sábado, 31 de dezembro de 2022

O PATO E O FAZ-TUDO

Fonte: Gloogle

                           

O PATO E O FAZ-TUDO


Elmar Carvalho


Após o término da audiência, o senhor Valdemiro Sousa confessou-me ser uma espécie de faz-tudo, pois é cabeleireiro, encanador, marceneiro, pedreiro, lavrador, e talvez mais alguma coisa que eu possa haver esquecido. Disse-lhe que ele era um polivalente, e lhe perguntei se poderia contar a anedota do pato. Demonstrei-lhe que um pato faz muitas coisas, como andar, nadar e voar, mas que nenhuma dessas atividades ele faz com eficiência.

Tem chouto lento, pois tem as pernas curtas, os pés em forma de palmas ou pás e o corpo pesado e um tanto parecido com o casco de um barco, o que lhe faz ser algo desengonçado; o voo é curto e rasteiro, o que não lhe dá muita vantagem no caso de uma fuga; o seu nado, embora gracioso, é lerdo, o que lhe torna uma presa fácil de um predador como um jacaré, por exemplo.

Sousa, entendendo o meu recado brincalhão, não lhe passou recibo e nem se deu por achado, e imediatamente respondeu, bem-humorado, que fazia bem-feito as coisas que fazia. É claro que temos o chamado homem de sete instrumentos, que geralmente não é exímio em nenhum deles ou, na melhor das hipóteses, só domina um ou dois, mas dificilmente vindo a ser virtuose ou mestre.

Elevado ao paroxismo, o especialista é aquele que sabe tudo de nada, e o generalista é o que sabe nada de tudo. Ora necessitamos das profundidades abissais e quase obscuras de um especialista, ora precisamos da visão rasa, mas ampla e geral de um mestre das superficialidades. O mundo é composto e plural, e assim o devemos aceitar.  

28 de abril de 2010

quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Deus, para um Poeta maior!

Fonte: Google

 

Deus, para um Poeta maior!


Cícero Véras

Pastor, poeta e escritor

 

Sabe, ao ler seu poema, ao qual chamei de perfeito, pude ver uma nota do próprio Apóstolo João, ao escrever o evangelho que muito tem inspirado pessoas a viverem em Deus, em suas bem definidas palavras que expressam a manifestação de Deus através de Jesus. Ele o faz de uma forma muito simples, porém completa. Diz João:

 

João 1:1-3

 

“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e, sem ele, nada do que foi feito se fez”.

 

A profundidade empregada nesse poema, é algo assim bastante além da mente natural, incapaz de captar a singeleza que é pensar Deus. Ouvir falar e as vezes até tentar responder quem é Deus, pra muitos parece algo muito difícil, pois, para  uma mente natural descrever essencialmente quem é Deus, me parece impossível, sem a inspiração divina. Você o faz através da “pena de um habilidoso escritor” (Sl 45.1), o próprio Deus.

 

Esse ser tão extraordinariamente grande, poderoso, magistral, é também tão  extraordinariamente interessante, que através de uma estratégia nada comum e nem natural, envia seu filho unigênito para se tornar primogênito, o primeiro de muitos, para que nós também, fôssemos transformados em filhos, através do seu filho.

 

Depois, completando essa estratégia extraordinária, decide habitar dentro de nós, meros mortais, a quem Ele convida a ser eternos através do sacrifício vicário de seu filho tão amado, Jesus.

 

Como expressar esse Deus, que nos amou de tal maneira, que deu o seu filho pra morrer por nós? Através de meros pensamentos, impossível. Por isso, teimo em dizer, que não foi o natural que te inspirou a escrever essa poesia, mas o próprio Deus.

 

Como disse em um breve comentário: disse tudo com tão poucas palavras, porém extraordinariamente tudo. Perfeito!

quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Comentário ao poema Deus

Fonte: Google
Arte: Elmara Cristina


O poeta Wilton Porto escreveu o comentário abaixo sobre o meu poema Deus, que se encontra publicado na postagem anterior deste blog, em que ressaltou vários aspectos do sintético poema, inclusive a sua simplicidade, mesmo tratando de um tema tão complexo:

O poema acima é simplesmente magistral.

Elmar diz com profundidade, usando de palavras simples, para mostrar aquEle que é o mais profundo dos seres.

A sequência dos versos, numa sapiência de grande sensibilidade, depois do poema pronto, é um poema comum. Mas para montá-lo, já não é comum. E ninguém ousou.


Se é nada, nada pode criar. É muito evidente. Nada é só um vácuo. Até num ditado comum se usa da expressão: este cara não cria nada, não consegue nada, porque ele não é nada... O poeta reforça o primeiro verso, no segundo: se é nada; deixe-o encostado: "Ah, cara! Ele é nada! "Apenas nada!"No nada, não existe valorização. É encostado, jogado no lixo.

No terceiro verso começa o poema a deslanchar.

Deus; que ninguém O creou(com "e", sim!). Por isto "incriado" é o "criador"(creador. Deus crea, o homem cria. Conforme Huberto Rohden).

Ora! Se Deus não foi criado, Ele não existe; é nada.

Porém, este nada crea. Somente Ele é o criador, conforme o eu-poético.

Se o nada, nada cria, somente Deus, que "nada" ou ^incriado", consegue criar ou crear algo.

Nos versos seguintes, o eu-lirico afirma que Deus "criou tudo e nada o criou".

O Poeta joga com as palavras, para dar beleza ao poema. Para torná-lo criativo. Elmar é Mestre em aliterações.

Ele mostra que, Deus criou tudo que nos há. Mas ninguém criou Deus. Ele Se creou a Si. E com o dom de crear, creou todas as coisas existentes 

Nos versos seguintes, o eu-poético afirma e confirma o poderia de Deus.

Por isso, Ele é Deus.

Deus é Poder máximo. A grande Onipotência.

Ele é Único e Se divide em três.


Por que, que tudo sem Deus é nada?

O homem não é creador. O que Deus crea, não se destrói, não queima, não se afoga, não se mata. Ele crea o intangível e o homem o tangível. Só o tangível se destrói.

Tudo, se estivermos em Deus e com Ele, sobreviverá. No Novo Céu.

Você pode não nada neste mundo; se tiver Deus, tudo você tem.

Com Ele, do nada a rocha gera água potáve e dos Céus vem o maná(caminhada no deserto do povo hebreu).


"Logo Deus é tudo",


Veja o desfecho do poema: jogada de Mestre.

Se Deus, Ser incriado, cria tudo. E tudo que cria não se destrói. Se com Ele tudo temos, tudo podemos.

Este Ser, que não se sabe como Se criou ou creou, que tudo pode, que é Onipotente, Onisciente e Onipresente, é um Ser Perfeito e Único e que o chamamos de Deus. Ele é "tudo!"

terça-feira, 27 de dezembro de 2022

DEUS

 


Recebi um cartão virtual sobre o coração humano, no qual consta uma estatística sobre quantas vezes ele bate por segundo, por minuto, por hora, por dia e por um ano. Isso demonstra o quão bem-feito e forte é esse “comboio de corda” ou bomba. A meu ver só pode ter sido projetado e criado por Deus. Repassei essa postagem aos meus contatos. Mesmo tendo grandes teólogos e filósofos escrito sobre Deus,  ainda assim cometi a loucura, a temeridade ou audácia de construir o poema abaixo, na verdade um tosco esboço:


DEUS


Elmar Carvalho


O nada não cria nada.

O nada é apenas nada.

Somente Deus é  o incriado criador. 


Deus criou tudo.

E nada o criou.

Por isso é que ele é  Deus.


Tudo sem Deus é nada.

Nada com Deus é tudo.

Logo, Deus é tudo.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

LEITURAS COMPARTILHADAS DE HISTÓRIAS DE ÉVORAS DE ELMAR CARVALHO

Fonte: Google


LEITURAS COMPARTILHADAS DE HISTÓRIAS DE ÉVORAS

DE ELMAR CARVALHO


Francisco Carlos Araújo

 

O LENDÁRIO ZÉ LOLÔ

 (Capítulo XVIII, páginas 87 a 90)

 

Por que escolhi esse texto?

                De certa forma, a decisão de escolher esse texto se deu por três motivos. Primeiro, porque o assunto nos leva a lembrar as “histórias de assombrações” que ouvimos quando criança e na adolescência. Eu, quando ainda muito pequeno, testemunhei pessoas adultas falando da existência de criaturas sobrenaturais que andavam perambulando pelas matas, ruas, estradas, rios. Falavam que já tinham visto, por exemplos, o lobisomem, caipora, a mulher chamada não-se-pode, o cabeça de cuia etc. Essas histórias, naturalmente, nos causavam muito medo nesta nesse faixa etária, e, talvez também, junto às pessoas adultas. Esses boatos nos deixavam mais quietos em casa; evitávamos demorar na rua um pouco mais durante à noite.

                O segundo motivo, deve ao fato de eu ter escrito uma crônica memorialística alusiva à minha adolescência quando minha família ainda residia no bairro “Morro da Esperança”, zona norte de Teresina, no final da rua Alcides Freitas, bem próximo ao rio Poti, onde fica localizado o “Monumento Motorista Gregório” (na época inexistia a Av. Marechal Castelo Branco). Nesse texto, intitulado “O MORRO DOS VENTOS DA ESPERANÇA” (Capítulo IV, págs. 249/253 do nosso livro “O MENINO, O RIO E A CIDADE”), eu falo de algumas de minhas lembranças, dentre elas um boato de um certo lobisomem que aparecia em um beco que servia de travessia entre as ruas Alcides Freitas e Manoel Domingos.

                E por último, escolhi o mencionado texto por ser um tema instigante, interessante, e, principalmente, por se tratar de um gênero da literatura chamado de Realismo Fantástico, ou Realismo Mágico. Poderia ter escolhidos os textos dos capítulos XXII e XXIII (A serra encantada 1 e Serra encantada 2) que também se enquadram também nesse gênero. Mas, pelas razões já conhecidas, preferi mesmo foi o “O LENDÁRIO ZÉ LOLÔ!”.

                Antes iniciar meus comentários, quero salientar que Histórias de Évora do poeta e romancista Elmar Carvalho é, segundo minha opinião, um dos melhores romances de autores piauienses que li nesses últimos cinco anos. O autor do premiado livro Rosas dos Ventos Gerais, Noturno de Oeiras, Cromos de Campo Maior, Lira dos Cinquentanos, Confissões de um Juiz, foi muito feliz nesse desafio de escrever ficção e estrear no gênero do romance. Veja o que disse o ilustre escritor piauiense e pós-doutor em Literatura Brasileira Cunha e Silva Neto sobre o romance Histórias de Évora:

                “Preferindo seguir a linha de uma ficção de corte mais tradicional, até na linguagem, com ressonâncias de autores portugueses ou brasileiros, mas ao mesmo tempo incorporando ao seu texto contribuições da narrativa contemporânea, (...), Elmar Carvalho logrou êxito nessa combinação do antigo com o novo, o que, de certa maneira, sem forçar, se poderia aduzir que na obra em questão existem traços distintivos inegáveis de pós-modernidade.”

                Ainda sobre o romance Histórias de Évora, o escritor maranhense de Presidente Dutra/MA e Coordenador do blog Folhas Avulsas, Dr. José Pedro Araújo Filho, manifestou-se da seguinte forma:

                “ (...). Agora, não satisfeito com tudo o que já fez pela literatura piauiense, vem o trovador nos surpreender com uma obra romanesca: Histórias de Évora. E Elmar Carvalho vem até nós, munido da sua fonte inesgotável de criação, presentear-nos com uma obra ficcional de estreia densa e deliciosa.”

                Mas deixemos para os críticos literários e estudiosos a incumbência de analisar e estudar essa magnifica obra do escritor Elmar Carvalho: Histórias de Évora.

                Agora, vamos ao que me cabe nessas Leituras Compartilhadas de Histórias de Évora de Elmar Carvalho, que é comentar o texto intitulado “O LENDÁRIO ZÉ LOLÔ”.

(Iniciar a leitura O LENDÁRIO ZÉ LOLÔ - Capítulo XVIII, páginas 87 a 90)

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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O REALISMO FANTÁSTICO OU REALISMO MÁGICO

 

                Conforme eu disse anteriormente, o referido texto se enquadra no gênero literário conhecido como Realismo Fantástico ou Realismo Mágico. E o que significa esse gênero?

                Segundo um estudo¹ de Carolina Marcello, Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes, que o Realismo Fantástico ou Realismo Mágico surgiu no século XX, e que até hoje arrebanha cada vez mais um público maior de admiradores desse gênero.

                Paulatinamente, esse gênero literário foi sendo divulgado pelo mundo, inclusive influenciando grandes escritores europeus como Franz Kafka ao escrever seu livro Metamorfose, e Milan Kundera.

                O Realismo Fantástico é, conforme a mestre Carolina, uma mistura da “visão realista do mundo com elementos mágicos que são inseridos em cenários cotidianos.”

¹ Documento de autoria de Carolina Marcello (localizado na internet).

O realismo fantástico se manifesta nas artes, inclusive na literatura, onde os elementos da realidade se combinam com a fantasia, sonho e magia, engendrando uma produção harmônica. Por exemplo, fatos históricos ou mitológicos, lendas e folclore se combinam para produzir algo inédito, com o objetivo de analisar outros conhecimentos da realidade, utilizando-se de representações diferentes da ordenação lógico-científica.

No mesmo documento, Carolina Marcello elenca as principais características do Realismo Fantástico:

- Alguns elementos da ordem do fantástico são inseridos em cenários realistas e cotidianos, como se fossem comuns;

- Esses elementos são encarados com alguma naturalidade, sem provocarem grande surpresa, choque ou apreensão;

- Não existe uma explicação racional para os acontecimentos fantásticos, que apenas ficam abertos a interpretações subjetivas;

- O tempo não é tratado de forma linear, podendo estabelecer ligações entre o presente e o passado, como se os eventos ecoassem entre si;

- Está relacionado com temas ou figuras que fazem parte do imaginário comum de um determinado local, muitas vezes integrando suas crenças e mitos.

               

Na literatura latino-americano, os autores que se destacaram no realismo fantástico ou realismo maravilhoso são Gabriel García Marquez (Cem anos de solidão) e Jorge Luis Borges (Ficções, livro de contos, e O livro dos seres imaginários), Mario Vargas Llosa, Julio Cortázar e Isabel Allende.

                No Brasil, o primeiro autor a escrever o gênero realismo fantástico foi o mineiro Murilo Rubião, com seus contos narrando histórias de dragões e coelhos falantes, cenários de remotos reinos, seres esquisitos, bem como descrições de cenários do quotidiano, destacando epígrafes bíblicas na abertura dos contos.  O seu primeiro livro foi “O Ex-Mágico”, em 1947.

 José J. Veiga, natural de Corumbá de Goiás (GO) é outro grande nome do realismo fantástico brasileiro. Veiga escreve suas histórias baseadas narrativas faladas no cotidiano para criar novos espaços fantásticos em pequenas cidades situadas em distantes lugares, que são invadidas de forma surpreendente por seres extraterreste, cães, bois.

No Piauí, o romance de ficção intitulado FLOR MARIA do escritor teresinense Joseph Paz, publicado recentemente, se enquadra, salvo melhor juízo, perfeitamente no gênero do realismo fantástico ou realismo mágico. O autor mistura folclore, seres sobrenaturais e religiosidade com a história da Revolta da Balaiada com um resgate de uma bela moça que residia com seu pai em São José das Cajazeiras, na margem esquerda do rio Parnaíba, atual de cidade Timon.

O sequestro foi praticado por um chefe de um bando de revoltosos de nome Raimundo, que tinha o apelido de Cara Preta. Seu esconderijo ficava situado em algum lugar da Chapada do Corisco, hoje Teresina, capital do Piauí. O pai da moça e um oficial do exército de Duque de Caxias, aquartelado em Caxias, resolveram resgatá-la. O escritor descreve fantásticos relâmpagos que caem repentinamente atacando esses dois valentes homens. No final do romance acontecem coisas extraordinárias como, por exemplo, o aparecimento de “seres parecidos com o cabeça-de-cuia, sendo mais alto do que os homens, com escamas na coluna, entre elas, duas enormes entre os braços e o tronco, que pareciam asas. Também possuíam olhos verdes, peles caboclas ou cafuzas ou negras, revestidas de plantas fluviais. (...) Eles pulavam dos rios como fogos de artifícios e entravam na mata a correr, saltavam nas copas das palmeiras, quase voavam e levavam chicotes grossos feitos de cipós verdes e vermelhos para laçar os homens.”

                Ainda sobre esse gênero da literatura no Piauí, o ilustre escritor e poeta Elmar Carvalho vem contemplar aos leitores, amantes do realismo fantástico ou realismo mágico, no seu livro HISTÓRIAS DE ÉVORA com três extraordinários textos. O primeiro, intitulado O lendário Zé Lolô (Capítulo XVIII). O segundo, A serra encantada 1 (Capítulo XXII. E por último, A serra encantada 2 (Capítulo XXIII).

                O Capítulo XVIII trata de uma história fictícia ocorrida em Évora sobre um homem de nome José Malaquias, mas é conhecido como Zé Lolô, onde muitas pessoas da cidade acreditavam que ele se transformava em um lobisomem. O homem era negro, “cabelos e barba eram desalinhados, opacos e duros como crinas de cavalo. O caminhar era desengonçado e bamboleante como o de um símio.” Sobre outras características daquele estranho homem, o romancista Elmar Carvalho foi incisivo em seu texto:

“De estatura abaixo da mediana; no entanto era forte, entroncado e de membros grossos e curtos. Tórax musculoso e repartido. Os bíceps eram avantajados, como se fossem os de um pequeno Maciste, que eu conhecia através da tela panorâmica do velho Cine Galileia. Trajava uma esgarçada camisa de mangas curtas, aberta ao peito, o que deixava à mostra os braços e o peito de densos pelos hirsutos.”

O ponto culminante desse texto se dá quando um certo caçador de nome Francisco Cardoso narrou ao Marcos Azevedo, protagonista do romance Histórias de Évora, uma fantástica história sobre o Zé Lolô. Cabe aqui ressaltar que Marcos procurou o mencionado caçador para obter subsídios sobre aquele estranho homem que diziam que virava lobisomem, uma vez que o nosso protagonista decidira escrever uma série de artigos sobre algumas figuras lendárias populares e folclóricas de Évora para serem publicados em um periódico mimeografado e também no jornal mural da sua escola.

 Conforme o referido texto, o tal caçador narrou ao Marcos essa misteriosa história, que transcrevo a seguir:

“ (...) que certa feita foi fazer uma caçada, numa noite de quinta para sexta-feira. O céu estava um tanto nublado, e nem sempre a lua cheia se mostrava em toda sua glória. Mas, no momento em que os cachorros latiram desesperados, a acuar um bicho, ela saiu de uma grande nuvem escura, e brilhou com toda intensidade. O caçador viu que eles rodeavam um grande animal, de espécie que ele jamais vira.

O bicho era peludo e tinha o tamanho de um urso, embora não fosse gordo e demonstrasse ter muito mais velocidade e agilidade. Em determinado momento, o homem viu as suas orelhas grandes e pontudas, e os seus olhos brilhantes e vermelhos como dois tições em brasa viva. Apontou-lhe a arma e atirou. A assombração, que só podia ser um lobisomem, soltou um alto e pavoroso esturro de ódio e dor. Deu um enorme pulo por cima dos cães, e seguiu mata adentro como um raio. As pegadas eram enormes e não se pareciam com a de nenhum outro bicho da região.”

O caçador jurava, com “a mão sobre a bíblia”, o que acabara de contar não era mentira, e que o bicho que ele viu na mata era um lobisomem, ao tempo em afirmava que aquela horrenda criatura era o Zé Lolô, pois dias depois este apresentava com um ferimento no ombro. No entanto, o caçador com receio de ser chamado de tolo, concluía sua narração declarando que talvez fosse “história de caçador”.

 

CONCLUSÃO

 

                Conforme o exposto acima, o texto O LENDÁRIO ZÉ LOLÔ se enquadra perfeitamente no gênero da literatura chamada de realismo fantástico ou realismo mágico, uma vez que a narrativa contada pelo emérito escritor e poeta Elmar Carvalho em seu livro de romance HISTÓRIAS DE ÉVORA contém todos os elementos ou características que esse gênero exige. De igual modo, os textos correspondentes aos capítulos XXII e XXIII (A serra encantada 1 e A serra encantada 2), constantes nesse mesmo livro também se revestem das referidas características do realismo fantástico.

Parabéns, Dr. Elmar Carvalho.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

TEMPO, MEMÓRIA E METALINGUAGEM NO ROMANCE HISTÓRIAS DE ÉVORA, DE ELMAR CARVALHO



TEMPO, MEMÓRIA E METALINGUAGEM NO ROMANCE HISTÓRIAS DE ÉVORA, DE ELMAR CARVALHO


Carlos Evandro M. Eulálio

 

Histórias de Évora é o primeiro romance do poeta, cronista e crítico literário Elmar Carvalho, membro da Academia Piauiense de Letras. Trata-se de uma narrativa de fundo memorialista, visto que algumas cenas narradas se aproximam de acontecimentos vivenciados pelo próprio autor. Isso se evidencia nas primeiras páginas do livro, ao nos advertir sobre o espaço onde se passam as ações da narrativa:

A minha Évora é uma cidade fictícia, uma mistura de Parnaíba e Campo Maior dos anos 70 e 80, mas com uma pitada de outras cidades, a que sou ligado por laços sanguíneos e sentimentais. (CARVALHO, 2017, p. 10).

A essa advertência, segue-se um esclarecimento sobre a representação do tempo na narrativa em vários capítulos do livro. Esse procedimento metalinguístico e ao mesmo tempo intertextual tem sido um recurso recorrente na construção do discurso ficcional moderno. A profa. Giacomet cita como exemplo desse modelo de narrativa a obra São Bernardo, de Graciliano Ramos,

[...] quando Paulo Honório diz ao personagem Azevedo Gondim que não quer seu livro em “Língua de Camões” (RAMOS, 1995, p. 5), está estabelecendo uma relação intertextual de oposição a uma outra poética, a uma linguagem literária utilizada pelo classicismo. Em contrapartida, oferece ao leitor uma linguagem clara, despojada e concisa, efetua assim uma opção, evidencia uma poética de reconstrução e estabelece conexão entre o dizer e o fazer. O personagem age, então, metalinguisticamente, desnuda e questiona o processo de escritura do romance e projeta na narrativa o procedimento (GIACOMET, 2022, p.378).

No capítulo III (O apelo do sexo), o narrador situa o leitor no período em que acontecem as Histórias de Évora (décadas de 1970 e 1980). Nesse capítulo, põe em relevo a época em que ainda predominava, principalmente no Nordeste, o tabu da virgindade e sua preservação até antes do casamento. Refere-se ao fato de, àquela época, a mulher nordestina manter-se virgem em tais circunstâncias, como valor moral resguardado pelas famílias. Sabia-se que a pílula anticoncepcional já existia desde os anos 1960, 

[...], mas ninguém falava, e muito menos era usada pelas moças solteiras de então (CARVALHO, 2017, p. 31).

Para enfatizar o que afirma, o narrador cita Reginaldo Rossi que em um de seus grandes sucessos menciona esse tipo de rejeição, certamente aludindo ao seguinte trecho da canção A Raposa e as Uvas, sucesso musical desse cantor, no ano de 1982:     

A pílula já existia
Mas nem se falava
Pois nos muitos conselhos
Que tua mãe te dava
Tinha um que dizia
Só depois de casar                             

Mais adiante, em outro trecho, a personagem Marcos se dirige ao seu quarto [...] para ler uma antologia de poemas brasileiros que a Fename – MEC havia publicado (CARVALHO, 2017, p. 34).

Trata-se da Fundação Nacional de Material Escolar, órgão responsável pela política do livro didático e pelas publicações do Ministério da Educação, por sinal, extintas no início dos anos 1980.

São inúmeras as cenas indicadoras do tempo na narrativa, principalmente aquelas que nos capítulos primeiros aludem à iniciação sexual de Marcos que acontece no Quartel General ou QG, tradicional prostíbulo de Évora, com a veterana Doralice, sem compromisso sentimental. A exemplo de muitos jovens da classe média dos anos 1960/70, perder a virgindade com uma prostituta também era uma forma de afirmar a própria masculinidade para os amigos do grupo de convivência social. Esse era o costume da época, pois sendo

[...] rito de passagem é visto como uma necessidade de afirmação como homem diante de si e da sociedade, além de satisfazer uma curiosidade (LAGENEST, 1960, p.9).

 

Diferente dos dias atuais, quando o adolescente tem sua primeira relação sexual com a namorada. Isso também, devido à liberdade sexual conquistada pelas mulheres nos últimos anos. Na literatura brasileira, a iniciação sexual de crianças e adolescentes com prostitutas tem registro em algumas obras, como nos romances Menino de Engenho (1932), de José Lins do Rego, e Amar, Verbo Intransitivo (1927), de Mário de Andrade.

Embora não se mencionem na obra fatos relacionados ao período ditatorial brasileiro (1964-1985), principalmente nos anos de chumbo (1968 a 1974), quando houve a perda dos direitos civis e políticos e a censura prévia aos meios de comunicação em 1970, a representação e o imaginário que se constroem no romance mostra não uma juventude engajada nas lutas contra a ditadura, mas uma juventude distante da realidade da época, portanto, afastada das ações políticas e partidárias:

[...] Foi nessa época que, tanto por idealismo, como para fugir de sua melancolia, {Marcos} reuniu Mário Cunha, Fabrício Moreira, Cazuza, William Meneses e outros amigos para criarem um jornal alternativo, opinativo e teria um espaço literário, para publicação de crônicas, contos, poemas e artigos. Nele Mário Cunha e outros artistas poderiam divulgar seus desenhos e caricaturas com a utilização de estêncil (3) adequado. Não seria vinculado a nenhum partido ou grupo político (CARVALHO, 2017, p. 79).

            Noutra passagem, no capítulo III, o narrador refere-se aos jovens sem emprego e sem dinheiro, que passeavam no entorno dos cabarés,

[...] para espiar o movimento, enquanto ouviam os sucessos musicais do momento, sobretudo músicas românticas, recheadas de muita paixão, adultério e amores infelizes. Das velhas vitrolas evolavam as vozes de Waldick Soriano, Roberto Müller, Evaldo Braga, José Ribeiro, Carmem Silva e outros (CARVALHO, 2017, p.31).

            São implícitas nesses trechos do romance Histórias de Évora, as consequências do golpe militar de 1964 que contribuíram para a alienação e o retrocesso de nossos jovens e da nossa educação escolar nos âmbitos cultural e político. Acrescente-se que, além da censurar conteúdos de história e geografia, o regime militar tratou de retirar dos currículos escolares disciplinas que criavam hábitos de raciocínio, como Latim, Sociologia e Filosofia, para em contrapartida introduzir as famigeradas matérias OSPB (Organização Social e Política Brasileira) e Estudos Brasileiros, a fim de enaltecerem os valores do regime ditatorial. Em entrevista à Teresinha Queirós, o autor, respondendo sobre como reagia à censura durante o regime militar, diz:

A minha geração aflorou literariamente durante o regime militar, durante a época do 477, do AI-5, numa época em que não podia haver reuniões de estudantes nas universidades. Isso fez com que houvesse em nossos textos uma forte carga social, de denúncia, mas também fez com que exercitássemos a criatividade, para driblarmos a censura. Entretanto, a pior censura é a autocensura, fruto de nossos preconceitos, tabus, medos e mistificações (CARVALHO, 2006, p. 159).  

Em Histórias de Évora a metalinguagem também preside o ato de criação do narrador. Identificamos no romance dois tipos: um  autor-narrador em terceira pessoa (heterodiegético), que não participa dos fatos que expõe, e um narrador-personagem ou narrador-protagonista (autodiegético) em primeira pessoa gramatical, sob a forma de um “eu” que vivencia suas experiências.(1) Essa tipologia se esclarece no capítulo XI (Música e Memória), quando o autor-narrador, usando da estratégia metalinguística machadiana, intervém na  primeira pessoa para justificar sua atuação:  

[...] Julgo de bom alvitre, até para quebrar a monotonia desta narrativa, em que trato, sobretudo dos anos de puberdade e da juventude de meu protagonista, intercalar alguns trechos de suas memórias e de suas lembranças de Évora, bem como de alguns eborenses que ficaram na história oral da cidade. Portanto, a seguir, e em outros capítulos deste livro, interpolarei escritos de Marcos Azevedo, elaborados, alguns, em sua madureza e, outros, quando ele já descambava para a terceira idade. [...] Os textos, desentranhados de Histórias de Évora, Mitologia de Évora e Memórias, serão transcritos em itálico e entre aspas, para que não paire nenhuma dúvida sobre a autoria, porém, sem indicação expressa de título da obra e autor” (CARVALHO, 2017, p. 61).

            Estamos, por conseguinte, diante de um narrador, cuja função, além de narrar, funde seu papel com o de um autor-implícito, para explicar o modo de conduzir a narrativa. Essa voz do autor-narrador, na visão de Bakchtin constitui uma segunda voz,

[...] não a voz direta do escritor, mas um ato de apropriação refratada de uma voz social qualquer de modo a poder ordenar um todo estético, visto que não são as ideias do escritor que entram no objeto estético, mas sua refração (FARACO, 2005, p.40).

Esse mesmo narrador, muito antes, no capítulo VI (Évora e suas Histórias, p.79), esclarece o projeto literário de Marcos: escrever três livros em bases intertextuais (2): Histórias de Évora, Memórias e Mitologia de Évora. Segue-se então uma exposição, detalhando as estratégias que serão utilizadas na escritura desses livros, para logo depois informar que Mitologia de Évora foi escrito e publicado, quando Marcos houvera completado 36 anos de idade, já casado e com dois filhos. Assim, antecipa essa informação ao leitor sobre o destino da personagem, que será visto adiante nos capítulos finais XXXVII (Seus Olhos são negros, negros, p.171) e XXXVIII (Epílogo, p.177). No capítulo XXXV (Uma História da Cera de Carnaúba), o narrador interrompe o curso da narração, dirigindo-se ao leitor nos seguintes termos:

Vamos dar um salto na história de Marcos Azevedo. O rapaz, após concluir o antigo científico, fez o curso de Direito em sua cidade natal, também como aluno no Liceu Eborense. [...] Dois anos após a conclusão superior, foi aprovado em concurso público, para o cargo de Fiscal de Tributos Federais. Conseguiu ser lotado na Agência da Receita Federal de Évora, em cujo prédio funcionava a Alfândega local (CARVALHO, 2017, p.161)

 

A partir desse capítulo, cessa a participação do narrador-personagem Marcos que, de certa forma, discreta e indiretamente é em algumas passagens do romance uma espécie de alterego do autor, conforme ele próprio afirma:

Não há negar: em certos momentos Marcos pode ser considerado como uma espécie de meu alterego, porém em outras situações o meu protagonista é uma completa figura fictícia (CARVALHO, 2017, p. 10).

            Em certos trechos do romance, a personagem Marcos apresenta identidade de pontos de vista com o autor. Na entrevista que concede à professora Maria do Socorro Rios Magalhães, Elmar, além de mostrar seu interesse compulsivo pela leitura, declara:

[...] li a biblioteca de minha madrinha e a pequena biblioteca de meu pai. Mas lia vários outros livros, principalmente de história e sobre literatura. De modo que sempre fui um interessado da área de humanidades (CARVALHO, 2006, p.170).

No romance, sabe-se que a personagem Marcos

[...] Tinha certo pavor à matemática, e estudava apenas o suficiente para passar de ano. Entretanto, era um dos primeiros alunos em História, Geografia, Português, Literatura e outras disciplinas da área de humanidades (CARVALHO, 2017, p. 27).

            Na entrevista com a professora Teresinha Queiroz, solicitado a falar sobre sua vivência parnaibana de juventude, de cultura e de jornal, Elmar alude a respeito de sua participação em jornais desde os 16 anos. Cita como foi sua atuação

[...] no jornal Inovação que congregou um grupo muito atuante e muito questionador de pessoas inteligentes que cultivavam a leitura e eram bem informados (CARVALHO, 2006, p. 156).

Em Histórias de Évora, Marcos e mais cinco colegas do Liceu, quando cursava o terceiro ano ginasial,

 

[...] idealizaram um jornal mural que tinha colunas com notícias, informações sociais artigos, crônicas e poemas. Eventualmente publicava seus textos. [...] O Arauto, assim se chamava o jornal estudantil. [...] em Évora, vez ou outra, publicava contos e crônicas no jornal tipográfico A Batalha (CARVALHO, 2017, p. 27).

Esses e outros traços do autor em comum com os do protagonista do romance estão presentes em quase todos os seus capítulos. Ressalte-se, porém, que essa semelhança entre autor e personagem acontece como forma de potencializar a verossimilhança (4) no romance. Para Antônio Cândido,

A personagem é um ser fictício, expressão que soa como paradoxo. De fato, como pode uma ficção ser? Como pode existir o que não existe? No entanto, a criação literária repousa sobre este paradoxo e o problema da verossimilhança no romance depende desta possibilidade de um ser fictício, isto é, algo que, sendo uma criação da fantasia, comunica a impressão da mais lídima verdade existencial. Podemos dizer, portanto, que o romance se baseia antes de mais nada, num certo tipo de relação entre o ser vivo e o ser fictício, manifestada através da personagem, que é a concretização deste (CANDIDO, 1976, p. 55).  

Portanto, na visão de Antônio Cândido as personagens fictícias de um romance têm por base ou fonte de inspiração essa relação entre a pessoa e o ser vivo, a partir de cujos traços físicos, psicológicos e comportamentais os escritores as constroem.   

O romance Histórias de Évora compõe-se de 38 capítulos, que se concentram não apenas na trajetória de Marcos da adolescência à fase adulta, mas também na história de outras personagens do ponto de vista do protagonista. Estas se desenvolvem paralelamente às demais. São textos autônomos entre si, à semelhança de contos dispostos em capítulos que poderiam ser lidos em separado. Eis alguns exemplos: Capítulos XII e XIII -  Confissões (1 e 2), sobre as decepções e frustrações amorosas e sexuais de Pedro Pinto Pereira; Capítulos XXII e XXIII - A serra encantada (1 e 2), acerca do desaparecimento de João Galdino em caçadas com amigos na Serra do Cachimbo e de seus  possíveis contatos com seres extraterrestres, sugerindo a hipótese do fantástico; Capítulo XXV - A Matrona de Évora, focado na história de Ângela Fontenele que aos 15 anos é instada pelos pais a casar-se contra sua vontade com Constantino, muito mais velho que ela; Capítulo XXVII - O voo do Pardal, sobre a aventura de Eugênio Dantas, o Ícaro Eborense, que constrói uma Asa Delta, sendo por ela vitimado, e o Capítulo XXXIV -  O Segredo de Matilde, mulher imponente e enigmática, sobre cuja virgindade, mesmo depois de casada e divorciada ainda persiste dúvida.

Além dos capítulos mencionados, após o Epílogo (capítulo XXXIII), desfecho da trama principal, em suas páginas finais o romance inclui um ANEXO, com o subtítulo Outras Histórias de Évora. O anexo reúne 15 crônicas ou minicontos memorialistas que Marcos publicou aos 62 anos de idade, sobre tipos humanos da vida social de Évora:

[...] Eram textos curtos, densos, que a crítica e os doutos não souberam classificar ao certo se seriam crônicas memorialistas, contos ou apenas simples “causos” anedóticos (CARVALHO, 2017, p.183).

Histórias de Évora é um romance de época, que se constrói a partir de textos de vários gêneros, uma tendência da narrativa de ficção contemporânea. Trata-se, conforme mencionamos, de um romance desmontável, conceito concebido por Rubem Braga, na análise que faz do livro Vidas Secas de Graciliano Ramos, cujos capítulos possuem certa independência e, por isso, podem ser lidos separadamente. Como vimos, Histórias de Évora é um romance que traz inovações por incorporar em sua estrutura híbrida elementos metalinguísticos e intertextuais que sem dúvida ampliarão o repertório de informações do leitor e por abordar temas do cotidiano, numa linguagem clara, concisa e sedutora.          

NOTAS

1. No admirável ensaio Histórias de Évora, uma ficção do erotismo, amor e saudade, o escritor Cunha e Silva Filho, focaliza a questão do narrador, identificando o narrador 1, que relata os fatos relacionados ao protagonista e o narrador 2, na condição de escritor, que “tem um caráter de complementaridade no conjunto do enredo do narrador 1.

2. Intertexto, na definição de Júlia Kristeva, refere-se a “(...) todo texto se constrói como mosaico de citações, todo texto é absorção e transformação de um outro texto (...)” (2005: 68). O escritor Umberto Eco, citado por  Wender Marcell Leite Souza (UFMT), ao falar sobre o seu romance O Nome da Rosa aponta a importância de outros livros na construção do seu, “Descobri o que os escritores sempre souberam (e nos disseram muitas e muitas vezes): os livros sempre falam sobre outros livros, e toda estória conta uma estória que já foi contada” (apud HUTCHEON, 1991: 167).

 

3. Estêncil: Folha de papel fino especial que recebe gravações na forma de pequenas perfurações obtidas com o uso de máquina de escrever e estilete, para servir de matriz para a impressão por mimeógrafo.

 



4. Verossimilhança: O substantivo verossimilhança e o adjetivo verossímil contêm dois radicais: vero, que significa verdadeiro e símil, semelhante, parecido. Portanto, verossímil é aquilo que parece ser verdadeiro, que é semelhante à verdade, que pode acontecer na realidade. O verossímil, como se vê, é um simulacro da verdade, na medida em que é verdadeiro apenas na aparência. Referência: Blogue do prof. Ernâni Terra https://www.ernaniterra.com.br/verossimilhanca, acessado em 1º/12/2022.

REFERÊNCIAS


AMORIM, Ramom. O romance desmontável como experiência radical da narrativa contemporânea.https://leiturascontemporaneas.org/2020/07/02/o-omance-desmontavel-como-experiencia-radical-da-narrativa-contemporanea. Acessado em 1º/12/2022.

CANDIDO, Antônio et al. A personagem de ficção. São Paulo, Editora Perspectiva, 1991.

CARVALHO, Elmar. Histórias de Évora. Teresina: Academia Piauiense de Letras, 2017. (Coleção Século XXI, 15).

 

CARVALHO, Elmar. Lira dos Cinquentanos. Teresina: FUNDAPI, 2006.

 

CARVALHO, Elmar. Histórias de Évora, op. cit. p.13/23.

 

DUARTE, Alessandra, citada por Gabriela Naiara de Souza Candeu, Paula Ferreira Vermeersch in A Ditadura Militar e suas consequências na consciência da educação como política. Universidade Estadual Paulista – UNESP.

 

FARACO, Carlos Alberto. Autor e Autoria in BRAIT, Beth (org). Bakhtin: conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2005.  

 

GENETTE, Gérard. Discurso da narrativa. Lisboa: Edições 70, 1972.

 

GIACOMET, Michele. Metalinguagem: a meta do discurso romanesco moderno, In Revista Acadêmica Educação e Cultura em Debate, V. 8, N. 1, jan./dez. 2022, p. 378/386, acessado em 20/11/2022

 

LAGENEST, Barruel. Lenocínio e Prostituição no Brasil. Rio de Janeiro: Agir, 1975, citado em https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/37393/37393_6.PDF.

 

ROSSI, Reginaldo. As raposas e as uvas. https://www.letras.mus.br/reginaldo-rossi, acessado em 20/11/2022.

 

SILVA FILHO, Cunha e. Histórias de Évora, uma ficção do erotismo, amor e saudade in

 

SOUSA, Wender Marcell Leite. A literatura como diálogo: Um percurso histórico do intertexto.pdf – Adobe Acrobat Reader DC, acessado em 20/11/2022.   

No que os apontamentos de um ex-imperador romano, depois de várias centenas de anos, e o filme Tempos Modernos, de Charles Chaplin, são úteis para ensinar a respeito de nossa necessária reflexão na virada de ano?



No que os apontamentos de um ex-imperador romano, depois de várias centenas de anos, e o filme Tempos Modernos, de Charles Chaplin, são úteis para ensinar a respeito de nossa necessária reflexão na virada de ano? 

 

Fabrício Carvalho Amorim Leite (*)

 

Realizar anotações ou reflexões pessoais, é um antigo hábito e prática dos grandes estudiosos da alma, dos pensamentos e da saúde mental humana, como podemos citar os escritores e poetas – sabidamente, mestres neste ofício, através dos seus personagens, paisagens, momentos, sensações e sentimentos -.

 

Também, neste rol, abranjo os cientistas e pesquisadores da mente humana, filósofos, os bons roteiristas (ou diretores) de clássicos do cinema, dentre outros profundos conhecedores da matéria. 

 

E, nestes dias, apesar de ser um calouro na área, refleti a respeito, trazendo, por consequência, a pergunta simples, clássica e recorrente quando chegamos ao final de todo o ano:

 

- O que poderíamos tirar como lição do ano que está a acabar (2022)?

 

Um exercício simples e comum é o de escrever um pequeno registro ou rascunho dos eventos pessoais mais importantes do ano que passou (seria como uma espécie de chave bastante prática e acessível para o subconsciente).

 

A oração, meditação, a reza e o simples ato de ficar a sós sem às distrações eletrônicas e da vida moderna, podem ser medicinais, dizem.

 

Ocorre que, vivemos realmente (ou é virtualmente?) em tempos estranhos.

 

E, neste aspecto, convém lembrar o tema da desumanização do homem causada pela elevada e constante aceleração das inovações tecnológicas e industriais, substituição do ser humano por máquinas e suas polêmicas contradições, como foi descrito, dentre outras questões, pelo genial Charles Chaplin, no clássico Tempos Modernos, a despeito da película ser de 1936.

 

Seria um prelúdio? Talvez sim, talvez não.

 

Por vez, de uma forma caricata, o personagem Carlitos, em Tempos Modernos, no seu descontentamento com a fábrica e o sistema de trabalho que exercia, nos mostra em tons irônicos, uma profunda mensagem a respeito da desumanização e a perene necessidade do refúgio interno para reflexão como remédio para alguma de nossas aflições e descontentamentos trazidos pelos males da vida moderna, penso.

 

Não por isso, trazendo para o hoje, o exagero de informações (in) úteis na internet e a alta exposição pessoal nas redes sociais, ao tempo que nos distrai das aflições e angústias cotidianas, ao fantasiar a nossa vida através dos momentos alheios, serve para aproximar pessoas distantes geograficamente e liberar substâncias e hormônios agradáveis por meio da viagem pelas telas.

 

De outro lado, mas de forma paradoxal, há o excesso tecnológico que provoca o entorpecimento ao ponto de desprezarmos a não somenos importante prática do autoconhecimento e reflexão (ou do retiro dentro de si) a respeito do nosso mundo real.

 

Incluo, além disso, o chamado metaverso, que é um universo virtual que busca reproduzir a realidade usando tecnologias como realidade virtual.

 

Como exemplo, não precisarei abraçar afetuosamente alguma pessoa na realidade, porque estarei dentro deste mundo paralelo virtual e, como um passe de magia (ou apetando o mouse), o meu “avatar” ou boneco virtual poderá me representar (ou seria presentar?) neste momento tão profundamente humano.

 

Claro que, segundo pregam os defensores do invento, estarei sempre no controle do meu “avatar”, que possui um sem número de vantagens, como ter propriedades no referido mundo, ir às compras, e as coisas seguem assim...

 

Já penso na situação inusitada de um pobre cidadão (como Carlitos) estar esfomeado na vida real e, como um “toque de midas”, ser gentilmente conduzido ao tal do metaverso para receber um grande banquete para ficar sem fome...

 

Ou, como a figura dramática de Carlitos, em Tempos Modernos, aborrecido por fazer a mesma coisa no trabalho e, num belo dia, ingressar no metaverso para tornar-se um grande aventureiro e desbravador dos sete mares, escalando montanhas ou fazendo um grande tour pelo mundo.

 

Menos pior, aqui concordo com uma utilidade, se as guerras ou brigas sanguinárias forem ajustadas e resolvidas pacificamente e exclusivamente neste universo paralelo, rogo...

 

Seria bom, apesar de o invento ser mais propriamente uma fuga efêmera e paliativa para uma realidade artificial, fictícia e volátil criada por grandes conglomerados empresariais... E os efeitos sobre a mente humana são totalmente incertos.

 

Com isso tudo, após analisar alguns trechos do filme de Chaplin, refletir a respeito da internet, os dilemas das redes sociais e do tal metaverso, chamou-me à atenção sobre a vida e obra do ex- imperador romano Marco Aurélio (governou entre os anos 160 e 180 D.C.), que levava a tiracolo um simples caderno de anotações ou diário (este batizado, mais tarde, de “Meditações”).

 

Na verdade, é uma série de reflexões pessoais escritas disciplinarmente por este ex-imperador para o conhecimento de si (ou da alma) durante suas aflições e descontentamentos quando governava e tentava conservar seu gigantesco e complexo império.

 

Tal hábito de rever constantemente seus atos, pensamentos e o mundo ao redor praticado pelo líder romano seria um mero acidente de percurso, ou o motivo de sua venerada administração do império? O fato é que o peso de seu cargo era enorme.

 

Neste ponto acima, deixo para os historiadores profissionais, mas o fato é que Marco Aurélio fazia parte da Dinastia Antonina (muito falada por ter sido um período de estabilidade e paz no Império Romano, apesar dos grandes desafios).

 

Voltando ao diário de Marco Aurélio, o tema do diálogo interior é, por este, muito bem explorado, sobretudo, quando aborda, de forma simples, a complexa e atual questão a respeito da necessidade da análise individual interior e o descontentamento humano:

 

 "(...). As pessoas buscam para si refúgios, casas de campo, praias e montanhas; e tu também desejas isso intensamente.

Mas isso toca inteiramente as mais vulgares entre as pessoas, pois depende de tua vontade, a qualquer momento, fazeres o retiro para dentro de ti mesmo.

Com efeito, em lugar algum, seja em busca de mais tranquilidade, seja visando distanciar-se de negócios e atividades, consegue uma pessoa mais refúgio que dentro de sua alma, isso, sobretudo, quando abriga dentro de si pensamentos cuja contemplação lhe transmite imediatamente completo conforto; digo, a propósito, que conforto ou tranquilidade não é outra coisa senão uma boa ordem [da alma].

Portanto, proporciona a ti continuamente esse refúgio e renova a ti mesmo; e que teus princípios sejam concisos e possuam caráter elementar, para que, tão logo recorra a eles, bastem para repelir por completo a aflição [da alma] e te enviar de volta sem descontentamento às coisas ás quais retornas. (...) [In Marco Aurélio, Meditações, EdiPro, Livro IV, pág. 41].

 

Penso que, Marco Aurélio, no trecho, apesar de várias outras interpretações possíveis, ponderava que os refúgios externos ou distrações materiais não poderiam suprir a necessidade inata humana do exercício do autoconhecimento e reflexões constantes para fins de reparar às aflições ou descontentamentos.

 

E, neste ponto - no que tange a paz interior pelo habitual autoconhecimento e auto-observação - ao que tudo indica, ele era um verdadeiro mestre na teoria e na prática, em virtude do estoicismo, do qual era um aplicado estudante desta filosofia.

 

Porque, ao que tudo indica de parte da obra, aquilo que estava sendo necessário desbastar ou renovar, através da escrita ou íntima reflexão, apesar de ser, às vezes, angustiante, ressurgia, de uma forma ou outra, das profundezas de sua mente (da alma), a despeito da profusão de distrações e responsabilidades que possuía, como guerras, revoltas internas e uma grande burocracia estatal para administrar.

 

Logo, como o ex- imperador, o presente momento para rever o que acertou, alegrou-se, errou e sofreu é deveras benigno. Lembrando ou redefinindo a rota a tomar, se for o caso. Comemorar pequenas conquistas. Tentar substituir mágoas e desilusões por novos projetos, dentre outras opções.

 

Afinal, é (sempre) tempo de evolução e renovação pelo autoconhecimento e reflexões, como anotou e praticou o grande ex-imperador romano e, mais recentemente, retratou Charles Chaplin.

 

Sigamos sempre refletindo e meditando, através, se for o caso, de anotações em um simples caderno.

 

Feliz 2023.

(*) Advogado e escritor.   

Lágrimas insopitáveis




Lágrimas insopitáveis 


Carlos Rubem 


Estava no Fórum Desembargador Cândido Martins, por volta da 10h, talvez, nesta data (8/12), há 10 anos (2012), exercendo as minhas atividades ministeriais.


Recebi uma ligação telefônica. Era o amigo Gutemberg Rocha. Fez-se-me mensageiro da fatídica notícia. 


Participou-me que a Dona Aldenora Nogueira Campos e Reis, minha mãe, acabara de falecer na UTI do Hospital São Marcos, aos 80 anos de idade, em Teresina, vítima de câncer na bexiga.


Dorinha havia se submetido a uma melindrosa cirurgia para extirpar uma malignidade tumoral, no ano anterior.


Em seguida, passou por rigoroso tratamento quimioterápico. Logo sofreu os efeitos colaterais, mas nunca se abateu espiritualmente. Mulher de fé inquebrável. Zeladora do Coração de Jesus. Louca pelo seu amantíssimo Ditinho, meu pai.


Consciente da gravidade da moléstia que a consumia, resignada, procurava visitar pessoas amigas, velada despedida.


Um belo dia mandou-me chamar em sua casa. Nos seus aposentos, fez-me diversas recomendações de ordem familiar e comunitária, o que — filho obediente — tenho tentado cumprir contando com a compreensão de muitos.


Nesta página evocativa à sua memória, revelo um desejo expresso da pranteada: — não deixar ao desabrigo Valdemar Francisco de Oliveira, pontuou.


Conhecido por Galiano, este ingênuo rapagão mora conosco há 50 anos, certamente. Muito engraçado. Gente boa!


Indaguei-lhe acerca do seu propósito. — É para que vocês sempre se lembrem de praticar a caridade, enfatizou.


Se por algum motivo Galiano se zangava, mamãe, com a sua autoridade moral, dirigia-se ao nosso irmão afetivo, assim: — Diga: sou filho de Deus e herdeiro do céu. E chovia preleções que o deixava em plena mansuetude.


Está chegando a noite cristã, a comemoração nazarena. Em toda minha vida, por esta época, mamãe repetia o mesmo gesto: abraçava-me com ternura e cantava, com suavidade, aos meus ouvidos “Botei meu sapatinho”, canção natalina. Emocionávamo-nos! 


Ao escrever esta saudosa nota, ouço, perfeitamente, a sua maviosa voz entoando cantigas de ninar. Lágrimas umedecem o meu rosto! 

segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

Leituras Compartilhadas de Histórias de Évora de Elmar Carvalho

 



Com leituras dos Professores Dilson Lages,  Nilson Ferreira e Francisco Carlos.

Transmissão pelo Canal Círculo Literário Entretextos.

2909 - Poema de Walter Lima

 


domingo, 18 de dezembro de 2022

Seleta Piauiense - Rubervam Du Nascimento

Fonte: Google

 

Herança – II

 

Rubervam Du Nascimento (1954)

 

decorava versos para dizer ao seu homem

ao atingir êxtase quando podia quando

mãos do seu homem não apertava sua garganta

adorava falar garcia lorca

Enche, pois, de palavras minha loucura,

ou deixa-me viver noite da alma para sempre escura

encontrada morta no quarto de um motel

no sábado de aleluia

lua vermelha amassada nos lábios

garganta derramando sangue no lençol

no celular versos à voz de um poeta francês

morto ao escapulir do vagão de trem

numa tarde fria de paris

depois de um encontro com amada

“O tédio já não é meu amor. As raivas,

as farras, a lo cura de que..a vida é a farsa

mo ro de sede, s foco, não c nsigo de l i rar…”

 

Fonte: site da Revista Acrobata