CONSEGUI PROVAR QUE SOU SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL
Virgílio Queiroz
Cheguei à Secretaria de Administração do Estado do Piauí com
um objetivo; me recadastrar. Estava com medo de ter meu contracheque retido
(como aconteceu por diversas vezes. Obs: não vou contar os motivos. Outro dia,
quem sabe).
Havia um vuco-vuco na sala antes, onde servidores estavam
desesperados por conta do contracheque retido. O meu não estava e eu passei
direto. Documentação incompleta: faltava a portaria de 1915 (quinze mesmo!) do
meu início de trabalho. A Amanda me disse: “vá buscar e venha na parte da
tarde. Quatro horas não tem seu ninga”. Voltei no horário marcado. Agora o
vuco-vuco era no auditório. Eu disse: valei-me Virgem Santíssima! E agora, dona
Aurora!
Ei, Amanda, você disse que não ia ter seu ninga! Aqui está
entupetado de gente! Ela disse: “é, pois é... eu num contava com isso não. Mas,
peraí, vou resolver”. Olhou minha documentação e tudo ok. “Olha, seu Virgílio,
fale com a Patrícia”. Morena linda, apesar de sisuda. Ela me disse que era
melhor eu vir no outro dia pois, às 17:00h, ela iria embora. “E aí, eu vou
enfrentar todo esse balacobaco de novo?”, perguntei-lhe. “Amanhã, chegue às
oito horas. O senhor não enfrentará fila. Olhei a morena de cabo a rabo.
Parecia não ter defeito (rosto, resto do corpo, etc.), tirando a sisudez.
No outro dia, às 07:55h, eu estava rente. Não havia tanta
gente na sala onde houvera o pipoco no dia anterior (umas 50, talvez). Vi a
Patrícia (linda como ontem). Mostrei-lhe o papel com sua letra, autorizando a
minha ida, no dia seguinte, sem pegar fila. Ela, pela primeira vez, me olhou, e
para minha surpresa e satisfação, pegou-me pelo antebraço e levou-me à sala do
pipoco (acho que, por dentro, ela estava dizendo assim: vou levar esse porra
pra longe de mim). “Fique esperando a chamada. 318, 319!”, ela chamou os
servidores para uma outra sala de atendimento (bem mais vaga).
Olhei minha ficha e vi 320. O guarda disse: “entre, espere
sentado, no ar refrigerado”. Eu respondi que ia ficar fora, pois estava
chegando a minha hora. A Patrícia passou, passou, repassou e necas. Não pegou
no meu antebraço e nem disse nada. Eu perguntei para o guarda: “não vão me
chamar? “. Ele disse: “é por ordem de chegada. O senhor se senta na sala e vai
atendido”. Olhei, a sala tinha recebido
mais gente. Talvez já com 60 ou mais pobres servidores. Esperiquitei-me e
gritei como se fosse o Sílvio Santos: Patríciiiiiiiia! Ela, me olhou e disse:
“o que foi?”. Ela podia ser a mulher mais bonita do mundo, mas o meu orgulho
estava ferido. Que barato é esse! Eu sou o 320! Você chamou o 318 e o 319. E
eu!? “Espere na sala”, disse-me. Eu disse: “nem morta, dona Carlota, eu não
saio dessa porta!”. Ela cedeu, eu entrei.
Um rapaz(?) me atendeu: “os documentos, por favor” (disse,
sem antes soltar um sorrisinho matreiro). Virou-se, espreguiçou-se sensualmente
e disse para uma colega ao lado: “menina, estou com uma gripe daquelas! Tomei
nimesulida, recebi até injeção no bumbum. E continuo gripada (quis escrever
gripado). Ele pegava os meus documentos, passava a mão num papel higiênico
amassado e embebido em álcool, assuava o nariz. Toda porcaria possível. De vez
em quando ele bichichava: “ui! A internet caiu! Oh! (esse “oh” era a
identificação, além da mãozinha levantada até a altura do ouvido). Depois de
uns 20 minutos que me pareceram duas horas, ele bateu as mãozinhas e disse:
“pronto, finalizei”. Passei, ainda, por outra sala, mostrei novamente os meus
documentos (parecia o tempo de estudante universitário quando tive que ser
identificado pela PF ). O rapaz, outro rapaz (desta vez, rapaz), disse que o
recadastramento estava concluído.
Estou em casa, acamado. Rouco, com febre, gripado. Tomei um
antigripal, nimesulida, acebrofilina (injeção no bumbum, não), tudo contraído
pelo rapaz do “ui e oh”. Mas, confesso, estou feliz, consegui provar que sou
servidor público do Estado do Piauí.
Amigo Virgílio,
ResponderExcluirVocê não é gente não, cara.
Você é o cão em figura de gente.
Abraço,
Elmar
Excelente! Depois de alguns dias de profundo abatimento, hoje levantei com o pé esquerdo(isso mesmo, sou canhoto). Recebi algumas boas notícias e arrematei a minha manhã com um sorriso largo ao ler a crônica bem humorada(e vingativa) do bom Virgílio. Somente com humor para atravessar esse período em que aventureiros se abancam nos cargos públicos pra nos fazer de bestas. Provar que estamos vivos, quem já viu isso! E ainda correr o risco de morrer ao contrair uma gripe terrível do atendente! (desculpe, da atendente). Gostaria de ter autorização para publicar o excelente texto no Folhas Avulsas, mestre! Acho que ninguém foi agravado no texto, com exceção do seu criador.
ResponderExcluirSem dúvida acho que posso autorizar, em nome do meu amigo de longas datas Virgílio Queiroz.
ResponderExcluirFico feliz que vc tenha acordado com esse contagiante bom-humor.
Eu também irei passar por esse calvário, creio que um pouco mitigado, em virtude de provável convênio com a minha repartição.
Abraço,
Elmar