quarta-feira, 31 de agosto de 2011

DIÁRIO INCONTÍNUO



31 de agosto

MARANHÃO, LITERATURA E MÚSICA

Elmar Carvalho

Recebi e-mail do poeta, escritor e crítico literário José Neres, vazado no seguinte teor: “Vasculhando as inúmeras ruas virtuais dessa sempre surpreendente internet, encontrei seu blog. Li vários textos e vejo, como sempre, um estilo primoroso e claro. De quebra ainda encontrei uma bela crônica sobre Humberto de Campos, com direito a citar Tribúzi, meu amigo Lourival Serejo e o Instituto Geia. Isso despertou em mim a vontade de reler seus livros, o que começarei a fazer este fim de semana.” Em minha resposta, disse-lhe que já havia tratado da literatura maranhense em outro registro deste Diário, o do dia 7 de junho deste ano, sob o título de O Pantheon de Caxias. Tempos atrás, tive a agradável surpresa de encontrar estampada na revista De Repente, de grande circulação, uma crítica sobre a minha poesia, em que o professor José Neres analisava, de forma percuciente e arguta, as metáforas e outras figuras de estilo dos meus versos.

Consegui o seu endereço, através do repentista Pedro Costa, editor da revista, e lhe enviei uma carta e livros de minha autoria. Em resposta, disse-me ele que certa ocasião, numa livraria, creio que de São Luís, quase por acaso, encontrou ele o meu livro A Rosa dos Ventos Gerais, em modesta e singela (1ª) edição da EDUFPI, perdido no meio de vários livros, evidentemente mais vistosos e atraentes; começou a folhear o volume, de forma salteada, lendo um poema aqui, outro ali. Segundo ele, surpreendeu-se com a qualidade dos textos, e resolveu adquirir o exemplar. Em consequência, escreveu o pequeno ensaio literário, que muito me desvaneceu, e que faz parte de minha fortuna crítica, parte publicada na 2ª edição de Rosa dos Ventos Gerais, parte recolhida em Lira dos Cinqüentanos, embora de forma não exaustiva.

Após essa boa notícia maranhense, encontrei, na caminhada de sábado, o amigo Paulo Nunes, proprietário do Botequim, que me disse ter a professora universitária Glória Soares deixado em seu bar um pacote para este cronista. No domingo, fui buscar a encomenda. Tratava-se de dois livros da autoria de João Berchmans Carvalho Sobrinho, cujo nome é uma homenagem a seu tio paterno, parente e amigo de meu pai, que era para ter sido o meu padrinho de crisma, o que terminou não acontecendo em virtude do corre-corre e desencontros da vida. Por feliz coincidência, as obras – tituladas “Músicas e Músicos em São Luís: subsídios para uma história da música no Maranhão” e “Texto e Contexto: a comédia musical Uma Véspera de Reis” – são voltadas para a grande música erudita maranhense.

João Berchmans é de estirpes barrenses e regenerenses. Seu pai, o doutor Geraldo Majella de Carvalho, além de juiz de Direito, foi um orador de largos recursos, um articulista de muita capacidade argumentativa, um mestre da conversação e um compositor talentoso, a julgar pela bela valsa, de sua autoria, que ouvi por entre as campas do cemitério da Ressurreição, no dia de seu sepultamento, entoada pela cantora lírica Conceição Farias, que se fazia acompanhar pelos acordes de um violão dedilhado pelo Geraldinho Carvalho, irmão do autor dos livros. Dr. Geraldo Majella e seu irmão Sebastião Aécio de Carvalho, renomado médico piauiense, ambos barrenses, casaram-se com duas irmãs, nascidas em Regeneração.

Os dois livros são produtos de um acurado trabalho investigativo, realizado pelo autor em acervos de Lisboa (Fábrica da Sé e Biblioteca Nacional) e de São Luís (Arquivo Público do Maranhão – Inventário João Mohana). O lastro bibliográfico de sua pesquisa é de muito peso e qualidade. As pesquisas também foram empreendidas em mares internéticos e em acervos musicológicos do Piauí e Maranhão. O fato é que não realizou obras meramente de divulgação, condensando informações de outros livros, mas analisou e interpretou documentos, carreando novidades, aclarando dúvidas e informações controvertidas ou desencontradas, dessa forma contribuindo criativa e decisivamente para lançar luzes sobre a história musical do Maranhão.

Sendo João Berchmans doutor em Música, área de musicologia, pela Universidade do Rio Grande do Sul, com a tese “A Música Religiosa de Leocádio Rayol (1849 – 1909) e sua relação com o Maranhão do século XIX: um estudo musicológico com transcrição, análise e perspectiva histórica”, defendida em dezembro de 2003, e tendo larga experiência no ensino superior de música, seja como professor ou como dirigente de unidade letiva, além de ser instrumentista e compositor, pôde realizar duas obras, que não contemplam apenas a história da música maranhense e não fornecem somente dados biográficos de seus principais compositores, o que já seria de grande monta, mas emitem comentários críticos e analíticos sobre as obras musicais enfocadas, graças aos seus vastos conhecimentos teóricos e práticos, amealhados em longos anos de leitura, reflexões, estudo, magistério, manejo instrumental, regência e composição.

Músicas e Músicos em São Luís: subsídios para uma história da música no Maranhão”, traz uma contextualização histórica em geral e na parte específica de história musical, tanto em relação ao Brasil como a Portugal, mormente porque essa obra remonta aos primórdios da arte musical do Maranhão, reportando-se inclusive à fundação de São Luís, sob o signo do catolicismo, com direito a missa e entoações de Te Deum. As duas obras analisam o gosto musical e os costumes da época, tecendo comentários sobre os gêneros musicais mais apreciados.

Através de sua leitura, ficamos sabendo que na segunda metade do século XIX a música teatral era o gênero mais praticado e apreciado na capital ludovicense. A ópera, sem dúvida, era a arte mais cultivada em São Luís, bastando que se diga que, em 1856, foram encenadas cerca de 56 (cinquenta e seis) dessas composições. De tudo isso podemos concluir que a capital maranhense tinha acentuado refinamento cultural e estava em franca efervescência musical, com caráter nitidamente europeizado, embora alguns compositores já mostrassem um viés algo voltado para o nacionalismo, pois muitos eram bem informados e estudaram e atuaram em outras paragens, sendo que o compositor e regente Francisco Libânio Colás ostentava expressiva circularidade, com músicas suas tendo sido apresentadas em Recife, Salvador, Belém, Manaus, Rio de Janeiro, inclusive quando da inauguração do Teatro da Paz, na capital paraense. Foi figura proeminente do proscênio musical pernambucano, durante muitos anos.

Os dois livros de João Berchmans Carvalho Sobrinho lançam luzes sobre os grandes compositores e maestros da música erudita maranhense, sobretudo as sacras e as teatrais, como óperas e comédias musicais, estas permeadas de matizes populares, pela utilização de maxixes, lundus, polcas e tangos, porém em orquestrações e arranjos eruditos. O autor resgata a trajetória, a música e a biografia de figuras do porte de Antônio Luiz Miró, Vicente Ferrer de Lyra, Leocádio Rayol, Francisco Libânio Colás, João Pedro Ziegler, Elpídio Pereira e Antônio Rayol. Por intermédio de seus livros, acima nomeados, podemos imaginar uma época de fastígio e fascínio musical, em que orquestras sinfônicas executavam músicas maviosas, celestiais, tão diferentes das acachapantes, degradantes “músicas” de hoje, recheadas de tigrões, cachorras e eguinhas pocotós, com apelo à sexualidade mais vulgar e brutal.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

FLAGRANTES & INSIGHTS




FAZENDEIRO DE ALTO COTURNO

Elmar Carvalho

A conversa girava sobre assuntos diversos e aleatórios, quando passou a tratar de heranças, fazendas e outros cabedais. O Reginaldo Miranda, advogado e presidente da Academia Piauiense de Letras, disse da forma mais displicente e humilde possível:
- A minha fazendinha está perto de quatro mil cabeças de gado bovino...
O seu interlocutor esbugalhou os olhos, entre perplexo e exultante, com a progressão geométrica do rebanho do amigo:
- É mesmo?... Pois não é mais fazendinha, já deve ser uma das maiores do Piauí!
O Reginaldo, então, explicou o seu “progresso”:
- Ela está perto, pois ao seu lado fica a fazenda do Borges, que tem quatro milheiros de reses.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

NO REINO DO SURREAL


NO REINO DO SURREAL


II – BASQUETEBOL

Elmar Carvalho

tomaram-me
         tudo inclusive
         o óbolo inútil
         o bolo indigesto
         a bola murcha
         a bala de festim
         a balada calada
                       alada
         mas sem vôo
mas ainda me sobrou
         cabeça para arrancá-la
         e enfiá-la
         na cesta

sábado, 27 de agosto de 2011

PALMAS PARA O TOCANTINS


Elmar Carvalho, Danilo Melo, Assis Brasil, Juarez Moreira Filho e Reginaldo Miranda


Reginaldo Miranda
Presidente da Academia Piauiense de Letras

O governo do Estado do Tocantins realizou um evento literário de grande envergadura, a Feira Literária Internacional do Tocantins(FLIT), que aconteceu entre os dias 25 de julho e 03 de agosto, na Praça dos Girassóis, centro de Palmas, capital do Estado. Por ali passaram e discutiram literatura e ecologia, grandes nomes das letras, tanto em nível nacional quanto internacional. O evento foi comandado pelo jovem secretário estadual de educação Danilo de Melo Souza, piauiense de Parnaíba.
Atendendo a convite dos organizadores, ali estivemos no dia 29 de julho, em companhia dos escritores Assis Brasil e Elmar Carvalho, participando de mesa redonda sobre ecologia e literatura. Fomos bem recebidos e prestigiados pelo secretário Danilo de Melo Souza que, apesar de inúmeros afazeres, esteve conosco durante todo o tempo em que em estivemos no local. Também, vale destacar a receptividade dos distintos escritores da Academia Tocantinense de Letras, partícipes ativos do evento, entre os quais Juarez Moreira Filho, Mário Martins, Odir Rocha, Osmar Casagrande e tantos outros que foram chegando e se achegando. As moças da equipe organizadora, à frente a servidora Adriana Dias, foram de uma gentileza inexcedíveis.
Sobre a nossa participação, primeiro a palavra foi concedida ao acadêmico Assis Brasil, que discorreu sobre literatura e ecologia, trazendo à baila os principais aspectos desse palpitante tema. Depois, em breve síntese, falei sobre a formação histórica do Piauí, a ausência de escolas na fase inicial da colonização, as primeiras manifestações literárias no Estado, a fundação e realizações da Academia Piauiense de Letras. Aprofundando e alargando o debate, falou o acadêmico Elmar Carvalho, também em breve síntese, nominando os principais quadros e obras de nossa literatura, os principais movimentos literários e conclui declamando poemas de Mário Faustino e Da Costa e Silva. Foi bela e aplaudida a participação da delegação piauiense. Esteve em alta o nome da Academia Piauiense de Letras. Também, valeu pelo intercâmbio entre as duas academias.
No final da tarde, a convite do secretário municipal de educação, Zenóbio Júnior, a delegação piauiense visitou a Escola de Tempo Integral (ETI) Caroline Campelo, onde conheceu uma grande iniciativa governamental desenvolvida pelo prefeito de Palmas, Raul Filho. Em companhia do Secretário Zenóbio, da diretora da escola Profa. Leila Roque e de alguns assessores, eu, Assis Brasil e Elmar Carvalho, visitamos todas as dependências da escola, passando por laboratório de pesquisa, sala de informática, quadras esportivas, piscinas, salas de aula, restaurante, auditório, entre outras. Enfim, trata-se de uma moderna edificação que visa a educação em tempo integral. O aluno entra no início da manhã e só sai no final da tarde. É uma feliz iniciativa da prefeitura de Palmas, empreendimento de primeiro mundo. Vale a pena ser visto e deveria servir de modelo para o País. Portanto, por essas iniciativas estão de parabéns o governo estadual e a administração municipal de Palmas. Aplausos para eles. Palmas para o Tocantins.

(Artigo publicado no jornal Diário do Povo, coluna Opinião, edição de 23.08.2011).

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

O PRESENTE


CUNHA E SILVA FILHO 

Para Cunha e Silva, centésimo sexto ano de seu nascimento

O leitor nem imagina o quanto comove a alguém que do próprio pai recebe um presente diferente. Diferente porque nada tem a ver com um objeto concreto de valor, um presente que não é uma camisa nova, um par de sapatos, um terno, um relógio nem outros tantos itens que deixam alguém bem contente por algum tempo. O presente que ganhei há quarenta e sete anos ninguém esquece nunca, pois já se tornou parte espiritual da minha vida. Ele não veio de uma fábrica, de uma indústria nem do balcão de uma loja elegante e sofisticada, dessas que deliciam os empedernidos consumistas de hoje.
O meu presente é atemporal, situa-se na esfera das estrelas e nos planos mais elevados da espiritualidade. Não é feito de matéria-prima, não tem etiqueta, nem foi posto em anúncio de alguma revista vistosa e de impressão impecável, como são estas belas publicações cheias de publicidades e apelos em formas de lindas mulheres com olhares sensuais, e que trazem entrevistas de pessoas famosas do momento.
Meu presente é de outra ordem. Feitos de palavras bem escolhidas e brotadas do fundo do coração. Fez-se de ritmos, de melodias , de musicalidade. Sua intenção, antes de ser estética, é a de exprimir sentimentos ternos, carinhosos, que combinam saudades, lágrimas e esperanças de mistura com uma alguma incerteza do futuro. Também a ele não faltam rimas que em parte ajudam a dar maior cadência ao todo harmonioso.
Presente feito em gênero antigo, de limitados versos. Seu tema gira em torno da partida de alguém que vai para longes terras e para trás deixa os entes que mais preza, bem como outras lembranças: seus pais, irmãos, irmãs, amigos, amores acabados, interrompidos, desejados, sonhados e falhados. Deixa mais: a terra natal, os amigos de sua época, a fisionomia da sua cidade, seu calor, seu sotaque, seus costumes, sua história, sua cultura, seu canto no lar, suas leituras, alguns escritos juvenis publicados em jornais, seus ex-professores, seus parentes, suas ruas queridas, o Parnaíba, o Poti, suas diversões, seus passeios a pé com um primo, suas noites de amor, suas igrejas, sobretudo a de São Benedito, suas construções, o Palácio de Karnak, suas praças, a Rio Branco e a Pedro II, o Liceu Piauiense, o Rex e o Theatro, seus logradouros que aprendeu a amar, seu então único prédio mais alto que dá para a Praça João Luís Ferreira.
Este presente o recebi pouco dias depois que saí de Teresina. É um soneto de meu pai de título “Talismã”. Pode não ser um poema de um grande poeta, mas afetivamente é como se o fosse e por isso tem a perfeição das coisas simples e belas de que gostamos. Os poetas têm lá seu tanto de vaticínio, de profético. Foi publicado no jornal “Estado do Piauí”, jornal para o qual meu pai colaborou durante longos anos com artigos assinados e artigos de fundo. Eu próprio escrevi vários artigos para o velho e extinto jornal de Josípio Lustosa. Do poema tenho ainda um envelhecido recorte que guardo comigo há quase cinquenta anos.Eis o presente de meu pai escrito com as lágrimas da dor da partida de um filho que, com apenas dezoito anos, iria enfrentar a vida no Rio de Janeiro:

O TALISMÃ

Ao meu bom filho Cunha e Silva Filho

Cunha e Silva

Com lágrimas nos olhos te vi partir,
Com lenço branco pra mim acenavas
Da janela do avião a sorrir
Pra mim que, com tristeza, me deixavas.

Logo que o avião voo tomava,
Prolongado adeus me concedeste,
Emotivo, lágrimas enxugava
No lencinho que me ofereceste.

Este lencinho tenho-o guardado
E só quero revê-lo quando chegares,
Um dia, com teu sonho realizado.

O talismã da tua felicidade
É ele, meu filho, e, ao regressares,
Devolver-to-ei com ansiedade. 

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

A POESIA COMO ELEMENTO DE CRIAÇÃO DA ARTE LITERÁRIA



Daniel Castello Branco CIARLINI 

A Emoção cria o Ritmo;
O Ritmo produz a Beleza;
A beleza desperta a Emoção!
Manuel do Carmo.

RESUMO: o presente trabalho tem como objetivo analisar o sentido da palavra poesia e a sua
influência no ato da criação literária. Parte, inicialmente, do conceito aristotélico para então chegar à essência da expressão metafórica do “eu”, diferenciado em três tipos: “eu-social”, “eu-odioso” e “euprofundo”. Trata-se de uma análise científica à base de uma pesquisa bibliográfica de críticos literários como Boileau-Despréaux (1979), Moisés (2003), Ivo Korytowski (2008), Bosi (2006), Machado de Assis (1946) e Carlos Bousoño (1966). Verificaremos que a importância criadora do elemento poético para os textos literários reflete-se não no plano estilístico de uma estrutura concreta, mas através do abstrato, em um dado momento imaginativo de produção, ou seja, exteriorização do “eu”, de cuja voz ativa resulta a própria arte literária.

PALAVRAS-CHAVES: Poesia. Literatura. Criação.

1. Considerações iniciais
Quando estudamos a arte poética, somos conduzidos a apreciá-la sob dois pontos de
vista: Material (concreto) e imaterial (abstrato). A poesia, no sentido explorado deste artigo,
está situada no plano imaterial, adequada à subjetividade, diferente, portanto, das demais
manifestações literárias como o poema e a prosa, que se situam no campo estético, estilístico.
Sendo os dois campos muito vastos – muitas vezes confundidos –, e a poesia uma
manifestação que transcende as barreiras da literatura, incidindo, inclusive, sob as demais
artes, restringimo-nos, pois, a analisá-la em seu aspecto criativo e essencial à produção
literária, como ponto de partida ao entendimento da mudança de seu estado primitivo
(imaterial) à concretude da escrita configurada polivalente e carregada de sentimento.
Conforme veremos, e como dita a concepção tradicional, a poesia é a essência que
conduz o autor à vontade e o leitor à contemplação da arte. Como não está relacionada ao
campo estético, torna-se comum a todo e qualquer ser humano conscientemente são: “A
poesia é algo tão natural que mesmo pessoas sem instrução formal, homens simples do povo,
às vezes se revelam exímios poetas” (KORYTOWSKI, 2008, p. 7).
A problemática que conduz contemplar a poética em dois prismas de entendimento,
embora não comum, ainda hoje se reflete no ambiente de ensino, no que tange o saber básico
do aluno, e a não especialização docente, por confundirem e/ou dar sentido simples ao
conceito histórico, e etimologicamente amplo, da poesia.
Como diz o verbete do dicionário Aurélio (2001, p. 578), a poesia significa, de forma
denotativa: “Arte de criar imagens, de sugerir emoções por meio de uma linguagem em que se
combinam sons, ritmos e significados”; nesta, e em outras tantas definições práticas, ela
aparece relacionada, apenas, a um sentido estritamente material, e sem análise às concepções
individualistas dos estados emocionais que influem de maneira transformada do abstrato para
o concreto. Entendemos, aqui, abstrata, a poesia, e concreta, a sua estrutura poemática, ou
seja, o poema, a prosa literária e seus respectivos gêneros, enfim, quaisquer manifestações
artísticas que têm por limite o apuramento intelectual lírico através das letras.
Nosso objetivo, portanto, será a leitura da poesia, em suas diferentes dimensões, na
construção da literatura. Para isso, trabalharemos um dialogismo entre autores de diferentes
correntes teóricas como Boileau-Despréaux (1979), por sua visão filosófica e à linha de
Aristóteles, Massaud Moisés (2003) e Ivo Korytowski (2008), que seguem a concepção
estruturalista, Alfredo Bosi (2006), pela explanação e teorização, necessárias, das escolas
literárias das quais se expressa a poesia diferentemente, Machado de Assis (1946) e Carlos
Bousoño (1966), pela visualização abstrata e ampliada acerca do fenômeno poético. Estes
autores nos conduzirão a um estudo que enxergará a poesia expressa nos mais diversos
períodos da arte literária, hoje, pelos críticos e teóricos, divididos, a fim de didática, em
escolas; assim, veremos, também, as singularidades da poética e as formas com que se
manifesta nos gêneros lírico e épico, e quando, e até quando, neste, ela está desenvolvida.
Para isso, analisaremos as características e as formas do “eu-poético”, fator decisivo à
compreensão da imaterialidade poética.
Voltando ao campo de ensino, a diferença que não se costuma, portanto, ensinar da
poesia, como elemento abstrato, e do poema, como elemento concreto (objeto literário), por
exemplo, se deve ao fato natural de se entender, em suas etimologias, as duas palavras como
análogas. De acordo com o nosso estudo, o poema se trata, apenas, de uma ferramenta auxiliar
para a expressão do eu-poético (poesia), não obstante, aquele que transmite e indica uma
carga de sentimentalismo através dos signos linguísticos, até então latentes, não
transformados, senão pela interpretação. Para Boileau-Despréaux (1979), a interpretação da
poesia a partir de um objeto literário trata-se de um processo inverso ao ato criativo, já que
tende da racionalidade para a emoção, ou seja, do concreto para o abstrato: “A sabedoria,
expressa em mil escritos famosos, foi anunciada aos mortais, com auxílio dos versos; e por
toda a parte, seus preceitos venceram os espíritos, introduzindo-se pelos ouvidos, e entrando
nos corações” (BOILEAU-DESPRÉAUX, 1979, p. 69-70).
2. Algumas questões
Quando tratamos a poesia sob jugo de algo abstrato, importante é considerar a sua
essência e o verdadeiro sentido da palavra, já indicada pelo conceito aristotélico como
“filosófica e de caráter mais elevado que a história”, o que nos remete aos princípios da
diferenciação entre o universal (a poesia) e o específico (a história): “[...] é evidente que não
compete ao poeta narrar exatamente o que aconteceu; mas sim o que poderia ter acontecido, o
possível, segundo a verossimilhança ou a necessidade” (ARISTÓTELES, 2007, p. 43).
Este caráter universal, na concepção de Moisés (2003, p. 81-2), é atribuído a um
“indivíduo de determinada natureza, pensamentos e ações que, por liame de necessidade e
verossimilhança, convém a tal natureza”. Para o poeta e crítico literário espanhol Carlos
Bousoño (1966, p. 23), a universalidade não está associada aos “pensamentos e ações que, por
liame de necessidade e verossimilhança, convém a tal natureza”, porque “el pensiamento que
en ella reside no es, en postrer esquematización, nuevo”, ou seja, pensamentos e emoções
nada mais são que uma releitura de mundo e de indivíduo, nada há mais de novo.
Horácio chega a comparar, em um sentido mais amplo, os poetas aos pintores, quando
diz: “Os pintores e poetas sempre tiveram o comum privilégio de tudo ousar” (HORÁCIO
apud BOILEAU-DESPRÉAUX, 1979, p. 55), pensamento este reforçado e ampliado pelo
espanhol, anteriormente citado, quando refere que “La pintura menos figurativa, la poesía más
metafórica, existen en cuanto que se refieren a la vida, y pensar lo contrario es ignorar que los
seres humanos no podrían interesarse por un supuesto arte que no los implique de un modo o
de otro” (BOUSOÑO, 1966, p. 28).
A ousadia citada por Horácio é vista por Boileau-Despréaux (1979, p. 41) como “a
habilidade agradável de um pincel delicado transforma o mais horrendo objeto num objeto
fascinante”, logo, tanto para o poeta como para o pintor, a realidade não é tal qual a
enxergamos, mas como queremos ou podemos, através de nossas sensações e emoções,
distinguir ou criar, isto é, na concepção aqui exposta, a beleza que a poesia nos faz perceber
intrinsecamente.
No saber de Bousoño (1966, p. 43), “El término „poesía‟ es más amplio que el término
„poema‟”. E conforme pontuou Hermes Vieira (19--), a respeito do pensamento de Órris
Soares, o fazer literário, mais precisamente o verso (poema), pode tanto ser construído ao
crivo de poesia como não.
Por seu estado lírico e abstrato, a poesia, como expressão elevada da subjetividade,
“tensão dialética entre vários pares, um dos quais constituído de emoção e pensamento”
(MOISÉS, 2003, p. 174), possui, ainda, caráter de modificador da língua, a-narrativo, ahistórico e, por consequência, a-temporal. Partindo, então, deste pressuposto, notar-se-ão
relevantes diferenças da poesia para a prosa não literária, e a sua consonância com os gêneros
literários, pois sendo a literatura uma linguagem que se desenvolve “como uma constelação
de signos carregada duma enorme taxa de subjetividade” (idem, ibidem p. 34), ou “um tipo de
conhecimento expresso por palavras de sentido polivalente” (idem, ibidem, p. 37), não
estranho fica, portanto, classificar a poesia não como produto, mas veículo que conduz a este
sentido. A par e passo disto, chega-se à constatação de que ela age como núcleo literário,
elemento criador que propaga, através das ferramentas que a literatura aplica no campo de
produção subjetiva, o verdadeiro ato criador, a inspiração e o lirismo, transmitidos pelo artista
em um dado momento fecundo de criação; o sentimento transgredido do abstrato para o
concreto. Como afirma Moisés (2003, p. 90), “A poesia está em nós”, ou seja, está num
conjunto de fatores que desencadeiam a sensibilidade do receptor em interação com a obra
vista.
2. Correntes teóricas
Frederich Hegel (1770-1831), filósofo alemão, sob o ponto de vista metafísico, definiu
a poesia como o “reino infinito do espírito” (HEGEL apud MOISÉS, 2003, p. 84). Suas ideias
foram acolhidas pelos literatos da escola do Romantismo, que também entendiam a poesia de
forma imaterial, consoante à própria vida, como afirmou Bosi (2006, p. 96):
A poesia, o romance e o teatro passam a existir no momento em que as idéias e os
sentimentos de um grupo tomam a forma de composições, arranjos intencionais de
signos, estruturas ou ainda, para usar do velho termo rico de significados humanos,
no momento que os assuntos viram obras (grifo do autor).
Nesta mesma linha, e após a febre parnasianista, que se relacionava unicamente à
estética, os simbolistas retomam os valores abstratos da poesia, classificando-a em um plano
ainda maior: O místico; portanto, integrada a uma espécie de “vida cósmica”, diferenciandose, desta maneira, do pensamento da “arte pela arte”.
Conforme destacou Bosi (2006, p. 263):
[...] recusavam-se a limitar a arte ao objeto, à técnica de produzi-lo, a seu aspecto
palpável; ambos, enfim, esperam ir além do espírito e tocar, com a sonda da poesia,
um fundo comum que susteria os fenômenos, chama-se Natureza, Absoluto, Deus ou
Nada.
Embora tenha existido, da idealização do Romantismo até o Simbolismo, um período
avesso à imaterialidade poética, que foi o Parnasianismo, notamos, porém, que esta visão
estética, material, da poesia, não era acatada com unanimidade pelos parnasianos. Assim foi
que Machado de Assis, considerado o maior prosador brasileiro, e um dos maiores
representantes do parnasianismo no Brasil, como crítico, em prefácio à obra de Enéas Galvão,
“Miragens”, contrariou a visão parnasianista ao enxergar que a arte poética não se constitui
apenas da pureza estética, como também do elemento de inspiração que dá vida a uma obra de
arte, do qual denominou poesia; para tanto, aconselhava, nas páginas alheias, o autor àquele
poeta, até então aspirante ao parnaso nacional, Machado de Assis (1946, p. 338-9):
[...] no esmero do verso não vá ao ponto sem cercear a inspiração. Esta é a alma da
poesia, e como toda alma precisa de um corpo, força é dar-lh‟o, e quanto mais bello,
melhor; mas nem tudo deve ser corpo. A perfeição, n‟este caso, é harmonia das
partes.
Aprofundando o pensamento machadiano, Bousoño (1966) alerta que a poesia não está
relacionada à comunicação ou percepção do sentimento, “evocación serena de impresiones y
de sensaciones”, mas à sua contemplação, visto que se acaso fosse sentida, todas as sensações
do autor se refletiriam no leitor de igual maneira e intensidade, Bousoño (1966, p. 21):
[...] la poesía no comunica lo que se siente, sino la contemplación de lo que se
siente. Si el poema comunicase lo que se siente, cuando el autor escribiese que le
dolían las muelas, le dolerían las muelas al lector; cuando escribise que estaba
enamorado, el lector se enamoraria.
Ainda não diferindo deste plano imaterial da poesia, o famoso crítico Middleton
Murry enxergava-a como a “expressão natural dos mais violentos modos de emoção pessoal”
(MURRY apud MOISÉS, 2005, p. 77). Todas estas ideias complementam a base de um longo
período que identifica a poesia como elemento incorporado ao campo do abstrato, e de cujas
bases serão revistas, apenas, a partir do Formalismo Russo e do New Criticism. Estas duas
correntes teóricas e críticas da literatura surgiram no limiar das primeiras décadas do século
XX, na Ásia e na América do Norte, respectivamente, e abordavam a poesia de forma
materialista, “A poesia é linguagem em sua função estética” (JAKOBSON apud FRANCO
JÚNIOR. In: BONNICI & ZOLIN, 2005, p. 95), reverenciando, neste caso, as estruturas
auxiliares que compunham os recursos poéticos como transmissão cognitiva, já exploradas, na
segunda metade do século XIX, pelos parnasianos.
Embora se concentrasse na reflexão da estrutura estética, o New Criticism,
diferentemente do Formalismo Russo, compreendia que além de uma carga puramente
racional, a poesia, não apenas em sua essência como, de igual maneira, à sua significação,
compunha, também, um leque de entendimento situado em um patamar de difícil
classificação, mas que poderia ser percebido num campo racional-emotivo, cujas mensagens
transgredidas em símbolos a tornavam peculiar e, por isso, relevante: “A poesia triunfa porque
tudo ou quase tudo que nela se diz ou se encontra implícito é relevante [...]” (WIMSATT &
BEARDSLEY apud FRANCO JÚNIOR. In: BONNICI & ZOLIN, 2005, p. 106).
Já tendo explorado algumas correntes acerca da poesia, retomemos sua origem
etimológica grega (poiesis), que nos remete a uma imagem abstrata, relacionada ao ato de
criar, aqui entendido, pois, em seu sentido imaginativo (MOISÉS, 2003, p. 81). Aristóteles,
primeiro filósofo a tomar nota do fenômeno poético em estudo, por sua vez, sabia que para o
seu perfeito ciclo, ou seja, autor/leitor, “a poesia reclama ânimos bem dotados ou capazes de
se entusiasmarem” (ARISTÓTELES, 2007, p. 64), em outras palavras, sabia o filósofo que
sendo a poesia um estado emocional do qual o artista torna concreto, esta concretização nada mais é que um apanhado de símbolos que auxiliam, ou provocam, no espectador, sensações
individualistas; ao que pressupomos: A codificação do artista dificilmente será a
decodificação do espectador. A partir disto, constrói-se a distinção entre forma e fôrma, em
que consistindo a primeira em abstração, sentimento, ato criativo; a segunda exerce uma
função concreta, como de ferramenta, de “invólucro” (CORTEZ & RODRIGUES, 2005, p.
61) carregado de elementos que conduzem o leitor a pistas que decodifiquem as angústias e
alegrias expressas pelo autor no ato criativo. Há, porém, críticos que inferem a interrelação
entre abstrato e concreto de tal maneira que, sem as estruturas fônicas, morfossintáticas, ou
mesmo semânticas, “a poesia está morta ou rasteja sem vigor e o poeta não é mais que um
prosador tímido” (BOILEAU-DESPRÉAUX, 1979, p. 46). Em síntese, a poesia, no sentido de
criação, é a arte não transformada, e a sua forma expressa, em verso ou prosa literária, é a
própria arte concluída. Assim, retomemos a afirmação construtivista que impunha que a
poesia “está em nós”, não no objeto, onde experiências e/ou conhecimentos prévios é que
mediam, individualmente, o seu grau de intensidade: “a la transmisión verbal de un contenido
psíquico particular que nuestro espírito ha conocido previamente” (BOUSOÑO, 1966, p. 63).
Para Moisés (2003, p. 217):
A poesia é, ao fim de contas, a procura de uma palavra que, intuída nas brumas do
poema a escrever, se torna o ponto de partida de toda a criação poética: o poeta
desdobra em infinitas metáforas a palavra que não conhece ainda, mas que paira
sobre o seu afã de exprimir-se, como um norte ignorado e implícito, ao qual
estivesse imantado sem saber.
Neste sentido, a poesia surge como o sentimento primitivo e próprio do ser humano,
este, por sua vez, a fim de torná-lo codificado, precisa utilizar de convenções para que ela se
torne expressão.
3. Das características da poesia
A poesia possui em sua essência características que a tornam peculiar em sentido de
transformação da realidade concreta. São elas que a configuram num patamar amplo e não
específico, como é o caso das limitações do verso e da prosa.
Antes de tratarmos de sua primeira característica, que é a de modificadora da língua,
necessário se faz a compreensão do que se é, enfim, a língua.
Para Ferdinand Saussure (2006, p. 24), a língua “é um sistema de signos que
exprimem idéias, e é comparável, por isso, à escrita, ao alfabeto dos surdos-mudos, aos ritos
simbólicos, às formas de polidez, aos sinais militares”. Com este pensamento, o mestre
genebriano da linguística sincrônica deixa claro que a língua, em si, pode se caracterizar, tal
qual já nos foi aqui estudado sobre poesia, de duas maneiras, concreta e abstratamente. Assim,
concluímos que a poesia, como elemento modificador da língua, está relacionada aos fatores
que influem, por exemplo, a transformação semântica que as palavras sofrem através das
figuras de linguagem, expressas tanto na escrita quanto na fala. As figuras de linguagem,
como a metáfora, o eufemismo, a metonímia, entre outras, principais ferramentas que
modificam a língua a partir da poesia,
La necesidad de justeza, de propiedad expresiva es, por conseguiente, el origem de
los procedimientos o sustituciones líricas: es la razón de su frecuencia, tanto em la
poesía escrita como em la hablada; tanto em las composiciones literarias, cuanto em
las frases del lenguaje ordinario (BOUSOÑO, 1966, p. 72, grifo do autor).
estão, segundo o crítico espanhol, presentes não apenas em nossa manifestação literária como,
também, em nossa fala cotidiana, sendo, por isso o motivo pelo qual:
[...] hablamos com metáforas o com esqueletos de metáforas, com onomatopeyas o
com esqueletos de onomatopeyas; gran parte de nuestro léxico és, em efecto, o
sincrónica o etimológicamente metafórica (idem, ibidem, loc. cit).
Moisés (2003, p. 89) também acentuou esta mesma visão modificadora da poesia à
realidade, condição que faz com que entendamos que “a obra toda de um poeta é uma
macrometáfora ou uma polimetáfora”. Para Bousoño (1966, p. 63), este caráter modificador é
que dá o real sentido ao ato poético, a condição necessária para a sua existência: “la labor
poética consiste em modificar la lengua: el poeta ha de trastornar la significación de los
signos o las relaciones entre los signos de la lengua porque esa modificación es condición
necesaria de la poesía”.
“O tempo da poesia é o tempo da palavra” (MOISÉS, 2003, p. 149), com isto, o citado
deixa claro que o tempo explorado na poesia não é o mesmo explorado na história, eis o
motivo de ser considerado “a-temporal” ou, antes, “a-histórica”; o tempo na dimensão poética
está mais relacionado ao “carpe diem, a efemeridade da existência, a saudade do passado, as
incertezas do futuro, enfim, tudo quanto constitui, desde sempre, matéria de angústia e
meditação [...]” (idem, ibidem, p.147, grifo do autor) que se refletem através da decodificação
dos signos linguísticos. Usemos, pois, uma citação que, apesar de se relacionar ao gênero do
poema, não declina a visão ampliada à prosa literária, Moisés (2003, p. 149-150):
[...] o tempo da poesia se manifesta na enunciação das palavras que constituem o
poema; a sucessão de vocábulos articula-se num tempo que não é histórico, nem
psicológico, nem mítico – é um tempo imanente, gestado pela enunciação dos signos
verbais e numa seqüência irrepetível, pois cada poema é único.
Conforme veremos no capítulo seguinte, a análise das diferentes formas de
manifestação do eu-poético pode nos levar ao pensamento de que o eu-social, por exemplo,
localizado no campo da poesia épica, por situar o leitor em um plano histór ico-narrativo, não
sustente o caráter “a-histórico”, e por cantar os anseios de uma nação, não o situe em um
estado “a-narrativo”, todavia, valemo-nos da expressão que dita que o “eu-poético” não influi
sobre o tempo em seus sentidos específicos, ou seja, nas três dimensões conhecidas:
Cronológico, psicológico e mítico; o tempo poético é mais amplo, ele está como “substância
da poesia (ou/e do poema), o tempo da poesia (ou/e do poema), o tempo no qual a poesia
transcorre, não o tempo a que se refere, nem o tempo gasto na leitura” (MOISÉS, 2003, p.
147-8), sua análise, portanto, tende, sempre, no campo da poética, para uma quarta e única
dimensão, agregadora das demais dimensões, embora, com elas, não se confunda: “o tempo
da poesia pode conter laivos de cada uma das três dimensões, sem identificar-se com qualquer
uma delas” (idem, ibidem, p. 148). No geral, o tempo da poesia segue uma regra: “principia
no tempo histórico e finaliza no mítico” (idem, ibidem, loc. cit). É como se pudéssemos, ainda
na visão de Moisés (2003), dizer que a poesia se movesse em um tempo, mas esse tempo não
pudesse ser medido pela História, porque está localizado na enunciação das palavras, estas,
por sua vez, estabelecem vínculos à “natureza rítmica, emotiva e conceptual ou semântica”
(MOISÉS, 2003, p. 150), o que nos faz recordar o já dito acima, em que a poesia não é
produto, mas veículo que conduz à expressão do sentimento.
Em resumo, a quarta dimensão, que configura o tempo da poesia, é a da dialética,
razão pela qual se utiliza dos elementos emotivo, rítmico, semântico e, até, gestual.
4. Das diferentes formas de manifestação do eu-poético
Na construção poética, existem dois “eus”. Embora o núcleo da poesia seja o “eu do
poeta”, em outras palavras, o impulso sentimental que conduz a emoção tornar-se explícita,
analisaremos aqui o “eu-poético” (a emoção explicitada), meio este com que o “eu do poeta”
usa para tornar-se expressivo, forma com a qual o artista vê, se enxerga e se expressa no
mundo: “um „eu‟ tornado objeto de um „eu‟ sujeito” (MASSAUD, 2003, p. 140); neste caso,
objeto, o eu-poético, sujeito, o “eu do poeta”. Como este artigo tem por finalidade a expressão
da poesia como ato de criação, eis que necessário se faz analisar o “eu-poético”, por ser ele o
“eu do poeta” manifestado.
Através dele, o autor, de certa forma, “dialoga” com o leitor. Trata-se da representação
interior, a forma com que captamos a nossa realidade e a exprimimos, e que na visão de
Bousoño (1966), constrói-se em três estados interrelacionados: o conceitual, o sensorial e o
sentimental. Estes estados, na linguagem de Moisés (2003), recebem nomes diferentes: “eusocial”, “eu-odioso” e “eu-profundo”; nomenclatura esta que, aqui, utilizaremos. Embora
separados pelos autores, cada um deles, em apuração artística, tendem para uma mesma razão,
“revelar o que há de belo, de hediondo e de trivial o que há no mundo o que é nosso”
(CORTEZ & RODRIGUES, 2005, p. 88), papel este que configura a poesia como um todo
refletido em palavras. Sobre este todo, Moisés entende que “A Poesia não aprisiona o todo,
mas a sua imagem refletida num espelho, a imagem reduzida do todo da realidade, a
condensação do real com todas as suas partes originárias” (2003, p. 220).
Em primeiro caso, o “eu-social”, manifestado na épica, o escritor se coloca em contato
direto com o mundo, não prevalecendo, nele, a essência individualista (intimista), mas os
fatos e as cotidianidades que influem sob sua percepção de existência. Neste sentido,
observam-se as inércias e ascensões que caracterizam os ditames sociais, e o “eu” coloca-se
na dualidade de aceitação ou rejeição, qualidade esta, inclusive, que explica o ser ou, antes, o
“eu”, inserido numa estrutura sociológica ambígua, própria da estrutura psicológica,
diferenciando-se dela, porém, pela transportação desta visão interna para um contexto
histórico e em sintonia com o meio ambiente. Em outras palavras, o escritor reflete a sua
realidade sob realidades congêneres, buscando explicações através da natureza, crenças ou
mitologias, a razão que o esclareça como parte de um todo ou mesmo o entendimento deste
todo; vê-se, pois, com isso, uma preocupação com o externo, com o “não eu”, que, para
Moisés (2005), implica numa “dilatação do „eu‟”, diferente do lírico, focado, completamente,
em seu interior. O “eu” incorpora na sua voz a voz coletiva e passa a cantar e representar os
anseios de um povo, de uma nação. Esta reflexão é o que o diferencia dos demais estados
poéticos, já que “O poeta esteta seria, essencialmente, o lírico, e o poeta filósofo o épico”
(MOISÉS, 2003, p. 172).
Ainda Moisés (2003, p. 238):
[...] todo poeta “superior” tende para o épico. Dispondo em partes o pensamento,
observamos que o poeta épico se caracteriza pela dilatação do “eu” ao infinito de
suas possibilidades, a ponto de romper as próprias barreiras e invadir o plano do
“não-eu”.
Neste “não-eu” “As agruras poéticas deixam de ser aquelas do simples „eu-te-gostovocê-me-gosta‟ do verso drummondiano, para ser as que nascem das universais inquietudes
humanas: ser e não-ser” (idem, ibidem, p. 242). O caráter universalista do “eu-social” ainda é
classificado por Moisés (2003) de duas formas: Universalismo individualista e universalismo
universalista; ou seja, enquanto aquele “resulta do encontro e subsequente expressão das
universais e perenes inquietações humanas” (idem, ibidem, loc. cit), este “o poeta está voltado
integralmente no sentido de captar e expressar os grandes conflitos humanos situados via de
regra fora do seu „eu‟, e por casualidade identificáveis por ele” (idem, ibidem, loc. cit).
O “eu-odioso”, relacionado ao campo da poesia lírica, é, na realidade, o próprio “eu”
“que supomos que somos” (MOISÉS, 2003, p. 85), instável para consigo, muito bem
observado na literatura no período do barroco, onde o “eu” é sempre visto em dualidade, e é
neste campo que o “eu-odioso” de Moisés trava profundo dialogismo com o aspecto sensorial
de Bousoño, já que para o artista barroco “A paisagem e os objetos afetam-no pela
multiplicidade dos seus aspectos mais aparentes, logo cambiantes, com os quais a imaginação
estética vai compondo a obra em função de analogias sensoriais” (BOSI, 2006, p. 30).
No “eu-profundo” o ser visita o próprio interior e faz uma releitura, a partir da
imaginação e da sensibilidade, dos demais “eus”. É, pois, neste “eu” que está centralizada a
poesia, e dele se desenvolve todo o processo da literatura. Como afirma Moisés (2003, p. 85),
é a camada íntima:
[...] onde se depositam as vivências decorrentes do contacto com o mundo exterior, e
transfiguradas pelos outros “eus” e pela imaginação, recalques, complexos, etc.,
reino de caos, anarquia, alogicidade, composto de sensações vagas, difusas, ainda
não verbalizadas, impermeável ao mundo exterior, salvo na medida em que abriga
os arquétipos, analogias profundas entre o inconsciente individual e coletivo.
Como se vê, o “eu-profundo” é uma espécie de subconsciência que absorve,
compreende e transforma profundamente um plano subconsciente em consciente, e através
dos signos, figuras e gêneros o coloca na superfície. Dos “eus”, o mais ampliado. Seu caráter
de busca pela compreensão, a partir da percepção e da anamnese, e expressão
verossimilhante, o faz dialogar com os níveis da materialidade e imaterialidade ao mesmo
tempo.
5. Considerações finais
O estudo da poética é um campo muito vasto e palco milenar de discussões entre
teóricos, filósofos e tratadistas. Isto se deve pela importância que teve, e tem, para a produção
da arte e, em especial, à literatura. Como dito pelo teórico Moisés (2003), “[...] a poesia
remonta aos inícios da cultura ocidental, e presidiu ao nascimento de todas as literaturas. E
não só inaugurou as literaturas ocidentais como nelas predominou durante séculos”
(MASSAUD, 2003, p. 80).
Seus entendimento e implicação confundem-se, por vezes, à análise da própria
essência humana: Uma parte se liga ao sentimento, que dá vida ao objeto; e a outra, ao estudo
deste objeto, como meio de se chegar a mais pura forma do estado lírico de um mundo
transcendental, situado, talvez, paralelo ao que vivemos, e que na filosofia de Platão
denominou-se o “mundo das ideias”.
Uma sentença, porém, pode ser defendida: Há poesia em toda e qualquer manifestação
que gere, em reflexão ao nosso íntimo, uma carga emotiva. Sua existência, se colocada restrita
ao campo literário, independe de signos linguísticos, embora estes auxiliem como espelhos a
sensibilidade humana. A poesia está em tudo quanto se resuma em conotação ou polivalência.
Se houvesse uma regra da qual pudéssemos utilizar para bem defini-la, poderíamos
dizer que a poesia é a própria ferramenta que transforma o sentimento em arte, e que a arte,
sem a poesia, é apenas um objeto, à procura de uma interpretação lírica para, enfim, tornar -se
artístico.
6. Referências
ARISTÓTELES. Arte poética. São Paulo: Martin Claret, 2007.
MACHADO DE ASSIS. Crítica literária. São Paulo: W. M. Jackson, 1946.
BOILEAU-DESPRÉAUX, Nicolas. A arte poética. São Paulo: Perspectiva, 1979.
BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 45.ª edição, São Paulo: Cultrix,
2006.
BOUSOÑO, Carlos. Teoría de la expresión poética. 4.ª edição, Madri: Gredos, 1966.
CARMO, Manuel do. Consolidação das leis do verso. São Paulo: Casa Duprat, 1919.
CORTEZ, Clarice Zamonaro; RODRIGUES, Milton Hermes. Operadores de leitura da
poesia. In: BONNICI, Thomas; ZOLIN, Lúcia Osana. Teoria literária: abordagens
históricas e tendências contemporâneas. 2.ª edição, Maringá: Eduem, 2005, p. 57-89.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio: século XXI. 2.ª edição, Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
FRANCO JÚNIOR, Arnaldo. Formalismo russo e new criticism. In: BONNICI, Thomas;
ZOLIN, Lúcia Osana. Teoria literária: abordagens históricas e tendências
contemporâneas. 2.ª edição, Maringá: Eduem, 2005, p. 93-107.
MOISÉS, Massaud. Criação literária: poesia. 18.ª edição, São Paulo: Cultrix, 2003.
SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de lingüística geral. 27.ª edição, São Paulo: Cultrix,
2006.
VIEIRA, Hermes. Humberto de Campos e sua expressão literária. São Paulo: Cultura
Moderna, (19--).
KORYTOWSKI, Ivo. Manual do poeta. Rio de Janeiro: Ciência Moderna, 2008.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

DIÁRIO INCONTÍNUO


Charges: Gervásio Castro

24 de agosto

O LANÇAMENTO DE POEMITOS DA PARNAÍBA

Elmar Carvalho

Quando as coisas têm que dar certo, até o acaso parece conspirar para isso. Certo dia, encontrei-me com o advogado Valdeci Cavalcante, que havia sido meu professor no curso de Direito da UFPI, nas escadarias do Tribunal de Justiça, por pura casualidade. Aproveitei para lhe entregar meu livro PoeMitos da Parnaíba, que por sorte conduzia em minha pasta, junto a papéis da burocracia oficial. Espontaneamente, sem nenhuma insinuação de minha parte, ele me perguntou se eu não gostaria de lançá-lo em Parnaíba, através do SESC, pertencente ao sistema FECOMÉRCIO, do qual é ele dinâmico presidente. Diante disso, fiz os devidos contatos com a equipe da instituição em Parnaíba, através da coordenadora de eventos, Lili Machado, e tudo aconteceu na mais perfeita ordem e organização, de acordo com o que fora planejado. Nessa empreitada, muito contribuiu o Fernando de Castro, irmão do genial chargista Gervásio Castro, autor das belas ilustrações dos poemas, tanto nos contatos comigo e com o SESC, como nos contatos entre este e seu irmão, bem como no assessoramento à confecção dos grandes banners, com os textos e as charges, que ficarão expostos na Galeria Carlos Guido até o dia 30 de setembro.
Lili Machado, Mestre Ageu, Elmar, Cego Bento e Janaína Sampaio

Vicente de Paula, Zé de Maria, Elmar e Cosme Sousa
O evento foi bastante divulgado pela equipe do SESC, através das emissoras de TV parnaibanas, dos portais e blogs noticiosos, de convites e folders, cabendo ressaltar a beleza e funcionalidade destes últimos. A TV Costa Norte fez uma excelente cobertura da exposição, dando-lhe um bom espaço, em que falei da concepção dos PoeMitos e de algumas figuras retratadas na obra. Recitei o poema Bar do Augusto, com que extemporaneamente encerrei essa série poética, ainda inédito em papel impresso, com o qual homenageei as figuras emblemáticas e legendárias de Dourado e dom Augusto da Munguba, templário mor do Recanto da Saudade. A Lili Machado complementou as minhas informações e acrescentou outras. A equipe dessa TV filmou minuciosamente os banners com os textos e as charges, para melhor ilustração da reportagem televisiva.
Flagrante da exposição

Janaína Sampaio, Fernando Gomes e B. Silva
Na noite de sexta-feira, dia 19, aconteceu o lançamento, com bela apresentação, seguindo roteiro bem elaborada pelo cerimonial. Segundo consta, de meus “poemitos” apenas três continuam vivos: Cego Bento, admirável sanfoneiro do mais legítimo forró pé de serra, Mestre Ageu, verdadeiro Pigmalião e mago da arte escultórica, e Bernardo Carranca, inenarrável e inimitável cantor/ator, mestre de improvisadas performances músico-teatrais. Os dois primeiros se fizeram presentes, e ficaram exultantes com as homenagens recebidas. A professora Rossana Silva, em gesto de profunda generosidade e compreensão humano, leu para o Cego Bento o poema em sua homenagem, e lhe descreveu a charge estampada no banner, em que ele surfa na crista de uma onda, ao som mágico de sua sanfona, em cuja ilustração não faltou o detalhe de um coco da praia e a elegância esbelta e flexível de um coqueiro. Quanto ao Marechal, existem muitas controvérsias e dúvidas sobre se morreu ou se está vivo; tenho para mim que ele ficou encantado, nem morto nem vivo, visível e invisível, num reino mítico, a ostentar seus galões, galardões e condecorações.
Alcenor Candeira Filho
Alcenor Candeira Filho, mestre da poesia e da prosa, inexcedível orador, excedendo-se a si mesmo, fez uma brilhante palestra sobre este poeta e sobre o autor das charges, Gervásio Castro, que telefonou do Rio de Janeiro, para dizer que estava num boteco, do qual já estava de saída para comparecer espiritualmente à solenidade, à qual gostaria de estar presente também de corpo. Mas estava bem representado por seu irmão Fernando de Castro, igualmente extraordinário chargista e artista plástico, além de arquiteto. Como eu estava dizendo, o Alcenor proferiu excelente improviso, com sua boa voz de dicção irretocável, em que teceu pertinentes comentários sobre os textos e as ilustrações, além de discorrer sobre a amizade que o liga fraternalmente ao poeta e ao chargista, há várias décadas. Em seguida, leu um texto que escreveu para o lançamento anterior, ocorrido há mais de ano, por todos aplaudido entusiasticamente. Na verdade não saberia dizer qual o melhor, se o texto escrito ou se a peroração ao sabor do improviso, em que não vislumbrei um único equívoco, titubeio ou gaguejar.
Idelmar Cavalcante Jr. e Rossana Silva
Rossana Silva, uma das melhores professoras de literatura de Parnaíba e do Piauí, e Idelmar Cavalcante Jr., professor de História, e grande contista, de vertente moderna, em que a narrativa e a descrição de cenários são diluídos e mitigados ao longo do texto, foram os responsáveis pela mesa de discussão denominada “Literatura e Oralidade: uma síntese poética dos tipos humanos da velha urbe parnaibana”. Rossana leu um texto escrito, na verdade um pequeno ensaio, em que ministrou lições de história da Linguística, empreendendo uma passeio no tempo, da antiguidade aos dias atuais, para demonstrar que PoeMitos da Parnaíba contém recursos da oralidade, e não apenas da linguagem escrita e culta. O professor Idelmar fez uma abordagem compatível com vertentes da historiografia contemporânea. Disse que o livro poderia ser útil a historiadores, vez que a História não deveria falar apenas das grandes personalidades, mas também das figuras miúdas, que compuseram o cenário humano de uma cidade, que contribuíram para a construção de uma cidade, através do trabalho, da arte, da cultura e até dos costumes, delineando a sua paisagem humana. Foi uma bela mesa de discussão, em que aspectos instigantes da oralidade foram abordados com percuciência e acuidade pelos dois conferencistas.
O ator Fernando Silva
Em suma, foi uma magnífica festa da literatura, como disse em minha breve fala, em que agradeci ao poeta Alcenor Candeira Filho por suas generosas palavras, que tanto emocionaram meus pais, especialmente meu genitor, de natureza acentuadamente emotiva, bem como à equipe do SESC, que se excedeu em cuidados para que a solenidade pudesse ter o brilhantismo que teve. De maneira especial cito os nomes de Janaína Sampaio, gerente do SESC/Avenida, de Lili Machado e do sonoplasta Manuel, aos quais agradeço pelo esmero na realização do evento e pela atenção que dispensaram a todos os convidados. A Janaína e a Lili tiveram todo o cuidado com o Cego Bento e Mestre Ageu, pessoas idosas, e dois dos maiores artistas populares de Parnaíba, sobre os quais já tive o ensejo de escrever também trabalhos em prosa, em que lhes abordei a vida e a arte.
Foi exibido o clipe Parnaíba no Coração, em que faço um depoimento de meus tempos e labutas na cidade, em que falo do meu encantamento pela paisagem do litoral piauiense e da importância das amizades que construí e conservo, e em que recito os meus poemas que enaltecem a velha urbe, com belas imagens citadinas e praianas. Como corolário da festiva noite de cultura, Fernando Silva apresentou uma performance de sua autoria, em que ele, travestido de jardineiro letrado e amante inveterado de livros, leu alguns PoeMitos e outros textos, com invulgar capacidade interpretativa, que bem revelou o competente ator que ele é.
Lili Machado, Diá, Fátima, Elmar e Sérgio Prado
Compareci acompanhado por meus pais, minha mulher, minha irmã Maria José, cunhada e dois sobrinhos. Vários amigos estavam presentes, entre os quais cito, numa enumeração apenas exemplificativa e incompleta: Canindé Correia, Vicente de Paula (Potência), B. Silva, Wilton Porto, Sérgio Ximenes do Prado e Cosme Sousa. Também compareceram vários confrades e amigos da Academia Parnaibana de Letras e do Instituto Histórico e Genealógico de Parnaíba, entre os quais ressalto Dilma Pontes e Dr. Carlos Araken, além do vereador e conterrâneo Fernando Gomes. Como se tudo isso não fosse o bastante, ainda foi servido lauto coquetel, com fartas e variadas iguarias, para deleite e confraternização dos convidados. Ou para escândalo de nossos estômagos, como disse o mítico Pacamão, em célebre carta dirigida a Dom Filipe Conduru Pacheco, primeiro bispo da Diocese de Parnaíba, comunicando o nascimento de uma das “edições” de seu amor, que ainda se encontrava em estado anônimo, aguardando a nomeação do registro público e da pia batismal.
Flagrante do coquetel