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Histórias de Évora. Os novos voos do Poeta
Hércules Amorim *
Em novo rol de escritos, como sempre escancarados à crítica e
imaginação de quem os lê, o escritor e poeta piauiense Elmar Carvalho nos leva
agora a uma viagem de retorno a nossos primórdios, colocando em capítulos a
forma, tonalidade e expressividade já demonstradas em outras obras de sua
verve.
Trata-se de Histórias de Évora, a cidade imaginária onde
personagens vivem intensamente os períodos mais belos e conflitantes - ora felizes, ora tristes e mesmo hilários -
das suas formações comportamentais e, principalmente, humanas. São histórias e
estórias da pré até perto da pós-adolescência de jovens que não se contiveram
em apenas ver a vida passar, mas colocaram nela molho apimentado, fatos e
acontecimentos que, vivenciados, nos trarão à boca o licor da saudade.
Não dá para dispensar observação singular ao estilo.
Constatar que Elmar alguma vez passou pelos bancos da escola Parnasiana,
embora, modestamente, não se aprofunde ou guie-se pela construção fidelíssima
de textos buscados e rebuscados. Por isso, a fazer aquilo que se torna pura
expressão do antagonismo latente entre dois movimentos literários de peso: cai
não só na linguagem bem apurada dos plenos sentidos, mas também no Romantismo,
aliás bem apropriado à época em se desenrolam as histórias de sua fictícia – e
tão concreta – Évora.
Elmar, à certa altura, nos deixa confusos sobre o personagem
que ele próprio encarna. Mas no conjunto, fica evidente o que mais o retrata,
especialmente para os que trafegam no seu cotidiano literário e no seu
cotidiano de cidadão simples, mas, não raro, meticuloso. Os textos, com
esmeradas narrações, deixam patente o simbolismo e sonoridade das palavras,
como se cada uma represente uma imagem, uma foto. Não poderia ser diferente. Se
em alguns parágrafos o leitor estranhar um possível exagero da forma, para
melhor deduzir o conteúdo leia ou releia José de Alencar e veja se seria
possível descrever a silhueta da Virgem dos Lábios de Mel sob a luz da lua
cheia com apenas dois ou três adjetivos, e sem nenhum superlativo.
Os escritos, vezes eruditos, em Histórias de Évora, são
colocados com o objetivismo ou a subjetividade necessários à narração dos
eventos picantes, trágicos ou tragicômicos que vivenciaram seus protagonistas.
São eles quase sempre sedimentados numa paixão efêmera ou naquele amor que de tão
significativo tornou-se quase eterno, para eles e para nós, leitores. Podem se
materializar à vontade no Marcos Mendes Azevedo, no Mário Cunha, no Fabrício e
amigos, cada qual com sua personalidade e seu modo de se comportar nas
histórias da cidade que, em determinado ponto, percebe-se, se compõe numa ampla
faixa de terra sertaneja.
Como em toda obra de estrutura segmentada, alguns capítulos
ou narrativas levam à preferência. Como
leitor, indico singular atenção ao “Dono do Céu” - com sua pernóstica lourinha,
filha, pra variar, de um abastado comerciante -; o “Lendário Zé Lolô” - em sua
indescritível feiura –; a “Balzaquiana”, de farta e bela memória –; e o
impagável último “ Voo do Pardal”, se é que houve algum anterior. Se houve ou não, fica para outra história,
possivelmente em outra encarnação. Certo é que espocou manchete em “A Batalha”,
periódico eborense, a despeito de que ainda hoje não se tenha notícia sobre a
real situação e o quê de fato está por trás do mistério envolvendo o genial
Eugênio, audaz criador de engenhocas que lhe carimbaram o apelido de “professor
Pardal”, mais tarde somente Pardal.
Ademais, bebam, degustem e curtam o que de melhor nos revolve
aos tempos da meninice e juventude por vezes sofridas, mas sadias, cheias de
traquinagens, descobertas, namoros, flertes fortuitos, alegrias, saudades e gradual
apuração da sexualidade. Tudo isso nos contando como eram diferentes os
interesses dos jovens de há mais de três décadas, em particular a paixão pela
leitura e o bom uso da palavra.
Que todos os leitores se instalem na sua própria Évora. E que
Elmar Carvalho prossiga em suas viagens, sempre nos trazendo boas novidades.
* Hércules Amorim é jornalista
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