quarta-feira, 30 de agosto de 2023

NA CASA DO ESTUDANTE E NO LICEU


 

NA CASA DO ESTUDANTE E NO LICEU


Elmar Carvalho


Passando ontem pela rua Rui Barbosa, em direção ao bairro Tabuleta, vi o velho prédio da Casa do Estudante, que fica perto do Verdão e do Estádio Lindolfo Monteiro. Recordei o jovem de 16 anos, prenhe de esperanças e de sonhos, que fui um dia. Nessa época, consegui com o Gilberto Ferreira, então seu presidente, meu conterrâneo, uma vaga, disputadíssima, considerando que em 1973 poucas cidades do interior do Piauí possuíam o 2º Grau.

Cheguei a esse abrigo em março desse ano, na época das chuvas, com pouca bagagem e uma velha cama de campanha, de lona verde, creio, que meu pai tinha e me deu. Os apartamentos já estavam lotados, de modo que fui designado para ficar num grande alojamento, que mais se assemelhava a uma enfermaria de um hospital público, com dezenas de camas bem próximas, espalhadas pelo vasto recinto.

Restou-me um local perto de uma janela de venezianas. Na hora, não atinei por que aquele local ainda estava vago. De repente, acordo atordoado, em meio a grande alvoroço. Chovera, e todos que ficáramos perto da janela recebíamos os respingos da chuva. Não me recordo de como consegui voltar a dormir. O chamado prédio novo estava quase concluído. Os veteranos iriam ocupá-lo.

O Gilberto Ferreira, irmão do Paulo Ferreira, hoje médico bem-sucedido e humanitário, dono do Hospital das Clínicas de Teresina, e do Clemilton, de estrepitosa e contagiante gargalhada, meus amigos, prometeu que os quatro de Campo Maior iríamos “herdar” o seu apartamento, que era um dos melhores do prédio velho, tão logo ocorresse a mudança.

O quarteto éramos eu, o Rui Lima, o Edmar Pinto, já falecido, um dos maiores craques do futebol piauiense, e Alfredo da Paz Neto, hoje advogado da CEPISA. A promessa foi cumprida. As instalações hidráulicas e elétricas eram antigas e já estavam comprometidas, de modo que, às vezes, sofríamos pequenos choques, na hora do banho, o que me deixava sempre apreensivo.

Quando eu passava o final de semana em Teresina, o principal lazer consistia em irmos, em pequenos grupos, a pé, à Praça Pedro II, e contemplarmos os volteios das raparigas em flor, na expressão feliz e poética de célebre escritor.

Eu estudava, à noite, no velho Liceu Piauiense. Quando meu pai foi ali me matricular no primeiro ano do antigo Científico, recebeu a notícia de que não havia mais vagas, o que foi um choque para mim. Meu pai pediu para falar com o diretor. O professor Olímpio Castro nos recebeu. Meu velho lhe explicou a situação, tendo ele dito que só dava para arranjar uma vaga no turno da noite. Dei-me por satisfeito, e fui matriculado.

Achava bonito, como mais ainda acho, o velho educandário. Contemplava, encantado, o seu auditório, e menino-poeta interiorano me sentia o próprio Castro Alves, a recitar os seus versos condoreiros no Teatro Santa Isabel, no Recife. Eu havia lido o ABC de Castro Alves, de Jorge Amado, e aquilo tudo me deslumbrava. As estátuas das mulheres, simulando verdadeiras cariátides, que pareciam sustentar o teto do auditório, se me afiguravam enormes e belas deusas gregas, e a minha imaginação me transportava à Grécia de que ouvira falar através de minhas leituras.

Pouco tempo atrás, revi esse auditório. O recinto já não me pareceu tão grande, e as mulheres já não me pareceram deusas e nem tão belas. Era a diferença entre as perspectivas de um rapazola ingênuo, cheio de sonhos, expectativas e devaneios, e um homem maduro, que já não acalenta ilusões.

Saudoso de minha terra e de meus pais, voltei, como diz a música do Roberto Carlos. Lá concluí o primeiro e fiz o segundo ano letivo. Tive bons mestres, cujos nomes, com alguma involuntária omissão, declino: Altivo da Costa Araújo, odontólogo, homem bom e bem-humorado, José Martins, bioquímico, meu irmão maçônico, Luís Francisco Miranda, meu vizinho, em cuja motoneta, uma Vespa ou Lambreta, peguei carona algumas vezes, Iracema Gomes e Margarida Alacoc, todos competentes e dedicados.

De modo que o meu retorno ao aconchego do lar paterno e materno em nada me prejudicou. 

5 de junho de 2010

Com muita satisfação, recebi, por WhatsApp, o comentário abaixo do amigo e poeta Wilton Porto:

Caneta de um Mestre das letras.

O Liceu tem uma arquitetura de imponente atração. 

Fincado após uma praça de área sugestiva, não tem como não chamar a atenção.


Nunca adentrei naquele educandário. O próprio Olímpio escreveu um livro sobre essa escola.


O "menino-poeta interiorano", hoje tem muitos auditórios à disposição para declamar e ser aplaudido.


Aprendi que, temos que sonhar grande. Ninguém conquista nada, se nos alforges de viagem, não tiver sonhos dourados e imensos.


Elmar sempre foi um el mar de sonhos, potencialidade literária e inteligência plausível.

Parabéns, por mais uma crônica iluminada!  

segunda-feira, 28 de agosto de 2023

UM POEMA DE AMOR

Fonte: Google


UM POEMA DE AMOR


Elmar Carvalho

 

            Eu me entrego todo

            a teu corpo de doação

aberto como

corola e cálice

aberto para a

recepção de meu corpo

que também se entrega.

            Percorro

           – minhas mãos –

    percorro teu

    corpo em ânsia

    em busca de seus

    recantos secretos

de suas grutas escondidas

de suas fendas perdidas

de suas chagas naturais.

            Eu me te entrego

            que te me entregas

como uma dádiva

que te dou e que me dás.

            Nos instantes

            de nossos afetos

percorro os relevos e as vertentes

de teu corpo como

quem penteia

cabelos de nuvens

            e altera

            a posição

            das estrelas.

            E desejaria,

            nessas horas

de lúcidas loucuras

que um brutal espasmorgasmo

nos consumisse

nos braços um do outro.

            E que uma

            longa vertigem

nos transportasse

            ao paraíso

dos sonhos das quimeras

            e dos loucos.

 

           Parnaíba, 1979

sexta-feira, 25 de agosto de 2023

DESFALQUES NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

 

Fonte: Google

DESFALQUES NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Valério Chaves

Desembargador aposentado do TJPI

 

         O Tribunal de Justiça do Piauí tem sofrido nos últimos anos consideráveis desfalques na  sua composição de desembargadores por força de inexorável disposição constitucional, uma vez que, por escolha voluntária, talvez nenhum dos que já despiram  a toga nessa condição, seria desativado das funções judicantes no segundo grau.

         Entretanto, há de se reconhecer que a disposição constitucional tem sido rigorosa com várias e apreciáveis inteligências do tribunal piauiense nos últimos anos, quando se sabe que muitos dos que atingiram a idade limite da compulsória, estão ainda saudáveis e intelectualmente aptos para continuar desempenhando as funções do cargo por mais tempo.

         Verifica-se que a partir de 2010 muitos desembargadores do TJPI se renderam ao holocausto do tempo, ou seja, despiram a toga como heróis de guerra que ensarilham suas armas, deixando nas pegadas por onde passaram exemplos de coragem porque foram justos no decidir e grandes na aplicação do Direito. No entanto, o tempo, que não pode ser antevisto, como dizia PLATÃO, lhes foi implacável ao trazer a colaboração grave de um dever sem recusa possível.

         Vale a pena registrar que entre esses heróis que se curvaram à imposição legal da aposentadoria compulsória nos últimos cinco anos nomes como: José Francisco do Nascimento, Antônio Francisco Paes Landim, Luiz  Gonzaga Brandão de Carvalho, Raimundo Nonato da Costa Alencar, Oton Mário José Lustosa Torres, Maria Eulália Gonçalves do Nascimento Pinheiro e Edvaldo Pereira de Moura.

         Nesse contexto, seria até escusado consignar que a aposentadoria compulsória, não representa a culminância de uma trajetória de trabalho sabendo-se que os magistrados que a ela se submeteram nos últimos anos, sempre souberam, pelos seus atos e virtudes espirituais, revelar o verdadeiro sentido do homem e do magistrado.

         Em verdade, a história da crônica do Tribunal de Justiça do Piauí, mostra que em todas as suas grandes decisões, todos eles estiveram presentes através da sensibilidade e do trabalho intelectual. Conviveram, certamente, não apenas com os problemas jurídicos que por dever de ofício, foram obrigados a enfrentar e decidir, mas sobretudo com problemas sociais no percurso da árdua caminhada imposta pela profissão que abraçaram.

         Ao lado disso, integraram-se, igualmente, e com a mesma convicção, na luta em favor do prestígio e da dignidade do Poder Judiciário piauiense, virtudes que asseguram respeito e independência da justiça institucionalizada, padecente nos dias atuais tumultuados do presente, de campanhas desmoralizadoras, tudo em nome da liberdade e da democracia.

         Daí acreditarmos que o “despir a toga” não significa necessariamente para  esses desembargadores ter morrido para a utilidade do trabalho como ocorria no filme japonês “A Balada de Narayama” onde a única alternativa encontrada para a sobrevivência era a morte de quem completasse 70 anos de idade.

         De nossa parte, como aposentado em tais condições, não tenho dúvida de que as pegadas de todos os colegas desembargadores que se despediram do nosso Tribunal de Justiça nos últimos anos, permanecerão como incentivo aos que ficam remoendo a dura realidade que os rodeia.

         Os juízes mais moços, não devem se distanciar dos exemplos de dignidade e de coragem deixados pelos mais velhos, principalmente nos dias atuais quando aumenta descrença do povo nas instituições brasileiras, ante manifesta carência de lições de democracia.

domingo, 20 de agosto de 2023

COISA NENHUMA

Fonte: Google


COISA NENHUMA


Elmar Carvalho

 

Meus olhos jogados ao

acaso como pedaços

de espelho quebrado.

Meus cabelos arrancados

flutuando como

cabelos do vento.

Minhas mãos decepadas

acenando em vão e em vão

apertando coisa nenhuma.

Minha cabeça atirada

numa lata de lixo

onde o lixo era ela.

Minhas células espalhadas

por uma tempestade que

partiu de mim.

Os pedaços de meu

corpo mutilado depois

se agregam como antes,

exceto a cabeça.

(Ai! Dalí, Dalí, Dalí...

O meu corpo sem cabeça,

como o Farmacêutico de Ampurdán,

anda à procura de coisa nenhuma.)

 

           Parnaíba, 1978. 

quarta-feira, 16 de agosto de 2023

PARÁBOLAS DO REINO DE DEUS (Apresentação)


 

PARÁBOLAS DO REINO DE DEUS (Apresentação)

 

Carlos Evandro M. Eulálio*

 

Na obra Ofício de Escrever, do renomado Frei Beto, há um capítulo em que o autor afirma o seguinte: “Já não faço prefácios de livros. Nem apresentações.” E justifica: “[...] Deixar de lado meu trabalho literário para ler obra alheia fora de meu campo de interesse, fazia-me perder o fio da meada.” (BETO, FREI, 2017, p.11). De minha parte, eu confesso: apresentar a obra de um escritor como Chico Miguel, mesmo que o seu conteúdo esteja fora do meu campo de interesse, longe de causar-me desconforto, constitui um privilégio e ao mesmo tempo a oportunidade de muito aprender com sua versada e profícua história de vida literária.

Inicio a apresentação das Parábolas do Reino de Deus, falando um pouco do autor. Francisco Miguel de Moura nasceu no lugar Jenipapeiro, município de Picos, atual cidade Francisco Santos, no dia 16 de junho de 1933.  Conta hoje com 90 anos de idade. Literariamente conhecido por Chico Miguel, é poeta, ensaísta, cronista, romancista, jornalista e crítico literário. Formado em Letras pela Universidade Federal do Piauí, é pós-graduado na Universidade Federal da Bahia. Sua estreia como poeta aconteceu em 1966 com a obra Areias. Esse livro retornou ao leitor em primorosa 2ª edição pela Editora Life, São Paulo, 2021. Além dessa clássica obra literária, suas demais poesias estão reunidas na obra “Poesia (in) Completa”, edição de 2016 da Academia Piauiense de Letras, na coleção Centenário, sob o nº 56. Em prosa, entre outras obras, é autor do romance Os Estigmas. Como ensaísta e crítico literário escreveu “Literatura do Piauí, de Ovídio Saraiva aos nossos dias”, livro da maior importância para a historiografia literária piauiense. Atualmente, como funcionário aposentado do Banco do Brasil, diz que se dedica exclusivamente a ler e a escrever. É o 5º e atual ocupante da cadeira nº 8 da Academia Piauiense de Letras. Não poderia omitir nesta resumida biografia do autor que ele é casado com D. Maria Mécia Morais Moura. 

Meu primeiro contato com a produção literária de Chico Miguel deu-se por meio da obra Linguagem e Comunicação em O. G. Rego de Carvalho, quando eu cursava Letras na antiga Faculdade de Filosofia do Piauí, no início dos anos 1970. Considero um dos estudos mais completos de crítica literária sobre O. G. Rego.  

Hoje temos a oportunidade de conhecer uma outra vertente da criação literária do escritor Chico Miguel, ao trabalhar com o gênero ou discurso bíblico-religioso nas “Parábolas do Reino de Deus”. Como o próprio título anuncia, essa obra reúne as parábolas mais conhecidas de Jesus Cristo, aquelas que revelam verdades profundas e que tocaram a sensibilidade de Chico Miguel.

Ao narrar as Parábolas do Reino de Deus, Chico Miguel não se atém à simples tarefa de reescrevê-las, mas de interpretá-las do ponto de vista de alguém que vivencia com entusiasmo a palavra de Deus. Na apresentação do livro, ele expõe os motivos que o levaram a escrever a obra: “Quando comecei a reescrever ‘Parábolas do Reino de Deus’, contadas por Jesus Cristo, sem afastar-me do conteúdo que foi escrito originalmente pelos evangelistas Mateus, Marcos, Lucas e João, disse comigo mesmo que gostaria de fazer um trabalho que me agradasse, mas desejando, ardentemente, em primeiro lugar agradar a Deus” (MOURA, 2023, p.13).

Eis como Chico Miguel organiza o seu livro: nas páginas iniciais, escreve a biografia de Jesus em duas partes. Na primeira, fundamentado nos escritos dos evangelistas e numa vasta bibliografia, nos apresenta o Cristo educador, na figura do mestre dos mestres que, aos 12 anos, já era muito admirado, “até causando espanto àqueles que interpretavam os textos sagrados, ali repetidos por Jesus.” Na segunda parte, intitulada “Jesus Cristo, Deus e homem verdadeiro”, o autor descreve o perfil de Jesus Cristo, a partir de suas ações, comportamentos e propostas.

Após a descrição biográfica de Jesus Cristo, inicia-se a narração das parábolas. Para tanto, o poeta recorre à paráfrase, recurso definido pelos linguistas e teóricos da linguagem como reescrita de um texto sem distanciamento de seu conteúdo temático, sendo uma espécie de tradução dentro da própria língua. Conforme Samir Meserani, são conhecidos dois tipos de paráfrases que se diferenciam pela forma como o texto original é recondicionado. O primeiro é apenas reprodutivo, reescreve quase literalmente o texto base. O segundo, desenvolvido por Chico Miguel nas Parábolas do Reino de Deus, é aquele de natureza criativa, porque “ultrapassa os limites da simples reafirmação ou resumo do texto original”, indo além da transcrição literal. Essa ultrapassagem do texto original, sem afastar-se da ideia central, decorre da sua dimensão intertextual, que reforça a heterogeneidade do texto parafrástico. Nessa modalidade, a paráfrase remete a outro texto que passa a constituir um novo discurso. Aludindo a outros textos, deles se aproxima em extensão. Nas palavras de Affonso Romano de Sant’Anna: “falar de paráfrase é falar de intertextualidade das semelhanças” (Sant’Anna (1985, p.28). Esse entendimento indica que a paráfrase é um mecanismo dialógico com novos sentidos, sempre acrescentando algo ao que já existe. Daí, ao reescrever as Parábolas do Reino de Deus, Chico Miguel constrói um novo discurso que, para efetivar-se, exigiu de si um exercício exaustivo de criatividade e reflexão.

Na reescritura das “Parábolas do reino de Deus” fica evidente o propósito didático de Chico Miguel, ao interagir com o leitor, chamando-lhe a atenção para que as fábulas “sejam lidas com cuidado, com amor e com fé” (MOURA, 2023, p.19). Nas várias passagens do livro, como na paráfrase da parábola “A figueira amaldiçoada”, o poeta nos dá esse testemunho de fé cristã, “como forma de merecer as graças de Deus.” Essa convicção é compartilhada com o leitor, como incentivo de afirmação dessa virtude teologal, com estas palavras: “Creio que a leitura deste trabalho sobre as ‘Parábolas do Reino de Deus’, reescritas para serem distribuídas aos que disponham reler aquilo que está na Bíblia, seja mais um incentivo de afirmação de nossa fé em Deus para sermos dignos de receber suas graças” (MOURA, 2023, p. 71).

Essa intenção didática de Chico Miguel é explícita no final de cada narrativa, quando ele esclarece o leitor sobre o sentido do texto que acabou de ler, além de contextualizá-lo em nosso tempo histórico e cultural. Para exemplificar, eis como reescreve o final da Parábola do Grão de Mostarda, uma das menores parábolas de Jesus que nos traz um grande ensinamento sobre a fé e o reino de Deus: “Como vimos, esta parábola é um claríssimo convite de Jesus aos homens para que sintam o espírito germinar (como a semente de mostarda), em verdade, beleza e bondade, nos seus corações, em busca da glória de Deus, e evitem entregar-se à ilusória potência do mal, aqui representada pelo tamanho das folhas da mostardeira (MOURA, 2023, p. 40). Esse método facilitador de leitura auxilia o leitor a compreender o aspecto simbólico ou alegórico de cada parábola. Este o grande mérito da obra Parábolas do Reino de Deus.  

Chico Miguel é um polígrafo da literatura piauiense. Se ele não vive dos ganhos da atividade literária, sempre teve a intenção de viver exclusivamente dela. Nos diversos escritos que põe em prática mostra domínio em tudo que escreve. O livro que hoje publica pela Entrelivros constitui excelente exercício de hermenêutica bíblica das Parábolas do Reino de Deus. Certamente, nos ajudará a compreender o que é essencial e profundo em suas passagens, com mais precisão e aplicabilidade à vida diária. Seus benefícios vão além do autoconhecimento, podendo estender-se também à convivência cristã em comunidade.   

* Carlos Evandro M. Eulálio, professor e crítico literário. É membro efetivo da Academia Piauiense de Letras, segundo ocupante da Cadeira 38, tendo como patrono o poeta popular João Francisco Ferry.

  

REFERÊNCIAS

 

BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem, 5ª ed. São Paulo: Hucitec, 1990.

 

BETO, Frei. Ofício de escrever. Rio de Janeiro: Anfiteatro, 2017.

 

MESERANI, Samir. O intertexto escolar. 4.ed. São Paulo: Cortez, 1995.

 

MOURA, Francisco Miguel de. Parábolas do Reino de Deus. Teresina: Livraria Nova Aliança, 2023.

 

SANT´ANNA, A. F. Paródia, paráfrase & Cia. 3.ed. São Paulo: Ática, 1985.   

terça-feira, 15 de agosto de 2023

CEMITÉRIO VELHO – MUSEU E MEMORIAL

Fonte: Google

Fonte: Google

 

CEMITÉRIO VELHO – MUSEU E MEMORIAL


 Elmar Carvalho


Através da internet, vi matéria da Katiucia Alves, informando que as zeladoras do cemitério velho de Campo Maior, há muitos anos desativado, se queixaram de que algumas pessoas da circunvizinhança jogam lixo no seu interior, por cima de seu muro, já penso e gretado. Na mesma reportagem, consta que a prefeitura deseja construir no local uma praça, a exemplo do que ocorreu em Piripiri, em que foi construída a Praça das Almas no local onde existira um campo santo, mas que os campomaiorenses são contra essa solução.

 

No meu entendimento, toda administração, pública ou privada, deve ser criativa, e procurar várias opções para resolução dos problemas, inclusive soluções inovadoras e até mesmo revolucionárias em certos casos. Tenho conhecimento de que, em alguns outros países, inclusive na Inglaterra, um cemitério pode ser transformado num lugar agradável, usado para passeio, como se fosse uma praça ou um parque. Na Argentina existe o famoso La Recoleta, cantado e exaltado por Jorge Luís Borges.

 

Acredito que, com um bom trabalho de arquitetura e paisagismo, o nosso antigo campo santo, tão caro aos campomaiorenses, bem poderia ser transformado numa espécie de museu e memorial a céu aberto, com a plantação de árvores, criação de jardins, passeios, alamedas, caramanchões, bancos e um espaço coberto, que poderia servir de templo ecumênico e de uma espécie de auditório, para certas palestras ou encontros. Em certos recantos seriam colocadas estátuas alegóricas da vida, da morte e da saudade, bem como placas ou lápides, que contassem um pouco da história do cemitério, de seus mortos e de nosso município.

 

Seria um museu e memorial porque esse campo santo conta muito da história de Campo Maior. Muitos moradores antigos, de velhas estirpes do município, estão ali sepultados, assim como muitos de seus filhos ilustres, nas mais diferentes áreas da atividade humana, seja intelectual, artística, política ou empresarial.

 

Esse local guarda muito da memória histórica do município, através de suas lápides. Eu mesmo, em minha adolescência, percorrendo suas alamedas, descobri o túmulo do poeta Moisés Eulálio, e lhe escrevi um necrológio, em forma de crônica, que publiquei no inesquecível jornal A Luta, nos meus bisonhos dezesseis anos de idade.

 

Alguns túmulos têm valor histórico e artístico, e falam, em seu silêncio monumental, de costumes, de artes e valores de uma outra época. Por outro lado, esse prédio faz parte da paisagem urbana, e está incrustado na memória e na saudade de pessoas de várias gerações; sua destruição empobreceria o nosso patrimônio arquitetônico. A sua conservação, com o restauro dos túmulos e criação do museu e memorial, nos moldes em que sugeri, seria uma prova de respeito aos mortos e seus familiares.

 

Por outro lado, a nossa cidade estaria sendo pioneira no Piauí, não sei se mesmo no Brasil, em adaptar um cemitério para ser um museu e memorial, bem como um logradouro agradável e propício a passeios e meditações.

 

Também serviria para que os campomaiorenses tenham um sentimento de menos temor ante a perspectiva da morte; aliás, todos passariam a ver a morte com mais naturalidade, como parte integrante e indissociável da vida. Não agrediria a religião e a religiosidade de ninguém, porquanto todas as religiões respeitam os mortos e consideram a morte como a passagem para outra vida, como um pórtico de entrada para uma outra dimensão da existência humana. 

24 DE JULHO DE 2010

Literatura Piauiense na Escola , de Luiz Romero Lima

 



Já se encontra à venda no SALIPI - Salão do Livro do Piauí o monumental livro <<Literatura Piauiense na Escola>>, da autoria do professor Luiz Romero Lima, que traz comentários críticos e biográficos sobre os principais autores do Piauí, desde Ovídio Saraiva (1787 - 1852) aos contemporâneos, e entre eles os canônicos. A obra é ricamente diagramada e ilustrada com fotografias dos autores e das capas de seus livros. Muito importante e necessária para professores, estudantes e demais interessados, sobretudo agora em que a Literatura Piauiense será ensinada em nossas escolas, como disciplina obrigatória, conforme determina a legislação vigente.  

segunda-feira, 14 de agosto de 2023

Lançamento de "O Poeta e seu Labirinto" no SALIPI

 


“O Poeta e seu Labirinto”, de Elmar Carvalho, será lançado nesta segunda no SALIPI

 


O poeta Elmar Carvalho, da Academia Piauiense de Letras e da Academia Parnaibana de Letras, lança nesta segunda-feira (14) no Salão do Livro do Piauí, o SALIPI, na Universidade Federal do Piauí.

 


 

Elmar Carvalho se apresenta às 20h no Espaço Bate-Papo. A obra O Poeta e seu Labirinto, segundo o autor, traz uma importante análise crítica do professor Carlos Evandro M. Eulálio.

Fonte: Portal Correio do Norte

domingo, 13 de agosto de 2023

SONETO DA SOLIDÃO

Fonte: Google

 

SONETO DA SOLIDÃO


Elmar Carvalho

 

Nas noites em que a lua alumia

a solidão das desertas chapadas,

soturnamente, adormece a melancolia.

Os raquíticos espinheiros, como ossadas,

 

quando a noite é bem sombria,

a sós com a solidão das quebradas,

contemplam, tristonhos, a nostalgia

das lúgubres noites amortalhadas ...

 

 

A araponga, se a noite desce,

solta seu grito que esmaece

na solidão, seu calvário!

 

Quando o dia chega ao termo,

a solidão que envolve o ermo

é como minha alma de solitário.

sexta-feira, 11 de agosto de 2023

DE POEMAS E DE PECADOS

 

Fonte: Google

                          

DE POEMAS E DE PECADOS


Elmar Carvalho


De manhã cedo, em Regeneração, fui a uma farmácia, perto da matriz de São Gonçalo, colocar crédito em meu celular. Enquanto era atendido, de repente, caiu uma chuva torrencial, que me prendeu no estabelecimento. Aproveitei para olhar a chuva e os pequenos córregos que se formaram e desciam em direção ao Mulato, que separa o centro do bairro Jaicó.

Quando o tempo amainou um pouco, resolvi ir à gráfica Mulato, para conversar um pouco com a Nileide. Conversamos sobre assuntos diversos, mormente sobre cultura, experiência de vida, comportamento e sobre os pecados abordados pelo Zuenir Ventura em seus livros temáticos. Nos detivemos a analisar o triste sentimento da inveja. Disse-me a Nileide que foi esse pecado que mais trabalho deu ao escritor, porquanto ninguém admite ser invejoso.

Falamos sobre os despreparados para o exercício de cargos públicos, sobretudo os que se empolgam demais com o poder e sobre os que o usam sem a observância do princípio constitucional da impessoalidade, e querem administrar a coisa pública como se fossem donos. Contou-me ela que o seu irmão Moacy, dotado de senso de humor e verve, foi visitar um amigo na sua repartição.

Ao chegar, encontrou um conhecido com quem costumava brincar e que era expansivo e cordial com ele. Notou que o cidadão estava “fechado”, monossilábico, quase taciturno, e que mal lhe respondera o cumprimento. Em conversa com o amigo que fora visitar, recebeu a informação de que essa pessoa sorumbática havia se tornado o chefe de certa repartição pública. O irmão da Nileide, incontinenti, observou que havia notado que algo errado havia acontecido com ele.

Ou seja, deram-lhe um cargo público sem que ele estivesse preparado para assumi-lo. Por isso mesmo, o povo, em sua sabedoria, diz que a formiga quando quer se perder cria asas. A Nileide aproveitou para me mostrar um livro que havia recebido de seu parente Climério Ferreira, poeta e músico da melhor cepa. Era um livro graficamente belo, impresso em papel grosso, quase cartonado, algo semelhante a uma caderneta. Seu título era Da Poética Candanga, e tinha o subtítulo de Poesia sobre Poesia.

Pela subtitulação e pela rápida folheada que fiz, foi fácil inferir que tem metapoemas e que intertextualiza com autores diversos, sendo que alguns estão entre os melhores poetas contemporâneos do Brasil. Pelos poucos poemas que pude ler, tenho certeza que se trata de uma ótima obra poética, cujos poemas estão na mesma altitude das matrizes de que provieram.  

2 de junho de 2010

terça-feira, 8 de agosto de 2023

domingo, 6 de agosto de 2023

SACRIFÍCIO

Fonte: Google

 

SACRIFÍCIO


Elmar Carvalho

 

Abrir meu ventre

como uma rosa de carne

e de suas vísceras multicores

pétalas dispostas em arabesco

projetar uma poesia

feita de flores e de fezes.

Cortar meu corpo

e retalhar minha alma

e fazer uma poesia

de matéria e de espírito

e morrer na última palavra

do último verso por nascer.

Drenar

minhas veias e

com seu sangue

regar um poema canibal

que não fale de morte.

E escrever a obra-prima

com o sangue da alma.

            Parnaíba, 17.05.78

sábado, 5 de agosto de 2023

Elmar Carvalho participa das comemorações dos 200 anos de nascimento de Gonçalves Dias




Para comemorar os 200 anos de nascimento do poeta maranhense Gonçalves Dias, o Institut Cultive Suisse Brésil promove uma série de palestras com professores e poetas nesse domingo às 17h, horário de Brasília, pela internet.

Entre os palestrantes está o poeta Elmar Carvalho, da Academia Piauiense de Letras e da Academia Parnaibana de Letras.

Elmar Carvalho já fez a palestra presencial em Caxias no Maranhão dia 1º de julho.

Elmar Carvalho estará ao lado das professoras, Erlinda Bittencourt, Teani Godolfim e Valquiria Imperiano. 

Fonte/Foto: Elmar Carvalho. Edição: APM Notícias.

sexta-feira, 4 de agosto de 2023

ENTRE FARISEUS E SAMARITANOS




                         

ENTRE FARISEUS E SAMARITANOS  


Elmar Carvalho

       

No domingo, degustando um chopp no shopping, conversei com o Paulo Nunes, que foi meu colega no curso de Direito da velha UFPI. Estávamos no simpático Botequim, de propriedade de sua mulher. Ele é aposentado como agente da Polícia Federal e é o chefe de gabinete da Secretaria de Segurança Pública.

Contou-me ele um caso curioso, que bem mostra como às vezes pode ser difícil o mister de um julgador, e que demonstra que cada caso é um caso, como diz o jargão jurídico, com as peculiaridades e nuanças próprias. Ele fazia parte de uma blitz da PF, quando os agentes abordaram um caminhoneiro gaúcho. Encontraram no veículo uma razoável quantidade de maconha.

O motorista, desesperado, chorou e soluçou copiosamente, e terminou confessando que fizera o transporte da droga porque estava desesperado, com quatro prestações do carro em atraso, e que já havia sido notificado de que a empresa concessionária iria entrar com uma ação de busca e apreensão. Mostrou o carnê com as prestações atrasadas e o aviso de que a ação seria ajuizada. Foi-lhe permitido fazer as ligações de praxe para os seus familiares.

Posteriormente, no cárcere, contou para o Paulo que a sua mãe iria vender o pequeno imóvel agrícola, do qual seus parentes tiravam o sustento, para contratar um advogado do Rio Grande do Sul. Condoeu-se Paulo com o drama que se delineava, e resolveu ligar para a mãe do motorista. Pediu-lhe que tivesse paciência, e não vendesse a propriedade, pois tentaria encontrar um advogado de Teresina, que cobrasse honorários mais em conta e parcelasse o pagamento.

Contactou o César Feitosa, que aceitou a causa do caminhoneiro, que acabou sendo solto três meses após. O motorista e sua família cumpriram fielmente o acordado. Além disso, o caminhoneiro tinha a virtude da gratidão, e todos os anos, na época do Natal, liga para o seu benfeitor, ainda reconhecido pelo gesto de bondade e compreensão.

Paulo cumpriu fielmente o seu dever, mas soube compreender as vicissitudes e tragédias a que todos somos suscetíveis, na fragilidade e instabilidade da condição humana. Sem dúvida, entendeu que aquele homem não era propriamente um bandido, mas alguém que, num momento de fraqueza e de desespero, cometera um crime, do qual se arrependera amargamente.

Aposentou-se sem nunca ter sofrido uma pena disciplinar. Certamente, muitos fariseus, que se acham mais catões do que o próprio Catão, jamais fariam o gesto de solidariedade e compreensão humana que o Paulo fez, sem outro interesse senão o de mitigar o sofrimento do próximo, como se fora o samaritano da parábola de Cristo.  

1º de junho de 2010