segunda-feira, 5 de março de 2012

AUTOBIOGRAFIA


AUTOBIOGRAFIA

Elmar Carvalho

Após seguir os mais ásperos caminhos,
Napoleão avesso, eu próprio me coroei
com uma coroa de cravos e espinhos.
Subi montes, rompi charcos,
atravessei grutas sem luz,
com os ombros esmagados
ao peso de férrea cruz.
Em noites de névoas e luares
sofri e cantei perdido nos lupanares.
Em dias de sol escaldante e incandescente,
fui casto Dante
e Baudelaire delirante e indecente,
pelas tardes mornas de ressacas e orgias.
No Olimpo a que subi em busca
dos mitos, à procura de Zeus,
pregaram-me numa cruz onde
puseram irônica tabuleta: “Rei dos Judeus”.
Por frígida e pálida manhã,
envolto em solidão e neblina,
rasguei e perdi minha toga purpurina.
Cheio de ódio e de amor,
sorvendo taças e mais taças
de bebida balsâmica e malsã,
nos bordéis de Eros, nos templos de Pã,
e nos palácios dourados de Mefisto,
onde sucumbo e resisto,
no meio de mentira e desengano,
fui Satã,
fui Cristo,
fui Humano.

2 comentários:

  1. "Sou composto por urgências: minhas alegrias são intensas; minhas tristezas, absolutas. Me entupo de ausências, me esvazio de excessos. Eu não caibo no estreito, eu só vivo nos extremos"
    ( Clarice Lispector)

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  2. Excelente citação, caro professor Nelson Rios.
    Por mais coerência que possamos ter, também temos as nossas contradições, ou pelo momentos contraditórios.

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