
bagagem de guerra de Fidié,constituída de munição, armas, dinheiro e os
despojos da vila de São João da Parnaíba, foi furtada pelos soldados das tropas
do capitão português Alexandre Pereira Nereu e levada para a cidade de Sobral no
Ceará onde foi feita a apreensão e colocada em hasta pública, em maio do mesmo
ano. Este fato fez com que Fidié,diante do enfraquecimento de seu arsenal,
decidisse ser mais prudente desistir de marchar sobre a cidade de Oeiras.
(Cronologia Histórica do Estado do Piauí, vol. II, pág. 307).
Como se pode
ver, o assunto é polêmico, naturalmente gerando nos parnaibanos e nos oeirenses,
um certo aborrecimento toda vez que se cogita de revisar a história do Piauí
para se acabar com a dúvida ou com a inverdade sobre qual data se deve
comemorar o Dia do Piauí – 24 de janeiro, 19 de outubro ou 13 de março.
O que não se pode esconder, contudo, é
que os parnaibanos foram heróis, cívicos e imbuídos de grande patriotismo ao combaterem
as forças portuguesas através de um movimento liderado pelo juiz de fora João
Cândido de Deus e Silva e pelo coronel Simplício de Sousa Dias.
Os oeirenses também foram heróis e patriotas.
Tudo é uma questão de interpretação histórica que cabe aos historiadores
proclamar a verdade.
A propósito
dessa discussão, merece destaque uma tese muito interessante defendida pelo
historiador piauiense Wilson Brandão, segundo a qual, o nosso primeiro e grande
patriota da independência foi Antônio Maria Caú, escrivão da junta de Fazenda
da Província. Caú era um desses tipos populares que as vezes pregam ideias e as
vezes levam ideias à frente. Foi ele quem chefiou uma trama revolucionária para
mudar a ordem política da Província sob o falso pretexto de jurar logo a
constituição portuguesa que simulava defender, mas o alvo principal, segundo
F.A. Pereira Costa na obra citada, página 253,“era depor o governador Elias José Ribeiro de Carvalho e a
instalação de uma Junta Provisória, da qual seria presidente o cirurgião
Francisco José Furtado”.
O
desembargador Cristino Castelo Branco, uma das maiores mentalidades do Piauí,
acha por sua vez, que a verdadeira independência se verificou no dia 13 de
março de 1823 com a Batalha do Jenipapo. O mesmo ponto de vista é defendido
pelo não menos respeitado historiador piauiense Monsenhor Joaquim Chaves e pelo
pesquisador e jornalista Arimathéa Tito Filho. Na opiniãode ambos, já
falecidos, uma terra se liberta pelo heroísmo de seu povo. E foi,efetivamente, o
heroísmo dos campo-maiorenses que deu a Independência do Piauí e do Brasil.
Abdias Neves
em sua monografia intitulada A Guerra de
Fidié, (1907, pág. 6), destaca o seguinte trecho do ofício em que o Dr. João Cândido de Deus e
Silva,acusado pelos portugueses de não punir os sediciosos em Parnaíba, enviou ao
Presidente da Junta Provisória do Governo em Oeiras, no dia 30 de setembro de
1822:
“A melhor, a
maior, a mais rica, a mais populosa parte do Brasil tem-se declarado a favor da
causa da Independência; como persuadir-nos que o resto não siga a mesma causa?
Ou quererão os povos olhar de sangue-frio o seu país dividido, seguindo o Sul
um sistema e o Norte outro? Não me persuado que tal seja possível”
Em verdade, há aqueles que
criticam o movimento patriótico dos parnaibanos, achando que a ocasião não era
propícia para se manifestar contra a ordem vigente. Há ainda os que se
insurgiram contra os reveses ocorridos às margens do riacho Jenipapo, em Campo
Maior.
Mas é o próprio Abdias Neves quem
responde tais críticas:
“...toda
reforma, seja social ou religiosa, precisa de mártires e desse batismo de
sangue para se impor e criar raízes na alma das multidões”.
De nossa
parte, longe da capacidade de análise e observação histórica que o assunto
requer, diríamos que Campo Maior, através da bravura de seu povo, heroicamente
demonstrada no episódio do Jenipapo, com certeza, está inserida no contexto desse
pensamento.
José Itamar Abreu Costa
ResponderExcluirO desembargador Valério, descreve com riqueza de detalhes a nossa pequena, porém grande participação do nosso heroico povo em prol da indepêndencia do Brasil. Continue a pesquisar e encontrará informações consistente e que ajudará esclarecer de uma vez por toda, algumas dúvidas que ainda existem em relação äs datas.
O que aconteceu a Elias José Ribeiro de Carvalho depois de 26 de Outubro de 1821? Voltou a Portugal?
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