Cunha e Silva Filho
Me
perdoe o leitor o cunho historicista-memorialístico deste artigo.
Foi revolvendo velhas cartas de meu pai do tempo de nossa longa e
proveitosa correspondência de, pelo menos vinte anos, que me chamou
a atenção um assunto que, volta e meia, ele repetia: a carestia, o
custo de vida. Estou pensando aqui numa das cartas do tempo do
governo Sarney, na qual o jornalista rebelde, em tom de indignação
e um tanto de melancolia, se queixava da alta dos preços, o que
implicava numa alusão aos baixos salários do brasileiro que não
faz parte dos quadros da elite abastada e gastadeira (hoje, diriam
“consumista”).
Ora,
décadas se passaram desde o final do mandato de Sarney e o tema
persiste, renova-se, azucrina a vida dos barnabés (outro termo
antigo mas que serve aos propósitos deste artigo). Na carta de meu
pai, em tom de ironia, ele faz um comentário, que não vou
repetir ipsis literis, mas que dizia mais ou menos isso: “Esse
negócio de ter no país um presidente poeta não dá mesmo certo.”
O
cronista não tem compromisso com o economês nem tampouco com a
estatística, mas com a sua própria e modesta visão da vida e dos
homens. Daí que discutir economia, salário e custo de vida reflete
a percepção leiga, porém, realista de quem sofre na pele todas as
dores e aflições oriundas do descompasso entre a remuneração e a
subida dos preços de itens nas despesas necessários inadiáveis
mensais: alimentos, remédios, prestação da casa própria, plano de
saúde, aluguel, lazer, entre outros, já que, do contrário, quem
não desfruta do básico nesse conjunto de itens não está vivendo
decentemente.
É
óbvio que estou falando de uma difusa recém-denominada nova classe
média.(?), classe que, a bem da verdade, até hoje não sei ao certo
o que é ou com que base de cálculo matemático foi assim definida.
Será, por exemplo, que um porteiro da Zona Sul ou de outros bairros
menos nobres esteja agora, na pirâmide social, nessa nova classe
média? Que as condições sociais de uma classe mais baixa
melhoraram nos últimos dez anos é um a fato que até pode ser
levado em conta como uma mudança concreta.
Contudo,
o governo, sob a orientação petista, está permitindo, ou melhor,
através de suas agências dos diversos setores da economia, está
autorizando aumentos no custo de vida e o está fazendo às custas do
achatamento salarial do funcionalismo público federal e, por tabela,
estadual e municipal. Ora, a injustiça nesse descompasso é fácil
de ser percebida mesmo para quem não é dado aos números. O maior
indicador de como anda o país econômica e financeiramente está nos
aumentos dos produtos de consumo de cada cidadão, informações que
qualquer dona de casa sabe com respeito a gastos familiares. Se o
custo de vida aumenta nos boletos dos itens já assinalados linhas
atrás e o contracheque permanece o mesmo, estagnado, é porque está
sendo corroído por inflação ao longo do ano. Os aumentos dos
produtos tanto dos governos (gás, luz, Correios, transportes. IPTU,
IPVA, pedágios etc), quanto de setores privados são todos
determinados pelos governos federal, estadual e municipal. Logo, De
quem é a culpa? Claro, desses setores públicos. Na iniciativa
privada, tanto no comércio, na indústria, no atacado e no varejo,
quem paga a conta é o bolso do povo. Não é preciso ir longe. No
caso dos remédios, é absurda a despesa mensal com a qual o
brasileiro tem. que arcar, sobretudo se estiver aposentado
e com baixos proventos. Não é gratuita a circunstância de
que estão pipocando greves em universidades federais e
em outros setores públicos ou privados.
Um
país dividido em classes, que eu classificaria como alta, média e
baixa, na qual esta última se mostra difusa no que tange à renda
familiar, à medida que ocorrem aumentos de produtos diversos, e
sobretudo os de primeira necessidade, quem mais sofre o arrocho
salarial são os de renda média e baixa. Quanto aos ricos, isso
pouco monta, de vez que para eles sempre têm de sobra o que
possam gastar e consumir faraonicamente.
As
classes dominantes estarão sempre na vanguarda dos lucros e dos
gastos, dos frutos das regalias sem medida, sem medo nem pudor, na
realeza consumista, na conquista das benesses e do poder, seja, o
econômico, de grande peso na estrutura do país, seja o político,
os quais, desde “A República Velha”, mandam e desmandam na
sociedade brasileira, sociedade na qual o anacrônico útil,
contínuo, e o moderno oportunista confluem como traços singulares
do país miscigenado, cordial, solidário e paradoxalmente modelo de
honestidade bruzundanguense.
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