DA EXALTAÇÃO À MELANCOLIA
Jacob Fortes
Ainda ecoa pelo país afora, sobretudo nos meios urbanos, a
retumbante derrota da seleção canarinho para os alemães. A derrota — que
ocasionou sentimentos de tristeza, indignação e fez prantear a muitos — chegou
a ser adjetivada por alguns como assombrosa: colisão entre feitos do passado e
o fracasso do presente cuja avaria principal consistiu em murchar não apenas a
bola, mas o ufanismo nacional.
Aos que, movidos pela paixão do futebol, prantearam a derrota
do seleto time, ressalto que neste Brasil, recheado de brasis, há razões muito
maiores para estear, senão o pranto, a indignação profunda. Evidentemente
refiro-me à indignação daqueles que não pensam apenas em si, que não pensam
apenas neste ou naquele esporte, mas no país como um todo. Essas razões não precisam
ser elencadas de modo cabal. Basta olhar o diário da TV: violência urbana
demarcada pela pena de morte decretada pelos celerados; a deplorável situação
dos hospitais públicos; o transporte, nas grandes metrópoles, onde os
trabalhadores são submetidos ao calvário de viajar, por longas horas, em trens
e ônibus sucateados, comprimidos aos moldes de vagões boiadeiros.
No “país do futebol”, o orgulho maior de ser brasileiro não
está, exatamente, em vencer um campeonato mundial, mas na felicidade geral alicerçada
em alto índice de desenvolvimento do país. Somente a educação pode assegurar,
de modo peremptório, esse desenvolvimento. A educação sempre vence; o futebol
nem sempre. A inclusão social se faz primordialmente por meio da educação, não
unicamente por meio da bola: caminho sinuoso e estreito. O tijolo que alicerça
a prosperidade de uma grande nação não se chama bola, mas livro. “Um país se
faz com homens e livros”. A bola não pode ter primazia sobre os livros. Os
livros darão aos brasileiros todas as oportunidades, inclusive de poderem
comprar ingressos e não apenas permanecerem do lado de fora dos estádios
olhando os turistas estrangeiros adentrarem, frajolas, entoando cantos
efusivos, alguns flertando com Vinicius: ”Olha que coisa mais linda mais cheia
de graça... que vem e que passa num doce balanço a caminho do mar”.
Agora que o antitérmico germânico fez baixar o estado febril
da exaltação futebolística brasileira, deixemos que a atonia da derrota se
transforme em assomo de esperança por uma prosperidade nacional demarcada não
pela bola, esta pode bambolear, murchar, mas esteada nas colunas inexoráveis da
educação. Quanto mais conhecíveis e atraentes forem os caminhos das escolas
tanto mais incognoscíveis serão os caminhos dos presídios. Preferível ser
derrotado no futebol a ter que ser campeão de violência urbana e de falta de
saúde pública para todos. Que as forças do povo se aglutinem não apenas em prol
do futebol, mas, principalmente, para que a educação brasileira prospere em
messe, se fortaleça cada vez mais. Quando a obrigação com a educação atingir o
patamar de devoção em que chegou o futebol, ninguém mais irá maldizer a
escuridão. Nessa ocasião até o insigne compositor Waldeck, o “Gordurinha” irá
refestelar-se e repetir para os seus colegas lá do assento sobreceleste o que
lhe sucedera na terra: “eu perdi a mocidade com os pés sujo de lama, eu fiquei
analfabeto, mas meu fio criou fama”.
O excesso de luz que sobeja no futebol, míngua na educação:
que redime muito mais e enseja prêmios nobeis. Pena que o país, que se
notabilizou pelo futebol e carnaval, ainda não tenha sido laureado com tamanha
comenda. O futebol por vezes faz parecer que a bola é a “Estatua da Liberdade”
brasileira, mas a verdadeira liberdade, em forma de caneta, somente as escolas
podem modelar mediante o uso de matéria prima intangível.
Que os acessos de delírio e sonhos febris que acometem o
futebol possam infectar a educação, pois assim a nacionalidade brasileira
poderá engalanar-se com a taça de maior distinção honorífica, o NOBEL.
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