Cunha e Silva Filho
Uma
vez, um padre brasileiro, após a liturgia da missa, afirmou pela
tevê o seguinte: “Votem no candidato certo!” Minha mulher,
então, fez a seguinte pergunta para sim mesma ou para quem a
ouvisse: “E quem é, afinal, o candidato certo? Diz o Novo
Testamento, pela boca de Cristo: “Amai o próximo como a ti
mesmo.” “Mas, quem é meu próximo?”, disse um homem da
multidão.
Eis
uma boa pergunta, difícil, contudo, de ser respondida. Os eleitores,
durante um período determinado pelo Tribunal de
Justiça Eleitoral, assiste à desacreditada “Propaganda
Eleitoral”, que alguém com espírito engraçado e malicioso - e
com certa razão - a chamou uma vez de programa humorístico.
Dizem as más línguas que, grande parte do povão, e aqui incluo no
bolo os diversos níveis sociais e culturais de telespectadores, logo
que aparece o “obrigatório’ programa eleitoral, pega de um
controle remoto e muda de canal, ou melhor, muda para os canais de
assinatura a fim de se livrar de uma parte do programa eleitoral que
não passa de mentiradas de alguns candidatos.
Seria
o programa um mal necessário? Mesmo com todas as mentiras que não
mais são engolidas pelo telespectador mais politizado, já é hora
de o Tribunal Eleitoral repensar uma outra forma de realizar a
propaganda eleitoral. O mínimo que ela pode fazer para o
telespectador até hoje é uma amostragem do variado nível de
qualificação dos candidatos. Os eleitores, peneirando
cuidadosamente alguns candidatos melhores, vão aos poucos anotando
algumas ideias colhidas das apresentações de cada um deles, assim
como o nome do partido e o nº do candidato a prefeito e a vereador.
Talvez, sob este ângulo, a propaganda eleitoral de alguma maneira
sirva para a orientação do eleitor.
Em
assuntos de política, de religião e de escola de samba, o
ingrediente de fanatismo, de cegueira ainda impera e dita alguma
direção para o eleitor. Entretanto, por ser imbuído de fanatismo,
de parcialidade, de gosto individual, de simpatia pessoal, é que
entra a figura do indeciso.
Os
partidos brasileiros são numerosos, as siglas embaralham o
eleitorado. Candidatos de partidos diferentes apresentam por vezes
os mesmos programas, os mesmos projetos, as mesmas ideias. Tudo
isso confunde a cabeça do eleitor e, por serem mostrados num
programa televisivo, já por si só maçante, o eleitor indeciso,
fica num mato sem cachorro, perdido que está em concepções
diferentes de visão política que, divulgando ideias e correntes
ideológicas, mais embarafustam a mente cansado do trabalhador ou de
outro indivíduo de profissões variadas. Em síntese, o eleitor
mergulha no seu mundo interior tentando buscar alguma coerência a
que possa se agarrar para fazer uma opção de um candidato menos
desastroso para dirigir sua cidade e sua Câmara Municipal.
Num
contexto nacional em que decide no Supremo Tribunal Federal o destino
do famigerado “Escândalo do Mensalão,” com a perspectiva de
ainda o eleitor votar em candidato “ficha suja”, fica, por
conseguinte, difícil fazer-se uma escolha menos traumática de
alguns candidatos.
Uma
coisa me parece certa, o eleitor bem intencionado fica remoendo mais
ou menos nestes termos: este candidato é bom mas não tem
experiência político-administrativa. Este outro está fazendo uma
boa administração mas, politicamente, é ligado a políticos e
governantes sobre os quais pesam suspeitas de corrupção. Direita,
esquerda, centro, extrema direita, extrema esquerda, moderados,
neoliberais, democratas sociais, anarquistas, são formas ideológicas
que, cada vez mais, se esvaziam de seus princípios originais. De
teorização ideológica estamos cansados. Queremos governos que se
comprometam com a democracia social na prática, não na teoria
nebulosa e sem pés fincados no chão do Brasil.
A
profissionalização rasteira e nauseabunda tornou-se a regra no
conjunto da política nacional. Nossos homens públicos, com raras
exceções , só visam ao poder e às benesses que irão receber na
condição de mandatos e de cargos legislativos. A oligarquia ainda
se mantém forte num país politicamente provinciano como é o nosso.
Se
nosso políticos exercessem sua atividade sem as regalias
pantagruélicas próprias do Estado brasileiro, é provável que a
Câmara Federal, o Senado, os governos estaduais, os deputados, as
prefeituras, os vereadores sumissem como fumaça e as eleições se
tornassem um enredo tragicômico de um romance de José
Saramago (1922-2010). Daí que estão repletos de mediocridades e até
de analfabetos e oportunistas os nossos poderes constituídos, que
nos envergonham como brasileiros.
O
brasileiro, eleitor indeciso, ainda vota em alguém em troca de
favores ou porque o candidato é amigo de um amigo de um amigo, de um
amigo, numa corrente contínua que me lembra o poema drummondiano
“Quadrilha”, fazendo-se, é claro, as devidas modificações
semânticas, mas sem retirar o lado irônico da afirmação e
estendo-a não para as coisas do “amor,” mas da miséria de
nossa politicalha. Que venham as eleições, mas junto delas
eleitores de bem e amantes da democracia brasileira. Amém!
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