27 de dezembro
MULHERES DROGADAS
Elmar Carvalho
Ao caminhar com um amigo, no calçadão da avenida Raul Lopes, contou-me ele que uma enfermeira, casada com um conhecido seu, começou a se queixar de fortes dores de cabeça ao marido. Com esse pretexto ia ao banheiro, onde ficava por vários minutos. Essas desculpas se tornaram frequentes, e cada vez ela se ausentava mais do leito conjugal, às vezes por quase duas horas, no período noturno. Certa noite o marido flagrou a mulher a injetar-se droga, que naturalmente ela conseguia no hospital ou clínica onde trabalhava. Tornara-se ela viciada, ou dependente química, como se diz hoje, de forma eufemística.
Esse caso me fez lembrar um outro, um verdadeiro dramalhão, quase uma tragédia grega, que li nas páginas 112/114 do Diário Secreto, de Humberto de Campos, reeditado pelo Instituto Geia, em 2010, cuja primeira e única publicação data de 1954, também em dois volumes, pelas Edições O Cruzeiro. A anotação diarística é de 4 de janeiro de 1928. Referia-se ao caso de uma filha de um médico, mulher muito formosa. Casara-se ela com um esculápio, que fora, parece, aluno de seu pai. Como um dia sentisse fortes dores, provocadas por uma colite, o seu marido aplicou-lhe uma dose de morfina.
Poucos dias depois a mulher alegou sentir novas dores, que foram se tornando cada vez mais amiudadas, com as consequentes aplicações da droga. Não tardou muito, o marido constatou que ela se tornara uma morfinômana. Entregou-a aos cuidados de um colega, que era tido como especialista em cura de viciados em morfina. Semanas depois, posta sob confissão, a mulher terminou revelando ao marido que o tal especialista era viciado na droga, e que passara a tomar o entorpecente em sua companhia. Veio o desquite, como corolário dessa tragédia familiar.
Com a separação e com o vício do tóxico, a bela mulher descambou para a prostituição, seja para sustentá-lo, seja porque o uso da droga lhe fizera romper os freios inibitórios morais, donde lhe teria advindo o exacerbamento da sexualidade. Os amantes se sucediam em profusão, um após outro, ou mesmo de forma concomitante. O marido não suportando a saudade e a ausência da mulher, terminou por lhe pedir para ser também seu amante, e passou a frequentar sua alcova duas ou três vezes por mês, sob a alegativa de que nunca encontrara uma mulher que se lhe comparasse em desempenho sexual.
Um dia, acidentalmente, a mulher, ao injetar-se a morfina, cuja quantidade de doses aumentara assombrosamente, já chegando a 24 ampolas por dia, aplicou a substância diretamente na veia, o que lhe causou um mal-estar insuportável, com dores e alucinações violentas. Na crise, tentou estrangular um dos filhos. Precisou ser contida por várias pessoas, que lhe amarraram à cama. O marido passou a se dedicar devotamente ao tratamento da mulher, aplicando-lhe os sedativos e medicamentos da época.
Quando Humberto de Campos viu essa bela mulher a desfilar sua beleza em rua do Rio de Janeiro, fazia apenas três dias que ela melhorara da crise a que me referi. Não posso, por isso mesmo, dizer se a mulher do médico, com a ajuda deste, conseguiu vencer o vício. Ante a tragédia que relatou com muitos detalhes, Humberto de Campos finalizou a sua anotação com esta pergunta: “Não estará aqui o arcabouço do meu primeiro romance?”
De meu conhecimento, essa obra (quase) anunciada nunca foi escrita. Acaso tivesse sido, não sei se o grande escritor iria lhe dar um final feliz. Quanto à senhora referida no início deste registro, o meu amigo disse que foi embora com o marido para outra cidade, onde conseguira superar a sua dependência ao uso de tóxico. Portanto, fica aqui o arremate feliz da enfermeira que “conseguiu ficar limpa”, libertando-se do vício que lhe prejudicava o bom convívio conjugal.
Conheço muito dos efeitos das drogas nas pessoas, infelizmente por efeito de laços familiares.Estas se drogaram por perturbações mentais que padeciam. Isto ajudou abrir o portal do inferno para elas. Talvez todo drogado em verdade seja antes de tudo um doente mental.Sem dar valor a sua vida joga com ela como se nada fosse e por não ter noção põe fora tal preciosidade divina. Tudo de depõe contra a auto estima e moralidade acaba com a felicidade dos seres.
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