terça-feira, 9 de julho de 2013

Ruas fervem: 1684, 1835, 1964, 2013


Fonseca Neto

Quatro anos de quatro séculos. Anos de marcantes insurgências nas ruas deste país, cujos sofredores jamais se deixaram adormecer. Pura ideologia da desmemória essa coisa de “o gigante acordou” somente agora. Para o debate, breves pinceladas no painel.
1684: o povo do Estado do Maranhão se levanta e depõe o governador–geral. Os “três estados” assumem o poder e em seu nome proclamam uma Constituição que extingue o monopólio mercantil que oprimia a liberdade dos tratos e impunha exploração vil. Líderes enforcados, Manoel Bequimão e Jorge de Sampaio. Esse Maranhão correspondia à metade da América portuguesa de então, hoje Brasil – e “povo” eram os homens livres. Em 1695 os latifundiários esmagam Palmares; assassinam a liderança de negros quilombolas, Zumbi à frente. 1712: Mandu Ladino lidera o levante geral dos tapuias e vaqueiros do Piauí e Maranhão: assassinado c.1717. 
1817: Pernambuco explode insurgente contra o mando português no Brasil. Proclama a República e levanta um governo pelas armas sonhadoras das ideias francesas da Revolução. Os líderes, padres Miguel Joaquim (fuzilado) e João Ribeiro (suicídio). Decretou-se a extinção do “império do despotismo até seus últimos vestígios”. Intento de República que refloresceria na Confederação do Equador, 1824, culminando com o fuzilamento da figura maior, frei Caneca do Amor: na cadeia, por isso, no Piauí, o poeta Leonardo e o dr. Deus e Silva. 
1835: cabanas amazônidas levantam-se, insurgentes, na região do arquipélago marajoara, baía de Guamá, Belém, Pará. Eles? Índios, fazendeiros menores, negros, pobres livres e despojados em vis condições de vida. Depõem governos provinciais, assumem o comando. O Império manda tropas destruí-los. Intenso o massacre que, afirma a historiografia, até 1840, trucida cerca de 30 mil pessoas.
1839: balaios, vaqueiros, negros, publicistas liberais, levantam-se irredentos e conflagram Maranhão e Piauí. Revolução espalhada como fogo com táticas de guerrilha. Todos os ermos do sertão em armas abolindo até câmaras. Império assustado manda esmagá-la e o encarregado é o coronel-político Luís Alves, que arrebata Caxias. Cinco mil negros se autodeclaram livres. O líder destes, Bento Cosme, enforcado; brancos anistiados. O vaqueiro Raimundo Gomes, que abriu a “bastilha” da Manga do Iguará, sumiu.
1848: ainda Pernambuco incandescendo de revolução; agora é a  “praieira”. Querem mudanças radicais, distribuição de terras aos que não as tinham; cunho é liberal-radical. O tacão da “ordem” mata milhares de insurgentes. Liderança pega prisão perpétua. 1925, com Prestes, contra as oligarquias, milhares de legionários andam 26 mil quilômetros. 
1964: “família” marchando “com Deus, pela liberdade”; o povo na rua derruba um governo inclinado a encaminhar “reformas de base” na estrutura social brasileira. É militar o braço que golpeia, apoiado pelo partido da oposição civil (UDN), mídia e Fiesp. 
1984: rios de gente nas praças em comícios clamando por eleições diretas para presidente e o fim da ditadura. Setores da chamada classe média apoiando. Desapontamento: enquanto as ruas se enchiam, lideranças negociavam (Tancredo Neves), nos quarteis, a derrota da PEC das Diretas; ficaram as indiretas.
1992: aos milhares, jovens, sindicalistas e militantes partidários, depois a mídia, mobilizaram até milhões de patrícios bradando “Fora Collor” de Mello, acusado de corrupção. O Congresso o tirou. E hoje não há dúvidas que ele só caiu porque não comprou deputados e senadores em seu apoio.
2013: brasileiros enchem ruas, de novo puxados pela classe média (agora o estrato mais alto, segundo Datafolha), empregada, incluída. Tem o calculado apoio de políticos conservadores e sobretudo da mídia e do empresariado: Fiesp à frente. É confessa, e justa, a busca de qualidade de vida, a partir da mobilidade urbana, caótica; contra a corrupção dos agentes públicos. Há sinais de rechaço às organizações do movimento social; queima-se bandeiras vermelhas. Calados e murchos, de vereador a senador, juízes, “os políticos” quase todos. Incisiva a ritualística da quebra de ícones. 

Brevíssimos rabiscos para lembrar as principais e tantas e quantas vezes brasileiros encheram caminhos, eitos, campos, ruas e praças, animados em tomar sua história nas próprias mãos. Bons projetos. Roubados quase todos. Bons, tirante 64 e a queima das bandeiras da cor do amor e da vida. Infovias da sedição!?? Ruas reais. Ótimo. Mas só enquanto desafiarem o coro dos contentes: OBG TN.  

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