terça-feira, 6 de abril de 2010

DIÁRIO INCONTÍNUO

Elmar Carvalho


6 de abril

MELANCOLIA DO ENTARDECER

Ontem, ao sair do trabalho, de tardezinha, estava um tanto melancólico. Por isso mesmo, resolvi dar uma volta de carro até o início da Chapada Grande, seguindo pela estrada que vai de Regeneração para Oeiras. O entardecer, na zona rural, em que se percebe com mais intensidade o cair da noite, sempre me entristece um pouco. Acho o amanhecer sempre mais alegre; até o cantar das aves me parece mais festivo, com a luz surgindo e fazendo tudo ressurgir. O cair das trevas é quase como se fosse um aniquilamento de tudo, com as coisas e a paisagem desaparecendo na escuridão. É como se fosse a antecipação ou o ensaio da morte. Dizem que o sono é uma pequena morte, mas o sono nunca me causou tristeza. Ao contrário, a falta dele é que causa uma certa ansiedade e até mesmo graves problemas psicológicos nas pessoas que têm dificuldade em dormir. Isso porque sentimos vontade e mesmo necessidade de dormir. Bandeira, num de seus poemas, fala que quando fora dormir, em certa noite de São João, havia conversa, risos, luzes, mas quando acordou, alta madrugada, já nada disso havia, porquanto estavam todos dormindo, dormindo profundamente. Há o dormir mais profundo, o dormir da noite eterna, o dormir da morte, de que jamais se acorda. Suponho que essa nostalgia ao entardecer é um sentimento atávico, ancestral, entranhado na alma e numa espécie de memória genética, se é que assim me posso exprimir, que aparentemente surge sem razão e para o qual não se encontra fácil e instantânea justificativa. Contudo, creio que o tombar da noite, nos lugares em que não existe luz elétrica, lembra o caos primordial em que nada existia, mas do qual tudo surgiu. Um caos primordial às avessas, que tudo vai destruindo, que tudo vai reduzindo a nada, porque as coisas vão desaparecendo de nossa vista, como se deixassem de existir de fato, e não apenas para a nossa percepção visual. Embora tenhamos fé numa outra vida, a morte nos entristece pela saudade que sentimos da pessoa que não mais veremos. A separação pela distância nos deixa triste, mas acalentamos a esperança de que sempre poderemos rever a pessoa amada. Talvez fiquemos tristes ao crepúsculo porque é como se as coisas morressem ao desaparecer nas trevas, e a noite se nos afigurasse como uma espécie de antecipação da morte; da morte de nós mesmos, e da morte do mundo que perderemos com a nossa morte. Mas, parafraseando a letra viniciana, chega de tristeza, chega de saudade.

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