quinta-feira, 30 de abril de 2015

Francisco de Sousa Martins


Francisco de Sousa Martins
                                                                                              
Reginaldo Miranda
                                                                                  Da Academia Piauiense de Letras

O dia 5 de janeiro de 1805, assinala o nascimento de Francisco de Sousa Martins, notável advogado, magistrado e político brasileiro. Nasceu em casa de seus pais, na fazenda Canabrava, freguesia de N. Sra. das Mercês, hoje Jaicós, então termo de Oeiras. Era filho do coronel Joaquim de Sousa Martins, governador das armas do Piauí, e de sua esposa Teresa de Jesus Maria. Pelo lado paterno era neto do açoriano Manuel de Sousa Martins e de sua esposa Ana Rodrigues de Santana. Eram seus avós maternos o coronel Francisco Pereira da Silva, ouvidor-geral e membro da junta governativa do Piauí e sua esposa Isabel José da Conceição, todos descendentes das primeiras levas de colonizadores portugueses.

Designado para a vida eclesiástica, cedo foi mandado para a vizinha fazenda Boa Esperança, para, sob a orientação de um ilustrado parente, o grande pároco e educador Marcos de Araújo Costa, iniciar as primeiras letras e preparar-se para o sacerdócio. Nesse educandário, o famoso Colégio da Boa Esperança, permaneceu por toda a juventude até concluir o curso de humanidades.

Concluídos esses estudos em 1825, seguiu com o pai para o Rio de Janeiro, matriculando-se no Seminário de São José, onde prosseguiu em sua formação intelectual, estudando teologia e liturgia, cujas noções eram necessárias para a ordenação. Por esses dias seu pai havia entrado em desavença com o presidente da província, o irmão primogênito Manuel de Sousa Martins(2.º do nome), brigadeiro e futuro visconde da Parnaíba, abrindo uma facção de oposição ao mesmo. E aproveitou a viagem à corte para tratar de assuntos políticos, formulando denúncias contra os desmandos que entendia existirem no Piauí.

Todavia, antes da ordenação resolveu Sousa Martins abandonar o seminário para ingressar na carreira jurídica. E aproveitando-se da amizade que travou com alguns seminaristas portugueses que ali também estudavam e tomaram a mesma resolução, rumou para Portugal em 1827, matriculando-se na Universidade de Coimbra, depois, é óbvio, de obter o consentimento e apoio dos pais. Entretanto, não pôde prosseguir no curso jurídico por muito tempo, porque no ano seguinte a referida universidade foi temporariamente fechada, em face da agitação política que passava a nação portuguesa, em torno da sucessão de D. João VI, tendo por personagem central D. Miguel.

De regresso ao Brasil, dirigiu-se diretamente para Olinda, porque sua chegada coincidia com a fundação do curso jurídico que ali se iniciava. Então, matriculou-se na primeira turma de 1828, recebendo o grau de bacharel em 1832, depois de ser aprovado com distinção em todas as disciplinas.

De imediato, retorna ao Piauí, fixando residência na cidade de Oeiras, então capital da província, dedicando-se à advocacia. Ao mesmo tempo é nomeado procurador fiscal da Tesouraria da Fazenda. Por esse tempo, seu pai já havia se reconciliado com o poderoso irmão, fato que facilitou a ascensão do jovem bacharel aos mais elevados cargos públicos na província natal.

Em 1833, Francisco de Sousa Martins foi nomeado juiz de direito da comarca de Oeiras, em cujo exercício permaneceu até o ano seguinte.

No entanto, em 1834 ingressa na política, sendo eleito deputado geral(hoje federal) pelo Piauí e permanece no parlamento, com pequenos interregnos, em face de gestões administrativas, até o ano de 1847, por cinco mandatos consecutivos, alguns deles também pelo Ceará. Durante esses mandatos parlamentares distinguiu-se entre seus pares, tanto nas comissões técnicas, por seu reconhecido conhecimento em finanças públicas, área em que se especializou, quanto na tribuna parlamentar, proferindo eloquentes discursos que ficaram marcados nos anais do parlamento nacional.

Ainda ao final de 1834, foi nomeado presidente da província da Bahia, então uma das mais importantes do Império, tomando posse em 10 de dezembro, à frente de cujo governo demorou-se até 18 de abril do ano seguinte. Essa passagem pelo governo da Bahia foi marcada pela Revolta dos Malês, quando, desassombradamente, de arma em punho, com a sua guarda, enfrentou os negros muçulmanos que tentavam tomar o governo da província e proclamar um reinado. Para isso planejaram assaltar o Palácio do Governo, o Quartel Militar, o Forte de São Pedro e o Quartel de Infantaria de Linha, dominando, assim, a cidade de Salvador, para matar todos os brancos cristãos e coroar a escrava Sabrina, que a tinham como princesa em sua terra. A maioria dos negros revoltados era formada por ex-escravos libertos, africanos, islâmicos da etnia nagô, que exerciam atividades livres em Salvador, daí serem chamados “negros de ganho”(alfaiates, pequenos comerciantes, artesãos e carpinteiros). Embora livres e com pequenas economias eram discriminados em face da cor e da religião. Principalmente esses mais abonados lideraram o movimento e forneceram armas e munições. Tudo foi arquitetado em sigilo, através de suas associações religiosas e sociedades secretas. A data do levante foi estrategicamente designada para a noite de 24 para 25 de janeiro de 1835, durante os festejos do Senhor do Bonfim, que atraía grande parte da população local. O plano é era surpreendê-la e chaciná-la. É que os negros maometanos contavam com a ausência de forças militares na Bahia e demais províncias do Norte, que se encontravam combatendo a Revolta dos Farrapos, no Rio Grande do Sul. Então, nesse momento de tensão, a firmeza de pulso desse varão piauiense foi crucial para abafar o movimento rebelde. Sobre o assunto diria mais tarde, o desembargador José Manoel de Freitas, no Diário de Pernambuco: “A presidência do Dr. Francisco de Sousa Martins na Bahia é um de seus momentos de glória. Ainda hoje os baianos agradecidos referem-na com mostras de júbilo, de satisfação, e nossa história contemporânea não poderá deixar de registrá-la. (...). No dia do cataclisma, o Dr. Sousa Martins não era somente o presidente enérgico e resoluto; não, ele era também o soldado destemido e valoroso que peito a peito se debatia com os insurgentes; a insurreição sucumbiu de repente, em presença de tão porfiada resistência”(Diário de Pernambuco. Maio, 1857).

Depois de retornar ao Parlamento, em 1839, foi nomeado presidente da província do Ceará, tomando posse em 3 de fevereiro de 1840 e permanecendo até 9 de setembro, por sete meses. Novamente, ficou atento à revolta dos Balaios, que eclodia no Meio-Norte brasileiro e ameaçavam invadir Frexeiras, perto de Granja. Por essa razão, dirigiu-se para a cidade de Sobral, visando preparar a defesa da fronteira cearense. Em sua gestão tem início a edificação do farol do Mucuripe, em Fortaleza. Também, pela lei provincial de 26 de agosto de 1840, foi transferida a sede de Vila Nova de El-Rei para Ipu.

Ao ser afastado do governo cearense, em face de mudança ministerial, reassume seu cargo de juiz na comarca de Oeiras. Em 1842, foi removido desta comarca para a do Rio de Janeiro. Em 1845, foi removido para a de Ouro Preto, então capital de Minas Gerais, não assumindo, porém, em face de se encontrar no exercício parlamentar. Todavia, ao fim deste, em princípio 1847, assumiu o lugar de juiz dos feitos da fazenda Pública do Rio de Janeiro, em cujo exercício, infelizmente, demorou-se apenas quatro meses, afastando-se para cuidar de sua saúde, não mais a recuperando. Tão jovem, com apenas 42 anos de idade, encerrava sua vida pública, pondo fim a uma ascensão brilhante em que preponderou a honradez na administração da coisa pública, a justeza nas decisões judiciais, a sapiência nas questões financeiras e a eloquência na tribuna parlamentar.

 Desde então, quase cego, doente do corpo e da mente, passou por uma série de martírios e de sofrimentos. Segundo o desembargador José Manoel de Freitas, o início desses males coincide com o de seu casamento com uma “donzela fluminense, em cujas faces refletiam os atrativos das ilusões da mocidade; desposou-a, e desde esse momento a alegria afugentou-se de seu coração; uma febre abrasadora como que lhe devorava o cérebro, e os homens que o conheceram ávido de glória, intrépido nos combates da tribuna, e refletido nas suas resoluções, chamaram-no de louco, vendo-o assim triste abatido e indiferente a todas essas grandezas que ainda há pouco disputava; mas não, o Dr. Sousa Martins não era louco, ele era apenas um homem que sofria muito e que queria ocultar ao mundo os arcanos de seus sofrimentos” (Diário de Pernambuco, maio, 1857)

Em busca de lenitivo, ao final de julho desse último ano, obtém licença dos poderes legislativo e executivo, e viaja para a França, que a encontra revolucionada. Mais tarde, depois de peregrinar por outras cidades europeias, vai para Lisboa, onde se demora por algum tempo. Sobre esse assunto escreveu ele diretamente de Lisboa para o Diário de Pernambuco, edição n.º 280:

“É inútil aqui mencionar tudo quanto tenho sofrido nos últimos três anos; posso, porém, dizer em geral, que durante esse espaço de tempo, um só dia não tenho vivido com humor contente e espírito livre e satisfeito. Aos males físicos que diariamente me oprimem, acrescem noites contínuas de completas vigílias e anuviadas com as mais lúgubres e funestas meditações; a sociedade humana tem-se-me tornado um flagelo, e a minha vida converteu-se em uma agreste e selvática misantropia. A única satisfação que ainda experimento é a que me confere a solitária leitura de meus livros; estes são hoje os meus únicos amigos, os companheiros dos meus momentos de infortúnio, os consoladores das minhas tristezas, o único conforto que neste vale de lágrimas da vida humana não pode ser roubado ao infeliz, ainda que desamparado de toda  natureza.

‘Mas, esse mesmo derradeiro refrigério de uma existência amargurada, em grande parte me tem sido impedido e contrariado pelos sofrimentos de meus olhos; pois que, ainda que agora possa ler e escrever, contudo isto não o posso fazer sem grande fadiga, cansaço da vista e exaltação do cérebro, o que acarreta penáveis incômodos nas maldormidas noites. Ainda isto mesmo, só agora, depois que estou em Portugal, me tem sido permitido, porque antes quase que nenhuma leitura me era possível por mais de meia hora”.

Em 1851, “abatido pelas moléstias e acabrunhado de desgostos”, no dizer de Miguel Borges, recolhe-se a Oeiras, onde é efusivamente recebido, passando depois para sua fazenda Canabrava, onde vive os últimos dias de sua vida. Consta que, em 1853, tentou sem êxito, o suicídio.

Finalmente, veio a falecer em 5 de maio de 1857, com apenas 52 anos de idade.  Em seus pertences encontraram uma tradução por ele feita, e que ficou inédita, de Viagens em redor do meu quarto, de Xavier de Maistre, entre outras, e escritos sobre finanças. Em vida publicou Progresso do jornalismo no Brasil(RIHGB, t. VIII, p. 262 a 275), alguns discursos nos Anais do Parlamento Brasileiro, e alguns outros trabalhos que ficaram esparsos na imprensa de seu tempo. Pertencia ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.


Traços de sua biografia exaltando a sua personalidade foram anotados pelos biógrafos Miguel de Sousa Borges Leal Castelo Branco, João Pinheiro e Joaquim Chaves, a quem venho associar-me com essas notas que visam relembrar grandes vultos que honram e glorificam a terra piauiense. 

POSSE DE SEBASTIÃO FIRMINO NA ALMAPI (Parte I)


30 de abril   Diário Incontínuo

POSSE DE SEBASTIÃO FIRMINO NA ALMAPI (Parte I) 

Elmar Carvalho

Na tarde de sexta-feira, dia 24, o escritor Herculano Moraes me telefonou para me dar a notícia de que o magistrado Sebastião Firmino Lima Filho tomaria posse de sua cadeira na Academia de Letras da Magistratura Piauiense, cuja solenidade, presidida pelo des. Luiz Gonzaga Brandão de Carvalho, aconteceria a partir das 19 horas, e acrescentou que eu seria o orador de sua recepção. Informou-me, a meu pedido, que o patrono da cadeira era o desembargador Robert Wall de Carvalho. Ante o fato consumado, tratei de fazer um esquema mnemônico de meu improviso.

Sabia que o último ocupante da cadeira fora o desembargador Tomaz Gomes Campelo, que eu conhecera há mais de 17 anos, quando ele já era inativo e eu me encontrava prestes a ingressar na magistratura. Conhecia-lhe os principais fatos de sua biografia. Por conseguinte, não teria dificuldade de me pronunciar sobre ele.

Com relação ao colega Sebastião Firmino, também não teria obstáculos em falar sobre ele, uma vez que já o conhecia há mais de uma dezena de anos. Após o telefonema de Herculano, recebi um e-mail do juiz Edison Rogério me recomendando não deixasse de falar sobre os dotes artísticos e esportivos do novel acadêmico. Segui a boa orientação, e não lhe regateei elogios nessas duas atividades.

Pesquisei dados sobre o patrono da cadeira. Vali-me dos monumentais Dicionário Histórico e Geográfico do Estado do Piauí, de Cláudio Bastos, que levou mais de 30 anos em sua elaboração, e Dicionário Enciclopédico Piauiense Ilustrado, de Wilson Carvalho Gonçalves, meu amigo e confrade na Academia Piauiense de Letras. Tive a honra e satisfação de contribuir para a publicação do primeiro, quando eu era presidente do Conselho Editorial da Fundação Cultural Monsenhor Chaves.

A seguir, farei um apertado resumo do que disse em meu pronunciamento.

O desembargador Robert Wall de Carvalho nasceu em Caxias, em 1918, e faleceu em Teresina, em 1984. Figura emblemática da magistratura piauiense, é dela também um verdadeiro paradigma, pelas suas virtudes, capacidade administrativa e dotes intelectuais. Foi jornalista, professor, presidente e corregedor-geral do Tribunal de Justiça, membro da Academia Piauiense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí. Exerceu cargos hoje correspondentes a secretário de Estado. Um dos fundadores da Universidade Federal do Piauí, foi seu primeiro reitor.

Era filho de Cromwell Barbosa de Carvalho, de estirpes amarantinas e oeirenses, que exerceu quase todos os cargos exercidos pelo filho, entre os quais os de presidente do TJPI, secretário de Estado, jornalista, membro da APL e diretor da velha Faculdade de Direito do Piauí. Pelo lado materno descendia de industriais caxienses, inclusive dos Dias Carneiro, que instalaram famosa indústria têxtil em Caxias, no final do século 19.

Francisco Dias Carneiro, poeta e capitão de indústria, tem seu busto afixado no Pantheon caxiense, ao lado dos poetas e escritores Gonçalves Dias, Coelho Neto e Vespasiano Ramos. Segundo informação oral, que não tive condição de confirmar, o poeta Francisco Dias Carneiro fora casado com uma senhora do Rio de Janeiro, que teria falecido ainda jovem. O filho do casal teria sido criado pela família da mãe, na então capital federal.

Sobre essa ilustre família, da qual descendia Robert, já tive o ensejo de dizer: “No meu périplo caxiense, encontrei o prédio de extinta fábrica têxtil, que outrora fora símbolo de poder e de orgulho, com os seus operários e administradores na azáfama do dia a dia. Como os engenhos do romance de José Lins do Rego, o seu fogo de há muito já era morto. Todavia, um penacho de nuvem por detrás da alta e soberba chaminé, que, como uma torre de Babel, parecia querer desafiar o céu, provocou-me uma ilusão de ótica, dando-me a impressão de que ainda soltava as suas últimas baforadas de fumaça, e eu tive a ilusão de que os operários ainda teciam as peças de pano, e que os teares ainda se movimentavam com seus dedos de fiandeiras mecânicas. // Contudo, as plantas que nasciam na boca da chaminé me trouxeram de volta à triste realidade, e eu tive a nítida certeza de que o facho de vida da fábrica já estava morto e emborcado.”

Posteriormente, em conversas, soube que Robert Wall de Carvalho fora um exímio professor. Dava suas aulas sem anotações e sem necessidade de compulsar livros. Tinha boa dicção e postura muito ereta. De denso e aprimorado conteúdo, suas aulas eram quase conferências, em que o mestre se excedia em esmero e dedicação. Aposentou-se voluntariamente do cargo de desembargador em 1967, com apenas 49 anos de idade, como a lei da época permitia, não sei se por desapego a cargo público, ou se por ter pretensão política, ou se por outro motivo de foro íntimo.


De qualquer forma, como já disse, para além de ser uma personalidade emblemática da magistratura piauiense, é uma figura paradigmática, que lhe orna, de forma destacada, a galeria mais seleta e rigorosa. 

quarta-feira, 29 de abril de 2015

Lições e mistérios dos beija-flores e libélulas



Lições e mistérios dos beija-flores e libélulas

José Maria Vasconcelos
Cronista, josemaria001@hotmail.com

                 A ciência anda a anos luz de descobrir os mistérios da natureza. E se arvora a conclusões precipitadas, inclusive a de subestimar a ação da Inteligência Suprema. O evolucionismo é aceito, mas de braços dados com o criacionismo. A ciência só entende do primeiro; o segundo, somente os sábios aceitam.

Às cinco da manhã, a oração de louvor e agradecimento, entre fruteiras do amplo jardim. Alaranjada aurora, frescor úmido, o primo canto dos bem-te-vis. Lá vêm encantadores beija-flores. Aproximam-se a meio metro de mim, bebericam água suculenta que lhes preparei. Saciados, pousam no fio, exibem a fina língua, longa como o bico. Outros pássaros festejam a ração posta no vaso. A libélula baila sobre uma poça d’água, tocando-a, saltitante, com a ponta traseira, espalhando minúsculos ovos. Vida saudável a minha, compartilhada com a natureza, que me dá lições de bem-estar, como nenhuma academia.

         Nesta manhã, dirigi-me à clínica dos olhos. Enquanto aguardava, sentado na poltrona, a chamada para implante de lente no olho esquerdo, assistia ao painel eletrônico. O vídeo exibia os avanços da tenologia nas cirurgias oculares, além do currículo de jovens médicos, que consumiram anos de estudo e dinheiro por uma só especialização em cirurgia do olho. Especialista só para cirurgia de catarata; outro, em glaucoma; outro mais, córnea oftalmopediatria; mais um, em  estética ocular... cirurgia refreativa... estrabismo... vítreo-retina. A ciência que descortina e consome anos de pesquisa por uma minúscula parte do corpo: odontologia e suas múltiplas especialidades; dermatologia e mil funções da pele; urologia, obstetrícia etc, etc. E São Paulo atacado por epidemia de dengue. Insetinho indomável derrubando e matando. Virose, virose, virose aporrinhando a gloriosa ciência dos homens, que soltam rojões quando conseguem descortinar segredos da natureza. E se arvoram de negar a Inteligência Superior e Infinita. Aí me volto às libélulas e beija-flores do meu jardim.

        A engenharia ainda não conseguiu se igualar à natureza quando o assunto é voar, segundo um estudo que compara colibris a helicópteros. Pesquisadores afirmam que os pássaros são mais eficientes do que as mais avançadas aeronaves. Aliás, avião vem de AVE. A engenharia copia a sustentabilidade e dirigibilidade das aves. Até a ponta da asa da aeronave (winglet) reproduz a saliência que aparece nas pontas das asas das aves. Corte a saliência do capote, ele não mais voará.

         Estudando a Bíblia, entendi a metáfora do fruto proibido: o conhecimento humano limitado, ao ponto de não conhecer, totalmente, o universo de seu corpo, só uma parte, por especialização. Porém questionam a existência da Suprema Inteligência Divina. Libélulas e beija-flores que lhes digam.   

segunda-feira, 27 de abril de 2015

Minha formação (4 e 3)


Minha formação (4)
                    
Cunha e Silva Filho

A VIRADA.  Vivi em Teresina dos três ou quatro  aos  até completar dezoito em dezembro de 1963. Em fevereiro do ano  seguinte,  1964,   embarquei de avião da Vasp para o Rio de Janeiro, espécie de turning  point que, nessa cidade,  mudaria o rumo de tudo, mas de tudo  estruturalmente  falando: vida pessoal,  familiar, estudos,  objetivos  desviados, enfim,  tudo. Teresina ficaria para trás durante   dez anos em que, na hoje megalópole carioca,  conforme  disse acima,  as vias do percurso  humano e intelectual  iriam  conhecer alegrias e ao mesmo  tempo  muitos  óbices que  dilacerariam  em parte o meu mundo interior.
         No entanto,  aqueles dez anos de ausência de Teresina e de meus  familiares,  foram  um tanto compensados  pela  volta à “Cidade Verde.”
        Muita coisa  acontece numa década de ausência, e isso foi constatado   nessa  minha primeira grande volta a Teresina, em 1974. Fiquei deslumbrado com  as mudanças da capital mafrense e, para isso,  remeto  o leitor a uma crônica,  com  título sugerido por meu pai (ele era ótimo para dar títulos a seus  textos)  “Impressões da Cidade”,  que se encontra na minha  obra As ideias no tempo (2010).
         Falei  acima  que, ao lado do deslumbramento ou “alumbramento” bandeiriano,  de rever  Teresina,  havia trazido comigo  outras  mudanças: não era mais o adolescente   que mal completara dezoito anos, mas um jovem adulto de  vinte e oito anos, casado, com  dois filhos  pequenos. i.e., um pai de família que viera abraçar   os pais, irmãos e irmãs. Mamãe me dizia que eu estava pouco à vontade e que não era mais  o filho de antigamente. Acentuo,  todavia,  que  a ausência de uma década, de certa maneira,  havia sido amenizada por uma correspondência intensa entre mim e meu pai.
        Através desse canal  de comunicação por carta trocávamos afagos,  confidências de toda a sorte e,  por conseguinte,  virtualmente,   mantive  um elo  espiritual  e intelectual  com meu pai que se prolongaria  por  vinte e seis anos.Papai  se queixava às vezes  reclamando  que eu quase não  escrevia pra mamãe.
   Expliquei-lhe que não era essa a minha intenção, pois, escrevendo-lhe,  intencionalmente  era como  se estivesse  também  me dirigindo a mamãe, visto que a ela  sempre me referia e bem assim a meus irmãos. Mas, assim mesmo,  segundo ele,  mamãe  reclamava de que não lhe mandava  cartas diretamente pra ela.
       Hoje,  entendo o motivo  principal da minha  preferência paterna: sempre estive  em sintonia com ele mais por razões  intelectuais. Tanto ele quanto  eu  nos entendíamos muito  bem    por via  da dimensão  intelectual. Nas cartas que  lhe enviava em resposta às dele, que eram mais  numerosas,  sempre fazia  comentários   críticos, elogiando-lhe  a qualidade de seus artigos,  a propriedade  do tema neles  discutidos, seu estilo  de escrita   de um jornalismo  “doutrinário,”  segundo a referência  que lhe fez o  ilustre  jurista   e conterrâneo  Cláudio Pacheco (1909-1993), que foi assistente, na Faculdade Nacional de Direito, do historiador e professor,   membro da Academia  Brasileira  de Letras, grande orador, ensaísta,  político, Pedro  Calmon (1902-1985).
         Pedro Calmon conheci  pessoalmente no Rio de Janeiro, no tempo  a que a ele recorri  pra  conseguir  gratuidade de inscrição ao curso de Letras na  célebre  Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade  do Brasil, depois chamada  Universidade  Federal do Rio de Janeiro.  Na época,  1965,  Calmon  era Reitor da Universidade do Brasil e a reitoria  ficava no lindo bairro da Urca, hoje um velho  prédio que comporta  um dos campi da UFRJ. Recebeu-me com um sorriso cativante  e, no corredor,  atendeu-me  ao  pleito. Saí encantado com  a sua  cordialidade  e simpatia.
       Depois de cinquenta  e um anos residindo no Rio de Janeiro,   as reminiscências  se embaralham  em parte no meu espírito. Porém,  a intenção  desses relatos não  tem cunho  cronológico. Será exposta num vaivém, em fluxo  dependente  do que  as associações   de camadas  múltiplas do tempo me invadam  o ato da  escrita e o    desvio  das linearidades   temporais, ou, para usar um termo de G.Genette, das anacronias
     No meu primeiro  regresso a Teresina,  meu  pai  foi meu  guia turístico  e a ele devo  o que me  mostrou de novidades  andando a pé pelas ruas do Centro de Teresina  e,  se mais afastado,  tomando  um  ônibus não muito   confortável.  Íamos a uma redação  de jornal para o qual  estava   escrevendo  mais, o Estado do Piauí, de Josípio  Lustosa. Passávamos pela   velha  Praça  Pedro II, parando um  pouco  para vermos  o anúncio de algum filme do momento no Rex e no Theatro 4 de  Setembro. Gostava de traduzir   alguns  trechos  do cartaz  de um filme  italiano.
     Nos dirigimos,   depois, para a memorável  Praça  Rio Branco, locus  no qual  se reunia, no passado,  a nata da intelectualidade piauiense ou  espaço público   mais adequado aos grandes comícios   políticos, assim como   o fora a Praça  Pedro II no tempo da "Geração  Perdida" de que nos fala o crítico literário,  ensaísta e  professor emérito de literatura portuguesa,  o piauiense M.Paulo Nunes.
    Paramos   numa  lanchonete pra   bebermos, cada um,  dois copos de garapa bem geladinha,  acompanhada de  um  delicioso  pastel de carne moída. Uma delícia  proustiana! Era  costume dele  me perguntar se queria  repetir o lanche, fosse um copo de garapa,  uma prato de coalhada, um sorvete de bacuri ( para mim, a fruta mais  gostosa   do planeta, que até dela fiz  matéria de uma crônica), entre outros  refrescos   imperdíveis  de frutas da  terra.  
    Quando  era pequeno,  fazíamos  isso com frequência, sendo que ele  não esquecia de me tomar pela mão e gostava  de, a intervalos,  dar um aperto mais forte  e   carinhoso com aquelas  mãos lindas que Deus  lhe deu e que, em Amarante,  na sua  juventude e mocidade   se dizia - serem   as mãos mais lindas da cidade. Meu filho mais velho,  o advogado   público  e professor universitário  de direito, Francisco Neto, a meu ver,   herdou-lhe a beleza das mãos.
     Fomos ao aeroporto de Teresina.  Até hoje, não sei por que me levara pra aquele lugar.   Seria por que  o associava   à possibilidade  de partidas e de despedidas com o coração entrecortado de saudades antecipadas ? Esse fato  me leva  -  não sei  também  por quê  -  à poesia  de  Cesário  Verde (1855-1886), sobretudo do  emblemático poema  “Sentimento de um Ocidental.” Quem pode  decifrar  os escaninhos  das memória  e das sondagens profundas  do tempo  passado?  De repente,  sentados que estávamos   a uma mesa  de um espaço aberto do aeroporto e bebericando  um refrigerante, meu pai solta   essa  declaração  num tom  de desabafo  e de pedido  de  perdão: “Meu filho,  você se fez sozinho. Conseguiu,   até agora,  realizar tudo sem a minha ajuda.” Nada fiz  por você.”
        Naquele  instante de quase silêncio, reparei  com atenção no seu   belo semblante,  de rosto arredondado e voz   expressiva, aquela voz  que, por vezes,   por causa dos anos,   com esforço mal  consigo   ouvir agora e que, por isso,  me  causa  tristeza. O sons,  o cheiro,  o perfume  impregnados  na memória  nunca deveriam se perder no tempo da velhice. Estávamos,  segundo  assinalei  atrás,  no mês de julho de 1974. Foram alguns dias de férias  que aproveitei  a fim de  matar a saudade  dele, de mamãe, de meus irmãos e alguns parentes  mais  queridos. Àquela altura da vida,  ainda  cursava a universidade e trabalhava, no Rio de Janeiro, capital do então  denominado  estado da Guanabara,   no bairro  da Penha, como  professor de inglês e português  de cursinho  pré-vestibular (Curso  Policultura)  e preparação para os exames do Artigo  99.  (Continua).      


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sexta-feira, 3 de abril de 2015


Minha formação (3)
                          
“Seek knowledge wherever you are”

Cunha e Silva Filho
                                                                                       
  
          A par de A. Tito Filho,  no curso científico, tive o prazer de ter sido aluno, não tão brilhante,  de professores como  o Lapa (de matemática),  figura extraordinária  de mestre,  Edgar  Tito de Oliveira  (também de matemática, irmão do Lysandro  Tito de Oliveira). Este último era competentíssimo, mas exigente ao extremo. Uma vez,  confessar à minha turma  que seria  militar do Exército, provavelmente um  general, pois cursara  a Escola de Oficiais mas,  por  problemas de saúde,  não poderia  seguir a carreira militar. Grande inteligência não lhe  faltava.
        Mais tarde,  descobri que era uma alma boa  e simples oculta naquela    fisionomia  séria,  muito irônica durante as aulas. Fui aluno do  professor Cordão,  que era oficial  do Exército. Lecionava  química. Bom professor,  dava boas aulas. Foi pena que não pudesse corresponder  à altura das suas  aulas, pois não era forte  nas  disciplinas exatas.. A madame Helena, conhecida mais por Madame,  era casada com um  médico  veterinário  francês e por certo  o convívio dela com um falante nativo muito a auxiliou a dominar a língua   de Racine. Lecionou-me francês. Tempos  depois,  já falecido o marido,  ela deixara  Teresina e , com sua filha,  que foi  colega de turma de minha irmã Sonia, mudou-se para Belo Horizonte.
    Assim me contou alguém. Não tive mais notícias  da ilustre  professora. Outro professor no Liceu Piauiense  de alta capacidade que tive foi  Camilo Filho,  que me lecionou  história  geral. Suas aulas  eram  prazerosas e instigantes.
      Tive outros  professore mais novos  de física, de literatura brasileira. Era uma  jovem senhora recém-admitida ao Liceu. Possuía boa didática  e gostava de que preparássemos  uma exposição  oral  sobre um tema pré-selecionado. Uma vez,  fiz uma exposição. Cria que me saíra bem, mas um  colega metido a engraçado  me fizera um reparo:  "Você  repete muito a expressão  "né em sua  apresentação. Não gostei da sua crítica.  A professora de literatura brasileira   apenas  observava  sem  fazer  comentário algum.
       Naquele tempo  do 3º ano científico, já vinha escrevendo  desde os  quinze ou  dezesseis anos pra jornais locais.  Assuntos dos meus artigos: esboços de contos e outros temas, sobretudo  falando  de períodos   da literatura brasileira, alguma tradução de poemas  do inglês e francês. Foram unas  dois  ou três poemas traduzidos do inglês, além de um   texto em prosa  de autor francês. Foi nessa época do último ano do científico que coloquei no jornal Estado do Piauí  um anúncio em inglês me oferecendo pra  dar aulas particulares de inglês e francês em minha  casa. Apareceram alguns  alunos que me renderam alguns trocados.
    Por falar de literatura brasileira, um fato  memorável me vem à mente. Foi precisamente na biblioteca do velho Liceu  Piauiense - naquela minha época chamava-se Colégio Estadual  "Zacarias de  Góis" - que, pela primeira vez,  li uma obra de Machado de Assis. Foi o romance Helena, ainda da primeira  fase   romântica do maior  ficcionista brasileiro. A narrativa me  agradou bastante.Não tinha sido  indicado por nenhum  professor   de literatura. Li  por mera curiosidade de entrar em contato com  o autor.  Contudo,  não   li,então,  as outras  produções  de Machado e vou dizer  por quê. Veja o leitor como  um  jovem  estudante  concluindo  o científico  é suscetível de seguir o conselho dos mais  velhos. 
     Num dos livros  didáticos, não me lembro  se para o ginásio  ou  o curso científico e clássico,  José Cretella Jr.  advertia   ao leitor que Machado de Assis não deveria  ser lido  por jovens em virtude de sua   narrativa ser muito  pessimista e, segundo  ele,  não muito aconselhável  aos jovens, que precisam  de narrativa   mais edificante, que mostrasse a vida na ficção  por uma ótica  mais otimista  e saudável. Não é que segui o conselho  de Cretella Jr.?  Hoje me arrependo,   porque  tal  postura  me  atrasou,em tenra idade,  a possibilidade  de  entrar em contato com  a grande  obra machadiana.  Mal sabia eu que,  muitos anos mais tarde,  na maturidade e no período do Doutorado, iria  aprofundar  minhas pesquisas sobre Machado de Assis em ensaio acadêmico. É bem verdade que antes já tinha  lido  parte da obra  machadiana e importantes ensaios  sobre  ele.
    Segundo  assinalei linhas, ainda  no período do curso científico,  publiquei,   em jornais de Teresina,  alguns  artigos nos quais  discutia   sobre autores   brasileiros  e sobre  movimentos  literários  brasileiros,   por exemplo,  o Simbolismo,   o Modernismo.
     Uma  amável  leitora de artigos  meus   me confessara que  se preparava pra cursar  a universidade e, segundo ela,   aproveitara alguns artigos meus  como  complemento  de suas leituras  para atingir  seus objetivos. Ficara desvanecido   com  tal  notícia.  
   Nenhum autor  escreve gratuitamente, ou seja,  só pra si mesmo. A função do escritor  é  chegar aos leitores  e, se possível,  ganhar  sua  estima. Escrevo  pros leitores, não  por narcisismo. Meu  único desejo  é me comunicar com o outro, não só  numa  crônica,  num artigo, mas  também no ensaio, na crítica, na tradução. Nesta  última,  posto que  esteja lidando com  a obra  alheia,  estarei dando  a minha  contribuição através  do trabalho  criativo que é próprio  da tradução, por menos   brilhante que seja a minha forma  individual  de transpor para uma outra língua.      
   Naquela  época,   o ensino  de idioma moderno  se pautava nos moldes  tradicionais, i.e., na leitura e tradução ou versão e as aulas  eram  dadas em português. No caso da Madame,  era diferente; de certo modo,   ela se aproximava  do que chamamos hoje    no ensino de idiomas   de “Comunicative method”, ou seja, ao aluno  importa  aprender a língua   com ênfase na conversação, sendo  não recomendável, exceto no início dos estudos,  explicar  a gramática no idioma  nativo do aluno. O método da Madame Helena era o "Direct method", que  adiante comentamos  Não  era  só a Madame  quem  o utilizava, naquela época,  décadas de cinquenta e sessenta  do último século. O professor  Alcobaça  também  a empregou nas suas aulas de espanhol. Da mesma  maneira,  a usou a professora Cristina  Leite, uma espécie de rival da Madame.
       A abordagem, q no ensino de línguas modernas,  nos anos  30 e 40  e 50do século passado, no país fora  iniciado pelo  Externato   Pedro II. Era a grande  novidade que, como já acentuei antes,  se fundamentava  no ensino do idioma  estrangeiro  pelo idioma  estrangeiro. Chamava-se “Direct method.”   No Colégio Pedro II  fora introduzido graças ao seu diretor de então, Henrique Dodsworth, por influência do filólogo  professor Delgado de Carvalho e, segundo nos  informa  o  eminente  professor de línguas, Júlio Matos  Ibiapina,   “...com o apoio  do ministro Francisco Campos, sugestionado  provavelmente  pelo  seu chefe de Gabinete,  professor Lourenço  Filho.”(1)
       O “Direct method” já havia tido  sucesso  pela Europa e, no Brasil,   o  professor Júlio  Matos Ibiapina, que  fizera  estudos   profundos de línguas naquele  continente,  respectivamente,  França, Inglaterra e Alemanha, foi um dos seus  seguidores, inclusive publicando    admiráveis  livros didáticos, sobretudo  de inglês e francês, obras  que vim a  conhecer  no  “quarto-biblioteca”  de meu pai e que li  na sua quase totalidade. Todavia,   em alemão não parece que tenha  escrito nenhum livro didático, mas   apenas uma tese para  professor catedrático de alemão,   aprovada pela Congregação do Colégio Militar do Rio de Janeiro e  intitulada Construção alemã (1921). Matos Ibiapina foi quem, pela primeira vez, no Brasil,  traduziu a obra Mein Kampf, de Adolf  Hitler, tradução elogiada pelo sociólogo  cearense  Djacir Menezes.
    Por outro lado,  o “Direct method” exigia muito do professor,  principalmente fluência e contato com  a língua no   país  de origem. A dificuldade de se implantar tal método   residia  em que  a maior parte dos  docentes  não tinha  tanta fluência  naquelas línguas e,  além disso,   com turmas  numerosas,  que é o caso da maioria do professorado, brasileiro, era bem  mais difícil  aplicar tal abordagem de ensino. Houve até autores que  empregaram essa abordagem  chamando-a de “Semi-direct method”, como  fez a  autora didática  de origem  francesa,  mas radicada  em Porto Alegre, muito conhecida  nos anos  1930,  1940 e 1950,  Suzanne Burtin  Vinholes. Pelo  “Direct method”,  o livro todo seria  escrito  no idioma  estrangeiro, ao passo que, no “Semi-direct method,” a obra era, nos níveis mais  elementares,   escrita em português.
    Já no “Communicative approach, ” a exigência  de a obra ser escrita na língua estrangeira é obrigatória e a diferença em relação ao  “”Direct method”, era que naquela   a ênfase se punha  na comunicação,  na conversação, no diálogo, sendo a gramática   limitada ao essencial..Por isso,  instrumentos adicionais  são  necessários ao  docente, tais  como  gravações  dos diálogos  falados por nativos da língua   estudada, filmes,   encenação, em suma,  todas as quatro  habilidades - conversação, leitura,  escrita e   compreensão. A tradução é evitada ao máximo e proibida nos  níveis avançados. Por outro lado,  no "Direct method"  o livro didático era escrito na língua estrangeira,  e bem assim os exercícios aplicados. Havia conversação, mas não com tanta ênfase quanto no "Communicative  approach", segundo  já ressaltamos. Entretanto,  professores há que, em algumas situações,  dá sua "mãozinha" em português.
    Quando  me aposentei pelo  Colégio Militar do Rio de Janeiro, em 2010, como  professor concursado  titular de língua  inglesa, empregávamos  a  “Communicative approach,” a par de existir  boa realia  de que podíamos lançar mão em   nossas aulas. Os professores eram muito  exigidos pela coordenação da sessão de inglês e ali passei um bom período onde desenvolvi  muito  a minha experiência  no  ensino  da língua   inglesa, especialmente devido ao corpo docente ser  de alta competência.
    No meu tempo do ginásio e mesmo do científico, em Teresina não havia ainda     cursos  de idiomas  nos moldes que hoje temos  em abundância pelo  país afora: IBEU, Cultura inglesa,  CCAA, Wizard, Fisk etc.  Quem desejasse,  por inclinação  do espírito, aprender  línguas tinha que se contentar com   as aulas nas escolas e  com os filmes falados  em inglês,  francês,  espanhol,  italiano com  legendas em  português,  exibidos  nas sessões matinais ou vespertinas do Rex e Theatro na Praça Pedro II.
   Um fato curioso, na Teresina do final  dos anos  de 1950 e inícios de 1960 poucas  pessoas falavam  alemão. Me lembro de que, de acordo com o que me falara meu pai,  o Des. Vidal de Freitas, que conhecias línguas,  também  falava alemão. Soube ainda que um moço de Teresina, conhecido por sua  inteligência,  igualmente  falava alemão. No passado, um professor  do Liceu,  Francisco César de Araújo ( popularmente conhecido como professor  Chico César (1892)   conhecia  várias línguas, inclusive o alemão.(2) Ele tinha feito  estudos  na Universidade Gregoriana, em Roma, licenciando-se  em filosofia  no Liceu, ministrou  aulas de inglês, francês  e latim; nesta última  língua,  era tão proficiente que  compunha poesia  em latim clássico. Era cearense, mas se transferira  primeiro,   para Campo Maior (PI) e, depois, para Teresina.
   Outro  professor que ficou   também conhecido no meio estudantil  teresinense foi Agripino Oliveira (3)) que, por informações de meu pai,  passara boa temporada na Inglaterra e, ao voltar a Teresina,  tornou-se professor de inglês do Liceu Piauiense, tendo  mesmo publicado uma obra Duas palavras sobre verbos ingleses (1924). Dizia-se que ele frequentemente sintonizava  seu rádio  em estações radiofônicas  de Londres e, ao que parece, traduzia  com facilidade em rodas de amigos. Mencionaria   dois outros  professores de inglês, bastante  respeitados,  Nelson  Sobreira (4) que,  me arguiu um vez,  junto com o meu  querido  professor Viveiros, em   exame oral no Liceu e o professor  José Eduardo Pereira ( 1929-1993) do qual  folheei uma tese de inglês para professor  do Liceu  versando sobre  literatura inglesa, se não me engano. Não era piauiense, nascera em Realengo, no Rio de Janeiro. Além disso,  exercera funções  públicas relevantes em Teresina.  Num passado ainda mais remoto, havia língua alemã no currículo do Liceu
    Qualquer americano ou falante  de inglês seriam bem-vindos à juventude  ávida de  dominar  línguas.  Fui um desses jovens. Houve um tempo, nos anos  1960, em que havia  freiras americanas  prestando  serviços  religiosos em Teresina  e algumas delas  aproveitavam  também  para  ensinar inglês a  piauienses. Na Teresina nos naos 1950    militares americanos ficaram  um tempo  instalados, em missão  do governo  americano, talvez a serviço da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, início dos anos de 1950 (governo Dutra e, depois,  Governo Vargas).
   Mais tarde,  já adulto,  ouvia-se falar que ali estavam  para exploração de areias monazítica que serviriam  à  fabricação  de bomba atômica e de hidrogênio... Eles,  no entanto,  homens altos alguns,  me pareceram muito   sisudos e, para a minha  visão de menino curioso,  apenas ficava  olhando-os de longe sem deles me aproximar. Moravam na mesma rua que eu,  a 24 de Janeiro, no centro de Teresina, num casa  enorme de esquina,  que dava para o lado direito do largo da Igreja de São Benedito. Eu  era menino   e não  havia ainda entrado  pro Ginásio.
   Lamento até hoje não me ter  me preparado, de forma  ainda mais  intensa, com aulas  particulares em francês, inglês e espanhol com os professores  de que então dispúnhamos, dos poucos que eram    fluentes em inglês,   como o meu querido  professor  Viveiros. Para isso, teria que falar com meu pai e isso dependia também  do tempo e disposição  dos mestres.
     Em casa,  com meu pai não  dialogávamos   em francês; apenas líamos  muito e até  discutíamos  a melhor  forma de traduzir  alguns  parágrafos  na preparação de suas aulas de francês no “Domício.” Tinha apenas catorze anos.Papai   tinha mais  proficiência na leitura em francês, assim como no italiano,  línguas que aprendera  quando aluno  salesiano (Colégio Salesiano  de Niterói, Rio de Janeiro) e São Paulo (Seminário Lavrinhas). Seus colegas internos eram  nativos  da língua italiana. Sempre fora aluno  excelente na juventude e perdera a fluência ao regressar pra Amarante, onde não tinha com quem encetar  conversações  nas duas línguas. "Time makes perfect" - me dissera  um cliente  americano do City Bank  a quem, um dia,  "at the  counter" com um sorriso nos lábios. (Continua)

Notas:

(1). MATOS IBIAPINA, J. de. English  easily mastered. 3. ed. aumentada e ilustrada. Porto Alegre: Edição da Livraria do Globo, 1940, p. 8. Veja, na obra,  o elucidativo prefácio do autor.
(2)Não consegui localizar a  data de seu falecimento. 
(3) Não consegui  localizar sua data de nascimento e falecimento.
(4) Da mesma forma,   não consegui informação sobre a data de seu nascimento e falecimento.

  

domingo, 26 de abril de 2015

Seleta Piauiense - Dílson Lages Monteiro


(IN)DECISÃO

Dílson Lages Monteiro (1973)


Cai o sereno nas notas da noite
e o coração do sol se assombra.

Cai sobre a máscara do mar
e a face cega do amor
canta uma canção de despedida.

Cai sobre as pálpebras da boneca
despenteada pelo calor dos olhos.

Cai sobre as mãos
que acenam o adeus.    

sábado, 25 de abril de 2015

Jambeiros


Jambeiros

Neide Moscoso

nos tapetes
sobre as calçadas
sigo na
exuberância
rosa pink
como rainha
em passos
cuidadosos
o privilégio
da florada

dos jambeiros    

Frederico Burlamaqui


FREDERICO BURLAMAQUI
O pioneiro da paleontologia no Brasil

Reginaldo Miranda
Da Academia Piauiense de Letras

Em janeiro de 1806, chegava à pacata cidade de Oeiras, centro administrativo da capitania de São José do Piauí, o novo governador Carlos César Burlamaqui, onde se demorou à testa do governo, com pequeno interregno, por pouco mais de um lustro, enfrentando toda sorte de adversidade. Vinha com a jovem esposa Dorotéia Adelaide Ernesta Pedegache da Silveira, sua prima prematuramente falecida e três filhos menores, entre esses uma criança de dois anos de idade. Seu nome, Frederico Leopoldo César Burlamaqui. Nascera em Lisboa, a 16 de novembro de 1803.

Mas foi na acolhedora urbe sertaneja, entre o largo da Vitória, as poucas ruas estreitas e tortuosas e as plácidas margens do velho riacho do Mocha que viveu os mais despreocupados anos de uma infância triste de menino órfão. Seu pai contrairia novas núpcias com Maria Benedicta Castelo Branco, com que teria mais dois filhos.

Foi em Oeiras, sua cidade adotiva, que ele aprendeu as primeiras letras. Desasnado, curioso, inteligente, seguiu com o pai para o Rio de Janeiro, onde prosseguiu nos estudos, dando azos à sua inteligência invulgar. Na Escola Militar do Rio de Janeiro, onde foi matriculado, estudou as matérias típicas da carreira militar e as não militares, como cálculo integral, mecânica racional, química, mineralogia, etc., conhecidas como assuntos científicos, mas que compunham a grade curricular, recebendo o grau de doutor em Ciências Matemáticas e Naturais. Nessa mesma instituição de ensino, agora com nome mudado para Escola Central do Rio de Janeiro, pelo decreto n.º 2.116/1858, retornaria como professor de Mineralogia, onde lecionou por mais de vinte anos, conquistando largo conceito.

Na carreira militar ingressou muito jovem, ao tempo da Revolução Pernambucana de 1817, tendo partido da corte para o front de luta junto com os fuzileiros do Exército, a fim de sufocar a revolta. De regresso ao Rio, foi promovido para o posto de alferes, passando na década seguinte para o de tenente e, galgando outros postos até atingir o de Brigadeiro, onde foi reformado.

Porém, notabilizou-se como paleontólogo, botânico e mineralogista divulgando importantes trabalhos de pesquisa, entre os quais: Resumo estatístico histórico dos Estados Unidos da América Setentrional(1830); Memória analítica acerca do comércio dos escravos e dos males da escravidão doméstica(1837); Resumo do curso da história e da arte militar de J. B. Rocquancourt(1842); Curso elementar da história e da arte militar(1842); Compêndio de montanística e de metalurgia(1848); Riquezas minerais do Brasil(1850); Memória sobre o salitre, a soda e a potassa(1851); Sistema de medidas para a progressiva e total extinção do tráfego da escravatura do Brasil(1856); Ensaio sobre a regeneração das raças cavalares do império do Brasil(1856); Aclimatação do dromedário nos sertões do norte do Brasil e cultura da tamareira(1857); Notícia acerca de alguns minerais e rochas de várias províncias do Brasil, recebidas no Museu Nacional durante os anos de 1855 a 1858(1858); Notícia de minerais brasileiros(1858); Manual dos agentes fertilizadores(1858); Manual das máquinas, instrumentos e motores agrícolas(1859); Monografia do cafeeiro e do café(1860); Monografia da cana de açúcar(1862); Monografia do algodoeiro(1863); Manual da cultura do arroz e de agricultura(1864); Manual da cultura, colheita e preparação do tabaco(1865), entre discursos, pareceres e outros estudos versando sobre agricultura, colonização, raios solares, astronomia, hagiologia, paleontologia, mineralogia e abolição da escravatura.

Atuou ativamente na imprensa, redigindo por alguns anos o Auxiliador da Indústria Nacional, periódico mensal em que contribuiu com artigos de natureza agrícola e defesa do trabalho livre em contraposição ao trabalho escravo. Colaborou também no Filantropo e o Monarchista, periódicos de cunho antiescravistas, bem como nos Trabalhos da Sociedade Vellosiana, da qual era sócio efetivo. Foi nessa última revista que publicou em duas partes, sendo uma em 1855 e outra em 1856, um importante artigo, Notícia acerca dos animais de raças extintas descobertos em vários pontos do Brasil, “que se constitui na primeira publicação sobre fósseis brasileiros em um periódico nacional. No texto teceu comentários sobre os primeiros exemplares descobertos em território nacional e descreveu sucintamente alguns fósseis adquiridos pelo museu. A importância desta publicação inédita reforça o papel inovador de Burlamaqui no estudo da Paleontologia brasileira” (Antonio Carlos Sequeira Fernandes e outros professores da UFRN).

Prestou relevantes serviços ao país, no exercício de importantes cargos públicos e direção de entidades científicas, a saber: diretor do Museu Nacional e da 3.ª seção de Mineralogia, Geologia e Ciências Físicas da mesma entidade(1847 -1866); membro e secretário da comissão organizadora da 1.ª Olimpíada da Indústria, ocorrida em 1861; secretário da diretoria do Imperial Instituto Fluminense de Agricultura, este último cargo por decreto de 19.09.1860; membro da Sociedade Defensora da Liberdade e Independência Nacional; secretário da Sociedade contra o Tráfico dos Africanos e Promotora da Civilização e Colonização, ambas críticas do tráfico; e diretor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, de junho de 1861 a agosto de 1862, quando substituiu a mão-de-obra escrava por trabalhadores livres, entre outras entidades nacionais e estrangeiras, às quais prestou relevantes serviços.

À frente do Museu Nacional por 19 anos, desde 19 de junho de 1847, realizou fecunda e operosa administração, transformando-o em um estabelecimento científico de prestígio internacional. De início, contratou diversos naturalistas para realizar expedições e coletas de material para enriquecer o acervo do museu. E manteve intensa correspondência com os presidentes de províncias visando arrecadar quaisquer achados de interesse científico, que deveriam ser encaminhados ao museu, sendo eles ressarcidos pelos custos da remessa. Em sua gestão arrecadou mais de uma centena de exemplares, a maior parte proveniente no nordeste, coroando, assim, de êxito a sua hercúlea luta. Segundo os citados professores da UFRJ “a situação do acervo paleontológico(do Museu Nacional) somente começou a modificar-se a partir de 1847 quando Frederico Leopoldo César Burlamaqui, empossado diretor do museu, formaria um rico acervo representativo da paleontologia do Nordeste brasileiro graças à correspondência com os representantes das distintas províncias nacionais, e também de outros países, em que solicitava a remessa de material fossilífero para a instituição. A incansável atuação de Burlamaqui na formação desse acervo, somado ao seu grande interesse pelos fósseis, o levou a publicar o primeiro artigo em um periódico nacional sobre a megafauna pleistocênica do Brasil. Por esses motivos pode ser considerado como o primeiro paleontólogo brasileiro”.

A verdade é que embora o dinamarquês Peter Wilhelm Lund(1801 – 1880), que realizou pesquisas nas grutas de Minas Gerais, seja considerado o “pai da paleontologia brasileira”, seu acervo foi encaminhado para Copenhagen. Ao contrário daquele, embora Burlamaqui não tenha realizado trabalhos de campo, em face de sua luta para localizar e classificar os fósseis brasileiros, com consequente publicação do primeiro estudo em um periódico nacional, deveria deter esse reconhecimento. Felizmente, se não lhe reconhecem essa paternidade, ao menos é considerado como o primeiro paleontólogo do Brasil.

Gozando de largo conceito profissional, participou ativamente de diversas sociedades literárias e científicas, entre essas: Academia de Belas Artes, Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, secretário perpétuo honorário da Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional e co-fundador da Sociedade Vellosiana de Ciências Naturais, entidade criada em 1850, com o objetivo de indagar, coligir e estudar todos os objetos pertencentes à história natural do Brasil.

Como reconhecimento por seu trabalho recebeu importantes distinções honoríficas, tais quais: carta de conselheiro do Conselho de S.M.I; comenda de cavaleiro das ordens de São Bento e Avis e oficial da ordem da Rosa.

Em 28 de maio de 1844, no Rio de Janeiro, onde fixou residência definitiva, casou-se com Carolina Carlota da Silva Coelho, de cujo consórcio teve sete filhos: Pedro de Alcântara, Francisco Leopoldo, Carlos Leopoldo, Carolina Adelaide, Filomena Presciliana, Emília Joaquina e Antônio Tíbério, todos César Burlamaqui. Em segundas núpcias casou-se com Maria Genoveva de Melo Burlamaqui, com quem não teve filhos. Faleceu esse notável cientista luso-brasileiro, na mesma cidade, em 13 de janeiro de 1866, aos 62 anos de idade, vítima de tuberculose pulmonar. Nesse mesmo ano, teve o seu busto inaugurado em sessão solene no salão de honra da Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional, de que foi sócio honorário e secretário perpétuo, com eloquente discurso proferido pelo médico Nicolau Joaquim Moreira(1824 – 1894), revelando importantes dados e sua biografia. É, pois, mais um vulto que honra a terra piauiense.    

quarta-feira, 22 de abril de 2015

LANÇAMENTO DE “CONFISSÕES DE UM JUIZ” EM CAMPO MAIOR


Em pé: Coló, Ditoso, Cabo Válter, Zé Costa, J. Monte, Cabo Dulce e Napoleão.
Agachados: Antônio Pinto, Geraldo Pucuta, Fumaça e Escurinho.
A mulher que aparece na foto é Altair Lima (Tatá), na época esposa de Geraldo Pucuta.
Fonte: Portal Líder.com

23 de abril   Diário Incontínuo

LANÇAMENTO DE “CONFISSÕES DE UM JUIZ” EM CAMPO MAIOR

Elmar Carvalho

No plenário da Câmara Municipal de Campo Maior, na última sexta-feira, foi realizado o lançamento de meu livro Confissões de um juiz. O auditório estava lotado. Os presentes tudo ouviram com muita atenção e paciência. Para o pleno êxito do evento, contei com o apoio do amigo e professor José Francisco Marques, que não mediu esforços em sua organização. Também prestaram colaboração para que tudo se realizasse conforme o planejado a professora Luciana Gomes e o parente e amigo Dr. Domingos José de Carvalho.

A mesa de honra foi composta pelo desembargador José Francisco Nascimento, representante do Tribunal de Justiça do Piauí, professor César Robério, representante da Prefeitura, juiz Antônio Oliveira, representante da Associação dos Magistrados Piauienses – AMAPI, João Alves Filho, presidente da Academia Campomaiorense de Artes e Letras – ACALE, professor José Francisco Marques, que fez a apresentação do livro, o médico Domingo José de Carvalho, que falou sobre o autor da obra, o advogado Dácio Mota, representante da OAB-PI, e o Dr. Josias Bona, filho do saudoso e impoluto juiz Hilson Bona, que foi homenageado (in memoriam) pela AMAPI, e este cronista. O cerimonial foi executado com muita maestria pela professora e acadêmica Avelina Rosa.

Estavam presentes membros de minha família, entre os quais minha mulher Fátima, Miguel Carvalho, meu pai, Antônio José e Maria José (irmãos). Compareceram ainda vários confrades da ACALE, como professor Loiola, Corinto Brasil, Jesus Araújo e Luciana Gomes, além de várias pessoas amigas e interessadas em cultura, dentre as quais registro o professor José Martins, Moreninha Melo, Leal, Josino Gomes de Oliveira, Jônathas Silva, Evandro Araújo e Geraldo Pucuta (ex-craque do Caiçara).

Domingos José, médico competente e dedicado, maçom da melhor linhagem, cidadão honrado, sem jaça, falou de minha trajetória de vida, de meu percurso literário e de servidor público, com belas e emocionantes palavras, que nos comoveram, a mim e a minha família, sobretudo meu pai, que chegou a chorar em mais de um trecho de seu discurso.

Com a mesma competência e propriedade, José Francisco falou de Confissões de um juiz, fazendo uma perfeita síntese de seu conteúdo e lhe examinando a linguagem e a estrutura organizacional das matérias enfeixadas nas diferentes partes. Discorreu também, assim como fizera seu antecessor, de forma sintética, sobre meus atributos intelectuais e sobre as minhas principais características humanas, bondosamente deixando de lado os meus defeitos.

José Francisco e Domingos José falaram ainda de minha curta, porém intensa, atuação de goleiro, em que afoitamente fiz minhas “pontes” e “voadas”, algumas vezes me arrojando aos pés do atacante, para fechar o ângulo da possível trajetória da bola. Domingos José terminou confessando que éramos torcedores do Caiçara e do Flamengo carioca.

Diante disso, aproveito a oportunidade para dizer que uma de minhas primeiras crônicas, publicada no jornal A Luta, quando eu tinha 16 anos, foi sobre as acirradas disputas entre o Comercial e o Caiçara, em que pontificaram dois dos maiores goleiros piauienses, Beroso e Coló, sobre os quais já escrevi crônicas, que podem ser encontradas através dos sites de busca da internet. Esses duelos, como os designei, incendiavam as ensolaradas tardes domingueiras de Campo Maior.

Em meu discurso, discorri brevemente sobre o conteúdo de meu livro, mormente sobre o meu percurso de servidor público. Falei sobre as principais características e virtudes de um verdadeiro magistrado, especialmente a imparcialidade e o senso de justiça. Prestei minha homenagem ao Dr. Hilson Bona, que considero um legítimo paradigma da magistratura piauiense. Ao falar das lutas que empreendi, como homem público e intelectual, me concentrei principalmente na parte relativa a Campo Maior.

Expliquei que em diferentes oportunidades me esforcei para retirar do olvido ilustres figuras da história de nossa comunidade. Entre esses injustamente esquecidos se encontravam (ou ainda se encontram) o seu fundador, sobre o qual, seguindo as pegadas de padre Cláudio Melo, escrevi o livro Bernardo de Carvalho – o Fundador de Bitorocara; o bravo tenente Simplício José da Silva, herói da Batalha do Jenipapo; Raimundo Gomes Vieira Jutaí, estopim da Balaiada, e um dos seus principais líderes. No seu manifesto, lavrado na vila da Manga – MA, datado de 15/12/1838, dois dias antes de liderar a abertura das portas da cadeia pública dessa vila, para libertar vaqueiros e outros trabalhadores injustamente presos, proclamou no seu artigo primeiro: “que seja sustentada a Constituição e garantias dos cidadãos”; e José Eusébio de Carvalho Oliveira (n.10/01/1869 e f.25/04/1925), que foi jornalista, promotor de Justiça, magistrado, membro de Junta Governativa do Piauí, e que exerceu os cargos de deputado federal e senador da República, pelo Maranhão, durante 25 anos. Portanto, o senador José Eusébio foi também membro dos Poderes Executivo e Judiciário. Recentemente, lembrei-lhe o nome ao deputado Wilson Nunes Brandão, quando ele me disse estar escrevendo um livro sobre os parlamentares piauienses.

Disse que em vários textos e discursos, a partir de 1997, quando tomei posse em Campo Maior de minha cadeira na Academia de Letras do Vale do Longá, defendi a preservação e restauração dos casarões e sobrados de nossa cidade, inclusive os da famosa Zona Planetária, de nome tão poético e sugestivo, sobre a qual escrevi um poema épico moderno de igual título, que terminaram reduzidos a escombros; na transformação do Cemitério Velho em museu e memorial a céu aberto, com a conservação e restauração dos túmulos, e criação de alamedas e caramanchões, além de um espaço temático, ainda que sobre pilotis, se necessário; a despoluição do Açude Grande, com a instalação de jardins e fontes luminosas, que lhe aumentem a beleza e a atração turística.

Com muita ênfase, defendi a ideia de que o entorno da barragem, sobretudo o horto florestal, poderia ser transformado num jardim botânico e em agradável balneário, com a instalação de bicas artificiais, que bem poderiam, em projeto arquitetônico e paisagístico, imitar cascatas ou bicas naturais. Evidentemente outros espaços poderiam ser criados no local, inclusive bares, quiosques e restaurantes.

No final, foi servido farto e variado coquetel, e houve a indispensável sessão de autógrafos. Nessa parte tive a satisfação de apertar a mão de vários amigos, como a professora Lindalva, que juntamente com seu marido, o comerciante José Francisco Cunha, foi prestativa e bondosa vizinha de meus pais.

E tive a emoção de ver uma pequena e bem conservada fotografia, trazida pela Gracinha (Maria das Graças Vieira da Silva), em que eu, com apenas um ano de vida, estava no colo de minha saudosa mãe, ambos ladeados por meu pai, parentes e amigos, todos jovens e bonitos.