terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

COGITAÇÕES


COGITAÇÕES

Jacob Fortes

Há momentos em que a mente abandona o seu posto de vigilância e, entre prostração e calundu, mergulha em profundos e silenciosos devaneios.  É uma circunstância inesperada. Numa introversão indefinida se põe a ruminar sobre quase tudo: o ontem, o hoje, o amanhã, enfim, um cortejo de vultos pardacentos dentre os quais figuram as vitórias, que tonificam; as derrotas, que deixam o travo; a desopressão pelos benefícios recebidos e concedidos; a compunção pelos atos malévolos (quem nunca os cometeu, ainda que involuntariamente, que se professe imaculado), mais das vezes acesos, martelando, fazendo o seu autor purgar em arrependimentos. É o seu jeito paciencioso de vingar-se.

Enquanto perdura o alheamento letárgico, a mente se detém nas suas escavações particulares fazendo desfilar o cortejo das legendas nevoentas: saudades, de pessoas e coisas; lembranças: esquivas, desgastadas, memoráveis; a carta fechada do porvir; o jardim da mocidade — que se dizia eterno, imarcescível, — progressivamente emurchecido ante o escoamento incontornável dos anos. E o filme segue exibindo legendas múltiplas que se alternam entre a melancolia, a taciturnidade, a alacridade.

Mas, assim como desperta o corpo que se estira em sesta dormitiva, os devaneios também acordam.  A mente, como que alfinetada, estremunha-se de súbito e dá-se por encerrada a introspectividade.

Reativado o radar da mente o nauta, que se houve retido por falta de bússola, dar prosseguimento à faina de navegar. Restabelece-se, então, a rotina; o discernimento reassume o leme. 

Este enunciado, ainda que exprima apenas o imaginário do narrador, é factível; pode acometer a qualquer um. É o que sucede aos que apascentam o olhar na pradaria do vago ou nas baforadas de um cigarro.   

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