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REFLEXÕES SOBRE A POESIA
Paulo de Tarso Mendes de Souza
Escritor, professor e advogado
De todas as artes, a mais bela e abissal, a mais expressiva e difícil é, sem dúvidas, a poesia. Isto porque se dirige ao coração, para comover -
"da ampla Igreja relembro a majestade/ das novenas de maio a suavidade .../tem trinta anos a dor que em mim se expande!";
à imaginação, para exaltar -
Te vejo sob os Arcos da Lapa/e elevo-me no pecado do adultério/do desejo que da alma desata/nos sonhos que estou a te ungir/semanalmente ressonhados sob mistérios/sem corrigir-me do vício de ti;
e à razão, para persuadir -
"não venhas me dizer/que o amor é verde ou azul/Quem disse que o amor tem cor?/Deixa de ser besta, Maria/e verás que a fantasia/só vai te fazer chorar/Desperta-te, abre os olhos/cai na real, Maria". Sejamos, sempre, homens feitos de poesia.
Quando digo poesia, penso não só na poesia escrita, mas também na poesia das coisas, dos dias, da vida. A poesia da amizade que construímos diuturnamente. A poesia que considera o tempo. A poesia que canta a transcendência. A poesia dos que se atrevem - "a aeromoça/abre os braços/e mostra as saídas de emergência .../e eu a sonhar//que ela abrisse/as pernas e mostrasse/as entradas de quintessência".
Como disse o poeta Manoel de Barros, "me agradam mais aqueles que se atrevem do que aqueles que se atêm(...)". É por isso que sempre rogo a Nossa Senhora da Escuridão, que me perdoe por gostar dos deseróis, amém!
Poesia é tema amplo, tão antigo quanto a história, talvez até mais antigo que esta, sendo a forma primal e primária das línguas, embora só discretamente presente na vida da maioria. Como disse Ben Jonhson, a poesia "fala um pouco acima de uma boca mortal"`. É que o homem vive em eterna tensão por saber-se transitório. Daí a necessidade de libertar-se do momento presente, que se esgota em si mesmo. Quando fracassamos nesse esforço, é como se perdêssemos nossas raízes, porque em nossa condição humana, impossível durarmos sem elas. Fundamental, assim, a sabedoria de transformar o agir de ontem em algo que se fazendo visível hoje, assegure, também, sua permanência no amanhã. Ao fazermos dessa forma, nos colocamos um pouco acima da mortalidade.
Eis o sonho que deve seguir em frente. E quão belo é um sonho quando adquire vida própria, rompendo as amarras da incredulidade, para tornar-se, enfim, realidade. Mas o que é um sonho liberto de seus sonhadores? Eu vos digo - torna-se poesia que ecoa pelos cantos nebulosos da mente, clamando pelo carinho da mulher vista diariamente sob os Arcos, para transformar-se em vida, sentimentos, amores.
Que os atos de hoje, do agora, possam definir e bendizer o porvir. Que bela palavra - porvir. É ele o impulso que agiganta todos nós, personagens do espetáculo da existência. Nossa convicção é a de que o amanhã não é senão a estreia de uma grande peça - trágica ou cômica - para a qual estamos e sempre estaremos ensaiando.
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