A GALLÁTICA TUTOIA
Elmar Carvalho
Por ocasião da solenidade de lançamento de meu livro PoeMitos
da Parnaíba, entre vários amigos, como o prefeito Zé Hamilton, os poetas
Alcenor Candeira Filho e Wilton Porto, o jornalista Bernardo Silva, vários
confrades da Academia, encontrei Antônio Gallas Pimentel, que conheço desde o
início de minha chegada a Parnaíba, no começo da segunda metade da década de
setenta. Ele era professor de inglês, jornalista e diariamente uma crônica sua
era transmitida pela Rádio Educadora, a mais antiga do Piauí e, então, a única
emissora da cidade, através da bela voz do locutor Gilvan Barbosa.
O professor Joaquim Furtado de Carvalho, primo de meu pai,
que falava o inglês fluentemente e era um grande causeur, recomendou-me fizesse
amizade com o Gallas. Um dia, vencendo a minha timidez de ainda adolescente,
fui à sede do jornal Folha do Litoral perguntar se o hebdomadário aceitava
colaborações literárias.
Estavam na redação o Gallas, B. Silva e o Xixinó, um grande
compositor; bem entendido, compositor tipográfico. Tinha extraordinária
habilidade de recolher cada tipo de sua respectiva caixa e colocá-lo no
componer, na composição dos vocábulos e períodos. Gallas era professor de
minhas irmãs Maria José, Josélia e Joserita. Em acidente automobilístico, em
que, entre várias outras pessoas, eram passageiras minhas três irmãs, Josélia
veio a falecer.
No dia do seu enterro, o diretor suspendeu as aulas para que
os estudantes pudessem ir assistir à missa na catedral e acompanhar o
sepultamento. Nesse dia, foi lida na Educadora uma crônica do amigo Gallas,
sobre minha irmã, o que muito comoveu a nossa família.
Às vezes, na boca da noite, eu e o B. Silva íamos até a casa
dele, para ouvirmos um tangos, pelo rádio, enquanto degustávamos umas três
doses de boa pinga. Eram uns belos e vibrantes tangaços, como dizíamos. Um dia
o Gallas me convidou a ir até sua residência ouvir uns tangos e tomar umas duas
ou três talagadas de calibrina. Para me convencer, como se estivesse falando de
uma raridade quase impossível disse: - Elmar, eu tenho até dinheiro!... Verdade
que naqueles tempos inflacionários e de vacas magérrimas, dinheiro era um tanto
difícil e arredio.
Certa feita, eu e ele fomos ao aniversário do Moreira, meu
contemporâneo no Campus Reis Velloso - UFPI, hoje ocupante de importante cargo
de carreira jurídica do governo federal. Fui convidado ou me autoconvidei a
fazer uso da palavra. Entretanto, na empolgação do discurso terminei chamando o
Moreira de Monteiro, ato falho provocado porque um meu colega de turma tinha
este último nome.
A mulher do Moreira, me aparteou, e perguntou como é que eu,
que me dizia amigo de seu marido, trocava o seu nome. Não me dei por achado, e
respondi que o fizera de propósito, para saber se estavam prestando atenção a
meu discurso, e, ao mesmo tempo, porque Monteiro se referia a monte, e o
Moreira havia atingido a culminância da cultura e do saber. As palmas espocaram
e preferi encerrar o discurso nesse momento estratégico.
Já estive com o Gallas na sua bela e histórica Tutoia,
outrora importante cidade portuária da região do Delta do Parnaíba. Contemplei
as suas lindas praias, como a de Andreza, e a sua exuberante lagoa, ornamentada
de coqueiros e outras árvores. Nessas ocasiões, tomei agradáveis banhos nos
córregos e rios do percurso.
Certa época correu a notícia de que Tutoia estava prestes a
ser soterrada pelas dunas; mas, pelo visto, ela continua impávida e inabalável
como a conheci. Sempre que vou a Parnaíba tenho encontrado o Gallas. E sempre
na condição de bom amigo, e de mestre de sábias libações.
1º de abril de 2010
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