Fonseca Neto
Neste
ano que termina o Brasil celebra João Francisco Lisboa, “o Timon
maranhense”. Destacado intelectual da época do Império, sua
escrita se constituiu enquanto ele um jornalista (na acepção do
termo) e no viço historiógrafo. É patrono da cadeira 18 da
Academia Brasileira de Letras.
Nasceu
Lisboa em 22 de março de 1812, no interior da capitania do Maranhão,
numa localidade do município de Itapecuru, que seria mais tarde a
cidade de Pirapemas. Crescido e estudado em São Luís, aos vinte
anos torna-se um agitador de ideias, militante do jornalismo
partidário e já se tornando um prócer liberal da província, um
“bentivi”.
Todo
o Império do Brasil viveu com a sensação de “aceleração
histórica” o tempo posterior a 1830, década seguinte ao fim do
reinado de Pedro I. No Maranhão, época marcada por um estado de
vibrações insurrecionais, a luta de partidos entra em máximo
engalfinhamento – a década começa com a chamada “Setembrada”
(1831) e termina com a “Balaiada”(1838-1841). A economia sinaliza
desorganização, o dominato rural esforça-se por manter seus
privilégios em nível de poder municipal e os políticos da capital
inauguram a era das deputações provinciais. São Luís sinaliza um
relativo decaimento em relação à virtuose metropolitana
experimentada desde a era Pombal, ancorada pelo algodão – o “ouro
branco” em pluma – além das perdas simbólicas de tornar-se
(após 1808/1815) uma simples sede de poder provincial e não mais a
capital de Estado, que tanto a empoderou nos séculos precedentes –o
reino de Portugal, agora, estava sediado no Rio de Janeiro.
Nesse
contexto, as lutas intestinas opõem fortemente “os maranhenses
brasileiros” aos portugueses, que, em São Luís, nas baixadas do
arredor e até em Caxias, boca dos sertões de dentro, assim se
enfrentam em busca da hegemonia no poder local-provincial.
João
Lisboa faz-se um arrebatador bentivi e quando no Iguará o vaqueiro
Raimundo Gomes derruba a “bastilha da Manga” e põe em liberdade
trabalhadores ilegalmente presos, em São Luís, sua pena escritora,
como que faz tremer as estruturas do velho poder, tão lembradas e
temerosas da quentura produzida pela queda de outra Bastilha, quatro
décadas antes. Aliás, segundo biógrafos, era escrita em francês
(de Jouy) a epígrafe de seu jornal “O Brasileiro”, de 1832:
“Journalistes de tous les pays, élevez-vous au dessus des prejugés
nationaux, dénoncez tousles crimes, nommez touss les coupables.”
Já no tempo balaiense, batendo fortemente no governo conservador,
atuava na “Crônica Maranhense”, autêntica tribuna bentiviana,
acusada depois pela radicalização revolucionária. Acusação
problemática, advirta-se, pois, ainda que “radicais”, os
liberais recuam em sua condição de “classe”, quando esse
movimento avança sobre as estruturas de poder e sobretudo da
produção,nela agora confluindo negros aquilombados, além da
vaqueirama e outros trabalhadores e oficineiros livres. Dessas idas e
vindas, suas emoções elevadas e vicissitudes, não escapa o futuro
“Timon Maranhense”, que delas saiu um verbo-inflamado liberal,
misantropo, conformado, porém, nos limites da ordem imperial.
De
São Luís, já figura notável, humanista, foi para o Rio de
Janeiro; muito festejado. Sobre essa mudança e os anos seguintes
dele, anotou seu amigo e principal biógrafo, Antonio Henriques Leal:
“a 4 de julho de 1855, partiu esse notável escritor do Maranhão
para a capital do nosso Império, onde foi honrosamente acolhido por
todas as celebridades políticas e literárias, e tomou parte nas
redações do Correio Mercantil e do Jornal do Comércio. [...].
Outros cuidados, porém, o chamavam à Europa, sendo nessas vistas
auxiliado pelo nosso poeta, Antonio Gonçalves Dias, que pedira
dispensa da comissão, que exercia em Portugal, de investigar
documentos e outros subsídios para a nossa História, e fazer
extrair cópias deles para o Arquivo Público e para o IHGB,
indicando o nome de seu ilustrado comprovinciano para substituí-lo
nesse importante e afanoso encargo. Sendo aceita a desistência de
Gonçalves Dias, foi Lisboa nomeado, e em dezembro desse mesmo ano
(1855) se fazia de volta a Portugal em companhia de sua família”.
Lisboa
faleceu na cidade de Lisboa, em 1863. Sua obra sobre corrupção –
o “Jornal de Timon”, por exemplo – e outros males que afetavam
o organismo social e político do Brasil de seu tempo, são letais
até hoje e ajudam explicar os limites do liberalismo no Brasil.
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