Torre de Babel. Fonte: Google |
Quando religião vira desgraça
José Maria Vasconcelos
Cronista,
josemaria001@hotmail.com
Topei convite para ministrar palestra
a grupo de jovens de uma igreja. Coloquei-os em círculo. Cada membro passaria
adiante a mensagem que eu ditara ao ouvido do primeiro da fila: “O Senhor manda
dizer que você pode melhorar o mundo”. Quando a mensagem chegou ao último
ouvido do grupo, pedi-lhe que a repetisse em voz alta. A mensagem não condizia
com a que eu enviara pela primeira pessoa do círculo. A experiência provava
quanto a comunicação vira babel, quando a linguagem é mal interpretada, provoca
litígios e desgraças coletivas.
Religiões, muitas vezes, pregam o
oposto do que diziam seus fundadores. Jesus nunca falou em gays, apenas que
“uns são naturalmente; outros se fazem pelo reino de Deus”. Nem obrigou
celibato a seus discípulos. Ele se concentrava nos pobres, doentes e pecadores.
Não aprovou escravidão de negros e índios, na piedosa intenção de os batizarem.
Jesus não demonizava gays e pagãos, mas a elite religiosa da época, que
sufocava os fiéis com pesados tributos e exigências: “Guias cegos, que coais
mosquitos, mas engolis camelos!” (Mateus, 23-24). Não ensinou a demonizar
bruxos e apóstatas, torturando-os em fogueira, repetindo carnificina do império
romano.
Maomé elevou o status das
mulheres, em sua época; alguns islâmicos clérigos, entretanto, mutilam as
genitais das mocinhas e impõem a burka. O carismático Maomé nunca aprovaria o
desmanche de monumentos sagrados nem asssinatos em massa, em nome de Alá, como
pratica o Estado Islâmico. Buda, provavelmente, ficaria em choque com apartheid
imposto à minoria Rohingya pelos budistas de Mianmar.
No Antigo Testamento, judeus
consideravam-se a raça nobre de seus patriarcas, de um Deus, único, invisível.
A raça desprezava pagãos, não os permitia no Templo de Jerusalém nem os
saudavam nem comiam com eles, ao contrário de Jesus. Hoje, judeus cultivam mais
tolerância: muçulmanos guardm a sexta-feira sagrada; cristãos, o sábado ou
domingo.
Fundadores de religião comportam-se
como visionários ousados e carismáticos, cuja inspiração moral se transforma em
ensinamentos voltados para seus próprios interesses. Até montam teatro de
ataque assassino que aplica golpe na garganta; a peça ensanguentada vira leilão
de 8 milhões de reais. Não é o Jesus dos evangelhos.
O Ocidente transforma-se, cada vez
mais, secular, mundano, “sem religião”, talvez pelo avanço do materialismo
exacerbado, a cultura do bem-estar, egolatria e desmonte das virtudes. O
despojado e virtuoso Mahatma Gandhi confessava admiração a Jesus Cristo, porém
se escandaliza com o mau exemplo dos cristãos. Durante séculos, leis
eclesiásticas não permitiam casamento entre cristãos e judeus. Hitler fora
educado nessa apartheid.
Convido os mais afastados de religião
a se permitirem um círculo de leitura dos evangelhos e Atos dos Apóstolos. Ao
menos isto. Ali se encontram as bases do espírito de Jesus. As mensagens podem
perturbar o entendimento, mas, só de se darem as mãos e ouvidos, vale a pena
buscar o sentido da vida.
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