segunda-feira, 22 de maio de 2023

A IMPOTÊNCIA SEXUAL EM FACE DA LEI

Foto meramente ilustrativa    Fonte: Google


 A IMPOTÊNCIA SEXUAL EM FACE DA LEI


Valério Chaves Pinto – Des. aposentado do TJPI

 

            Há algum tempo foi divulgado um fato que se não fosse fruto de falsos dogmas defendidos por setores mais radicais da sociedade brasileira, tinha muito a ver com o ineditismo popular e as supérfluas fórmulas sacramentais de certos atos da vida civil do brasileiro.

            A notícia (não confirmada oficialmente) dizia que um influente líder religioso teria se negado a celebrar o casamento de um funcionário público com uma empresária do ramo de cosméticos pelo simples fato de o noivo ser paraplégico e não ter prova médica de sua capacidade sexual.

            - Só pode casar quem tiver capacidade física comprovada de gerar filhos. Fora do sexo para fins de procriação, não existe felicidade no casamento – teria dito o celebrante perante os noivos.

            Afinal, quem possui defeito físico e é impotente sexual está proibido de casar perante a igreja e a lei civil?

            Para a lei brasileira qual é a posição do Direito Civil em relação aos chamados fins do casamento?

            O Código Civil Brasileiro de 2002 tem respostas para essas questões na medida em que ao tratar das proibições para o casamento em seu artigo 1.521, não elenca a impotência sexual como um dos impedimentos dirimentes públicos ou privados que obstam a realização válida do casamento. Apenas para efeito de anulação do casamento o Código refere no seu art. 1.556 ao erro essencial quanto à pessoa do outro cônjuge, mas só se o erro for de tal forma que o seu conhecimento ulterior acerca da realidade fática ou jurídica, torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado.

 Erros de natureza diversa ou secundária como os que dizem respeito a defeito físico, capacidade de gerar filhos, preferências esportivas, artísticas e culturais não interferem na validade e na eficácia do vínculo matrimonial estabelecido. Para a doutrina o erro essencial não deve imiscuir-se estranhos, porque somente o cônjuge poderá decidir se a vida conjugal deve continuar.

Embora se saiba que o sexo é componente importante no casamento, eis que dele decorre a reprodução da espécie humana e o entrosamento de homem e mulher, porém ninguém pode alegar impotência sexual como defeito físico insuscetível de cura pela medicina, como causa de impedimento para o casamento civil entre homem e mulher.

 Mesmo que a esterilidade do cônjuge se constituísse em proibição para a celebração do ato, haveria de se ponderar que somente a vontade dos contraentes deve atuar como instrumento para a felicidade de ambos, mormente se existe recíproca afeição e comunhão de esforços.

Com efeito, sendo o casamento um direito intangível, parece claro que todo homem, enquanto livre e não escravo, merece exercitá-lo desvinculado de tendências sociais, morais, filosóficas, políticas e, principalmente religiosas.

No mundo moderno, com os avanços da ciência aumentando a capacidade do homem de criar e superar limites, ninguém mais ignora a quantidade de casos de cura de pessoas que sobrevivem à expectativa dos próprios médicos. Os desafios estão sendo mostrados pela velocidade de multiplicação do saber. As doenças incuráveis deixaram de ser regra para se tornar exceção. Disso resulta claro que, sendo a impotência sexual no casamento uma questão de direito, é também, fundamentalmente, um problema de medicina.

O caso em referência, certamente deve ter tido um final feliz porque ninguém tem o direito de proibir a felicidade de outrem. Afinal, o sentido de o homem dar significado à sua vida e dimensionar sua personalidade, transcende a uma mera condição física.

Portanto, diferentemente do que pensam alguns defensores das desilusões que emergem do sonho não realizado, está na hora de esquecer os falsos dogmas e se estabelecer uma distinção bem nítida entre impotência sexual e vontade de ser feliz.

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