Concurso de poemas |
Alunos, ladeados pela profa. Régia e pelo prof. Clementino Siqueira |
31 de maio Diário Incontínuo
AINDA MEU “TESTAMENTO” LITERÁRIO
Elmar Carvalho
Em meu depoimento no Pro Campus, recordando as minhas
antigas leituras de menino, falei que alguns dos livros da biblioteca
de meu pai estavam incompletos. É que, quando eu tinha de dois para
três anos de vida, ao brincar com esses livros, talvez folheando
aleatoriamente suas folhas, sem saber decifrar ainda o código da
escrita, e sem imaginar o prazer que mais adiante elas me dariam, no
meu início de leitor inveterado, rasguei algumas dessas belas
páginas, sob o olhar indulgente e divertido de minha avó paterna.
No afã e no prazer da leitura, ficava triste e
frustado, quando perdia parte do desenrolar da narrativa, por causa
das folhas perdidas, que eu mesmo rasgara nos meus tempos de infante.
Um desses romances foi o Mártir do Gólgota, sobre o qual já me
referi neste Diário, e um compêndio sobre a Literatura Brasileira,
que continha história e crítica literária, com a transcrição
exemplificativa de trechos dos poemas. Esta última obra foi decisiva
para que eu, desde bem jovem, passasse a distinguir a boa da má
literatura, a separar o joio do trigo, como nos adverte a parábola
evangélica.
Nessa época eu lia de tudo, mormente poemas e ficção.
Lia e relia as antologias contidas nos compêndios de gramática e
literatura. Li muitas revistas, inclusive gibis e fotonovelas, e até
mesmo romances condensados ou transformados em histórias em
quadrinhos, à falta momentânea de obras literárias. Encantava-me a
beleza de Michela Roc e Paola Pitti, atrizes italianas, que
interpretavam as heroínas dos lacrimejantes folhetins fotográficos.
Ao ler a biografia dos grandes poetas e escritores, e ao lhes ver o
retrato estampado nas seletas, almejei me tornar um poeta de valor, e
não simplesmente um poeta qualquer. Se consegui ou não o meu
objetivo é uma outra questão, que não me cabe responder.
Foi nessa época que li todo o Novo Testamento, numa
edição que tinha notas históricas e de exegese, que me adestraram
a interpretar sobretudo as parábolas de Jesus. Certa vez, já
estudando na cidade, fui à pregação de um sacerdote católico,
numa casa próxima. O padre perguntou aos assistentes a interpretação
de certa parábola. Adestrado pelas notas a que me referi, dissequei
a alegoria exemplar sem titubeios e vacilos, o que causou enorme
admiração pela minha pouca idade.
Vendo meu pai o meu grande interesse pelos livros, e já
começando a esboçar alguns textos, trouxe-me ele de presente, certo
dia, um dicionário de bolso, das Edições de Ouro. Foi grande o meu
deslumbramento. Em meu incontido entusiasmo, comecei a ler o
dicionário, página por página, verbete após verbete. Meu pai,
vendo essa minha dedicação, explicou-me que dicionário não era
para ser lido dessa maneira, mas apenas para ser consultado, quando
eu tivesse dúvida sobre o significado de um determinado vocábulo.
Cedo percebi, que, pelo contexto da leitura, muitas palavras
desconhecidas poderiam ter o seu significado extraído da própria
interpretação do texto.
Não pude deixar de explicar aos acadêmicos da AJULE
que a literatura era a mais inglória das artes; que o renome através
dela só vem tardiamente, quando vem, após muito esforço e
dedicação; que se desejassem dinheiro e Glória, deveriam buscar a
música (ainda que fosse a música medíocre da geração Teló) ou o
futebol, ou mesmo a política, mesmo a de Demóstenes e outros demos
demoníacos. Também lhes adverti que usassem com afinco a caneta
vermelha, a borracha, a cesta de lixo e a tecla delete, conforme seu
instrumento de escrever, porquanto muito do que escrevemos são
gorduras e celulites, que apenas engordam o texto, sem lhes dar a
contrapartida da beleza.
Aproveitei para fazer, como venho fazendo há muitos
anos, um alerta sobre as ciladas das drogas. E disse que os colégios,
públicos e privados, muito poderiam fazer, preventivamente, para
evitar que o jovem caia no mundo dos entorpecentes, através de
palestras e aulas a respeito desse mal que assola as famílias e a
sociedade, bem como promovendo o esporte, a arte e a cultura, através
de campeonatos intercolegiais ou interclasses, gincanas culturais,
certames de declamação, concursos literários e musicais.
Expliquei-lhes que outrora havia jornais manuscritos,
murais e impressos em mimeógrafos, ou nas trabalhosas e antiquadas
imprensas tipográficas, em que os textos eram compostos tipo a tipo
no componer, pelo “compositor” nada musical. Eu mesmo fui
colaborador de alguns desses jornais, entre os quais referi o A Luta,
o Folha do Litoral, o Norte do Piauí, o Inovação, que a Régia,
coordenadora da Academia Juvenil, bem conhecera em Parnaíba.
Defendi a ideia de que os colégios poderiam criar blogs
e sites culturais, para explorar a criatividade artística dos jovens
estudantes, que neles poderiam publicar seus poemas, crônicas,
contos e ilustrações, desenhos ou pinturas, e até mesmo pequenos
filmes e videoclipes. Poderiam promover a encenação de pequenas
peças teatrais ou produzir performances com a utilização de poemas
e exposição de artes plásticas de seus alunos.
Enfim, mediante essas atividades esportivas, artísticas
e culturais, a que fiz referência, os educandários poderiam
contribuir para afastar a juventude dos narcóticos, dando aos jovens
um maior e melhor sentido da vida, desenvolvendo ou aumentando a
autoestima deles, e, quem sabe, possibilitando o surgimento de novos
e grandes artistas. As quadras já existem, os auditórios já
existem, os professores já existem. O que falta, pois?
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