A SOMBRA, O ENCOSTO, A BELEZA E O
FRUTO
Elmar Carvalho
Num determinado local de
Teresina, entre curioso e perplexo, observei, com a ajuda de minha mulher, que
uma senhora, sem carro e sem garagem em sua casa, colocara umas grandes e
pesadas pedras na rua, sobre o asfalto, de modo que tive que parar meu veículo
antes de sua casa, o que me impediu de usufruir a sombra da árvore que havia
sobre a calçada. Não foi difícil concluir que ela se incomodava com o fato de
que alguém pudesse se beneficiar com a sombra de sua bela amendoeira.
Não podendo ela impedir que
alguém contemple a beleza verde, elegante, esgalhada do vegetal, impede,
agredindo a postura municipal e o Código de Trânsito, que alguém ponha seu
carro à sua sombra refrescante. No seu egoísmo, certamente ela entende que a pessoa
estaria tirando proveito indevido do que ela acha ser seu, como se ela pudesse
ficar mais pobre com esse fato.
Por que, então, ela não colhe a
sombra da amendoeira e armazena no seu depósito ou dispensa para vendê-la, já
que Teresina, tão quente, tão ensolarada, seria propícia à comercialização de
sombra? Será se isso é fruto da inveja, já que ela não tem carro, e por esse
motivo fica chateada que alguém ponha seu automóvel à sombra de sua árvore.
Suponho que se ela não pudesse colocar as grandes pedras, terminaria por
cortá-la, exterminando com suas machadadas a beleza e a sombra da amendoeira.
Se ela fosse condenada a se
transformar em árvore, acredito que escolheria ser um mandacaru, que não dá
sombra nem encosto. Não, talvez ela preferisse ser um arbusto seco e espinhento
da caatinga, porquanto um mandacaru nos enternece com a sua beleza insólita e
espinhenta, e ela, certamente, nada deseja conceder, nem mesmo a beleza que
porventura pudesse ter.
O egoísmo dessa mulher é árido,
inútil, uma vez que nenhum proveito ela tira de seu gesto, a não ser a
satisfação subjetiva de sua própria mesquinhez. Talvez seja amarga, cheia de
ressentimentos contra tudo e contra todos. A sua atitude me fez lembrar, por
contraposição, de uma lenda árabe, que desejo repartir com meu eventual leitor.
Um velho estava plantando uma árvore que só frutificava após décadas. Um
sultão, que ia passando, admirou-se daquele gesto de desprendimento ou de
loucura, e indagou ao ancião o motivo que o levava, em sua provecta idade, a
cultivar aquela morosa fruteira.
O velho respondeu-lhe que não
estava plantando para si, mas para os outros, para seus filhos e seus netos;
que se outros não tivessem feito anteriormente o que estava a fazer ele também
não teria degustado tão saborosos frutos. O potentado, boquiaberto com a
resposta, deu ao homem uma vultosa soma em moedas de ouro. O ancião levantou as
mãos e o olhar para o alto, e agradeceu a Deus pela dádiva, e o bendisse porque
a árvore, mesmo antes de nascer, já lhe estava dando frutos.
Como eu gostaria que essa
senhora, que tenta impedir a sua árvore de ser generosa, de acolher os outros
com o refrigério bendito de sua sombra, pudesse recolher em sua alma a lição
desse velho tão sábio na simplicidade do seu gesto de plantar uma árvore, para
que os pósteros pudessem fruir do mesmo prazer que ele desfrutara.
21 de setembro de 2010
Excelente lição.
ResponderExcluirImediatamente, lembrei-me de uma tamareira que presenteei à minha mãe. Ela a rega todos os dias, na esperança de que netos e bisnetos se lembrem dela.
ResponderExcluirAbraços e parabéns pelo excelente texto.
Reflexo do egoismo e individualismo humano, que reinam nos últimos tempos.
ResponderExcluirMestre, o egoísmo provoca a inveja e a inveja é a arma que os incompetentes udam para atingir os seus semelhantes.
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