sábado, 11 de dezembro de 2010

ONDE HUMANO - , POETA LUIZ FILHO DE OLIVEIRA

Francisco Miguel de Moura

FRANCISCO MIGUEL DE MOURA*




Faz algum tempo que o poeta e historiador da literatura do Piauí, Herculano Moraes, criou a necessária Geração do Milênio, para classificar escritores realmente novos do final do século passado e começo deste, não os deixando cair na relação dos que ficaram conhecidos como Geração do Mimeógrafo (ou Marginal). E eu não me advertira ainda de que está havendo certa diferença a mais nos escritores (menos nos prosadores) deste começo século XXI.

Mas agora, lendo a obra de Luiz Filho de Oliveira, especialmente seu segundo livro, “Onde Humano”, gritei para mim mesmo: Eis um poeta diferente, com sumo, com força, com raça, que merece ser distinguido dos de antes pela postura lingüística nova, sem querer imitar gregos nem troianos, clássicos nem modernos, apenas ser ele mesmo, a figura impar do que acontece no mundo, o poeta – em forma de palavra, língua, linguagem, poesia. Num poema de quatro versos, analisemo-lo quando ele faz  
questão de poesia:  (p.15)
deixe completo ou complete 
o verbo é avesso da morte 
e por dentro & fora  
permanece” __________

(Espaço de exercício gramático-poético). 

Noutro poema, este bem maior, assistimos o despacho do “onde humano”, cujo título enorme não faz medo, mas ilumina o achado da poesia-humanidade, sem sumo de humanismo:  
poema armado a sua dessemelhante imagem” (pg.16): 

não lapida a palavra este poeta
mas a lapidar-elas¹ como poema 
físico-estético, sócio-linguístico 
arma /este edifício funcional engenho 
erguido na pedra argila cerâmica 
papiro, pergaminho, papel tela eletrônica 
ao pegar da cunha do estilo do pincel 
à caneta esferográfica ao teclado em pixel² 
e sobe ao subsolo bem rente ao cume e 
desce os degraus rumo ao cimo e 
armado o poema resiste firme 
com o espaço destes elementos e 
veste tais paredes (estas linhas) e
arranha o céu dos sentidos 
o enésimo sétimo talvez sim 
pela engenharia do pedreiro 
pela forma livre do que 
em vida edifica texto: 
música ou poema 
sentido.... espaço humano construindo”  

(Das preciosas pedras, em Pedro II, à do sal, em Parnaíba). 

Quero saber se o leitor, principalmente o comum, o mais sensível, compreendeu o desejo do poeta de arrancar do espaço e do tempo o impossível, o interdito, “a dor da força desaproveitada” que tão bem lembrou Augusto dos Anjos. Não falo dos poetas, eles entendem o que o leitor comum outrora chamava de loucura do poeta. Hoje, todos que consomem versos e poemas sabem muito bem.

Luiz Filho de Oliveira não precisa de prefácio, apresentação ou crítica. É um poeta pronto para saltos maiores: os de ter seus poemas publicados em editoras e vendidos em livrarias, assim como seu nome divulgado em antologias e dicionários, pois é o que merece.  Ele é um verdadeiro poeta Milenista, ou seja, deste século e do futuro, digo sem medo. Ele não vai desaparecer na multidão de poetas comuns, porque sabe o que quer, o que faz e aonde quer chegar. É muito bom quando a gente tem poetas assim, individuais, pessoais, inimitáveis, como são as criaturas do nosso mundo onde o indivíduo, a criatura é também o criador de si e do mundo em redor de si. Para o bem e a felicidade da arte. Porque a arte é isto aí: palavras, sons, silêncios, símbolos, imagens que transmitem o até então intransmissível: a poesia. E o poeta é um arauto do futuro, além de ser o intérprete do presente. Poetas e profetas – as raízes são as mesmas. Por isto é que são radicais. O estilo de Luiz Filho é radical e ao mesmo tempo racional. As explicações que ele dá às expressões assinaladas com (¹) e (²), nos versos acima, são de quem conhece gramática, linguística e línguas. Cai, assim, no número geral assinalado por Mário de Andrade: “só os poetas que sabem podem errar” – se alguém, por preconceito, achar que o poeta Luiz Filho erra nisto ou naquilo. Ele não erra, ao invés renova. E todos os poetas são renovadores, criadores. Benvido, poeta! Entre, a porta está aberta para a literatura, aqui e alhures.
                                              ____________________________
Notas numeradas:
 1. Lapidar-elas (p.16) - Falsa forma de brasileirismo, segundo Rui Barbosa. Na  verdade, trata-se de um lusitanismo conservado no falar do brasileiro,  em que se usa o pronome pessoal ele (e suas variações), como objeto do verbo, conforme cita Ismael Lima Coutinho em sua Gramática Histórica (Ao Livro Técnico, 1796). O próprio Rui Barbosa registra alguns exemplos, como o de Fernão Lopes: El-rei mandou-o logo prender,  e levaram ele e Mateus Fernandes a Sevilha. Além de citar esse exemplo, Coutinho acrescenta outros, dos quais Desque vi ela é o mais antigo, do Cancioneiro da Vaticana. Neste livro, o autor usou o hífen para destacar a relação verbo-objeto.
2. Pixel (pg.16) - Termo inglês, usado em informática para designar a menor unidade de formatação da imagem (fotos, desenhos, vídeos, etc.) em certos equipamentos eletrônicos.
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 *Luiz Filho de Oliveira, piauiense, nascido em 1968, em Campo Maior, já publicou dois livros: "BardoAmar", estreia em 2003; e "Onde Humano", 2009. Mora em Teresina, Piauí.
**Francisco Miguel de Moura, escritor, membro da Academia Piauiense de Letras, da UBE-SP e da IWA - International Writers and Artists Association, Estados Unidos da América.


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