sexta-feira, 27 de novembro de 2015

BREVES ANOTAÇÕES SOBRE BITOROCARA


BREVES ANOTAÇÕES SOBRE BITOROCARA

Chico Acoram Araújo
Historiador e cronista

            O ilustre poeta e escritor Elmar Carvalho em seu livro “Bernardo de Carvalho, o Fundador de Bitorocara”, capítulo III (A LOCALIZAÇÃO DA FAZENDA BITOROCARA), sustenta que, - assim como todos os maiores historiadores do Piauí, - a fazenda Bitorocara localizava-se realmente nas imediações dos rios Longá e Surubim. Assim, pode se aferir que a origem do nome da fazenda de Bernardo de Carvalho decorreu do fato de que esta propriedade estava localizada próximo ao rio Bitorocara, hoje Longá. Para provar a existência dessa propriedade, Elmar Carvalho recorre várias vezes ao padre Cláudio Melo, considerado um dos maiores historiadores do Piauí. No mencionado capítulo III do seu livro, o escritor destaca alguns comentários de Cláudio Melo, como o que a seguir transcrevo:

 “Todos os maiores historiadores do Piauí afirmam haver existido a fazenda Bitorocara e seu fundador Bernardo de Carvalho Aguiar, a começar pelo mais antigo, o padre Miguel de Carvalho, em sua descrição do Sertão do Piauí, datada de 2 de março de 1697. Quase todos admitem que essa propriedade ficava situada em Campo Maior. E como exceção ou voz discordante, um ou outro admite haver dúvida a esse respeito. (...)”.
“De início, eu supunha que o riacho Bitorocara era o Surubim, em razão de a Fazenda Bitorocara ser a atual cidade de Campo Maior. A descoberta da sesmaria de Dâmaso Pinheiro de Carvalho, nas cabeceiras do riacho Cobras, me fez ver que Cobras é o Surubim, Bitorocara, portanto, ou seria o Longá ou o Jenipapo. Surgiu em mim um impasse: a fazenda Serra fica no Longá e o Jatobá no Jenipapo. Como os limites da fazenda Serra não atingem o Jenipapo, mas os limites da fazenda Jatobá podiam chegar até o Longá, concluí, por fim, que Bitorocara seria o Longá. A fazenda Bitorocara se expandia pelos três rios, e ela estava na confluência deles. ”

Assim, pelos comentários e explicações de Pe. Cláudio Melo, indubitavelmente, não há dúvidas quanto à existência do rio Bitorocara e a fazenda de mesmo nome, encravada em suas imediações, em cujo entorno se formou um arraial (inicialmente militar) onde foi construída a igreja de Santo Antônio do Surubim, hoje a atual cidade de Campo Maior.

 Por sua vez, falando sobre a existência de Bitorocara, o prestigiado escritor João Alves Filho, Presidente da Academia Campo-maiorense de Artes e Letras – ACALE, em palestra proferida sobre os 300 anos da igreja de Santo Antônio, disse que “o português Bernardo de Carvalho e Aguiar, quando aqui chegou, no ano de 1692, encantou-se com os recursos naturais e com a beleza do lugar. Inicialmente, fundou seu primeiro curral em local que deu o nome de “Cabeça do Tapuio”, hoje município de São Miguel do Tapuio. Em seguida, com o propósito de conquistar novas terras, no ano de 1695, instala uma nova fazenda na confluência dos rios Longá e Surubim, dando o nome de Bitorocara em homenagem a uma cidade de Portugal. Disse ainda que Bernardo de Carvalho e Aguiar, depois de um ano residindo nesse lugar, recebeu a visita do Padre Miguel de Carvalho, que instalara a Freguesia da Mocha, hoje, a cidade de Oeiras, com o objetivo de ampliar suas atividades religiosas na região.

João Alves relata também que em 1710, Bernardo de Carvalho e Aguiar recebe a visita do Padre Tomé de Carvalho, e toma a decisão “de dividir seu rebanho, construindo em Bitorocara uma igreja, por se encontrar a região, a 600 quilômetros da Vila Mocha”. Bernardo de Carvalho e Aguiar como bom religioso deu ao Pe. Tomé todo o apoio material e humano para a construção da primeira igreja às margens do Longá e do Surubim, e a deu por invocação ao Glorioso Santo Antônio de Pádua. A solenidade de inauguração da igreja, celebração da primeira missa e instalação da imagem de Santo Antônio, aconteceu no dia 12 de novembro do ano de 1712.

No livro Bernardo de Carvalho O Fundador de Bitorocara, Elmar Carvalho lembra que o romancista e historiador Afonso Ligório Pires de Carvalho destacou que o padre Cláudio Melo adquiriu a certeza de que Campo Maior teve a sua origem a partir da fazenda Bitorocara ao ler o testamento de Miguel de Carvalho e Aguiar, filho de Bernardo de Carvalho.

Por outro lado, o ilustre escritor e poeta anexa como prova de que Bitorocara é a atual cidade de Campo Maior, o fato de a antiga igreja de Santo Antônio do Surubim ter sido construída por Bernardo de Carvalho Aguiar e batizada em 12.11.1712, a pedido de seu sobrinho, o Pe. Tomé de Carvalho, argumentando ainda que as igrejas de antigamente sempre eram construídas pelos fazendeiros nas proximidades da casa-grande ou residência, em terras de sua propriedade ou posse. E a igreja de Santo Antônio do Surubim não poderia ser diferente, daí a convicção de que esta foi construída em suas terras, próximas aos rios Longá e Surubim.

Há, no entanto, quem pense diferente. Em recente trabalho publicado por um autor campo-maiorense ele afirma que a Fazenda Bitorocara não estava localizada em Campo Maior, mas nas proximidades onde estão situados os municípios de São Bernardo, Maranhão, e Luzilândia e Campo Largo, do lado do Piauí. Ou seja, a referida fazenda estava encravada em ambas as margens do rio Parnaíba, afirmando ainda que o “Arraial Velho e a Bitorocara são termos sinônimos da mesma fazenda”. Baseou-se o novo trabalho no pressuposto de que a Data Arrayal, de propriedade de Miguel de Carvalho Aguiar, filho do Mestre de Campo Bernardo de Carvalho, seria a mesma fazenda Bitorocara, cuja denominação passou a ser mencionada como Arraial Velho.

Por considerar uma tese simplista, o eminente escritor e poeta campo-maiorense Elmar Carvalho discorda frontalmente dela e alerta que “Arraial (velho ou não) é um topônimo genérico, e que designa vários locais do Brasil, e também do Piauí”. No caso do Piauí, o escritor cita, por exemplo, o que deu origem ao município de Jerumenha, o dos Aroases, o dos Paulistas, o de Nossa Senhora da Conceição, o dos Ávilas, e o que originou a atual cidade e município de Arraial. Afirma ainda que na fazenda Bitorocara, entorno da igreja de Santo Antônio do Surubim, formou-se também um arraial.

Incansável na sua luta para provar que a velha fazenda de Bernardo de Carvalho e Aguiar ficava mesmo próximo ao rio Bitorocara, que seria o mesmo Longá. Elmar Carvalho justifica ainda que, em termos cronológico e documental, Bitorocara jamais poderia se referir ao Arraial Velho do rio Parnaíba, uma vez que o documento a este correspondente é datado de 1739, enquanto a referência à fazenda Bitorocara, apontada pelo Pe. Miguel de Carvalho é de 1697, conforme explicita em relato publicado sob o título de Descrição do Sertão do Piauí.

Acobertado pelas provas documentais existentes, o ilustre escritor e poeta afirma sem rodeios que:

“O certo é que o Arraial Velho que deu origem à cidade de São Bernardo (MA) não é e nem poderia ser o Arraial Velho que formou a cidade de Campo Maior. ”

E vai mais além, ao afirmar que o Pe. Miguel de Carvalho, autor do mencionado relatório, em sua desobriga, “percorreu apenas as terras que ele entendia como pertencentes à freguesia de Nossa Senhora da Vitória, conforme explicitou o padre Cláudio Melo em seus comentários (v. bibliografia) ”.

“Ora, se o padre Miguel de Carvalho sequer percorreu todo o território do atual estado do Piauí, com muito mais razão não poderia ter ido até os atuais municípios de Brejo e de São Bernardo, no Maranhão (em cuja região veio a ser situado o Arraial Velho), que pertenciam a outra jurisdição eclesiástica. Consequentemente, a fazenda Bitorocara a que ele se referiu em seu relatório ficava mesmo no rio Longá, perto de onde fica a atual cidade de Campo Maior. ”

Ao final do capítulo III do seu livro “Bernardo de Carvalho, O Fundador de Bitorocara (2ª edição virtual), o ilustre escritor, de forma peremptória, conclui:

“Em consequência o arraial militar, ou arraial, ou ainda arraial velho referente a Campo Maior, que se formou no entorno ou perto da igreja de Santo Antônio do Surubim, não pode, em hipótese nenhuma, ser confundido com o Arraial Velho maranhense, localizado perto do Parnaíba. Mesmo porque Bernardo de Carvalho e Aguiar, último mestre de campo das Conquistas do Piauí e do Maranhão só se mudou para atual cidade de São Bernardo, da qual é considerado fundador, em 1721, quando deixou o cargo.
A fazenda Bitorocara, portanto, ante tudo o que expusemos, ficava na confluência dos rios Longá, Surubim e Jenipapo, o que, admitamos, era estratégico, uma vez que haveria suprimento de água para consumo humano e do gado, e para a formação de pastagem, além de que seriam evitados problemas com eventuais confrontantes, porquanto os limites ficariam bem estabelecidos por esses cursos d’água”.


Diante dessas breves anotações não há como duvidar da existência da fazenda Bitorocara, que se transformou em Arraial Velho, local onde foi construído um templo dedicado a Santo Antônio. Sua localização na confluência dos rios Longa (Bitorocara) e Surubim é incontestável, tomando-se por base as tratativas do insigne poeta e escritor campo-maiorense Elmar Carvalho, baseadas em pesquisas realizadas em registros históricos da lavra de respeitáveis historiadores piauienses como os Pe. Miguel Carvalho e Cláudio Melo. Ademais, o ilustre escritor João Alves Filho, o historiador Gilberto de Abreu Sodré Carvalho e o cronista Antônio Francisco de Sousa defendem e comungam da argumentação defendida por Elmar Carvalho. E, por tudo que li até agora sobre o assunto, acredito piamente que a fazenda Bitorocara realmente existiu nas confluências dos rios Longá e Surubim. “SITUAR BITOROCARA É FÁCIL, ESTÁ NA CARA”, como diria meu amigo Francisco Almeida, grande cordelista e Advogado da União, em sua mais recente obra publicada no Blog do Elmar Carvalho. 

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Parnaguá sem Miridan



Parnaguá sem Miridan

Reginaldo Miranda
Da Academia Piauiense de Letras

Ainda há pouco assisti no noticiário a informação de que a Lagoa de Parnaguá está vazia, com solo esturricado e alguns poucos arbustos onde outrora havia água. De que o rio Paraim, que a alimenta, está completamente seco e com uma barreira de areia separando-o de onde em outros tempos foi a lendária lagoa. Infelizmente, vi apenas o final da reportagem, mas o suficiente para perceber a gravidade da situação e compreender que estão morrendo os mananciais do Piauí. Já havia percebido isto com relação ao Gurgueia, que é alimentado pela referida lagoa, chegando a escrever a respeito. O mesmo ocorre com os demais cursos d’água. Não é diferente a situação do rio Canindé, de que também posso dar testemunho, assim como do Piauí, do Poti, do Longá e de todos os outros afluentes do Parnaíba. Na reportagem, dizia uma pessoa ligada à administração pública municipal de que esperava duas máquinas a serem enviadas pelo governo estadual para desobstruir o canal no leito do Paraim e, assim, abrir a possibilidade de que com o inverno que há de vir, assim esperamos, as águas do rio possam voltar a alimentar a outrora bela lagoa. Isto porque, ao que percebi hoje sem esse trabalho ainda que volte a chover não teria como aquele rio retomar seu antigo curso e voltar a alimentar a lagoa. Percebem a gravidade disso? Não mais existem rio nem lagoa. Ainda assim, o leito do rio não chega mais à bacia da lagoa, encontrando-se separados por uma extensa barreira de areia. Gostaria que alguém dissesse que estou equivocado, que entendi errado.

Existiu um tempo em que os ribeirinhos do Baixo-Gurgueia, aí pelos municípios de Jerumenha, Bertolínia até Bom Jesus do Gurgueia(em mau hora reduzido o nome apenas para Bom Jesus) tinham verdadeiro pavor dessa lagoa sangrar. Em anos de inverno rigoroso, quando o Gurgueia extrapolava o seu canal habitual cobrindo imensas áreas e destruindo plantações, dizia-se “o rio comeu o legume”. Então, começavam as especulações sobre a referida lagoa. Quem quisesse alarmar a região dissesse: “A lagoa de Parnaguá vai sangrar”. É que esta funcionava como uma imensa reserva no altiplano da cordilheira serrana que divide o Piauí da Bahia. Uma elevada e imensa reserva d’água que derramava sobre o Gurgueia, alimentando as grandes enchentes.

Ora, em qualquer país com uma visão de futuro, que tenha planejamento, a preservação dessa lagoa e de seus mananciais seria questão estratégica, sobretudo porque bem próxima às áridas caatingas do semiárido nordestino. E por sua altitude, o que facilita a alimentação de outros mananciais e projetos de irrigação por gravidade, a custo baixo, deveria ser a sua preservação e manutenção uma questão de segurança nacional. Mas não. Qual nada! Está tudo ao descaso, ao deus-dará.


E o que será de Miridan? Diz a lenda que a bela jovem foi tragada pelas imensas águas da lagoa, onde passou a viver encantada. Hoje, certamente morreu de sede ou fugiu com algum louco mancebo, pois não tem mais água onde possa esconder-se dos curiosos, nem matar a sua sede. Triste Miridan, que pensara ter passado o seu momento mais dramático. E agora se vê a agonizar, desnuda e sedenta. Porém, mais triste de nós piauienses que assistimos inertes à morte dessa bela lagoa e de todos os outros mananciais. Aliás, parece ter morrido o nosso senso de preservação e nossa capacidade de reagir e de lutar. É triste, é lamentável, mas já que não tem governo consciente, que não resta alternativa, vamos ao menos lamentar, chorar e nesse vale de lágrimas tentar salvar nossos mananciais. Que Parnaguá volte a brilhar, inundar e ressuscite a bela princesa acoroá.     

terça-feira, 24 de novembro de 2015

PAISAGEM URBANA


PAISAGEM  URBANA

                            Alcenor Candeira Filho

                                     sob urbana ponte
                                     parte sobre rio
                                     parte sobre rua
posta de ponta a ponta a ponte toda
                                              a Ilha Grande numa ponta
o centro histórico noutra
                   um  homem dorme que dorme
                   o tempo inteiro imoto
                   como se dormindo morto.

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

"Bernardo de Carvalho, o Fundador de Bitorocara” (2ª edição virtual) em promoção na amazon.com.br por apenas R$ 1,99



"Bernardo de Carvalho, o Fundador de Bitorocara” (2ª edição virtual) em promoção na amazon.com.br por apenas R$ 1,99

O livro digital “Bernardo de Carvalho, o Fundador de Bitorocara” (2ª edição virtual), da autoria de Elmar Carvalho, que conta muito da história do Piauí e de Campo Maior, no final do século XVII e início do século XVIII, está sendo vendido por amazon.com.br, em promoção, por apenas R$ 1,99. A oferta vai do dia 23 ao dia 27 do corrente mês. A edição é revista, aumentada e melhorada, em virtude de novos livros e documentos, a que o autor teve acesso após a primeira edição impressa. Traz novos capítulos e vários anexos, todos referentes à cultura, história e patrimônio arquitetônico e natural de Campo Maior.

domingo, 22 de novembro de 2015

Seleta Piauiense - Antônio Chaves


YAYÁ PEARCE

Antônio Chaves (1883 – 1938)

Eras a minha fé soberba, indefinida,
Eras a minha crença, ó lírio imaculado,
Tu, que trazias n’ alma inocente e querida
A ária do nosso amor e do nosso noivado.

Eras a fonte ideal do estímulo sagrado
Que me conduzia à Terra Prometida...
Eras minha ilusão, meu sonho alcandorado,
O sol que iluminava o céu de minha vida.

Mas quis Deus apagar o fulgor dos teus olhos,
Quis ele que afinal fanasses, como a rosa,
Deixando-me sozinho a tatear sobre escolhos...

E, assim, caiu por sobre a minha mocidade
A ampla noite sem luz, profunda, tormentosa,
Da tristeza e da Dor, da Mágoa e da Saudade.

sábado, 21 de novembro de 2015

Bumba-meu-Boi no Curador


Bumba-meu-Boi no Curador

José Pedro Araújo
Historiador, cronista e romancista 

Preciso justificar o título acima, uma vez que sou maranhense e é no Maranhão que se pratica o melhor Bumba-meu-boi do Brasil. Acontece que apenas na região da baixada maranhense, além da ilha de São Luis, este folclore é largamente difundido. Nas outras regiões brinca-se de forma esporádica, sem aquele apelo tão popular existente nas regiões acima descritas. O que acontece com a região de Presidente Dutra, por exemplo, é que sofremos forte influência cultural dos outros estados nordestinos e, apesar de gostarmos muito do velho forró pé-de-serra, dos folguedos e de outras festas do gênero, não existe entre nós a tradição dos grupos organizados de Bumba-meu-boi da forma que existe mais ao norte do estado maranhense.

Pois, certa época, em meados dos anos sessenta, fomos surpreendidos com a notícia de que o agitador cultural Cobra-Preta estava arregimentando um grupo de brincantes para organizar um Boi. A notícia correu rápido pelo Ginásio Presidente Dutra e logo a estudantada estava pronta para ir verificar no local a novidade. De fato, constatamos a veracidade da notícia. O terreiro havia sido organizado ali por trás do Cemitério, em uma rua nova que acabava de ser aberta. Era um lugar de casas simples, a maioria coberta de palha de babaçu, até certo ponto distante, mais pudemos verificar que a notícia havia atraído muita gente ao local. Aliás, antes mesmo de chegarmos lá, já era possível ouvir o rufar dos tambores, pandeirões, o picado das matracas e o som de orquestra, numa mistura de todos os ritmos que costuma separar os brincantes entre aqueles que preferem o boi de matraca, os que gostam mais do boi de pandeirões e, finamente, aqueles que têm predileção pelo boi de orquestra. Cobra Preta juntou tudo em um só. 

No mais, estavam ali os vários personagens que compõe o script da festa, como o Pai Francisco, a Catirina, a Burrinha, o Índio, os Vaqueiros, os Cazumbás, o Dono da Fazenda, o Padre, o Miolo, o Pajé, entre tantos outros personagens que enfeitam e tornam empolgante a história do vaqueiro que matou o melhor boi do patrão para satisfazer a vontade da mulher. Pela lenda, Catirina, mulher faceira, demonstrou a vontade de comer a língua do principal animal do patrão e empurrou o marido para uma grande enrascada. No local, é claro, estava o próprio boi, com suas cores, desenhos e matizes formados por vidrilhos e miçangas. Havia também lá uma mistura saudável de todas as classes sociais da cidade para presenciar os ensaios que aconteceriam até o dia quinze de junho, quando então aconteceria o batismo do boi.

De pronto, fiquei estupefato com a beleza cênica, com o som emitido por aquela mistura de sotaques que se elevava naquela aprazível noite de maio. Voltei muitas vezes ao local para acompanhar aquela festa de cores e sons que tanto agrada ao nativo maranhense. Naturalmente tudo tem um preço e eu tinha que gazetear algumas aulas para poder acompanhar as peripécias do boi do Cobra Preta.

Não sei por quantos anos a festança se repetiu, pois pouco depois tive de me retirar para estudar em outra cidade. Não sei também se a tradicional festividade deixou raízes na cidade, mas não tenho dúvidas em afirmar que o ritmo das toadas deixou saudades em mim e em tantos quanto presenciaram a animação dos brincantes do primeiro Bumba-meu-boi criado na minha cidade.


Em junho, os terreiros situados nos diversos bairros da ilha de São Luís são incendiados com os sons dos batuques de uma enormidade de sotaques de bois que infestam a cidade. Em junho também os arraiais são instalados para a deflagração dos festejos juninos em todo o nordeste brasileiro e os trios musicais compostos pela sanfona, zabumba e triângulo, dão o tom da festa. No interior de parte do Maranhão também. Mas é o Bumba-meu-boi que se apresenta como o maior representante das festividades juninas do Estado maranhense.          

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

BITOROCARA E CAMPO MAIOR: UM SÓ CORPO NO MESMO ESPAÇO


BITOROCARA E CAMPO MAIOR: UM SÓ CORPO NO MESMO ESPAÇO

Antônio Francisco Sousa
Auditor-Fiscal (afcsousa01@hotmail.com)

            De Bernardo de Carvalho – O Fundador de Bitorocara, o pequeno-grande livro eletrônico do bitorocarense Elmar Carvalho, dizer o quê? Muita coisa, em breves palavras: inebriante na medida certa, qual uma taça de bom tinto carmenère chileno, ou de um argentino malbec de boa cepa. Novidade, não somente na literatura piauiense dos tempos hodiernos quanto ao formato, virtual, mas no gênero: histórico-genealógico, assunto pouco explorado pelo mais poeta, ensaísta e cronista do que historiador, magistrado inativo, porém, imortal campo-maiorense.

            Sobre os homens? O dissertado: sem dúvida, um herói singular, figura unívoca, ainda que não única neste vasto e largo celeiro de grandes nomes da historiografia mafrensina (por que não - como tantas vezes quase diz o outro homem, o autor -, bernardiana?). Mesmo que sua Bitorocara tivesse originado São Bernardo, no Maranhão, o que não o fez por questão que Isaac Newton, o físico, explica por analogia em uma de suas leis, a que diz que um corpo não pode, ao mesmo tempo, ocupar mais de um lugar no espaço – menos ainda continuar, permanecer -; haja vista, propriamente ela, a fazenda, comprovadamente, ficar distante mais de vinte e cinco léguas, de ontem, cento e cinquenta quilômetros de hoje, da cidade maranhense; como se não bastasse, com um rio a separá-las, unindo os dois entes estatais; por si só, não haveria qualquer demérito nessa engenharia geográfica, se, de fato, não Campo Maior, mas São Bernardo tivesse nascido de Bitorocara.

            Se a lei proposta por Newton, sancionada e comprovada pela comunidade científica desde sua descoberta – resistindo aos assédios da Física Quântica - pudesse ser contestada quanto à sua conclusão – no máximo, um corpo no mesmo espaço-tempo – uma nova hipótese haveria para ser discutida: e em sendo um mesmo imutável espaço físico, mas tempos diversos? É que Campo Maior nasceu, pois esta é a data de fundação da Fazenda Bitorocara que ficava na confluência dos rios Surubim e Longá (daí porque teve a primeira igreja do povoado como padroeiro Santo Antônio do Surubim, erguida por Bernardo de Carvalho e Aguiar, dono da terra, bem próximo à casa-grande, e de cuja primeira missa, celebrada em novembro de mil, setecentos e doze, portanto, três séculos atrás, participou): no ano mil, seiscentos e noventa e seis; enquanto a fundação de São Bernardo, às margens do rio Parnaíba, no lado maranhense, ocorreu em mil, setecentos e vinte um.

            No que tange ao outro homem, Elmar Carvalho, autor de Bernardo de Carvalho – o Fundador de Bitorocara, há que se dizer o seguinte: um quase workaholic (viciado em trabalho), para fincarmos um termo modernoso; apaixonado pelas letras, pela literatura em suas mais diversas acepções, estilos e gêneros, como se pode comprovar em esse opúsculo, por meio qual se meteu a fazer incursões e perquirições minudentes pelos meandros da história genealógica.

            Do confronto entre os diversos estudos e apontamentos feitos pelos mais competentes e empenhados historiadores, genealogistas e pesquisadores de escol, em relação às terras adquiridas por Bernardo de Carvalho e Aguiar, uma conclusão assoma: a certeza quanto à localização da fazenda Bitorocara: às margens da confluência dos cursos d’água Surubim e Longá, onde se encontra há três séculos povoada e viçosa a cidade piauiense de Campo Maior. Negar essa verdade parece menos ação inteligente e mais intenção de escamoteá-la para usufruto intelectual pessoal; demeritório, todavia, se ao pretenso suposto beneficiário faltar o necessário estofo cultural histórico-genealógico-geográfico. Mera tentativa exacerbada e inócua, seria, de espalhar a cizânia sobre fatos a respeito dos quais não resta senão a residual dúvida decorrente da ausência de um conceito definidor, peremptoriamente, do que venha a ser verdade absoluta; inatingível, cognitiva e racionalmente pela inteligência humana no seu atual estágio de desenvolvimento existencial.

            O mais é saborear a obra, deixando-se envolver pelas sobejas virtudes de Bernardo de Carvalho e Aguiar, o fundador de Bitorocara (Campo Maior), fazedor de amigos, inclusive dentre aqueles que até motivos poderiam ter para não lhe querer bem nem o respeitar: os vencidos nas batalhas que precisou travar ao longo de uma vida de conquistas e glórias, mas, também, de muito sofrimento físico e moral.

            Valeu a pena, Elmar Carvalho, trazer à tona essa figura mítica, desmistificando-a. Às vozes discordantes resta tentarem mudar ou reparar a história para buscarem a sua verdade; o que não quer dizer que encontrarão a verdade.                

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

A LOCALIZAÇÃO DA FAZENDA BITOROCARA

Antiga igreja de Santo Antônio
Igreja do Rosário

18 de novembro   Diário Incontínuo

A LOCALIZAÇÃO DA FAZENDA BITOROCARA

Elmar Carvalho

Recentemente a Diocese de Campo Maior comemorou os 300 anos da Paróquia de Santo Antônio do Surubim. Houve missa concelebrada, com a presença de vários bispos e apresentação da Orquestra Sinfônica de Teresina, sob a regência do maestro Aurélio Melo. No ensejo da efeméride foi lançado o livro “Da matriz vejo a cidade”, da autoria de Natália Oliveira e Alcília Afonso, que ainda não me foi possível adquirir.  

A primeira igreja de Santo Antônio foi construída por Bernardo de Carvalho e Aguiar a pedido do padre Tomé de Carvalho, seu sobrinho, que foi o primeiro vigário da Mocha (Oeiras) por várias décadas, tendo construído a vetusta igreja de Nossa Senhora da Vitória, hoje catedral, que se encontra bem conservada e mantendo quase toda sua arquitetura original. Bernardo também contribuiu para a construção deste templo, inclusive lhe tendo doado uma rica e bela custódia, em ouro maciço e cravejada de pedras preciosas, que ainda hoje faz parte do patrimônio da Diocese oeirense.

Lamentavelmente a velha igreja de Santo Antônio do Surubim, em estilo colonial, batizada em 12.11.1712, foi demolida em 1944, conforme consta no livro Enlaces de família, do historiador e genealogista Valdemir Miranda de Castro.

Em virtude das festas comemorativas dos três séculos da Paróquia e de haver sido requentada a discussão sobre onde ficava a Fazenda Bitorocara, que a meu haver já estava definitivamente superada, com as pesquisas do padre Cláudio Melo, tanto em Belém do Pará como em Portugal, julgo oportuno transcrever nesta crônica diarística o terceiro capítulo de meu livro “Bernardo de Carvalho, o Fundador de Bitorocara”, 2ª edição digital (revista, melhorada e ampliada, em virtude de novos livros e documentos a que tive acesso, após sua primeira e única edição impressa), disponível no site amazon.com.br:

Todos os maiores historiadores do Piauí afirmam haver existido a fazenda Bitorocara e o seu fundador, Bernardo de Carvalho e Aguiar, a começar pelo mais antigo, o padre Miguel de Carvalho, em sua Descrição do Sertão do Piauí, datada de 2 de março de 1697. O padre Cláudio Melo considera esse documento como um dos mais importantes para os estudiosos de História do Piauí, e que deveria ser de manuseio constante. Quase todos admitem que essa propriedade ficava situada em Campo Maior. Como exceção ou voz discordante, um ou outro admite haver dúvida a esse respeito.

O próprio Pe. Cláudio Melo, no prefácio ao livro Descrição do Sertão do Piauí (Comentários e notas do Pe. Cláudio Melo), após advertir que o relatório do Pe. Miguel de Carvalho exigia acurada leitura, com “reflexão e análise prudente e comparada”, em sua proverbial franqueza e honestidade intelectual, aconselhou:

“Não se arrisquem a conclusões precipitadas. Historiador de alta respeitabilidade, como Odilon Nunes, concluiu que Bitorocara era Piracuruca, quando na verdade é Campo Maior [grifo meu]. Eu mesmo há dois ou três anos escrevi um artigo para ‘Cadernos de Teresina’ que, por sorte, não foi publicado (chegou com atraso). Hoje eu não subscreveria tudo que ali afirmei.”

Todavia, o próprio Odilon Nunes, segundo afirma João Gabriel Baptista em seu livro Mapa Geohistóricos, pág. 41, teria sido pessoalmente convencido por Cláudio Melo de que efetivamente o rio Piracuruca não era o Bitorocara. E ele João Gabriel confessa também ter se convencido de que a razão estava com Melo.

Espancando qualquer dúvida que possa existir sobre a localização de Bitorocara, no livro acima citado, o padre Cláudio, um dos maiores historiadores de nosso estado, afirma, a meu ver de forma categórica e peremptória:

“De início, eu supunha que o riacho Bitorocara era o Surubim, em razão de a Fazenda Bitorocara ser a atual cidade de Campo Maior. A descoberta em Portugal da sesmaria de Dâmaso Pinheiro de Carvalho, nas cabeceiras do riacho Cobras, me fez ver que Cobras é o Surubim. Bitorocara, portanto, ou seria o Longá ou o Jenipapo. Surgiu para mim um impasse: a fazenda Serra fica no Longá e o Jatobá no Jenipapo. Como os limites da fazenda Serra não atingiam o Jenipapo, mas os limites da fazenda Jatobá podiam chegar até o Longá, concluí, por fim, que Bitorocara seria o Longá. A fazenda Bitorocara se expandia pelos três rios, e ela estava na confluência deles.”

Para chegar a essa conclusão, pelo que se depreende de seu conselho (ou advertência), acima transcrito, o notável historiador piauiense leu e releu várias vezes e em profundidade o relatório da lavra de Pe. Miguel, com certeza cotejando-o com os vários documentos que consultou em Portugal e no Piauí, muitos deles transcritos no livro Bernardo de Carvalho, de sua autoria.

O padre Miguel, em seu relatório, indicava os rios em que as fazendas por ele referidas se situavam, preservando dessa forma a sua localização. As fazendas, na época, eram muito extensas. Ele situava três no riacho Bitorocara (Longá): a primeira, de nome Serra, ficava nas cabeceiras; a segunda, Bitorocara, se lhe seguia, e “a terceira e última deste riacho se chama o Jatobá”. Evidentemente a fazenda Jatobá ficava na margem direita do Jenipapo, que desemboca no Longá, podendo ter prosseguimento pela margem direita deste rio, uma vez que, na expressão de padre Cláudio, “a fazenda Bitorocara se expandia pelos três rios, e ela estava na confluência deles”. A linha de raciocínio do historiador obedece à lógica, e não a uma simples ilação tirada do nada, e, portanto, não merece reparo.

Como é sabido por todos, a antiga igreja de Santo Antônio do Surubim foi construída por Bernardo de Carvalho e Aguiar a pedido de seu sobrinho, o Pe. Tomé de Carvalho. Quase sempre (e não conheço exceção) as igrejas eram erigidas pelos fazendeiros nas proximidades da casa-grande ou residência, sempre que possível sobre uma colina ou outeiro, em terras de sua propriedade ou posse. Essa era a praxe na história do Piauí, ainda hoje observada. Quem iria construir uma ermida ou igreja distante de sua casa e fora de sua propriedade? Considerando-se que a fazenda Bitorocara (antigo nome do rio Longá) ficava na margem desse rio é lógico concluir-se que ela ficava nas proximidades da igreja construída por seu proprietário nas imediações do rio Cobras, hoje Surubim.

Sobre isso vejamos o que diz o historiador e genealogista Valdemir de Castro Miranda, em seu trabalho intitulado “Sobre as origens de Campo Maior”, publicado no blog poetaelmar.blogspot.com.br, em 04.09.2015:

Campo Maior tem sua origem ligada à figura do mestre de campo Bernardo de Carvalho e Aguiar, fundador da Fazenda Bitorocara no ano de 1695, na confluência dos rios Longá com o Surubim. Por volta de 1706, o Pe. Thomé de Carvalho e Silva fez desobriga na região, fundando ali um curato. Mais tarde, com a ajuda de Bernardo de Carvalho e Aguiar, construiu a Igreja de Santo Antonio, batizada a 12.11.1712, com a instalação da Freguesia de Santo Antonio do Surubim ou Longá, a segunda do Piauí e ainda ligada ao Bispado de Pernambuco. O procedimento para a instalação da nova Freguesia, foi o mesmo adotado pelo Pe. Miguel de Carvalho quando da instalação da Freguesia da Mocha, reuniu os moradores da região para definir o local da edificação do templo. Não contando com a ajuda dos arrendatários das fazendas da região, mas com o cel. Bernardo de Carvalho e Aguiar que construiu a capela a suas custas, conforme consta em carta do Pe. Thomé de Carvalho e Silva, Vigário confirmado na Matriz de Nossa Senhora da Vitória do Piauí de Cima em toda ela Vigário da Vara, pelo ilustríssimo Sr. Dom Manuel Álvares da Costa, Bispo de Pernambuco e do Conselho de Sua Majestade, que Deus guarde:

“Certifico que sendo esta minha Freguesia muito dilatada pelas grandes distâncias, principalmente a ribeira dos Longases, aonde não podia desobrigar a tempo de acudir com os Sacramentos nas necessidades dos meus fregueses residentes nela, pelos muitos rios que tem em meio para esta minha igreja, requeri ao Sr. Bispo de Pernambuco, mandasse fazer Igreja curada na dita ribeira dos Longases, por assim convir ao serviço de Deus, Nosso Senhor, ao que deu logo cumprimento. O dito Sr. Bispo mandou-me ordem para a poder fazer e, indo a esta parte, convoquei os principais moradores e, tomando-lhes os seus votos na parte que havia de erigir a nova Capela, que por invocação tem o nome do Glorioso Santo Antônio, lhe não achei possibilidade pra fazerem, dando várias desculpas pelos poucos escravos que tinham, e estando ocupados em fazendas que tinham os seus donos na Bahia as não podiam desamparar. Nestes termos, me vali do Coronel Bernardo de Carvalho que, com pronta vontade, buscou um carapina a quem pagou, e foi pessoalmente com seus escravos ajuntar as madeiras e os mais materiais, trabalhando o dito com grande zelo. E, com efeito, fez a capela à sua custa, tanto de escravos como gastos, farinha e dinheiro. E o acho com ânimo de gastar nela cabedal. Outrossim se me ofereceu com o gado que necessitasse para a nova ereção desta Matriz de Nossa Senhora da Vitória, e me prometeu 200$000 (duzentos mil reis) para uma Custódia para a dita Matriz e que se custasse mais o daria”.
(MELO, Pe. Cláudio. Fé e Civilização, 1991, p. 47-8).


[Não obstante sua meridional clareza, acho importante frisar: no documento acima transcrito o padre Tomé de Carvalho declara que para a construção da igreja sob a invocação do Glorioso Santo Antônio fez reunião com os principais moradores do lugar, mas que nenhum quis ou pôde ajudá-lo; que nestes termos se valeu “do Coronel Bernardo de Carvalho que, com pronta vontade, buscou um carapina a quem pagou, e foi pessoalmente com seus escravos ajuntar as madeiras e os mais materiais, trabalhando o dito com grande zelo. E, com efeito, fez a capela à sua custa”. Essa afirmativa, por si só, demonstra que o templo ficava perto da sede da fazenda ou da residência de Bernardo.]

    Recentemente uma voz discordante afirma que a Fazenda Bitorocara ficava, aproximadamente, onde hoje estão situados os municípios de São Bernardo – MA, Luzilândia e Campo Largo, os dois últimos no Piauí. O imóvel ficava em ambos os lados do rio Parnaíba. O defensor dessa hipótese parte do pressuposto de que o Arraial Velho e Bitorocara seriam termos sinônimos, e se fundamenta no fato de que Miguel de Carvalho e Aguiar, filho do Senhor de Bitorocara, teria herdado a sesmaria de Arraial Velho de seu pai, conforme documento existente em Belém do Pará, cuja propriedade em favor de Miguel foi confirmada em 1739. Essa informação é verídica e está devidamente documentada. Só um louco ou mistificador a negaria. Aliás, essa notícia é antiga, e já está inserida no livro Cronologia Histórica do Estado do Piauí, da autoria de F. A. Pereira da Costa, cuja primeira edição data de 1909.

Contudo a hipótese de que Bitorocara ficava no rio Parnaíba, na altura de São Bernardo, Campo Largo e Luzilândia, não pode prosperar, e muito menos se estabelecer como verdade, pelos motivos que passarei a expor de forma sintética.

Primeiro, Arraial (velho ou não) nunca foi e não é sinônimo de Bitorocara. É apenas um topônimo genérico, e que designa vários locais do Brasil, e mesmo do Piauí. Assim, no nosso estado existiram vários arraiais, entre os quais cito o que deu origem a Jerumenha, o dos aroases, o dos paulistas, o de Nossa Senhora da Conceição, o dos Ávilas, o que originou a atual cidade e município de Arraial e, evidentemente, o arraial que se formou no entorno da Fazenda Bitorocara e da igreja de Santo Antônio do Surubim, nela situada, etc.

O certo é que o Arraial Velho que deu origem à cidade de São Bernardo (MA) não é e nem poderia ser o arraial velho que formou a cidade de Campo Maior.

Por outro lado, em termos cronológico e documental, Bitorocara jamais poderia se referir ao Arraial Velho do rio Parnaíba, uma vez que o documento a este referente data de 1739, enquanto a referência à fazenda Bitorocara, feita pelo padre Miguel de Carvalho é datada de 1697, conforme seu relatório, publicado sob o título de Descrição do Sertão do Piauí.

Ademais, o seu autor, Miguel de Carvalho, em sua desobriga, que relatou nesse documento, percorreu apenas as terras que ele entendia como pertencentes à freguesia de Nossa Senhora da Vitória, conforme explicitou o padre Cláudio Melo em seus comentários (v. bibliografia): “Outras porções do território piauiense também eram habitadas, mas ficaram excluídas desta Descrição; é o caso dos sertões do Parnaguá (que ficariam na jurisdição de outra freguesia a ser instalada) é o caso do baixo Longá, Piracuruca e litoral que já estavam assistidos pelos Filhos de Santo Inácio, na Ibiapaba.”

Ora, se o padre Miguel de Carvalho sequer percorreu todo o território do atual estado do Piauí, com muito mais razão não poderia ter ido até os atuais municípios de Brejo e de São Bernardo, no Maranhão (em cuja região veio a ser situado o Arraial Velho), que pertenciam a outra jurisdição eclesiástica. Consequentemente, a fazenda Bitorocara a que ele se referiu em seu relatório ficava mesmo no rio Longá, perto de onde fica a atual cidade de Campo Maior.

Em consequência o arraial militar, ou arraial ou ainda arraial velho referente a Campo Maior, que se formou no entorno ou perto da Igreja de Santo Antônio do Surubim, não pode, em hipótese nenhuma, ser confundido com o Arraial Velho maranhense, localizado perto do Parnaíba. Mesmo porque Bernardo de Carvalho e Aguiar, último mestre de campo das Conquistas do Piauí e do Maranhão só se mudou para a atual cidade de São Bernardo, da qual é considerado fundador, em 1721, quando deixou o seu cargo.

A fazenda Bitorocara, portanto, ante tudo o que expusemos, ficava na confluência dos rios Longá, Surubim e Jenipapo, o que, admitamos, era estratégico, uma vez que haveria suprimento de água para consumo humano e do gado, e para a formação de pastagem, além de que seriam evitados problemas com eventuais confrontantes, porquanto os limites ficariam bem estabelecidos por esses cursos d’ água.           

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

SITUAR BITOROCARA É FÁCIL, ESTÁ NA CARA


SITUAR BITOROCARA É FÁCIL, ESTÁ NA CARA

Francisco de ALMEIDA (*)

  
Como as defesas célebres
Que se encontram na história,
No momento, faço uma
Tendo força vibratória:
Quem fundou Bitorocara
E local que se encravara?
Com fundamentos de glória.

Aqui se expõe argumento
Que por si, é vencedor,
Como na passagem Bíblica
Onde Jesus registrou:
A César, impostos seus;
A Deus o que é de Deus,
E, assim, sentenciou.

Também se pode lembrar
Do caso de Madalena,
Quando uma vez acusada
Naquela horrível cena,
Jesus mandou que jogasse,
A primeira pedra atirasse,
Quem nunca mereceu pena.

Nestes versos trato de
Quem fundou Campo Maior,
De origem Bitorocara
Com muita luta e suor,
Por Bernardo de Carvalho
Que nunca foi por atalho,
Pois tudo sabia de cor.

Foi ele quem construiu
A Igreja de Santo Antônio
Da bela Campo Maior,
O Santo do Matrimônio,
A pedido do sobrinho:
Padre Thomé, com carinho,
Sem ser preso a patrimônio.

E Bernardo levantou
À sua privativa custa,
Conforme Padre Thomé,
Sempre com ação augusta,
Registrou em uma carta
Que relatório encarta,
Com fidelidade justa

E Bernardo de Carvalho
Jamais fora sanguinário,
E tampouco genocida;
Ao revés, humanitário,
Tendo elevado conceito
Conquistando bom respeito,
Até por adversário.

A prova deste destaque:
Eleito Mestre do Campo,
Sem nenhuma divergência
E sequer alguém deu grampo,
Ao morrer Souto Maior
Foi alvo de uma voz só,
Um luminar pirilampo.

Falo da localização
Da Fazenda Majestosa,
De nome Bitorocara
E não de forma amistosa,
Trato com profundidade
Embasado na verdade
Com atitude exitosa.

Não deseje pôr em dúvida
O que está com a razão,
Consoante com a lógica
Livre de contestação,
Com provas irrefutáveis
Facilmente demonstráveis,
A correta opinião.

Os grandes historiadores
Do querido Piauí,
Do mais novo ao mais antigo
Traçando o perfil daqui,
Registram Bitorocara
Com perfeição muito clara,
Não se deve divergir.

Também é identificado
Como herói fundador,
O Bernardo de Carvalho
Um cidadão de valor,
Os registros são exatos
Não se trata de boatos,
Não é ficção de autor.

Desde o Século Dezessete
Que a história assegura,
Já com o Padre Miguel
Com base em pesquisa apura,
Em “Descrição do Sertão”
Com muita dedicação,
Não merecendo censura.

E o Padre Claudio Melo
Enaltece tal pesquisa,
Como documento ímpar
Que em comentário giza:
Ser de importância tamanha
Que a verdade não arranha
E muito bem analisa.

Sabe-se que o Padre Cláudio
Não foi de poupar cautela,
Pesquisou no Piauí
E em Portugal não protela,
Convencendo Odilon Nunes
Que a João Baptista se une
Nessa conclusão singela.

Se existiu Arraial Velho
Nas margens do Parnaíba,
É outra propriedade
Que registrou um escriba,
Pois o de Campo Maior,
Tinha carnaúba e pó
Para baixo e para riba.

É dedução racional
A do local da Fazenda,
Chamada Bitorocara
Vencendo qualquer contenda,
Na confluência dos três rios
Com argumentos sadios
Que não merecem emenda.

Foi na junção dos três rios
O local mais ideal,
Pra fixar a Fazenda
Por estudo imparcial;
Do Longá e Surubim
E Jenipapo, assim,
Foi a conclusão final.

No histórico encontro
Sendo mais exatamente,
Do Longá com Surubim
É o que diz fielmente,
O testamento de Miguel,
Filho do fundador fiel,
Pra neta, previamente.

Depois, chamando-se Velho:
Um Arraial Militar,
Brotando uma freguesia
Vindo uma vila a brilhar,
Ao final Campo Maior,
É a informação melhor
Pra origem do lugar.

Pois o Rio Bitorocara
Jamais foi Piracuruca,
Longe de serem o mesmo,
Só comparação maluca;
Quem falou se convenceu,
Corretamente entendeu,
E a verdade não machuca.

Diz-se de Piracuruca
Que é peixe resmungão,
Bitorocara é diversa,
Não há qualquer comunhão,
“Bito” é leite de vaca,
“Rocara”, quem mete a cara,
Há, pois, total distinção.

Assim registra Elmar
Com toda propriedade
Que se faziam Igrejas
Com curta proximidade
Da casa do Fazendeiro,
Pra bem dizer no terreiro,
Até por comodidade.

Um costume do passado
Que ainda hoje se pratica,
Era sepultar os mortos
A poucos metros da bica,
Debaixo de uma Igreja
Como uma ação benfazeja
Que o finado qualifica.

Consoante Elmar Carvalho
Não se pode confundir
Um diverso Arraial Velho,
Se com cuidado aferir;
E não é Bitorocara,
É bem simples, tá na cara
Ninguém deve discutir.

Dizer que Bitorocara
Margeava o Parnaíba,
Na altura de Luzilândia
Em devaneio se estriba,
Assim, assegura Elmar,
Não podendo prosperar,
É tese que se derriba.

Arraial, quer novo ou velho,
Que muito se tem notícia,
É topônimo genérico
Sendo uma área propícia
Pra parque de diversão,
Também quermesse e leilão,
Uma praça alimentícia
               
É claro que se formou
Ao derredor da Igreja
Do protetor Santo Antônio,
No local que se festeja,
Um animado arraial
Com alegria magistral,
É o que a história traceja.

Fernando Pessoa destaca
O rio de sua aldeia
Que é mais belo que o Tejo
Pois este lá não passeia,
Elmar descreve sua terra
Com força que não emperra,
E nunca a vê como feia.

Importantes personagens
Que aqui devemos lembrar,
Filhos de Campo Maior
Com uma vida exemplar,
Simplício  e Jutaí,
Eusébio também aí,
Merecendo um lindo altar.

Não se deve ter limite
Para buscar a verdade,
Cada contribuição
É um ato de bondade,
Não há nada absoluto,
Liderança, não disputo,
Quero apenas lealdade.

Desculpem a veemência
Das conclusões do cordel,
É que nesta literatura
A ênfase tem seu papel,
É própria do seu estilo
Para brotar mais cintilo,
Mas à verdade fiel.

Escrevi este cordel
Com trinta e três septilhas,
Por uma questão simbólica
Que traz muitas maravilhas,
Pois foi a idade de Cristo
E na defesa me alisto
De Bernardo e suas trilhas.

Referências:
1.            CARVALHO, Elmar. Bernardo de Carvalho, O Fundador de Bitorocara (segunda edição digital – 2015). Amazon.com.br;
2.            PAIXÃO, Marcus Vinícius Costa. Campo Maior Origens. Uma análise histórica e documental do início da povoação de Campo Maior/Marcus Vinícius Costa Paixão. – Campo Maior: Edição do autor, 2015;
3.            http://www.portalopiniao10.com/ - acesso em novembro/2015;
4.            http://www.proparnaiba.com/ - acesso em novembro/2015;
5.            http://www.campomaioremfoco.com.br/ver_coluna/64/ - acesso em novembro/2015;
6.            http://www.portalentretextos.com.br/colunas/ecletica- acesso em novembro 2015;
7.            http://bitorocara.blogspot.com.br/2008/11/bernardo-de-carvalho-e-aguiar.html - acesso em novembro/2015;
8.            http://poetaelmar.blogspot.com.br/ - acesso em novembro/2015

(*) Francisco de ALMEIDA.  Membro da Advocacia Geral da União (Advogado da União de Categoria Especial). Pós-Graduado- Lato Sensu - em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal; Pós-Graduado - Lato Sensu - em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Católica Dom Bosco, em convênio com Marcato – Cursos Jurídicos; Poeta Popular; Maçom - M.: I.: Gr. 33 (Pertencente à Academia de Mestre Maçons – Cadeira n. 86 – Patrono Joel Borges); pertencente à Academia Piauiense de Literatura de Cordel – APLC – Cadeira n. 01 – Patrono Firmino Teixeira do Amaral. E-mail: almeidaz@terra.com.br – telefone (86) 9-9991.2081.    

domingo, 15 de novembro de 2015

PASSEIO PELA CIDADE


PASSEIO PELA CIDADE

Alcione Pessoa Lima

Um passeio pelas ruas da cidade...
Após a chuva, raios e enxurrada...
Não existe mais a melancolia das tardes...
Somente mariposas sobre a jitirana do lixão colorido.
Um véu cinzento de monóxido de carbono...
E tantos zumbis a vagarem, sem asas.
As buzinas e ruínas perturbando a sensatez...
E os becos empilhados de pessoas...
São rostos desconhecidos...
Uma cidade que se desconhece...
Até por mim, que entre rios fui gerado.
Percebo uma divisão...
Entre arranha-céus e guetos...
A acomodação de um apartheid...
Um contraste entre os sonhos que se aglomeram...
E ao cruzar a praça da cultura...
Arde em mim um silêncio que perturba.
Onde está a liberdade de à sombra do oitizeiro poder amainar o ardor do sol...?
Talvez na velocidade da transformação...
A esconder um horizonte que ainda resiste...
E no encontro dos rios fétidos...
Um anzol traz apenas um arrastão esquecido...
E a natureza morta (aguapés) descendo pela correnteza...
Vejo-te, assim, cidade cosmopolita...
Em teu céu cruzarem pássaros de aço...
E sem saúde, amontoados de pedintes, em uma única fila...
Um olhar lacrimejante: o meu lamento.
E sobre uma serpente de concreto, arrastar-se o trem...
Que transporta a minha saudade...
E surfistas equilibrando a vida, até cruzarem a linha do destino...
Mas, ainda posso ver flores em teu caminho...
A se sobreporem aos espinhos da tua dor.

sábado, 14 de novembro de 2015

SER OU NÃO SER


14 de novembro   Diário Incontínuo

SER OU NÃO SER

Elmar Carvalho

Ao ouvir a informação de que o corpo da jornalista Sandra Moreyra fora cremado, me surgiu instantaneamente a ideia de um microconto ou mesmo de um nanoconto, intitulado Ser ou não ser. Ei-lo:

Ao receber a pequena urna, o homem surtou, e disse, qual novo, trágico e desvairado Hamlet: “Ser ou não ser, eis a questão. A estas poucas cinzas se resume um ser humano?” E ali mesmo, na sala de espera do crematório, derramou o que restava do corpo da bem-amada.    

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

MINHA SAUDAÇÃO A DÍLSON E A BARRAS

A velha igreja de Barras
A velha igreja de Barras

12 de novembro   Diário Incontínuo

MINHA SAUDAÇÃO A DÍLSON E A BARRAS

Elmar Carvalho

Com certa surpresa recebi o convite do professor, poeta e escritor Dílson Lages Monteiro para proferir o discurso de recepção em sua posse na Academia Piauiense de Letras. De imediato, embora com certa apreensão pela responsabilidade que me caía sobre os ombros, lhe disse aceitar o desafio.

A partir de então comecei a meditar sobre o modo como organizaria minha peça oratória; que assuntos deveria abordar, e como faria a sua distribuição na abertura ou introdução, no corpo principal ou desenvolvimento dos temas e no encerramento, que se deseja forme uma “chave de ouro”, como na estrofe final dos bons sonetos. Passei a ler e/ou reler a sua obra poética e em prosa, de forma meditada e com breves anotações.

Já tinha experiência em discursos acadêmicos de posse, mas não de recepção. Quando assumi minhas cadeiras nas academias de letras de Parnaíba, do Vale do Longá, de Piripiri e na Piauiense, fiz discurso formal escrito, em que tentei seguir a mais consolidada praxe na espécie. Nas demais, discursei ao sabor de improviso, ou sequer precisei discursar, por ser sócio fundador.

A exemplo do que fiz (ou pelo menos tentei fazer) em minhas orações acadêmicas anteriores, procurei dar ao texto beleza e emoção, plasticidade e certa leveza. Contudo, logo notei que em discurso de posse o orador tem mais liberdade, exceto na obrigação estatutária de falar nos antecedentes e patrono, ao passo que a saudação ao novel imortal não se pode deixar de lhe fazer o elogio, de se lhe examinar a obra literária, e de se referir aos antecedentes e patrono da cadeira a ser ocupada.

Como Dílson é filho de Barras e a sua poesia e romance se reportam a essa cidade, e também considerando que muitos de meus ancestrais paternos nasceram nesse torrão, no qual estive várias vezes, em minha infância e na minha adolescência, por ocasião de minhas férias escolares, resolvi fazer rápidas referências à rica história dessa aprazível, bela e simpática urbe. Não fosse isso tudo razão suficiente, ela deu ao Piauí importantes políticos, escritores e poetas, muitos dos quais patronos ou ocupantes de cadeiras na APL.

Em meu discurso, dei ênfase à obra magisterial, poética e romanesca de Dílson Lages Monteiro. Examinei-lhe a metodologia no ensino de redação, mormente as suas peculiaridades. Abordei as principais características e virtudes de sua poemática. Analisei o romance O morro da casa-grande, detendo-me nos pontos que julguei mais relevantes e singulares. Procurei fazer essas dissecações da maneira menos técnica possível, mas sem ser simplório, e sem enveredar por meros comentários de obviedades.

Ainda que em rápidas pinceladas, nele tentei traçar um sintético painel da história, da paisagem e da arquitetura da velha cidade. Não o transcrevo por ser um tanto longo para um simples registro diarístico como este, e também porque já foi publicado na internet, mas acho oportuno transpor alguns trechos mais pessoais e direcionados para a nossa nunca assaz louvada Barras do Marataoã:

“(...) Esta noite engalanada, portanto, vai ser uma festa barrense, e veremos aqui perpassar o reflexo dos vultos históricos da velha Barras do Marataoã, dos seus grandes poetas mortos, e ouviremos o murmúrio dos rios que lhe formam as barras, de onde lhe veio o telúrico e poético nome. Nesta Casa sentimos ainda a forte presença do barrense A. Tito Filho, seu presidente por mais de 20 anos, que acolheu e orientou o novel consócio com generosidade, quando ele ensaiava os primeiros passos na literatura.

Quando um afoito amigo quis escrever um artigo, no qual pretendia retirar de Barras o seu justo título de Terras dos Governadores, adverti-o para que não o fizesse, porquanto estaria laborando em vexatório equívoco. Por essa razão escrevi a crônica ensaística “Barras – terra dos governadores e de poetas e intelectuais”, a que em seu desenvolvimento acresci “e de marechais”, para afastar de vez futuras ousadias similares. Essa crônica teve ressonância no intelecto de Chico Acoram Araújo, a quem dei o título de cacique da tribo dos Marataoãs, que vem escrevendo uma série de estudos sobre barrenses ilustres, além de ótimas crônicas e artigos (...)

(...) Sinto como se tivesse lembrança desse Cristo, que vi em minha meninice, com os seus braços abertos, em acolhimento aos que chegavam, e a abençoar a cidade e os que partiam. Era uma bela e vetusta igreja em estilo colonial, construída por José Carvalho de Almeida, e destruída em 1963, como era um vezo dos padres da época, que gostavam de ampliar, reformar, descaracterizar ou demolir as velhas capelas e igrejas. Ao comentar o excelente livro Barras, histórias e saudades, de Antenor Rêgo Filho, a ela me referi, e remontei à ermida de N. S. da Conceição (que lhe antecedera), iniciada por Miguel de Carvalho e Aguiar, em sua fazenda Buritizinho, e concluída por seu herdeiro e sobrinho Manoel da Cunha Carvalho; essa capela e a casa-grande são a origem mais remota da cidade das sete barras, como a designei em poema telúrico e evocativo. (...)

(...) Por entre as páginas desse belo romance, vemos ainda os velhos sobrados, os casarões solarengos, os logradouros e praças de outrora, vetustos edifícios públicos, como o do teatro e o dos Correios, e lamentamos a destruição do antigo cemitério, cujas lápides contavam muito da importante história barrense.

Quando eu ia a Barras, me hospedava na casa de Salomão de Sá Furtado, primo de meu pai, que ficava bem perto desse saudoso campo santo. Salomão, além de exímio operador de morse, tinha uma linda caligrafia, e uma não menos bela redação. Era um estilista e tinha uma pequena biblioteca, caso raro, ainda nos dias de hoje. A poucas quadras de sua casa ficava o Marataoã, em cujas águas nadei em minha adolescência, onde me embebi embevecido nos olhos luminosos das garotas, que refletiam suas águas, feitas de ciganice e magia.

Dílson Lages Monteiro me comoveu, e me restituiu a velha e querida Barras de minha infância e de minha adolescência, que na redoma de minha memória ainda remanesce intacta, com a sua vetusta igreja, com o Cristo Redentor de braços abertos entronado no cimo de seu frontispício (...)”

Finalizando, desejo dizer que a posse de Dílson foi uma belíssima festa literária. A solenidade aconteceu no dia 10 de outubro, à noite, no auditório da APL. Compuseram a mesa: Nelson Nery Costa (presidente da APL), desembargador Oton Lustosa (rep. do TJPI), Antônio Pedro Almeida Neto (presidente da Academia de Letras do Vale do Longá – ALVAL), Dílson Lages, Aldaires Pereira (esposa do novel acadêmico), acadêmico Magno Pires, Renaud Hardi (filho do poeta Hardi Filho, último ocupante da cadeira) e este cronista. Ele proferiu um excelente e aplaudido discurso, em que analisou com pertinência e argúcia seus antecedentes e patrono; nos comoveu e nos trouxe beleza retórica, mormente nos momentos em que a oração adquiriu contornos de uma verdadeira prosa poética.

Foi prestigiado por seus conterrâneos, parentes, acadêmicos da APL e da ALVAL, e amigos, entre os quais me incluo. O auditório estava lotado e o coquetel foi farto, variado e delicioso. Que mais dizer? Nada mais há a dizer.